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NOTA TÉCNICA Nº 61/2015/CGAA8/SGA2/SG/CADE

 

Inquérito Administrativo nº 08700.008098/2014-71 (Autos Restritos nº 08700.012009/2014-91)

Representante:         Ministério Público do Estado de Santa Catarina.

Representados:        Agentes do mercado de equipamentos e material de informática.

 

 

  

EMENTA: Inquérito Administrativo. Mercado de equipamentos e materiais de informática. Instauração de Processo Administrativo, nos termos dos artigos 13, V, e 69 e seguintes, da Lei nº 12.529/11 c/c artigo 146 e seguintes do Regimento Interno do Cade. Suposta conduta restritiva vertical. Hub and spoke. Fixação de condições de revenda. Suposto cartel em licitações nos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.  Enquadramento nos arts. 20, I a IV c.c. art. 21, I, II, III, V, VIII, X, XI, XII, XIII e XIV da Lei nº 8.884/94 e art. 36, I a IV, e §3º, I, alíneas a, c e d, II, IV, VIII, IX, X, XI e XII da Lei nº 12.529/11.

 

VERSÃO pública

 

 

I. RELATÓRIO

Em 19 de março de 2014, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina (“MPSC”) comunicou a este Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) supostas práticas ilícitas, atentatórias à livre concorrência, perpetradas por fabricantes e distribuidores/revendedores de materiais de informática. As investigações realizadas pelo MPSC abrangeram o período de 2008 a 2012, e resultaram na operação denominada “Licitação Mapeada”, tendo o Parquet encaminhado cópia dos autos da Ação Penal nº 018.13.007315-3, em trâmite na Comarca de Chapecó/SC.

Em 29 de abril de 2014 (fls. 05 e 06), a Superintendência-Geral do Cade (SG/Cade), com o objetivo de analisar os indícios de suposta infração à ordem econômica, requereu ao MPSC o envio de: a) cópia integral dos áudios das interceptações telefônicas realizadas nos termos da autorização judicial; b) cópia da decisão judicial que autorizou o compartilhamento de tais provas produzidas na investigação criminal com o Cade.

Em 07 de maio de 2014 (fls. 02 e 03), a Juíza de Direito da 2ª Vara Criminal de Chapecó/SC, em conformidade com a manifestação do MPSC e decisão judicial que autorizou o compartilhamento de provas[1], encaminhou ao Cade a cópia integral dos áudios das interceptações telefônicas realizadas.

Conforme verificado da documentação encaminhada ao Cade, o MPSC, por meio da 10ª Promotoria de Justiça de Chapecó, em 25 de janeiro de 2012, deflagrou a denominada operação “Licitação Mapeada”, com o auxílio do Grupo de Atuação Especial de Combate a Organizações Criminosas – GAECO/Chapecó. Tal investigação visava apurar fraudes em licitações no município de Cordilheira Alta/SC, bem como em outros municípios da região (fls. 64 e 65), e foi iniciada a partir de denúncia [ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

Portanto, a partir do encaminhamento de tais fatos para a SG/Cade, às fls. 1.991 a 1.993, foi instaurado Inquérito Administrativo, por meio do Despacho n.º 1.371 do Superintendente-Geral (fl. 1.994, datado de 29 de outubro de 2014), tendo em vista a necessidade apurar a existência de indícios quanto à suposta adoção de condutas concertadas em licitações para aquisição de equipamentos e materiais de informática, em municípios de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.[8]

É o relatório.

 

II. CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE OS FATOS REPORTADOS À SG/CADE

A partir do relatado acima, verifica-se que as extensas investigações realizadas pelo MPSC, no âmbito da operação denominada “Licitação Mapeada”, demonstraram indícios quanto à possível ocorrência de duas supostas infrações anticoncorrenciais:

Condutas anticompetitivas resultantes da política de vendas da Positivo, abrangendo concorrências públicas e privadas destinadas à aquisição de equipamentos e materiais de informática. Em síntese, aliada à sua política de divisão de mercado, a Positivo desenvolveu uma política de mapeamento e reserva de oportunidades. A exemplo de cartéis do tipo hub and spoke, a Positivo teria supostamente passado a centralizar e repassar informações comerciais sensíveis entre revendedores - facilitando a adoção de condutas comerciais uniformes entre concorrentes - , e a conferir uma “autorização” para determinado revendedor participar de uma licitação e mesmo a impedir que revendedores não autorizados participassem de licitações mapeadas a outros revendedores, o que, se não cumprido, implicaria na recusa de fornecimento de produtos e na aplicação de outras penalidades. Além disso, destacam-se indícios de que a Positivo também não conferiria tal autorização em licitação que fosse de interesse da empresa, criando, portanto, dificuldades a concorrentes ou mesmo, como apurado, solicitando que eles desistissem de licitação em que a Positivo estaria participando, conduta essa que também seria passível de caracterização como conluio entre concorrentes.    

Indícios robustos de cartel em licitações destinadas à aquisição de equipamentos e materiais de informática nos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Tal conduta, inclusive, pode ser apontada como possível exemplo da outra conduta descrita no item anterior, em que a Positivo influenciaria a adoção de condutas concertadas entre concorrentes, notadamente se levarmos em conta o mercado atingido e, especialmente, o fato de ao menos um dos revendedores da Positivo (S&V Equipamentos para Escritório Ltda.) estar supostamente envolvido tanto na conduta indicada no item (a) acima quanto neste suposto cartel atuante em SC e RS.

Tratando-se, pois, de supostas condutas anticompetitivas com objetos distintos, passa-se a analisá-las em separado, iniciando-se, porém, pela identificação dos Representados, para que posteriormente esta SG/Cade aponte os indícios robustos em relação a cada um deles.

 

III. DOS REPRESENTADOS

Com base na análise dos documentos e das informações obtidas nos autos, há indícios robustos de infração à ordem econômica em face das seguintes pessoas físicas e jurídicas[9]:

 

Pessoas Jurídicas:

Caleb G. Kieling & Cia. Ltda. (“Caleb Ltda.”), CNPJ 01.194.290/0001-14, com sede na Rua Sete de Setembro, 132, Centro. Joaçaba/SC, CEP 89600-000.

Enge Áudio Comércio e Sonorização Ltda. ME (“Engeáudio”), CNPJ 07.892.831/0001-64, com sede na Rua Dona Chiquinha de Mattos, 100, Centro, Taubaté/SP CEP: 12.020010.

I 9 Soluções em Tecnologia e Informática Ltda. ME (“I9”), CNPJ 11.254.805/0001-88, com sede na Rua Rui Barbosa, nº 3317, Centro, Campo Grande/MS, CEP 79002-362.

Líder Suprimentos para Informática Ltda. (“Líder”), CNPJ 82.129.024/0001-00, com sede na Avenida Senador Salgado Filho, 568, Caçador/SC, CEP 89.500-000 e/ou Rua Maturino Borges da Luz, nº 50, Centro, Caçador/SC, CEP 89500-000.

MS Equipamentos e Assistência Técnica Ltda. (“MS”), CNPJ 05.956.936/0001-04, com sede na Avenida Fernando Machado, 703-D, Sala 2, Centro, Chapecó/SC, CEP 89.802-111.

Multicomp Informática Ltda. (“Multicomp”), CNPJ nº 11.055.328/0001-21, com sede na Rua XV de novembro, nº 7155, Centro, Guarapuava/PR, CEP 85010-000 e/ou Rua Frei Caneca, 2614, Trianon, Guarapuava/PR, CEP 85012-000.

Positivo Informática S.A. (“Positivo”), CNPJ nº 81.243.735/0001-48, com sede na Rua João Bettega, 5200, Curitiba/PR, CEP 81350-000.

Proxyline Informática Ltda. (“Proxyline”), CNPJ 09.474.456/0001-68, com sede na Avenida Porto Alegre, 998 D, Sala 01, Bairro Centro, Chapecó/SC, CEP 89.802-130.

S&V Equipamentos para Escritório Ltda. (“S&V”), CNPJ 00.523.549/0001-60, com sede na Avenida Fernando Machado, 703-D, Centro, Chapecó/SC, CEP 89.802-111.

Somaq Assistência e Equipamentos Ltda. (“Somaq”), CNPJ 81.607.715/0001-09, com sede na Rua Santos Dumont n.º 857, Centro, São Miguel do Oeste/SC, CEP 89.900-000 e/ou Rua 15 de novembro, 196, Centro, São Miguel D'Oeste/SC, CEP 89900-000.

 

Pessoas Físicas:

Angélica Scapinello, CPF 34.602.799-31, RG 4043992/SC, [ACESSO RESTRITO].

Caleb Gerson Kieling, CPF 177.961.210-91, RG n.º 6438659/SC, [ACESSO RESTRITO].

Claudir Frigeri, CPF 386.487.769-53, RG n.º 4610097/SC, [ACESSO RESTRITO].

Lindacir Salete Faccio Giaretta, CPF 846.727.229-53, RG 5904887/SC, [ACESSO RESTRITO].

Luciano Oscar Schmidt, CPF 041.646.489-02, RG n.º 4193907/SC, [ACESSO RESTRITO].

Marcelo Rodrigues de Gouveia, CPF 032.663.329-46, RG n.º 8012207/PR, [ACESSO RESTRITO].

Márcia Helena Jabuonski Siepko, CPF 927.674.009-00, RG n.º 5.133.431/SC, [ACESSO RESTRITO].

Paulo Roberto Marchine, CPF nº 859.713.918-87, RG 7143067/SP, [ACESSO RESTRITO].

Pedro Frigulha, CPF 196.129.159-20, RG 491340/SC, [ACESSO RESTRITO].

Rodrigo Benetti Dolatto, CPF nº 850.317.639-49, RG 4931309/PR, [ACESSO RESTRITO].

Rodrigo Cesar de Faria Correa, CPF nº 786.252.201-00, [ACESSO RESTRITO].

Samuel Prado, CPF nº 009.642.019-76, [ACESSO RESTRITO].

Sérgio Francisco Siepko, CPF 231.798.130-91, RG n.º 1010282679/RS, [ACESSO RESTRITO].

Solange Maria Ody Ficcagna, CPF 593.893.979-87, RG 2.034.950/SC, [ACESSO RESTRITO].

Vicente Borges Soares, CPF nº 850.518.378-91, RG 6.461.669 SSP-SP, [ACESSO RESTRITO].

Volmir Ficcagna, CPF 423.692.159-68, [ACESSO RESTRITO].

 Waldelei Schmidt, CPF 629.065.349-00, RG nº 2.160.009/SC, [ACESSO RESTRITO].

 Wilson Donizette Inácio, CPF 103.069.408-76, [ACESSO RESTRITO].

 

Com vistas a garantir a melhor compreensão dos fatos, apresenta-se o quadro abaixo no qual estão dispostas as informações básicas sobre as relações entre as pessoas físicas e jurídicas ora representadas:

Representado

Empresa

Angélica Scapinello

Funcionária da S&V

Representante da S&V e MS em várias licitações

Caleb Gerson Kieling

Sócio da empresa Caleb Ltda.

Claudir Frigeri

Sócio da empresa Somaq

Lindacir Salete Faccio Giaretta

Sócia da empresa Líder

Luciano Oscar Schmidt

Sócio da empresa Proxyline

Marcelo Rodrigues de Gouveia

Funcionário da S&V

Representante da S&V e MS em várias licitações

Márcia Helena Jabuonski Siepko

Sócia da empresa MS

Paulo Roberto Marchine

Gerente nacional de vendas – canais indiretos da Positivo

Pedro Frigulha

Sócio da empresa Líder

Rodrigo Benetti Dolatto

Gerente comercial da Positivo

Rodrigo César de Faria Correa

Sócio da I9

Samuel Prado

Sócio da empresa MULTICOMP

Sérgio Francisco Siepko

Sócio da empresa S&V, sendo responsável pela área administrativa, financeira e compras[10].

Solange Maria Ody Ficcagna

Sócia da empresa MS

Vicente Borges Soares

Diretor comercial da Positivo

Volmir Ficcagna

Sócio da empresa S&V, sendo responsável pela parte comercial, pelas filiais e eventualmente pela parte financeira e administrativa[11].

Waldelei Schmidt

Sócio da empresa S&V, sendo responsável pela parte comercial, pelas filiais e eventualmente pela parte financeira e administrativa[12].

Wilson Donizette Inácio

Sócio da Engeáudio

 

 

IV. ANÁLISE DA SUPOSTA INFRAÇÃO CONCORRENCIAL ENVOLVENDO A POLÍTICA DE VENDAS DA EMPRESA POSITIVO

Inicialmente, no contexto da investigação conduzida pelo MPSC, foram verificados indícios de conduta anticompetitiva em relação à política de vendas adotada pela empresa Positivo Informática S.A. (“Positivo”), especialmente no que se refere à sua política de mapeamento e reserva de oportunidades em concorrências destinadas ao fornecimento de equipamentos e materiais de informática em geral.

Há indícios de que, em regra, tal política inibiria e regulava a concorrência entre revendedores, fixaria condições comerciais a seus revendedores em negócios destes com terceiros, bem como influenciaria a adoção de conduta comercial uniforme entre concorrentes. No sentido dos chamados cartéis hub-and-spoke, a Positivo teria supostamente passado a centralizar e repassar informações comerciais sensíveis entre revendedores – influenciando a adoção de condutas uniformes entre concorrentes – e a conferir uma “autorização” para determinado revendedor participar de uma licitação e mesmo a impedir que revendedores não autorizados participassem de licitações mapeadas a outros revendedores, o que, se não cumprido, implicaria na recusa de fornecimento de produtos ou na aplicação de outras penalidades.

Além disso, considerando que a Positivo também participava diretamente de licitações – concorrendo, portanto, com seus revendedores –, há indícios de que tal política também supostamente criaria dificuldades a concorrentes ou mesmo, como apurado, implicava na caracterização de conluios entre concorrentes, havendo indícios de que a Positivo já teria solicitado que um revendedor desistisse de licitação em que a Positivo estaria participando ou teria interesse em participar.

Conforme anteriormente relatado, [ACESSO RESTRITO], revendedora de equipamentos da Positivo, que enfatizou a recusa de venda de produtos pela Positivo quando essa revendedora participava de licitações que não estivessem “mapeadas” ou reservadas para a [ACESSO RESTRITO]. A partir de tal bloqueio, a [ACESSO RESTRITO] não poderia, portanto, comprar as máquinas da Positivo, o que inviabilizaria a entrega dos produtos  nas licitações em que era declarada vencedora.

Antes de analisar os indícios apurados nos autos, entende-se oportuno tecer breves considerações sobre cartéis do tipo hub-and-spoke, visto que aplicáveis ao caso concreto.

 

IV.1 Cartéis do tipo hub-and-spoke

Uma das modalidades de cartéis é a do tipo hub-and-spoke[13], em que um distribuidor de um determinado produto funciona como ponto focal (“hub”) para o compartilhamento de informações comercialmente sensíveis com as empresas responsáveis pelas vendas finais do referido produto (“spokes”). Nesse tipo de acordo colusivo, o distribuidor obtém informação comercialmente sensível de determinado revendedor (como dados sobre potenciais clientes e o valor da proposta a ser apresentada pelo revendedor) (Fase 1) e os repassa para sua cadeia de revendedores (Fase 2), tornando desnecessário que estes se comuniquem entre si para atuarem de maneira coordenada (Fase 3)[14]. Posteriormente, o distribuidor monitora o cumprimento do acordo.

O esquema abaixo busca consolidar o modelo em tela:

 

A autoridade britânica de defesa da concorrência, por exemplo, sugeriu alguns requisitos para que a referida conduta – entre distribuidor e sua rede de revendedores – seja caracterizada como anticoncorrencial[15]:

“A fim de cumprir o standard de prova requerido, é necessário que se demonstre que o revendedor (A) informa para seu distribuidor (B) os preços que pretende praticar no futuro, sendo que as circunstâncias nas quais tal informação é repassada são tais que é possível afirmar que A o tenha feito com a intenção de que B irá (ou poderia) utilizar tal informação para influenciar as condições do mercado, ou de fato prevê que isso ocorreria por intermédio do repasse da informação para outros revendedores (C). É necessário mostrar que B tenha efetivamente repassado tal informação para C e que tal informação foi revelada em circunstâncias nas quais C tinha conhecimento do contexto no qual tal informação foi repassada de A para B, ou que C de fato tinha interesse que tal informação lhe fosse passada com a participação de A (isto é, para influenciar as condições de mercado)”.

Temos assim dois requisitos suficientes para que os cartéis do tipo hub-and-spoke sejam considerados anticoncorrenciais: (i) o revendedor A passa dados comercialmente sensíveis para seu distribuidor em circunstâncias tais que indicam que esse repasse de informações foi feito pelo revendedor A para que tais dados sejam utilizados para influenciar as condições de mercado; e (ii) os dados comercialmente sensíveis do revendedor A são de fato repassados pelo distribuidor para os outros revendedores.

Note-se que uma vez caracterizado o caráter anticompetitivo do cartel hub-and-spoke segundo os requisitos acima, a eventual comprovação do uso ou não da informação pelos revendedores que receberam a informação para a formação de seu preço é dispensável para a comprovação do ilícito, tornando-se, pois, um elemento adicional, de agravação da conduta.

No mesmo sentido, por ter como um de seus elementos constitutivos o intercâmbio indireto de informações estratégicas entre concorrentes, a colusão hub and spoke também é conhecida – especialmente no Reino Unido – como troca de informações A-B-C, que é um termo mais genérico, pois engloba também práticas concertadas, para além de sua ocorrência no âmbito de cartéis. Trata-se, em suma, da disseminação de informações estratégicas (v.g., sobre política futura de preços e outras variáveis comercialmente sensíveis) entre duas ou mais empresas concorrentes (“A” e “C”), por meio de um parceiro comercial comum (“B”) que, apesar de não concorrer diretamente no mercado relevante, mantém relações de fornecimento ou de distribuição com ambos os concorrentes (“A” e “C”)[16].

Casos recentes que se utilizaram expressa ou tacitamente o conceito de colusão hub and spoke foram decididos por autoridades nas seguintes jurisdições: Estados Unidos da América, Alemanha, Bélgica, Polônia, entre outros. O Reino Unido é provavelmente a jurisdição onde houve maior elaboração doutrinária e jurisprudencial sobre essa prática. O Competition Appeal Tribunal daquele país sugeriu alguns requisitos para que a referida conduta pudesse ser caracterizada como anticoncorrencial, os quais foram acima descritos e que permitem a identificação de algumas modalidades de trocas de informações A-B-C ou práticas colusivas hub and spoke, duas das quais teriam ocorrido no presente caso, como será demonstrado adiante.

A primeira destas modalidades é a modalidade mais comum de colusão hub and spoke ocorre quando um varejista (A) divulga intenções de preços e outras informações estratégicas para um fornecedor (B), em circunstâncias tais que permitam concluir que o objeto da comunicação era restringir a concorrência com outros varejistas relacionados a (B) – “C” – por meio da disseminação das informações estratégicas entre estes. Se ficar demonstrado que B repassou essa informação, então este participou da prática concertada, ao influenciar a adoção de conduta comercial uniforme entre concorrentes[17].

A segunda modalidade de prática concertada hub and spoke documentada nos autos pode ser descrita, de maneira geral, da seguinte forma: um revendedor A se queixa para um fornecedor B sobre as ações de um concorrente C no mercado de revenda, de modo a fazer com que B, influenciado por essa reclamação, tente limitar a liberdade de B para concorrer com A. Sempre que isso ocorre, é possível considerar que houve uma prática concertada anticompetitiva entre A e B, cujo objeto era limitar a concorrência entre A e C.

Feitas essas considerações teóricas sobre a forma de atuação dos cartéis hub-and-spoke, passa-se a analisar os fortes indícios de suposta conduta anticompetitiva adotada pela Positivo e alguns de seus revendedores.

 

IV.2 Política de Vendas da Empresa Positivo

A Positivo é uma empresa fabricante de equipamentos e materiais de informática, destacando-se especialmente na fabricação e comercialização de desktops, notebooks, tudo-em-um, tablets, celulares, smartphones[18] e equipamentos educacionais multimídia como lousas interativas, projetores e acessórios[19]. Sua rede de revenda é composta por cerca de 3.000 (três mil) revendedores[20], sendo que também consta de seu site que a empresa conta com mais de 10.000 (dez mil) pontos de venda[21].

Em informação disponível no Ato de Concentração nº 08012.000348/2010-50[22], em 2008, a Positivo possuía cerca de 14% do mercado nacional de computadores, destacando-se:

Vale destacar ainda que, segundo o sítio eletrônico da própria Positivo (http://www.positivo.com.br/pt/informatica), dados do International Data Corporation – Brasil (IDC Brasil), uma das mais conceituadas empresas de inteligência de mercado do mundo, especializada em TI e informática, a Positivo é a líder nacional na venda de computadores há 9 anos consecutivos.

Com relação especificamente às licitações públicas, vale ainda lembrar que conforme o art. 3º, da Lei 8248/91, bens e serviços com tecnologia desenvolvida no país terão preferência nas licitações públicas de informática, o já confere, desde logo, vantagem competitiva aos produtos da Positivo nestes certames.

Feitas essas breves considerações, verificou-se, a partir do apurado nos autos, que, notadamente para o setor público, a política de vendas da Positivo incluiria, inicialmente, uma divisão geográfica de mercado entre os seus revendedores, cumprindo-se destacar, nesse sentido, [ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

Aliás, verifica-se que tal política de divisão geográfica de mercado estava sendo alvo de discussão entre os revendedores. [ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

 

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO]

 

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

 

Aliado a essa divisão geográfica de mercado, verificou-se que a Positivo também adotava uma política de mapeamento e reserva de oportunidades, política essa que seria, em geral, assim estruturada:

Fase 1 – Mapeamento e Reserva de Oportunidades: (i) o revendedor Positivo “mapearia uma oportunidade” junto a um cliente ou órgão licitante localizado em sua área geográfica de atuação; (ii) mapeada a oportunidade, o revendedor comunicaria tal fato à Positivo; (iii) a Positivo checaria se a empresa era a primeira revenda a mapear tal oportunidade ou se ela atenderia aos critérios para a concessão de tal “reserva” para a licitação; (iv) atendendo a tais critérios e não tendo a própria Positivo interesse em participar[24] – a indicar que por vezes a Positivo atuava como concorrente potencial de seus revendedores –, a Positivo “reservaria” essa oportunidade para o revendedor, sendo que, antes dessa reserva, o revendedor não poderia participar da licitação.

Fase 2 – Compartilhamento de informações comerciais sensíveis entre revendedores concorrentes: (i) após o revendedor da Positivo mapear e reservar uma oportunidade, a Positivo possivelmente repassaria informações comercialmente sensíveis a revendedores concorrentes, tais como que já haveria outro revendedor mapeado naquela licitação, indicando, em alguns casos, quem seria seu concorrente potencial (facilitando, pois contatos diretos), e (ii) a Positivo ainda informava que o revendedor que não tivesse a oportunidade mapeada – seja por estar mapeada a outro revendedor, seja por ser considerada de interesse da Positivo, situação, pois, em que atuava como concorrente de seus revendedores – não deveria participar ou mesmo deveria desistir da licitação, conduta essa, aliás, cobrada por alguns revendedores, que, portanto, solicitavam “proteção” à Positivo, ou seja, solicitavam que a Positivo efetivamente não permitisse que outros revendedores não mapeados participassem da licitação;

Fase 3 – Punições a revendedores dissidentes: se o revendedor mapeado vencesse a licitação, a Positivo lhe forneceria o produto. Se um revendedor não mapeado participasse ou vencesse uma licitação não reservada a ele ou então considerada de interesse da Positivo, há indícios de que a Positivo bloquearia o acesso de tal revendedor ao sistema de compras da Positivo (prática denominada de bloqueio de “login”) ou não lhe forneceria o produto, o que implicaria na dificuldade ou impossibilidade de tal revendedor atender ao solicitado na licitação que havia vencido.

Observa-se, portanto, que tal forma de atuação, especialmente no que se refere às Fases 2 e 3, podem representar potenciais prejuízos à concorrência e serem enquadrados na Lei de Defesa da Concorrência. Veja que um programa de mapeamento de oportunidades não é necessariamente ilícito por si só, mas, no caso em questão, há indícios de que o programa possuía certas regras que ensejariam que a Positivo atuasse como ponto focal para compartilhamento de informações comerciais sensíveis entre os revendedores de materiais e equipamentos de informática, havendo até mesmo a previsão de penalidades para os dissidentes, condutas essas, portanto, que poderiam restringir ou falsear a concorrência e até mesmo ensejar a adoção de conduta comercial uniforme entre concorrentes.

Aliás, considerando que a Positivo também concorre com seus revendedores em determinadas licitações, o estabelecimento de uma política de mapeamento e reserva de oportunidades em que haja a fixação de condições de revenda, pode ensejar preocupações antitruste adicionais. Nesse ponto, deve-se ressaltar que a doutrina considera que um dos principais efeitos negativos da fixação do preço ou condições de revenda (FPR) seria facilitar uma conduta colusiva por parte dos revendedores, tendo sido utilizada, em muitos casos, para facilitar a organização de um cartel.

Conforme explicitado no voto-vista do Conselheiro Marcos Veríssimo[25]: “De fato, como anota Hovenkamp, a imposição de FPR foi usada em muitos casos, para facilitar a organização de um cartel. Segundo ele, ‘(...) a decisão dada em Dr. Miles condenando pela primeira vez a FPR foi o resultado de um dos maiores cartéis da história americana – um acordo entre membros das associações nacionais de atacado e varejo de drogas para fixar os preços de medicamentos patenteados. O autor afirma, ainda, que em todas as primeiras decisões dos tribunais americanos dadas em casos de FPR havia fortes evidências tanto de colusões horizontais quanto verticais[26].

Passa-se, pois, ao detalhamento da referida política de mapeamento e reserva de oportunidades.   

 

IV.2.1. Do Mapeamento e Reserva de Oportunidades (Fase 1):

A política de mapeamento de oportunidades da Positivo é retratada em comunicações telefônicas e telemáticas interceptadas judicialmente, no contexto da já mencionada operação “Licitação Mapeada”, realizada pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina com o auxílio do Grupo de Atuação Especial de Combate a Organizações Criminosas – GAECO/Chapecó.

Como apontado, foram alvo de interceptação sócios e funcionários das empresas S&V e MS, revendedoras de produtos da Positivo, razão pela qual a maioria das transcrições abaixo referem-se a tais empresas, embora deva-se destacar a existência de indícios em relação à Positivo (e seus Gerentes e Diretor abaixo indicados) e a outros revendedores de produtos da Positivo.

Com vistas a compreender a política de mapeamento de oportunidades da Positivo,  transcreve-se [ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

Verifica-se, portanto, que, [ACESSO RESTRITO] explica as principais regras desse Programa de mapeamento de oportunidades, sendo ele, aliás, o responsável por organizar os revendedores em tal política de vendas da Positivo. Em síntese, ele aponta que o revendedor participante deveria comunicar à Positivo seu interesse em participar de uma licitação (para qualquer quantidade de máquinas), devendo o revendedor aguardar a autorização da Positivo para efetivamente participar do certame. Observa-se, ainda, que tal autorização dependeria de tal revendedor atender aos critérios para receber a “reserva” da oportunidade, ou de a Positivo não ter interesse em participar diretamente de tal certame, o que supostamente ocorreria em licitações para a aquisição de mais de 200 (duzentas) máquinas, a indicar que, por vezes, a Positivo atuava como concorrente potencial de seus revendedores em licitações.

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO]:

  [ACESSO RESTRITO]

 

Verifica-se, portanto, que restam detalhadas as diretrizes que guiariam a participação de revendedores da Positivo em processos licitatórios, conduta essa que poderia caracterizar a fixação de condições de revenda. Como visto, tal política incluiria o mapeamento de licitações, o encaminhamento à Positivo de pedido de reserva da licitação, a definição pela Positivo de que tal licitação estava reservada para determinado revendedor – o que só então autorizava o revendedor a participar do certame – e, após, a aplicação de mecanismos de proteção ao revendedor que mapeou a licitação, conforme será abaixo detalhado.

 

IV.2.2. Compartilhamento de informações comerciais sensíveis entre revendedores concorrentes (Fase 2):

Conforme consta dos autos, há indícios de que, no contexto do Programa de mapeamento de oportunidades, após o revendedor da Positivo mapear e reservar uma oportunidade, a Positivo possivelmente repassaria informações comercialmente sensíveis a revendedores concorrentes, tais como que já haveria outro revendedor mapeado naquela licitação, indicando, em alguns casos, quem seria seu concorrente potencial (facilitando, pois contatos diretos), ou mesmo repassando ao revendedor que fez a “reserva” da oportunidade que outro agente tentou mapear tal certame.

Ademais, a Positivo ainda informava que o revendedor que não tivesse a oportunidade mapeada não deveria participar – ou mesmo deveria desistir – da licitação, conduta essa, aliás, cobrada por alguns revendedores, que, portanto, solicitavam “proteção” à Positivo, ou seja, solicitavam que a Positivo efetivamente regulasse o mercado e centralizasse a participação dos revendedores e não permitisse que outros revendedores não mapeados participassem da licitação, razão pela qual também ensejam sua inclusão no polo passivo da investigação.

A partir disso, há indícios de que, para implementar seu programa de mapeamento e reserva de oportunidades, a Positivo acabava por repassar e compartilhar informações estratégicas entre revendedores concorrentes, influenciando, portanto, a adoção de conduta comercial uniforme entre eles. Isso incluiria, por exemplo, repassar informações de quais empresas participariam de licitações vindouras ou mesmo solicitar que revendedores não apresentassem propostas em determinado certame, ou mesmo solicitar que eles desistissem de licitações, por já haver um revendedor mapeado para aquele processo licitatório ou em razão de a própria Positivo ter interesse em participar diretamente da licitação, situação essa em que a Positivo atuava como concorrente de seus revendedores e com eles supostamente ajustaria vantagens e condições em licitações, incorrendo em combinações com concorrentes.   

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Diante disso, constam dos autos indícios de que Positivo compartilhava informações comercialmente sensíveis entre revendedores concorrentes e os orientava a atuar de forma a não competir efetivamente com a revenda que detinha a “reserva” da licitação, sob pena de aplicação de penalidades, conforme abaixo detalhado.

 

 IV.2.3. Punições a revendedores dissidentes (Fase 3):

Conforme verificado dos autos, há indícios de que o Programa de mapeamento e reserva de oportunidades da Positivo previa a aplicação de penalidades a revendedores que participassem de licitações para as quais não tinham recebido autorização da fornecedora – seja por ser outro o revendedor que deteria a reserva, seja em razão de o certame ser de interesse da própria Positivo.

Com efeito, se um revendedor não mapeado participasse ou vencesse a licitação, há indícios de que a Positivo bloquearia o acesso de tal revendedor ao sistema de compras da Positivo (prática denominada de bloqueio de “login”) ou não lhe forneceria o produto, o que implicaria na dificuldade ou impossibilidade de tal revendedor atender ao solicitado na licitação que havia vencido, ensejando até mesmo a aplicação das penalidades legais, pela autoridade licitante, ao vencedor inadimplente. 

Aliás, várias das comunicações telefônicas interceptadas apontam indícios de que tal mapeamento de oportunidades ensejava conflitos entre os revendedores. Alguns exigiam da Positivo o efetivo cumprimento do programa, inclusive em termos de bloqueio ou descredenciamento dos demais revendedores que não cumprissem a reserva de oportunidade – em relação aos quais, portanto, entende-se pela existência de indícios de adoção de condutas anticompetitivas –, enquanto outros questionavam o programa, na medida em que tinham interesse em participar da licitação, mas se viam obrigados a não fazê-lo ou mesmo eram punidos se participassem ou vencessem licitações que não tinham sido mapeadas para eles.

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Diante do exposto, entende-se que há robustos indícios de que o programa de mapeamento e reserva de oportunidades da Positivo previa a aplicação de penalidades a revendedores que participassem de licitações que eram de interesse direto da Positivo – atuando, pois, como concorrente potencial de seus revendedores – ou em licitações que já estavam mapeadas para outros revendedores, penalidades essas que teriam sido aplicadas em vários casos, sendo esse, aliás, um comportamento cobrado por várias revendedoras, que exigiam, portanto, que a Positivo regulasse o mercado e centralizasse as informações de participação de licitações, definisse quem deveria participar ou não dos certames e “protegesse” os revendedores “mapeados” da concorrência potencial de outros revendedores. 

 

IV.3 Considerações finais quantos aos indícios referentes à política de vendas da Positivo

Conforme apontado acima, há indícios de que a política de vendas da Positivo, tal como implementada, teria produzido efeitos anticompetitivos, em decorrência da diminuição da concorrência especialmente em compras realizadas por entes públicos.

Em síntese, a política de vendas da Positivo previa inicialmente uma divisão geográfica de mercado entre seus revendedores, aliada a uma política de mapeamento e reserva de oportunidades, destinada a conceder determinados benefícios à revenda que prospectou um negócio para equipamentos e materiais de informática da Positivo.

Nesse sentido, inicialmente, o revendedor comunicaria a oportunidade à Positivo, que checaria se a empresa atenderia aos critérios para a concessão de uma “reserva” a ela para a licitação. Atendendo a tais critérios e não tendo a própria Positivo interesse em participar, a Positivo “reservaria” essa oportunidade para o revendedor. Em várias ocasiões, a Positivo apontou que suas revendedoras apenas poderiam participar de licitações após receber a autorização da Positivo, com vistas, portanto, a evitar a competição entre os seus revendedores por um mesmo negócio ou mesmo a competição com a própria Positivo nas licitações em que ela tivesse interesse em participar diretamente.

Assim, verifica-se que os eventuais objetivos economicamente justificáveis em tal programa de negócios da Positivo foram alterados, havendo indícios de que essa política de mapeamento e reserva de oportunidades veio a se tornar um mecanismo ilícito de coordenação entre a Positivo e alguns de seus revendedores, que, por vezes, atuavam como concorrentes entre si e até mesmo concorriam diretamente com a Positivo em licitações.

Com efeito, conforme apontado, há indícios de que a conduta da Positivo constitua um cartel do tipo hub-and-spoke. Nesse tipo de cartel, o distribuidor/fabricante de um determinado produto funciona como ponto focal (“hub”) para o compartilhamento de informações comercialmente sensíveis com as empresas responsáveis pelas vendas finais do referido produto (“spokes”). Nesse tipo de acordo colusivo, o distribuidor/fabricante obtém informação comercialmente sensível de determinado revendedor (Fase 1) e os repassa para sua cadeia de revendedores (Fase 2), tornando desnecessário que estes se comuniquem entre si para atuarem de maneira coordenada (Fase 3). Posteriormente, o distribuidor monitora o cumprimento do acordo e, no caso em questão, ainda aplicaria penalidades aos dissidentes.

No caso, a Positivo centralizaria informações sobre, por exemplo, a participação em licitações, e as disseminava de forma, por exemplo, a indicar para a revendedora “reservada” que outra empresa demonstrou interesse na licitação, ou vice versa, ou seja, dizendo para uma revendedora que não fez a “reserva” quem seria a empresa designada para aquele certame. Além disso, há indícios de que a Positivo apontava que determinado revendedor não deveria participar ou deveria desistir da licitação, por já estar ela reservada para outro revendedor, informações essas que teriam o condão de afetar as condições de concorrência em determinado certame. Assim, há indícios de que tal política passou a ser utilizada para compartilhar informações comerciais sensíveis entre revendedores concorrentes, conduta essa que poderia ensejar a adoção de condutas comerciais uniformes entre concorrentes, e passível, portanto, de enquadramento no art. 21, II, da Lei nº 8.884/94 e art. 36, §3º, II, da Lei nº 12.529/2011.

Outrossim, observa-se que a política de reserva de oportunidades da Positivo teria sido supostamente utilizada não só para dividir o mercado como também para evitar que a Positivo sofresse a competição de seus revendedores em licitações em que ela tivesse interesse em participar diretamente. Veja-se que, como a Positivo atua no mercado upstream e downstream, ela se beneficia diretamente da divisão de mercado empreendida por tal política. Aliás, constam dos autos indícios de que a Positivo teria chegado a contatar uma de suas revendas que estava com ela concorrendo diretamente para exigir que ela se retirasse da licitação, condutas essas, portanto, passíveis de enquadramento no art. 21, I, III, V e VIII, da Lei nº 8.884/94 e art. 36, §3º, I, alíneas a, c e d, e IV da Lei nº 12.529/2011.

Ademais, também há indícios de que, a partir de tal política de mapeamento e reserva de oportunidade, a Positivo passou não apenas a “regular” o mercado - estabelecendo acordos para a participação nas concorrências -, como também passou a ser cobrada por parte de seus revendedores para que passasse a efetivamente protegê-los da concorrência potencial de outros revendedores, inclusive por meio da aplicação de penalidades aos dissidentes. Tais situações, além de restringirem e falsearem a livre concorrência, ainda possivelmente ensejaram a criação de dificuldades ao desenvolvimento de concorrentes e adquirentes, a imposição de condições de revenda, a discriminação de adquirentes, a recusa de fornecimento ou venda de bens dentro das condições usuais de mercado e mesmo a criação de dificuldades ou rompimento de relações comerciais em razão da recusa da outra parte em submeter-se a condições econômicas injustificáveis ou anticoncorrenciais, condutas essas previstas no art. 21, V, X, XI, XII, XIII e XIV da Lei nº 8.884/94 e art. 36, §3º, IV, VIII, IX, X, XI e XII da Lei nº 12.529/2011.

Assim, especialmente por meio das interceptações telefônicas e telemáticas coligidas nos autos, há indícios de representantes da Positivo, juntamente com parte de sua rede de revendedores, passaram a privilegiar determinadas empresas em processos licitatórios em detrimento de outras empresas potencialmente concorrentes, o que impediria a livre concorrência e causaria prejuízos ao erário, pois nem sempre seria vencedora a empresa com uma melhor proposta (menor preço, etc.) e, se fosse vencedora, não poderia fornecer o referido produto em função de descredenciamento e recusa de venda pela empresa Positivo.

Veja-se que a Positivo defende a legalidade de tal política, por considerar não haver qualquer irregularidade na escolha do revendedor Positivo que irá disputar a venda para determinado cliente. Entretanto, aparentemente não havia transparência para os compradores de produtos de informática de que não haveria concorrência entre revendedores de produtos produzidos/distribuídos pela empresa Positivo.

Ademais, os revendedores Positivo não são simples representantes comerciais, mas entes empresariais completamente autônomos que foram impedidos de concorrerem entre si por determinação de outro ente empresarial que atua em ambos elos da cadeia produtiva.

De fato, em termos de política de revenda e distribuição, a Positivo poderia eventualmente estabelecer zonas de atuação de revendedores, o que permitiria trabalhar melhor a marca e divulgação dos produtos entre potenciais clientes, o que se configuraria, potencialmente, em uma estratégia válida objetivando aumentar a participação de mercado, ainda que mitigando a concorrência intramarca.

Entretanto, esta atuação deveria estar claramente estabelecida, e provavelmente não deveria incluir o repasse, entre os revendedores, de informações sobre que potenciais concorrentes que participarão de certames e ainda mais solicitar que não entrem ou desistam de propostas apresentadas. Com efeito, especialmente em um cenário em que a Positivo também por vezes concorre com tais revendedores, uma política de divisão de mercado e de fixação de condições de revenda passaria a facilitar e gerar um conluio entre seus revendedores, e mesmo um conluio que contaria com a participação da própria Positivo.

Veja-se, nesse sentido, como já apontado pela doutrina, que um dos principais efeitos negativos da fixação de condições de revenda seria facilitar uma conduta colusiva por parte dos revendedores, tendo sido utilizada, em muitos casos, para facilitar a organização de um cartel.

Assim, cabe à SG/Cade apurar em que medida tais fatos imputados aos Representados Enge Áudio Comércio e Sonorização Ltda. ME, I 9 Soluções em Tecnologia e Informática Ltda. ME, Multicomp Informática Ltda., Positivo Informática S.A., S&V Equipamentos para Escritório Ltda., Paulo Roberto Marchine, Rodrigo Benetti Dolatto, Rodrigo Cesar de Faria Correa, Samuel Prado, Sérgio Francisco Siepko, Vicente Borges Soares, Waldelei Schmidt e Wilson Donizette Inácio prejudicaram a livre concorrência, condutas essas passíveis de enquadramento nos arts. 20, I a IV c.c. art. 21, I, II, III, V, VIII, X, XI, XII, XIII e XIV da Lei nº 8.884/94 e art. 36, I a IV, e §3º, I, alíneas a, c e d, II, IV, VIII, IX, X, XI e XII da Lei nº 12.529/11.

 

V. ANÁLISE DE SUPOSTO CARTEL EM LICITAÇÕES PARA AQUISIÇÃO DE EQUIPAMENTOS E MATERIAIS DE INFORMÁTICA

Ainda, na linha de que a política de vendas da Positivo poderia eventualmente facilitar um cartel entre revendedores para o fornecimento de equipamentos e materiais de informática, destacam-se, como exemplo, os indícios abaixo indicados. Veja-se que não há, a princípio, indícios da participação da Positivo no suposto cartel abaixo indicado, mas entende-se que tal conduta pode ter sido facilitada por sua política de divisão de mercado associada ao mapeamento e reserva de oportunidades. Veja-se, inclusive, que um dos principais envolvidos no suposto cartel que passamos a relatar, a S&V, era revendedora da Positivo e tinha atuação bastante ativa também na conduta anterior (como spoke da Positivo).

Porém, antes de adentrar na análise dos indícios de cartéis em licitações dos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, devem ser explicitados aspectos gerais de combate a cartéis.

 

V.1 Aspectos Gerais de Combate a Cartéis

Cartel é um acordo entre concorrentes para, principalmente, fixar preços ou quotas de produção, dividir clientes e mercados de atuação, bem como combinar preços e ajustar vantagens em concorrências públicas e privadas. Cartéis prejudicam seriamente os consumidores ao aumentar preços e restringir a oferta, tornando os bens e serviços mais caros ou indisponíveis, e comprometendo a inovação tecnológica. Da mesma forma, cartéis em licitações públicas geram prejuízos ao Erário, ao impedir que a Administração adquira seus produtos e serviços ao menor preço possível.

Com efeito, dentre as condutas anticompetitivas, o cartel é a mais grave lesão à concorrência. Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), os cartéis:

(...) causam danos a consumidores e negócios que adquirem seus produtos, por meio do aumento de preço ou da restrição da oferta. Como resultado, alguns adquirentes decidem não comprar o produto ao preço determinado pelo cartel ou compram-no em menor quantidade. Assim, os adquirentes pagam mais por aquela quantidade que realmente compram, o que possibilita, mesmo sem que saibam, a transferência de riquezas aos operadores do cartel. Além disso, os cartéis geram desperdício e ineficiência. Eles protegem seus membros da completa exposição às forças de mercado, reduzindo a pressão pelo controle de gastos e para inovação, o que acarreta a perda de competitividade de uma economia nacional[34].

Não por outra razão é que grande parte dos países que possui políticas de defesa da concorrência trata os cartéis como delitos per se, calcando suas decisões na presunção dos efeitos nocivos a partir da prova da existência do acordo, o que torna desnecessária a comprovação e mensuração dos efeitos líquidos negativos da conduta[35]. O Brasil é um desses países que considera suficiente a prova da existência do acordo para configurar sua ilicitude[36].

As condutas concertadas entre concorrentes podem assumir estratégias múltiplas, mas resultam, invariavelmente, na aquisição de produtos e contratação de serviços em condições mais desvantajosas ou por valores acima daqueles que seriam encontrados em mercados efetivamente competitivos. Em casos de licitações públicas, tais condutas colusivas entre concorrentes implicam, ainda, a redução da eficiência dos gastos públicos, processo no qual os recursos públicos – fruto dos tributos pagos pelos cidadãos e empresas – são transferidos para tais agentes, que obtêm lucros adicionais resultantes da ausência de competição efetiva nos certames licitatórios.

As estratégias utilizadas pelos integrantes do cartel, especialmente no âmbito das licitações públicas, envolvem, regra geral, a mitigação da competição e a alocação privada e artificial de contratos entre empresas que, na verdade, deveriam competir entre si. Nesse sentido, o uso concomitante de estratégias comuns permite que tais agentes definam os contornos precisos do mercado, por intermédio da alocação de carteiras de contratos, órgãos contratantes, áreas geográficas, faturamento, dentre outros critérios, e para a distribuição dos lucros adicionais advindos da redução da pressão competitiva possibilitada pelo acordo colusivo.

Conforme a experiência internacional, em grande medida consolidada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)[37], as empresas participantes de cartéis em licitações utilizam-se, nos certames, das seguintes estratégias:

Propostas Fictícias ou de Cobertura (“cover bidding”). As propostas fictícias, ou de corbertura (também designadas como complementares, de cortesia, figurativas, ou simbólicas) são a forma mais frequente de implementação dos esquemas de conluio entre concorrentes. Ocorre quando indivíduos ou empresas combinam submeter propostas que envolvem, pelo menos, um dos seguintes comportamentos: (1) um dos concorrentes aceita apresentar uma proposta mais elevada do que a proposta do candidato escolhido; (2) um concorrente apresenta uma proposta que já sabe de antemão que é demasiado elevada para ser aceita; ou (3) um concorrente apresenta uma proposta que contém condições específicas que sabe de antemão que serão inaceitáveis para o comprador. As propostas fictícias são concebidas para dar a aparência de uma concorrência genuína entre os licitantes.

Supressão de propostas (“bid suppression”). Os esquemas de supressão de propostas envolvem acordos entre os concorrentes nos quais uma ou mais empresas estipulam abster-se de concorrer ou retiram uma proposta previamente apresentada para que a proposta do concorrente escolhido seja aceita. Fundamentalmente, a supressão de propostas implica que uma empresa não apresenta uma proposta para apreciação final.

Propostas Rotativas ou Rodízio (“bid rotation”). Nos esquemas de propostas rotativas (ou rodízio), as empresas conspiradoras continuam a concorrer, mas combinam apresentar alternadamente a proposta vencedora (i.e. a proposta de valor mais baixo). A forma como os acordos de propostas rotativas são implementados pode variar. Por exemplo, os conspiradores podem decidir atribuir aproximadamente os mesmos valores monetários de um determinado grupo de contratos a cada empresa ou atribuir a cada uma valores que correspondam ao seu respectivo tamanho.

Divisão do Mercado (“market allocation ou market division”). Os concorrentes definem os contornos do mercado e acordam em não concorrer para determinados clientes ou em áreas geográficas específicas. As empresas concorrentes podem, por exemplo, atribuir clientes específicos ou tipos de clientes a diferentes empresas, para que os demais concorrentes não apresentem propostas (ou apresentem apenas uma proposta fictícia) para contratos ofertados por essas classes de potenciais clientes. Em troca, o concorrente não apresenta propostas competitivas a um grupo específico de clientes atribuído a outras empresas integrantes do cartel.

Subcontratação. Os concorrentes acordam em recompensar a colaboração das empresas que, ao não participarem da licitação ou apresentarem propostas de cobertura, garantiram que a empresa previamente escolhida se sagrasse vencedora do certame. Dessa forma, a subcontratação das empresas colaboradoras permite que os lucros excepcionalmente elevados – fruto da ausência de competitividade derivada do acordo colusivo firmado entre as concorrentes – sejam divididos entre as empresas participantes do cartel.

 

V.2. Breves Considerações sobre Infrações em Compras Públicas

Inicialmente, entende-se oportuno iniciar a análise da presente conduta tecendo breves comentários sobre situações observadas em compras públicas e que por vezes geram questionamentos acerca de se constituem infração à Lei de Defesa da Concorrência e/ou mera infração à Lei de Licitações e outros diplomas legais, tal como a questão de participação em licitações de empresas com sócios comuns ou com relação de parentesco.

Segundo Marçal Justen Filho, “Licitação é o procedimento administrativo destinado a selecionar, segundo critérios objetivos predeterminados, a proposta de contratação mais vantajosa para a Administração, assegurando-se a ampla participação dos interessados e o seu tratamento isonômico, com observância de todos os requisitos legais exigidos[38]

Ocorre que, por vezes, por ato da própria Administração e/ou dos agentes econômicos atuantes em tais processos, observa-se a restrição ao caráter competitivo das licitações, situação essa caracterizada como crime e que enseja enquadramento no art. 90 da Lei nº 8.666/93, sem prejuízo de outras cominações legais, artigo este que prevê:

Art. 90. Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação. Pena – detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. 

 

Verifica-se que tal tipo legal é amplo e abrange fraudes diversas, as quais, por sua vez, acabam por também se enquadrar em outros diplomas legais, destinados a tutelarem bens jurídicos diferentes, como a Lei de Defesa da Concorrência, que se destina a prevenir e reprimir infrações contra a ordem econômica e a preservar princípios como o da livre concorrência e o da livre iniciativa. É o caso, por exemplo, do conluio entre licitantes ou cartel em licitações, que, além de uma fraude ao caráter competitivo da licitação, também constitui uma infração à ordem econômica prevista tanto na antiga Lei nº 8.884/94, como na atualmente vigente Lei nº 12.529/11.

Lei nº 8.884/94 - Art. 21. As seguintes condutas, além de outras, na medida em que configurem hipótese prevista no art. 20 e seus incisos, caracterizam infração da ordem econômica: (...)

VIII - combinar previamente preços ou ajustar vantagens na concorrência pública ou administrativa;

Lei nº 12.529/11 - Art. 36. (...)

§3° As seguintes condutas, além de outras, na medida em que configurem hipótese prevista no caput deste artigo e seus incisos, caracterizam infração da ordem econômica:

I - acordar, combinar, manipular ou ajustar com concorrente, sob qualquer forma: (...) d) preços, condições, vantagens ou abstenção em licitação pública;

 

Diante disso, é possível que ocorram situações em compras públicas em que as condutas ilícitas praticadas sejam (i) de competência exclusiva dos órgãos de controle e/ou de tutela criminal, (ii) de competência da autoridade antitruste e, até mesmo, (iii) de ambas autoridades, cada uma em sua esfera de atuação e competência legal.

Assim, passa-se a discutir a questão da participação em licitações de empresas que possuem sócios comuns e/ou com relações de parentesco e/ou afinidade, situação essa que muitas vezes gera discussão de se configuraria cartel ou outra infração à ordem econômica, ou configuraria apenas fraude à lei de licitações e outros diplomas legais.

Ressalta-se que o objetivo de tal discussão é tentar delimitar algumas condições mínimas para se considerar um fato passível de enquadramento na lei antitruste, embora deva se destacar que as hipóteses abaixo indicadas consistem em situações genéricas e que, por vezes, no caso concreto, ganham contornos que merecem maior análise por parte da autoridade antitruste.

 

V.2.1 Participação em licitações de empresas que possuem sócios comuns e/ou com relações de parentesco e/ou afinidade

Em atenção à questão de participação em licitações de empresas que possuem sócios comuns e/ou com relações de parentesco e/ou afinidade, a observação de algumas questões pode servir para determinar se estaríamos diante de um caso de mera fraude à lei licitatória ou também de caso afeto à Lei de Defesa da Concorrência, sem prejuízo, por certo, como já apontado, da análise de particularidades do caso concreto, que podem alterar o enquadramento das questões abstratas abaixo descritas. 

Quanto à questão de sócios comuns, cumpre à SG/Cade analisar inicialmente se os licitantes pertencem ou não ao mesmo grupo de fato ou de direito. Isso porque, como é cediço, para a caracterização de um cartel, em regra, o acordo sobre variáveis comerciais estratégicas deve se dar entre empresas concorrentes, condição essa não necessariamente observada em casos em que as investigadas possuem sócios em comum, a ponto de claramente integrarem um mesmo grupo econômico.

Nesse sentido, de forma a definir uma linha inicial mínima acerca da competência da autoridade antitruste, cumpriria à SG/Cade analisar se estaríamos diante de (i) empresas que claramente integram o mesmo grupo, ou (ii) empresas que, embora tenham sócios comuns, não pertençam ao mesmo grupo.[39]

Estando a SG/Cade diante de supostas combinações entre licitantes que claramente integram o mesmo grupo societário, tais fatos não configurariam cartéis em licitações, visto que não se trataria de empresas concorrentes, sem prejuízo de tais fatos poderem constituir fraude à Lei de Licitações.

Aliás, quanto ao tema de participação em licitações de empresas que possuem sócios comuns, a jurisprudência do TCU aponta no sentido de que tal participação não é ilegal ou configura fraude à licitação por si só, salvo em situações específicas em que são presumidos os prejuízos a princípios como o da moralidade ou da impessoalidade. Nesse sentido, destaca-se o Voto do Ministro Marcos Bemquerer Costa[40]:

21.     A respeito da participação simultânea de empresas com sócios comuns em licitação, vale frisar que nem os regulamentos próprios das entidades nem a Lei n. 8.666/1993 vedam essa situação. A interpretação teleológica da legislação, especialmente a do princípio da igualdade de condições a todos os interessados, conduz ao entendimento de que o concurso de licitantes pertencentes a sócios comuns somente é irregular quando puder alijar do certame outros potenciais participantes.

22.     De acordo com o precedente do Acórdão n. 297/2009 – Plenário, a participação simultânea de empresas com sócios comuns num mesmo certame configuraria irregularidade nos casos de: a) convite; b) contratação por dispensa de licitação; c) existência de relação entre as licitantes e a empresa responsável pela elaboração do projeto executivo; d) contratação de uma das empresas para fiscalizar serviço prestado por outra.

 

Por consequência, considera-se que, em casos de participação em licitações de empresas que claramente pertençam a um mesmo grupo societário, não haveria que se falar em cartel entre licitantes ou hipóteses de restrição à competitividade afetas à área antitruste. Havendo infração, seriam elas passíveis de enquadramento na Lei nº 8.666/93, notadamente nas hipóteses indicadas nos itens “a” a “d” do julgado do TCU acima transcrito.

Por outro lado, a contrario sensu, estando a SG/Cade diante de supostas combinações entre licitantes em que tal discussão societária é complexa ou que envolva, por exemplo, a participação em licitações de empresas com sócios comuns que, no entanto, não configurem um mesmo grupo, a competência da autoridade antitruste não está afastada. Em verdade, nesses casos prevaleceria a presunção de que elas são empresas concorrentes e, portanto, tal proximidade deve ser analisada em conjunto com outras provas, pois pode ser considerado um indício relevante de um ambiente propício para conversas sobre variáveis comerciais estratégicas e conluios.

Note-se que a dicotomia ora apresentada reside na constatação de que, no caso de empresas licitantes pertencentes a um mesmo grupo econômico, a ausência de concorrência entre elas é juridicamente e factualmente dada e evidente, de modo prévio à licitação e independente dela; é presumida a não rivalidade, de modo que, em regra, não se pode falar em um “cartel” entre empresas, já que elas não são concorrentes[41]. Já no caso de duas ou mais empresas que, embora possam possuir sócios em comum, não são claramente pertencentes a um mesmo grupo econômico, a ausência de rivalidade entre elas não é juridicamente ou factualmente dada ou presumida; pelo contrário, as partes se apresentam, ao mercado e de direito, como concorrentes. Neste caso, arranjos entre elas que eliminem ou ceifem a concorrência entre si caracterizam, em regra, um cartel.

Passando-se agora à questão de participação em licitações de empresas cujos sócios possuem relação de parentesco ou afinidade, novamente não há que se falar em ilegalidade por si só em tal fato. Contudo, como prevalece a presunção fática e jurídica de que se trata de empresas concorrentes, dado que parentescos entre sócios não qualificam, pela legislação, grupos econômicos, uma suposta combinação prévia entre elas sobre a participação em licitações seria passível de enquadramento na Lei de Defesa da Concorrência, além de também poder constituir fraude à licitação tipificada na Lei nº 8.666/93.

Em verdade, tem-se que a proximidade existente entre tais empresas, decorrente do parentesco ou afinidade entre seus sócios, pode ser considerado um indício relevante de existência de um ambiente propício para que eles conversem sobre variáveis comerciais relevantes e entrem em colusão, ensejando maior investigação por parte das autoridades públicas.

Segundo o TCU, “Não existe vedação legal à participação, em uma mesma licitação, de empresas com sócios com relação de parentesco. Entretanto, essas relações podem e devem ser levadas em conta sempre que houver indícios consistentes de conluio, como é o caso destes autos[42] (grifos nossos).

No mesmo sentido, destaca-se o voto do Ministro do TCU Augusto Nardes: 

De modo geral, a jurisprudência majoritária desta Casa é no sentido de que a constatação de relações de parentesco entre sócios de licitantes concorrentes é pressuposto de investigação mais acurada para confirmação dos indícios de fraude à licitação, senão vejamos: (...)

Acórdão nº 12.136/006 – 1ª Câmara:

9.3. com fundamento no art. 250, inciso II, do Regimento Interno/TCU, recomendar ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão – MPOG que oriente todos os órgãos/entidades da Administração Pública a verificarem, quando da realização de licitações, junto aos sistemas Sicaf, Siasg, CNPJ e CPF, estes dois últimos administrados pela Receita federal, o quadro societário e o endereço dos licitantes com vistas a verificar a existência de sócios comuns, endereços idênticos ou relações de parentesco, fato que, analisado em conjunto com outras informações, poderá indicar a ocorrência de fraudes contra o certame.[43]

 

Aliás, a Procuradoria do Cade também já se manifestou no sentido de que a participação de empresas de parentes não é por si só ilegal e que deveria que estar associada a outras provas que indicassem a atuação conjunta das empresas, embora constitua elemento importante de análise, colacionando-se: "Em primeiro lugar, a mera relação de parentesco entre sócios de diferentes empresas, embora seja elemento facilitador, não pode ser considerado por si só indicativo de conluio entre as mesmas[44]".

Diante do exposto, tem-se que, de forma geral, ou seja, sem prejuízo de se analisar as especificidades do caso concreto, um parâmetro inicial em termos da competência legal para a atuação antitruste poderia ser assim delineado:

Participação em licitações de empresas que possuem sócios comuns e que claramente integram o mesmo grupo societário: não é infração antitruste, pois não se trataria de acordo entre concorrentes, mas pode constituir eventual fraude à Lei nº 8.666/93;

Participação em licitações de empresas que possuem sócios comuns e que não constituem claramente o mesmo grupo societário: pode ser infração antitruste, além de fraude licitatória. A mera participação em licitações de empresas nessa situação não pode ser considerada uma prova de cartel por si só, mas tal identidade de sócios pode ser considerada indício relevante de proximidade entre concorrentes, mas que deve ser cotejado com outros elementos de prova;

Participação em licitações de empresas que possuem sócios com relação de parentesco/afinidade: pode ser infração antitruste, além de fraude licitatória. A mera participação em licitações de empresas nessa situação não pode ser considerada uma prova de cartel por si só, mas tal relação de parentesco e/ou afinidade entre sócios pode ser considerada um indício relevante de proximidade entre concorrentes, indício esse a ser cotejado com outros elementos de prova.

Feitas essas breves considerações, passa-se à análise dos indícios que corroboram a necessidade de instauração de Processo Administrativo para apurar possíveis infrações concorrenciais cometidas pelas pessoas físicas e jurídicas abaixo citadas.

 

V.3. Da Descrição do Suposto Cartel

Em síntese, foram apurados indícios de um suposto cartel em licitações destinadas à aquisição de equipamentos e materiais de informática - tais como lousas interativas, notebooks, desktops, câmeras de documentos, canetas estendidas para lousas interativas, projetores etc - nos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul[45].

A partir dos documentos coligidos nos autos, há indícios de que, notadamente no período de 2008 a 2012[46], os Representados teriam combinado previamente preços, condições e vantagens em licitações públicas, condutas essas passíveis de enquadramento nos arts. 20, I a IV e 21, I e VIII da Lei nº 8.884/94 e no art. 36, I a IV e §3º, I, alíneas a e d, da Lei nº 12.529/2011.

Com efeito, foram apurados indícios de que, previamente às licitações, as empresas S&V e MS supostamente entravam em conluio com as empresas Líder, Proxyline, Somaq e Caleb Ltda., sendo que tais empresas ora cediam ou combinavam que concorrentes elaborariam suas propostas comerciais, ora compareciam aos pregões para dar cobertura à empresa previamente designada para vencer o certame, tudo com vistas a falsear e restringir a livre concorrência e simular uma competição que de fato não existiu entre elas[47].

Nesse sentido, foram obtidos indícios de frequente comunicação entre membros de empresas concorrentes, incluindo indícios de que as empresas S&V e MS chegavam a preencher as propostas comerciais e a apresentar documentação na licitação em nome de suas concorrentes, o que corrobora a existência de robustos indícios de ações concertadas entre as Representadas, a justificar a continuidade da investigação em sede de Processo Administrativo.

 

V.4. Dos Indícios da Existência de Conduta Colusiva

Como já apontado, trata-se de suposto cartel integrado pelas empresas S&V, MS, Líder, Proxyline, Somaq e Caleb Ltda., empresas essas que atuariam de forma concertada em licitações para aquisição de equipamentos e materiais de informática nos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Em análise aos indícios do suposto cartel, entende-se oportuno iniciar pela discussão acerca da participação em licitações de empresas com relação de afinidade e parentesco, a fim de corroborar que o presente caso deve ser investigado sob a ótica da Lei de Defesa da Concorrência.

 

V.4.1   Das relações de afinidade e parentesco entre sócios das Representadas

Inicialmente, conforme Relatório de Interceptação Telemática nº 02/GAECO/2012-Chapecó, observa-se a existência de relação de afinidade e parentesco entre os sócios das empresas Proxyline, S&V e MS.

Em relação à Proxyline e S&V, verificou-se que o sócio da Proxyline, Sr. Luciano Schmidt, informou que seu pai é primo de Waldelei Schmidt, sócio da S&V. Além disso, o Sr. Luciano Schmidt relatou ter trabalhado na empresa S&V por um curto período de tempo e, posteriormente, em abril de 2008, abriu a empresa Proxyline.

Como já apontado no item III.2.1. acima, empresas cujos sócios possuem relação de parentesco ou afinidade são presumidas como concorrentes, o que é reforçado pelo fato de se apresentarem nas licitações de forma independente, servindo tal relação de parentesco e afinidade, em verdade, como um indicativo de proximidade que pode favorecer a existência de um ambiente propício para a coordenação entre elas.

No mais, não constam dos autos outros elementos que indiquem que as empresas S&V e Proxyline constituiriam o mesmo grupo societário, permanecendo, portanto, a presunção de que se trata de empresas concorrentes e, portanto, que eventuais combinações entre elas seriam passíveis de enquadramento na Lei de Defesa da Concorrência.

Por sua vez, em relação às empresas S&V e MS, destaca-se que, à época dos fatos, os sócios de tais empresas possuíam relação de afinidade, sendo que as sócias da MS eram esposas de dois dos sócios da S&V. A S&V tinha como sócios: 1) Volmir Ficcagna; 2) Waldelei Schmidt; e 3) Sérgio Francisco Siepko. Por sua vez, a MS tinha como sócios: a) Solange Maria Ody Ficcagna, esposa de Volmir Ficcagna; e b) Maria Helena Jabuonski Siepko, esposa de Sérgio Francisco Siepko.

Como apontado acima, empresas cujos sócios possuem relação de afinidade são presumidas como concorrentes. Contudo, no caso concreto, tal como destacado pelo MPSC, foram apontados indícios de que elas integrariam o mesmo grupo societário de fato, o que ensejaria uma maior investigação por parte da SG/Cade.

Com efeito, Waldelei Schmidt era a pessoa responsável pelas licitações na S&V e também tinha papel importante na MS, conforme constatado em diálogos explicitados no [ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

As Sras. Solange Ficcagna e Márcia Helena Jabuonski Siepko, sócias da MS, tinham participação ativa na administração das empresas S&V e MS. [ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

O Sr. Claudir Frigeri, sócio da Somaq, também ressaltou que as esposas de Volmir Ficcagna e Sérgio Siepko – sócias da MS – trabalham na parte administrativa da S&V. A Sra. Angélica Scapinello, formalmente funcionária da S&V, ainda esclareceu que Márcia Siepko e Solange Ficcagna trabalham no setor financeiro da empresa S&V, ou seja, ambas as sócias da MS trabalham também na S&V.

Pode-se ainda destacar que as empresas S&V e MS, apesar de formalmente serem empresas distintas, possuem o mesmo endereço, o mesmo telefone de contato, e até mesmo alguns funcionários comuns, além de os sócios da S&V serem representantes das sócias da MS (e dos quais são maridos) perante a Fazenda Estadual[48].

O MPSC chegou à constatação de que as empresas S&V e MS são de propriedade e administradas pelas mesmas pessoas, [ACESSO RESTRITO].

Há indícios de que tanto Marcelo Rodrigues de Gouveia quanto Angélica Scapinello trabalhavam para as duas empresas, ou seja, S&V e MS [ACESSO RESTRITO].

A atuação de Marcelo Rodrigues Gouveia e Angélica Scapinello como representantes tanto da empresa S&V quanto MS nos processos licitatórios [ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

Assim, embora o vasto material já produzido pelo MPSC aponte que S&V e MS sejam sujeitas, de fato, a uma administração conjunta, com sócios e administradores com estreita relação de parentesco, o fato é que, legalmente, as duas empresas não constituem um grupo, embora ajam como tal[49]. Veja-se que nenhuma delas possui ações ou quotas na outra. Para todos os efeitos jurídicos e de atuação comercial, ambas são empresas independentes. Um adquirente de produtos dessas duas sociedades ou um espectador comum que não tenha acesso a detalhes obtidos por meio de interceptações telefônicas e telemáticas não tem condições de verificar que as duas empresas são, na realidade, administradas de forma coordenada. Juridicamente, as duas empresas efetivamente se apresentam como concorrentes.

Note-se que essa constatação, de que juridicamente as empresas não integram um mesmo grupo econômico, não ilide as ilegalidades aqui investigadas. Pelo contrário: é justamente por se apresentarem em uma licitação como concorrentes (juridicamente e comercialmente), quando na realidade se coordenam entre si por trás dos panos, que gera as potenciais ilegalidades – no caso, tanto na esfera de fraude à licitação quando na esfera da legislação concorrencial (como um cartel). Assim, no caso, as relações e interações acima narradas entre os agentes das duas empresas não descaraterizam a competência do Cade e a ocorrência de um suposto cartel no presente caso. Mais do que isso, ao negarem ser um grupo de “fato” - e não sendo o grupo de direito - , a única justificativa para a estreita relação entre as duas empresas é, justamente, a intenção de agir de forma coordenada, em conluio, com vistas a fraudar o caráter competitivo dos certames em que assim atuavam.

Ademais, foram verificados indícios de que S&V e MS trocavam informações comerciais sensíveis e combinavam previamente a atuação em licitações com as empresas concorrentes Líder, Somaq e Caleb Ltda., além da já mencionada empresa Proxyline. Portanto, ainda que fossem consideradas conjuntamente S&V e MS, tem-se que eventual conluio delas com licitantes concorrentes para fraudar o caráter competitivo de licitações pode ser enquadrado na Lei de Defesa da Concorrência.

Feitas essas breves considerações, passa-se à análise dos demais indícios de infrações à ordem econômica coligidos nos autos.

 

V.4.2   Das combinações prévias entre concorrentes para a elaboração conjunta de propostas comerciais e apresentação de propostas de cobertura

Conforme apurado nos autos, há indícios de que Waldelei Schmidt, Volmir Ficcagna e Sérgio Siepko (todos sócios da S&V), juntamente com Márcia Siepko e Solange Ficcagna (sócias da MS e esposas de dois sócios da S&V), coordenariam a combinação prévia de preços e condições entre concorrentes em licitações destinadas à aquisição de equipamentos e materiais de informática. Consta, ainda, que tais combinações contavam com a participação de Angélica Scapinello e Marcelo Gouveia, formalmente empregados da S&V, que atuavam em licitações como representantes da S&V e também da MS.

Como visto, independentemente da discussão se S&V e MS integravam ou não o mesmo grupo societário, o fato é que tais empresas e seus representantes acima indicados coordenavam-se com empresas e representantes das empresas concorrentes Líder, Somaq Proxyline e Caleb Ltda., conforme verificado abaixo.

Com efeito, há indícios de que Lindacir Giaretta e Pedro Frigulha (sócios da Líder), Luciano Schmidt (sócio da Proxyline), Claudir Frigeri (sócio da Somaq) e Caleb Kieling (sócio da Caleb Ltda.), ora cediam ou combinavam que concorrentes elaborariam suas propostas comerciais, ora compareciam aos pregões para dar cobertura à empresa previamente designada para vencer o certame, tudo com vistas a implementar o previamente coordenado entre eles e simular uma competição que de fato não existiu.

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

 

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO] 

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

Verifica-se que os indícios acima indicam que os Representados comunicavam-se e combinavam previamente a atuação em licitações, sendo que alguns deles até mesmo afirmaram que eram seus concorrentes que elaborariam as propostas a serem ofertadas nas licitações, propostas essas, portanto, que teriam por objetivo dar cobertura à empresa previamente definida para vencer o certame.

Tais empresas até relatam que teriam feito isso mesmo sem ter interesse em vencer licitações, ou até em atenção a pedidos de amigos que já encaminhavam a documentação totalmente preenchida para ser entregue conjuntamente aos órgãos licitantes. Porém, tais justificativas não elidem a ocorrência de prejuízos à livre concorrência e ao caráter competitivo das licitações, para além de eventualmente caracterizarem outras infrações legais.

Ora, tais empresas eram concorrentes, atuaram como se independentes fossem, inclusive perante o órgão licitante, mas, em verdade, estavam conjuntamente definindo sua atuação nos procedimentos licitatórios, fato esse que teria o condão de restringir e falsear a livre concorrência nas licitações.

Aliás, a corroborar esses indícios de que as Representadas estariam atuando conjuntamente nas licitações, há vários indicativos de que elas já mantinham documentos seus em poder de concorrentes, de modo a facilitar a formulação e a participação concertada em procedimentos licitatórios.

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO].

 

[ACESSO RESTRITO]

 

 

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

Verifica-se que os indícios acima indicariam que os Representados comunicavam-se e combinavam previamente a atuação em licitações, sendo que alguns deles até mesmo afirmaram que eram seus concorrentes que elaborariam as propostas ofertadas nas licitações. Tais propostas, por sua vez, teriam por objetivo dar cobertura à empresa previamente definida para vencer o certame, sendo a cobertura, aliás, uma conduta considerada corriqueira.[56]

[ACESSO RESTRITO]:

[ACESSO RESTRITO]

[ACESSO RESTRITO].

[ACESSO RESTRITO].

Assim, há indícios robustos de que as pessoas físicas e jurídicas ora Representadas teriam combinado previamente preços, condições e vantagens em licitações públicas, condutas essas passíveis de enquadramento nos arts. 20, I a IV e 21, I e VIII da Lei nº 8.884/94 e no art. 36, I a IV e §3º, I, alíneas a e d, da Lei nº 12.529/2011.

Com efeito, foram apurados indícios de que, previamente às licitações, as empresas S&V e MS supostamente entravam em conluio com as empresas Líder, Proxyline, Somaq e Caleb Ltda., sendo que tais empresas ora cediam ou combinavam que as concorrentes elaborariam suas propostas comerciais, ora compareciam aos pregões para dar cobertura às empresas S&V e MS, tudo com vistas a falsear e restringir a livre concorrência e simular uma competição que de fato não existiu entre elas.

Nesse sentido, foram obtidos indícios de frequente comunicação entre membros de empresas concorrentes, incluindo indícios de que as empresas S&V e MS chegavam a preencher as propostas comerciais e a apresentar documentação na licitação em nome de suas concorrentes, o que corrobora a existência de robustos indícios de ações concertadas entre as Representadas, a justificar a continuidade da investigação em sede de Processo Administrativo.

Diante do exposto, conclui-se pela existência de indícios robustos de infração à ordem econômica em face de Caleb G. Kieling & Cia. Ltda., Líder Suprimentos para Informática Ltda., MS Equipamentos e Assistência Técnica Ltda., Proxyline Informática Ltda., S&V Equipamentos para Escritório Ltda., Somaq Assistência e Equipamentos Ltda., Angélica Scapinello, Caleb Gerson Kieling, Claudir Frigeri, Lindacir Salete Faccio Giaretta, Luciano Oscar Schmidt, Marcelo Rodrigues de Gouveia, Márcia Helena Jabuonski Siepko, Pedro Frigulha, Sérgio Francisco Siepko, Solange Maria Ody Ficcagna, Waldelei Schmidt e Volmir Ficcagna, a ensejar a instauração de Processo Administrativo, nos termos dos arts. 13, V, e 69 e seguintes, da Lei nº 12.529/11 c.c. art. 146 e seguintes do Regimento Interno do Cade.

 

VI. ANÁLISE DAS CONDIÇÕES ESTRUTURAIS DO MERCADO EM QUESTÃO

A suposta conduta perpetrada pelos Representados consubstanciar-se-ia, pois, especialmente em um cartel (cartel do tipo hub and spoke e cartel em licitações). Assim, se comprovada a existência desses supostos cartéis nos moldes em que eles se apresentam, presume-se, pois, seu potencial efeito nocivo à concorrência e seu poder de controlar artificialmente o mercado em que se enquadram.

Nesse sentido, não se faz necessária aqui uma profunda análise sobre o mercado relevante atingido pela conduta: primeiro porque a própria existência de um suposto acordo entre concorrentes com o grau de amplitude e coordenação que aqui fora apresentado seria suficiente para demonstrar a racionalidade desse acordo para que as empresas dominassem o mercado; segundo porque o próprio objeto desse acordo delimita o mercado afetado, alvo do abuso do poder econômico das empresas.

Considerando que o presente caso se caracteriza também como cartel em licitação, verifica-se que a competição se dá pelo mercado, e, portanto, os fornecedores competem entre si por um contrato para fornecer um determinado produto ou serviço, e a partir disso, o adquirente – especialmente o Governo – escolhe a proposta mais vantajosa possível. Assim, quando tais fornecedores combinam previamente sua participação em um certame ou um conjunto de licitações, o impacto para a concorrência é evidente.

Por fim, ainda que essa etapa não seja necessária, passa-se à análise do mercado possivelmente afetado por tal conduta, bem como da probabilidade do exercício de poder de mercado por parte dos Representados.

 

VI.1        Do Mercado Relevante

Inicialmente, em casos de cartéis, verifica-se que a própria prática anticompetitiva se apresenta como um importante parâmetro para a delimitação do mercado relevante.

A razão para tal se dá por conta de um fator específico, pois é o próprio escopo da suposta atuação ilícita dos Representados que auxiliaria a autoridade a delimitar qual é a área que está sendo afetada pela conduta (aliás, este aspecto também pode ser verificado, em maior ou menor medida, em outras práticas anticompetitivas). O próprio comportamento dos agentes do mercado (ao fixar preços de determinado produto e/ou serviço em determinada localidade) serve para indicar o mercado relevante, de modo que a análise de indícios econômicos para delimitação do mercado relevante representa, em casos de cartel, elemento meramente acessório.

Se os representados combinam preços em determinado município, estado ou país, é bem provável (ou lógico até) que o mercado relevante geográfico afetado seja justamente essa localidade, já que não faria sentido arcar com os custos de um cartel (seja de formação do acordo, seja de manutenção, com mecanismos de monitoramento e punição), sem auferir os respectivos benefícios. O mesmo raciocínio se aplica à definição do mercado produto e/ou serviço.

Dessa forma, para definir o mercado relevante seria necessário apenas verificar o escopo do suposto acordo. A partir dos documentos produzidos ao longo da investigação, percebe-se que, quanto à política de vendas da Positivo, a suposta prática referia-se basicamente ao mercado nacional de equipamentos e materiais de informática em geral, tais como desktops, notebooks, tudo-em-um, tablets, celulares e smartphones e equipamentos educacionais multimídia como lousas interativas, projetores e acessórios. Por sua vez, em relação ao suposto cartel apontado no item V, a suposta prática referia-se predominantemente também ao mercado de equipamentos e materiais de informática, mas nos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, passando a serem esses, portanto, os mercados supostamente afetados pelas condutas anticompetitivas investigadas no presente feito.

 

VI.2        Dos fatores facilitadores do abuso de poder de mercado

Em se tratando de uma investigação de formação de cartel, é importante enfatizar características do mercado relevante que possam facilitar o abuso de poder de mercado e também o monitoramento do conluio.

Nesse sentido, tem-se que algumas características do mercado relevante tais como, por exemplo, (i) grau de concentração do mercado; (ii) barreiras à entrada; (iii) elementos e mecanismos de monitoramento da cooperação dos membros do cartel; e (iv) homogeneidade dos produtos e/ ou serviços prestados[57], podem apontar a existência ou não de elementos que facilitam o conluio entre agentes econômicos.

Concentração de mercado. O primeiro fator refere-se à existência de um número restrito de concorrentes que atuam no mercado relevante. Com efeito, um número reduzido de players no mercado facilita a adoção de condutas concertadas entre concorrentes. Isso não implica, porém, que não é possível a existência de cartéis em mercados que possuam um grande número de agentes de mercado, já que estes podem estabelecer acordos estáveis e contar, por exemplo, com efetivos mecanismos de monitoramento e punição. Sem prejuízo, mesmo que o mercado em questão possua um número razoável de players, ainda assim eventual coordenação entre concorrentes se mostra factível. Primeiramente, embora ambos os mercados não sejam considerados concentrados, observa-se que a Positivo possui considerável poder de mercado e, no tocante ao suposto cartel apontado no item V, há indicativos de que, nas licitações investigadas, participavam poucas empresas e, em alguns casos, apenas as empresas Representadas, a indicar que uma eventual combinação entre elas teria o condão de restringir e falsear a livre concorrência.

Barreiras à entrada. O segundo elemento a facilitar o conluio entre concorrentes refere-se à existência de elevadas barreiras à entrada, uma vez que elas impedem a entrada de novos concorrentes, de modo que as empresas consigam manter os seus lucros extraordinários. No caso em análise, não se vislumbram significativas barreiras à entrada nos mercados em questão, não obstante Políticas de Preços como a da Positivo, aliadas a poder de mercado e a preferência de conteúdo nacional em licitações possam, sim, constituir-se em barreiras artificiais à entrada no que tange especificamente às licitações públicas.

Transparência. O terceiro requisito refere-se à possibilidade de as empresas cartelizadas monitorarem se as participantes do acordo estão cooperando com os termos da estratégia conjunta do cartel. Em outras palavras, é necessário verificar se há formas de se “fiscalizar” se as empresas praticam de fato o preço combinado e/ou se portam nas licitações como combinado. Como o presente caso se refere especialmente a contratações públicas, tal monitoramento é facilitado, visto que as licitações são marcadas pela publicidade e transparência, sendo que as empresas têm acesso à identidade dos participantes e vencedores e dos valores praticados, facilitando, assim, o monitoramento de eventuais acordos celebrados entre concorrentes.

Homogeneidade. O quarto fator a facilitar que as empresas cheguem a um acordo de cartel é a homogeneidade dos produtos ou dos serviços em questão. Isso porque o único aspecto pelo qual concorrem é o preço do produto, variável facilmente definível em um acordo de cartel. Esse fator também está presente nos mercados em questão, já que, de modo geral, não há motivos para se distinguir os produtos ofertados por diferentes empresas a não ser o preço, tanto que a modalidade licitatória observada nos presentes autos é o pregão, utilizado para a aquisição de bens e serviços comuns.

 

VII. CONCLUSÃO

Diante do exposto, face à existência de indícios robustos de infração à ordem econômica, sugere-se a instauração de Processo Administrativo, nos termos dos arts. 13, V, e 69 e seguintes, da Lei nº 12.529/11 c.c. art. 146 e seguintes do Regimento Interno do Cade, em face dos Representados Caleb G. Kieling & Cia. Ltda., Enge Áudio Comércio e Sonorização Ltda. ME, I 9 Soluções em Tecnologia e Informática Ltda. ME, Líder Suprimentos para Informática Ltda., MS Equipamentos e Assistência Técnica Ltda., Multicomp Informática Ltda., Positivo Informática S.A., Proxyline Informática Ltda., S&V Equipamentos para Escritório Ltda., Somaq Assistência e Equipamentos Ltda., Angélica Scapinello, Caleb Gerson Kieling, Claudir Frigeri, Lindacir Salete Faccio Giaretta, Luciano Oscar Schmidt, Marcelo Rodrigues de Gouveia, Márcia Helena Jabuonski Siepko, Paulo Roberto Marchine, Pedro Frigulha, Rodrigo Benetti Dolatto, Rodrigo Cesar de Faria Correa, Samuel Prado, Sérgio Francisco Siepko, Solange Maria Ody Ficcagna, Vicente Borges Soares, Volmir Ficcagna, Waldelei Schmidt, Wilson Donizette Inácio, a fim de investigar as condutas passíveis de enquadramento nos arts. 20, I a IV c.c. art. 21, I, II, III, V, VIII, X, XI, XII, XIII e XIV da Lei nº 8.884/94 e art. 36, I a IV, e §3º, I, alíneas a, c e d, II, IV, VIII, IX, X, XI e XII da Lei nº 12.529/11, na forma do artigo 69 e seguintes da Lei nº 12.529/2011.

Sugere-se, ainda, a notificação dos Representados, nos termos do art. 70 do referido diploma legal, para que apresentem defesa no prazo de 30 (trinta) dias. Neste mesmo prazo, os Representados deverão especificar e justificar as provas que pretendem sejam produzidas, que serão analisadas pela autoridade nos termos do art. 155 do Regimento Interno do Cade. Caso o Representado tenha interesse na produção de prova testemunhal, deverá indicar na peça de defesa a qualificação completa de até 3 (três) testemunhas, a serem ouvidas na sede do Cade, conforme previsto no art. 70 da Lei nº 12.529/2011 c.c. art. 155, §2º, do Regimento Interno do Cade.

Estas as conclusões.

 

[1] Consta dos autos o pedido de compartilhamento com o Cade e outras autoridades realizado pelo MPSC (fls. 1.964 a 1.970). [ACESSO RESTRITO].

[2] Segundo o MPSC, as supostas práticas criminosas teriam acarretado [ACESSO RESTRITO].

[3] Houve expedição de mandados de busca e apreensão na sede e filiais [ACESSO RESTRITO].

[4] [ACESSO RESTRITO].

[5] Licitação que tinha por objeto a aquisição de 15 microcomputadores pelo município de São Lourenço do Oeste.

[6] [ACESSO RESTRITO].

[7] [ACESSO RESTRITO].

[8]Por meio do Despacho n.º 1.421, em 11 de novembro de 2011, folha 1.995, houve a decretação de segredo de justiça, nos termos do art. 50, IV do Regimento Interno do Cade, tendo em vista que os autos contêm cópias de processo judicial que tramita em segredo de Justiça.

[9] Observa-se que constam dos autos referências a várias outras pessoas físicas e jurídicas, referências essas, porém, que ou não permitem identificar a quem se referem ou não constituem indícios robustos de infração à ordem econômica. Em síntese, tratar-se-iam de empresas e funcionários que podem ter tido ciência da conduta, mas, ao menos a princípio, não teriam supostamente participado das condutas, ou então consistem em funcionários que, em razão do cargo que ocupavam, não possuiriam poder de decisão, e/ou não tiveram participação ativa na conduta. Não obstante, caso esta SG/Cade identifique novos indícios robustos em face de tais pessoas físicas ou jurídicas, serão elas devidamente incluídas dentre as investigadas em sede de Processo Administrativo, respeitados os demais preceitos constitucionais.

[10] [ACESSO RESTRITO].

[11] [ACESSO RESTRITO].

[12] [ACESSO RESTRITO].

[13] Vide decisões do Office of Fair Trade (OFT): OFT decision no. CA98/8/2003 of 21 November 2003 (Hasbro - http://www.oft.gov.uk/shared_oft/ca98_public_register/decisions/hasbro.pdf), OFT decision no. CA98/6/2003 of 1 August 2003 (Replica Football Kit - http://www.oft.gov.uk/shared_oft/ca98_public_register/decisions/ replicakits.pdf) e OFT decision of 8 November 2004 (Double Glazing - http://www.oft.gov.uk/shared_oft/ca98_ public_register/decisions/uopdecision.pdf), acessados em 05 de agosto de 2013.

[14] Vide http://www.yars.wz.uw.edu.pl/yars2011_4_5/Bolecki_Polish_Antitrust.pdf (acessado em 02 de agosto de 2013).

[15] Vide OCDE, Information Exchanges between Competitors under Competition Law, 2010, p. 286 (http://www.oecd.org/competition/cartels/48379006.pdf – tradução livre – acessado em 06 de agosto de 2013).

[16] ODUDU, Okeoghene. Indirect Information Exchange - The constituent elements of hub and spoke collusion. European Competition Journal, V. 7, N. 2, Ago. 2011, pp. 205-242.

[17] ODUDU, Okeoghene. Indirect Information Exchange: The Constituent Elements Of Hub And Spoke Collusion. European Competition Journal, v. 7, n. 2, p. 205-242, out. 2011.

[18] Informação extraída de http://www.positivoinformatica.com.br/sobre-a-positivo#tab2. Acesso em 29/06/2015.

[19] Informação extraída de http://www.positivoteceduc.com.br/#. Acesso em 29/06/2015.

[20] [ACESSO RESTRITO].

[21] Informação extraída de http://ri.positivoinformatica.com.br/positivo/web/default_pt.asp?idioma=0&conta=28.

[22] Ato de Concentração nº 08012.000348/2010-50. Requerentes: Positivo Informática S.A. e Boreo Comércio de Equipamentos Ltda.

[23] [ACESSO RESTRITO]. 

[24] [ACESSO RESTRITO].

[25] Voto-vista do Conselheiro Marcos Veríssimo (condutor do Acórdão). Processo Administrativo nº 08012.001271/2001-44. Representante: PROCON/SP. Representada: SKF do Brasil Ltda. Relator: Conselheiro César Costa Alves de Mattos.

[26] Cf. Herbert Hovenkamp. Federal Antitrust Policy: The Law of Competition and its Practice. St Paul: Thomson Reuters, 2011, p. 465.  

[27] [ACESSO RESTRITO].

[28] [ACESSO RESTRITO].   

[29][ACESSO RESTRITO].

[30] Não foi possível identificar tal empresa e a pessoa mencionada. De qualquer forma, não há indícios robustos de que eles tenham solicitado que tal programa fosse efetivamente cumprido e sanções fossem aplicadas aos revendedores dissidentes.  

[31] Não há indícios, porém, de que tal empresa integrava tal programa da Positivo e/ou tenha solicitado que tal programa fosse efetivamente cumprido e sanções fossem aplicadas aos revendedores dissidentes.

[32] Não foi possível localizar os dados completos de tal empresa. De qualquer forma, não há indícios de que tal empresa integrava tal programa da Positivo e/ou tenha solicitado que tal programa fosse efetivamente cumprido e sanções fossem aplicadas aos revendedores dissidentes.

[33] [ACESSO RESTRITO].

[34] Tradução livre de “Hard Core Cartels”, preparado pelo Fórum Conjunto de Comércio e Concorrência da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE): http://webdominio1.oecd.org/commet/ech/tradecomp.nsf, 2003, p.2.

[35] Vide, por exemplo, a decisão da autoridade europeia de defesa da concorrência – em caso que condenou cartel que atuou em licitações para fornecimento de tubulação para sistemas de calefação residencial – na qual a comprovação da existência de acordo entre os concorrentes, bem como de práticas comerciais concertadas entre eles, serviu como fundamento para se determinar a existência do cartel (Case Nº IV/35.691/E-4: — Pre-Insulated Pipe Cartel).

[36] No julgamento do Processo Administrativo nº 08012.004702/2004-77 – relativo a cartel atuante no mercado brasileiro de peróxido de hidrogênio – o Relator afirmou que, verificadas as condições de existência de um cartel, alcançar-se-ia um quantum probatório em que uma decisão poderia ser exarada, sendo desnecessária a prova dos efeitos do acordo colusivo, adotando, portanto, a regra per se. Vide Processo Administrativo nº 08012.004702/2004-77, Conselheiro Carlos Emannuel Joppert Ragazzo, julgado em 09 de maio de 2012. Representante: SDE ex officio. Representados: Degussa AkTiengesellschaft,  Degussa Brasil Ltda., Peróxidos do Brasil Ltda., Solvay do Brasil Ltda. e outros.

[37] Cf. Diretrizes para combater o conluio entre concorrentes em contratações públicas. OCDE, fevereiro de 2009; e OCDE: Collusion and Corruption in Public Procurement, 2010, p. 458 (tradução livre).

[38] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 14. ed. São Paulo: Dialética, 2010, p. 11.

[39] Sem prejuízo de maiores aprofundamentos de acordo com os eventuais casos concretos que se coloquem, ou conforme se desenvolva a jurisprudência do Cade, vale citar algumas explanações doutrinárias e normativas relacionadas a grupos econômicos.

Segundo Rubens Requião, os grupos empresariais de direito seriam “(...) uma forma evoluída de inter-relacionamento de sociedades que, mediante aprovação pelas assembleias gerais de uma convenção de grupos, dão origem a uma sociedade de sociedades”, conforme previsto no art. 265 da Lei das Sociedades por Ações (LSA) (REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. São Paulo: Saraiva, V.2, 2003, p. 290).

Já os grupos empresariais de fato seriam “(...) as sociedade que mantêm, entre si, laços empresariais através de participação acionária, sem necessidade de se organizarem juridicamente. Relacionam-se segundo o regime legal de sociedades isoladas, sob a forma de coligadas, controladoras e controladas, no sentido de não terem necessidade de maior estrutura organizacional” (Ibid, p. 269).

Por sua vez, quanto à definição de sociedade coligada, o Código Civil prevê que seria “a sociedade de cujo capital outra sociedade participa com dez por cento ou mais, do capital da outra, sem controlá-la” (art. 1099, CC), enquanto a Lei das Sociedades por Ações prevê que coligadas seriam “as sociedades nas quais a investidora tenha influência significativa”, o que se presume “quando a investidora for titular de 20% (vinte por cento) ou mais do capital votante da investida, sem controlá-la” (art. 243, §1º, 4º e 5º, LSA).  

De outro lado, sociedade controlada é conceituada no Código Civil como (i) “a sociedade de cujo capital outra sociedade possua a maioria dos votos nas deliberações dos quotistas ou da assembleia geral e o poder de eleger a maioria dos administradores” e (ii) “a sociedade cujo controle, referido no inciso antecedente, esteja em poder de outra, mediante ações ou quotas possuídas por sociedades ou sociedades por esta já controladas” (art. 1098, I e II, CC). E, segundo o art. 243, §2º, da Lei das Sociedades por Ações, “Considera-se controlada a sociedade na qual a controladora, diretamente ou através de outras controladas, é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores”.

[40] Acórdão 526/2013 – Plenário, TC 028.129/2012-1, Relator Ministro Marcos Bemquerer Costa, julgado em 13.3.2013.

[41] Não por outro motivo, o art. 36, § 3º, da lei 12.529/2011, ao prever a conduta de cartel, especifica que caracteriza infração à ordem econômica: “I – acordar, combinar, manipular ou ajustar com concorrente, sob qualquer forma: (...) d) preços, condições, vantagens ou abstenção em licitação pública”.

[42] TC nº 013.658/2009-4. Relator Ministro Walton Alencar Rodrigues. Julgado em 12.06.2013.

[43] Acórdão nº 2588/2012 –TCU-Plenário.  TC nº 019.919/2005-7.  Ministro Augusto Nardes. Julgado em 26.09.2012.

[44] Parecer ProCade nº 319/2011, proferido na Averiguação Preliminar nº 08012.005404/2009-17, p. 4.

[45] [ACESSO RESTRITO].

[46] [ACESSO RESTRITO].

[47] [ACESSO RESTRITO].

[48] [ACESSO RESTRITO].

[49] [ACESSO RESTRITO].

[50] [ACESSO RESTRITO].

[51] [ACESSO RESTRITO].

[52]  [ACESSO RESTRITO].

[53] [ACESSO RESTRITO].

[54] [ACESSO RESTRITO].

[55] [ACESSO RESTRITO].

[56] [ACESSO RESTRITO].

[57] Cf. HOVEMKAMP, Herbert. Antitrust, 4ª ed., Thomson West, p. 92–94; OCDE, “Public procurement - the role of competition authorities in promoting competition”, OECD Series Roundtables on Competition Policy (DAF/COMP(2007)34), Paris, 2007, p. 20-23; SDE, “Combate a cartéis em licitações”, Coleção SDE/DPDE 2/2008, Brasilia, 2008, p. 13-14.


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Documento assinado eletronicamente por Diogo Thomson de Andrade, Superintendente-Adjunto(a), em 22/07/2015, às 16:22, conforme horário oficial de Brasília e Resolução Cade nº 11, de 02 de dezembro de 2014.


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Referência: Processo nº 08700.008098/2014-71 SEI nº 0086104