Timbre

Ministério da Justiça e Segurança Pública - MJSP

Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE

SEPN 515, Conjunto D, Lote 4, Edifício Carlos Taurisano, - Bairro Asa Norte, Brasília/DF, CEP 70770-504
Telefone: (61) 3221-8453 - www.gov.br/cade
  

Embargos de Declaração no Finalístico: Ato de Concentração Ordinário nº 08700.000726/2021-08

 

Requerentes: Claro S.A. ("Claro"), Telefônica Brasil S.A. ("Telefônica"), TIM S.A. ("Tim"), Oi S.A. ("Oi")

Advogados: pela Claro, Barbara Rosenberg, Leonardo Maniglia Duarte e outros; pela Telefônica, Marcos Paulo Verissimo, Victor Santos Rufino e outros; pela Tim, José Alexandre Buaiz Neto, Enrico Spini Romanielo e outros; e pela Oi, Caio Mario da Silva Pereira Neto e outros

Terceiros Interessados: Algar Telecom S.A. ("Algar"), Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas ("Telcomp"), Associação NEOTV ("NEOTV"), Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor ("Idec") e Sercomtel Telecomunicações S.A. ("Sercomtel")

Advogados: pela Algar, José Del Chiaro Ferreira da Rosa e outros; pela Telcomp, Eduardo Caminati Anders e outros; pela NEOTV, Ademir Antonio Pereira Jr. e outros; pelo Idec, Christian Tárik Printes e outros; e pela Sercomtel, Alexandre Ditzel Faraco e outros

Relatora para os Embargos de Declaração: Conselheira Lenisa Rodrigues Prado

Voto-Vogal: Conselheiro Luis Henrique Bertolino Braido

VOTO-VOGAL - CONSELHEIRO LUIS HENRIQUE BERTOLINO BRAIDO

VERSÃO PÚBLICA ÚNICA

Ementa:

Embargos de Declaração. ATO DE CONCENTRAÇÃO. OBSCURIDADE. TEMPESTIVO. CONHECIMENTO. PROVIMENTO.

 

voto-vogal

I. BREVE DESCRIÇÃO DO CASO

Trata-se de embargos de declaração opostos pela Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas ("Telcomp") e por Algar Telecom S.A. ("Algar") em face à decisão de aprovação condicional do ato de concentração 08700.000726/2021-08, referente à aquisição dos serviços móveis da Oi S.A. (“Oi”) pelas empresas Claro S.A. ("Claro"), Telefônica Brasil S.A. ("Telefônica") e TIM S.A. ("Tim"), conforme proferido pelo Plenário do CADE na 190ª Sessão Ordinária de Julgamento.

Consta no dispositivo do voto-condutor (SEI 1023783), da Conselheira Lenisa Prado, o qual foi acompanhado pelo Conselheiro Luiz Augusto Hoffmann e pelo Presidente do CADE, Alexandre Cordeiro Macedo, o seguinte:

Assim, tendo em vista o exposto acima, voto:

1. Pela aprovação da Operação, condicionada à assinatura de Acordo em Controle de Concentrações, conforme proposta anexada aos autos com as ressalvas feitas nesse voto - (i) garantia de execução dos compromissos para o fecfhamento da operação (ii) utilização de critérios para a precificação dos serviços a serem prestados pelas Requerentes e (iii) Medidas pré-fechamento - cujo cumprimento de seus termos deverão ser objeto de acompanhamento e fiscalização por este CADE;

2. Pela abertura de Inquérito Administrativo para apurar as alegações contidas no Memorial acostado aos autos pelo Ministério Público Federal (SEI nº 1018825);

3. Pela abertura de Processo Interno Disciplinar para apurar a condução das investigações necessárias para a solução do APAC nº 08700.005805/2020-16, com a devida ciência do Ministério Público Federal; e

4. Pela comunicação dessa decisão ao juízo responsável pelo processo de Recuperação Judicial da empresa Oi.

Conforme dispositivo acima transcrito, a operação foi aprovada mediante assinatura de acordo em controle de concentrações (“ACC”), com “ressalvas”. Tais ressalvas são obrigações adicionais, impostas às empresas adquirentes, conforme se lê nos parágrafos 38 e 39 do voto-condutor (SEI 1023783):

38. Além disso entendo que os critérios de precificação para as Ofertas de Referência de Roaming Nacional e para exploração de SMP por meio de Rede Virtual devem ser aqueles definidos pela Agência Reguladora ou, se na existência ou impossibilidade de serem adotados tais parâmetros, sugiro adotar:

- Oferta de Referência de Roaming Nacional: deve-se adotar estritamente, ou seja, como teto para o estabelecimento de preços no âmbito desta Oferta, valores de referência decorrentes da aplicação dos modelos de custos aprovados pela Anatel, para serviços de voz, dados e mensagens, em todas as tecnologias disponíveis (incluindo M2M e IoT) para regimes de contratação livres de compromissos de receita (“pay as you go”). Caso venha a haver compromisso com volumes ou valores mensais, aplicam-se descontos progressivos sobre os valores de referência (limites máximos) aplicáveis. No âmbito do remédio aplicado, as Requerentes não devem ofertar preços superiores aos valores de referência decorrentes da aplicação dos modelos de custo aprovados pela Anatel.

- Oferta de Referência para exploração do SMP por meio de Rede Virtual: deve-se estabelecer a adoção estrita de valores de referência decorrentes da aplicação dos modelos de custos aprovados pela Anatel, para serviços de voz, dados e mensagens, em todas as tecnologias disponíveis (incluindo M2M e IoT). Na ausência de valores de referência para insumos de atacado decorrentes da aplicação dos modelos de custos aprovados pela Anatel, deverá ser adotada a regra de retail minus, a qual consiste na divisão das receitas decorrentes de cada serviço (voz, dados ou SMS) pelo respectivo tráfego (voz, dados ou SMS) apurado em base trimestral. Sobre o valor resultante, aplicar-se-ia uma taxa de desconto – de, no mínimo, 25% – em função do volume trafegado.

39. Por fim, conforme previamente acordado com as Requerentes em Compromisso Unilateral, visando o caráter fix-it-first desta Operação, sugiro a realização das seguintes medidas antes do fechamento:

a) Apresentar, individual e separadamente, para homologação da Agência Nacional de Telecomunicações, as ofertas atinentes à ORPA – Roaming Nacional, [ACESSO RESTRITO AO CADE E REQUERENTES],

b) Disponibilizar, individual e separadamente, as ofertas atinentes à Oferta de Referência – MVNO, [ACESSO RESTRITO AO CADE E REQUERENTES],

c) Divulgar, individual e separadamente, em jornal de circulação nacional, e previamente ao Closing, seu compromisso público de cumprir tempestiva e integralmente o ACC negociado e aprovado com o CADE, [ACESSO RESTRITO AO CADE E REQUERENTES].

Consta, ainda, na ata da 190ª Sessão Ordinária de Julgamento, publicada no Diário Oficial da União (SEI 1023967):

O Plenário, unanimidade, conheceu da operação e por maioria aprovou-a condicionada à celebração e ao cumprimento de Acordo em Controle de Concentrações, nos termos do voto da Conselheira Lenisa Prado, que consignou a exigência de seu cumprimento antes do fechamento da operação e fez constar os métodos de precificação a ser utilizado. [...] O plenário, por unanimidade, determinou o encaminhamento da representação apresentada pelo Ministério Público Federal no Memorial MPF 1/2022 (SEI 1018825 e SEI 1018826 – acesso restrito) à Superintendência Geral, para fins de instauração de inquérito administrativo para apuração de eventual prática anticompetitiva, bem como envio à Corregedoria do Cade para apurar a condução das investigações necessárias para a solução do APAC nº 08700.005805/2020-16.

A Telcomp, em seus embargos de declaração (SEI 1025634), requereu “esclarecimentos e ratificações quanto (i) ao momento da homologação, pela e. Anatel e por este e. CADE, das Ofertas de Referência de Roaming Nacional e das Ofertas de Referência para exploração do SMP-RV a serem apresentadas por cada uma das Compradoras; (ii) ao momento da alienação das ERBS e (iii) ao perfil do trustee de monitoramento”.

A Algar, nos seus embargos de declaração (SEI 1028945), requereu a sanação de “obscuridades e contradições expostas na presente petição, de modo que seja publicado aditivo ou retificação ao ACC para contemplar, de maneira uniforme e objetiva, os termos do Voto Vencedor, incluindo as condicionantes adicionais e os remédios impostos pela Anatel”.

O Ministério Público Federal (“MPF”) apresentou o Memorial MPF 2/2022 (SEI 1031903), no qual requereu: “a) seja redigido o Acordo nos exatos termos dispostos e determinados pelo Voto condutor da Conselheira Lenisa Prado, cujas obrigações assumidas devem ocorrer ANTES do fechamento da Operação, sem exceções, sob pena de ser reputada não aprovada a Operação, por não aceitas as determinações constantes da decisão do Tribunal do CADE, de modo a afastar a nulidade do Acordo em Controle de Concentração - ACC assinado (SEI 1024099), na medida que não cumpriu a decisão do Tribunal; b) seja esclarecido o momento exato do Closing da Operação e a obrigatoriedade de efetiva alienação dos ativos ERBs e não mera oferta; e c) sejam adotadas pelo Tribunal do CADE no Acordo em Controle de Concentração - ACC as mesmas referências da anuência prévia da Anatel, relativamente às Ofertas de Referência no Mercado de Roaming Nacional e Oferta de Referência para Exploração de SMP, cujas obrigações não possuem limites voltados aos Prestadores de Pequeno Porte – PPPs e áreas geográficas em que não possuem autorização para prestação do SMP, especialmente para não possibilitar a sua utilização pelas Requerentes para se isentarem ou descumprirem a regulação do Setor”.

II. ANÁLISE DOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS

Os embargos opostos por Telcomp e Algar são tempestivos. As embargantes foram devidamente admitidas como terceiros interessados nesse processo e, portanto, possuem interesse recursal. Por fim, as questões suscitadas nos embargos referem-se à existência de supostas contradições, omissões e erros materiais a serem suprimidos do julgado. Assim, entendo estarem presentes os requisitos de admissibilidade recursal, razão pela qual conheço dos embargos opostos e passo a analisá-los quanto ao mérito.

Como se vê nos trechos dos embargos de declaração e memorial do MPF acima reproduzidos, as principais alegações estão centradas na existência de obscuridade acerca dos remédios antitruste impostos pelo Tribunal do CADE para fins de aprovação do ato de concentração.

Apego-me a um termo constante no Memorial MPF 2/2022 (SEI 1031903), o qual aponta para a “inexatidão” causada por diferença nos termos empregados no voto-condutor (SEI 1023783) e no ACC assinado entre o CADE e as Compromissárias (SEI 1024882).

Vejo múltiplas inexatidões na conclusão deste caso. Peguemos, por exemplo, o compromisso de ofertar até 50% das Estações de Rádio Base (“ERBs”) adquiridas. Trata-se de um compromisso duplamente vazio. As Compromissárias obrigam-se a ofertar, não necessariamente alienar. Concedem-se, ainda, ampla liberdade de escolha quanto à quantidade ofertada, podendo esta variar entre zero e 50% das estações adquiridas.

Existe uma classe de remédios antitruste, ditos estruturais, determinando desinvestimento mínimo. A proposta de ofertar ativos à venda, sem definição de critérios de negociação e apreçamento, deixando ainda assegurado a livre escolha das Compromissárias quanto à quantidade ofertada, podendo inclusive ser zero, resulta em um “remédio” absolutamente ineficaz, vexatório e incapaz de cumprir com as finalidades da Lei 12.529/2011.

Sem dúvida, sanar inexatidões como esta seria desejável a fim de dar concretude aos condicionantes exigidos para a aprovação da operação. Mas deve-se reconhecer que isso não passou despercebido. A redação  utilizada no ACC foi proposta conscientemente pelas empresas adquirentes e aceita pela maioria deste Tribunal. Lembro-me de ter feito alertas a esse respeito durante a 190ª Sessão Ordinária de Julgamento, em linha com o texto constante no voto-relator do ato de concentração (SEI 1025547):

188. Importante frisar não haver na proposta de ACC apresentada qualquer obrigação de venda de ativos, mas apenas o compromisso de se ofertar Estações de Rádio Base (ERBs) à venda, sem definir o critério de negociação a ser adotado.

189. Os demais compromissos previstos também se referem à disponibilização de ofertas de referência de infraestrutura (em diferentes modalidades), a ser compartilhada ou cedida, temporariamente, mediante a contrapartida financeira negociada entre as partes.

190. Portanto, enquanto o Guia de Remédios Antitruste recomenda acordos no estilo fix-it-first, nos quais a contraparte dos compromissos assumidos é definida a priori, a proposta de ACC se restringe à disponibilização de ofertas de referência, a serem disponibilizadas após o fechamento da operação, sem qualquer sem compromisso de execução efetiva. A meu ver, esse tipo de acordo, caso aceito, desmoralizaria o CADE.

191. Ademais, considero que tais compromissos não possuem a menor chance de permitir a entrada de um rival efetivo e, tão pouco, de promover repasse de eficiências ao consumidor.

192. Diante desses fatos, se seguirmos formalmente a boa análise antitruste, não resta alternativa a este Conselho a não ser reprovar esta operação.

Também não creio que as obrigações estabelecidas no voto-condutor lidem com o vazio dos remédios propostos.

Primeiramente, condicionar o fechamento da operação ao cumprimento dos principais compromissos é algo usual e deveria ser a regra nos acordos e decisões do CADE. Como bem se sabe, torna-se muito difícil reverter eventual descumprimento de obrigações após o fechamento da operação.

Todavia, o voto-condutor (SEI 1023783), conforme se lê no parágrafo 39 (transcrito acima), limita-se a “sugerir” para as empresas adquirentes “apresentarem/disponibilizarem”, antes do fechamento da operação, as ofertas de referência de roaming nacional e de aluguel de rede para operadores virtuais (“MVNOs”). Não vejo maiores dificuldades no cumprimento dessas sugestões/imposições.

Em segundo lugar, o voto-condutor define regra de apreçamento para esses dois tipos de ofertas de referência (roaming e rede virtual), conforme se lê no parágrafo 38 (transcrito acima). O preço de tais ofertas devem respeitar os critérios da ANATEL e, diante da ausência desses, atender a um desconto mínimo de 25% em relação ao preço de varejo.

Esta é uma inovação na jurisprudência do CADE. Em geral, a autoridade antitruste evita regular preços, atribuição típica de agências reguladoras. Considero ser um intervencionismo indesejável fixar desconto mínimo sem conhecimento detalhado de custos e margens de lucro praticadas nesse mercado.

Ademais, tal política, caso implementada, terá tão somente a função de transferir parcela menor dos ganhos da operação a terceiros, sem qualquer benefício ao consumidor. Isso porque o valor do aluguel continuará a ter como referência o preço de varejo majorado pela formação do triopólio e, portanto, as operadoras virtuais beneficiadas com essa decisão não terão como exercer pressão competitiva ou contestar os preços do novo equilíbrio de mercado.

A respeito de tema correlato, escrevi no voto-relator do caso (SEI 1025547):

182. Tenho duas restrições conceituais à adoção de remédios baseados no chamado “aluguel” de rede, em oposição aos remédios estruturais (venda de clientes, rede e espectro). Primeiramente, os eventuais compromissos assumidos pelas Requerentes possuirão prazo limitado e, necessariamente, deixarão de existir no futuro. Ademais, a definição do preço do aluguel passará, inevitavelmente, por algum tipo de negociação comercial. Ora, se inexiste rivalidade suficiente no varejo, não se deve esperar alta competição no atacado, pois as mesmas três dominarão entre 95% e 98% desses dois mercados.

183. Como é bem sabido dos manuais de Economia, a existência de poder de mercado no atacado afeta os preços no varejo. Um monopolista no mercado à montante, por exemplo, que se depare com um mercado à jusante perfeitamente competitivo, não terá dificuldades em impor o preço de monopólio ao consumidor final.

184. Assim, os preços dos acordos de aluguel de infraestrutura, necessariamente, refletirão os novos preços de equilíbrio a serem cobrados no varejo pelo triopólio resultante desta operação.

Sendo assim, não vejo mérito nas medidas que condicionam a aprovação deste ato de concentração, tanto as acordadas, quanto as impostas. Entretanto, reconheço ter sido essa a decisão do Tribunal e, somente por correção técnica, considero adequado esclarecer o comando do voto-condutor, fazendo constar em seu dispositivo a aprovação do ato de concentração sujeito à imposição de medidas unilaterais, as quais incluem tanto as cláusulas constantes na proposta de ACC bem como as inovações trazidas nos parágrafos 38 e 39, supracitados.

Concluo minha manifestação com uma mensagem de esperança dirigida aos servidores do CADE que atuaram nesse caso, incluindo aqueles que se afastaram ou foram afastados durante o processo. O trabalho de vocês foi de alto nível. As conclusões da Nota Técnica SG e do Parecer DEE não se comunicam com a análise rigorosa constante no corpo desses documentos. A decisão deste Tribunal também não fez jus ao empenho de vocês. Mas tudo isso está registrado. Esse caso será revisitado pela comunidade antitruste e por acadêmicos, no Brasil e exterior. O trabalho de vocês não foi em vão. Continuem!

Dispositivo

Com base no exposto, conheço dos embargos declaratórios e, no mérito, dou-lhes provimento para, visando sanar as obscuridades apontadas, fazer constar do dispositivo do voto-condutor e da ata da 190ª Sessão Ordinária de Julgamento as medidas impostas pelo Tribunal para a aprovação do ato de concentração, quais sejam, os remédios apresentados pelas empresas adquirentes em sua proposta de ACC, adicionados às obrigações definidas pelo Tribunal, constantes nos parágrafos 38 e 39 do voto-condutor.

É o voto.

LUIS HENRIQUE BERTOLINO BRAIDO

Conselheiro

(assinado eletronicamente)

 

 


logotipo

Documento assinado eletronicamente por Luis Henrique Bertolino Braido, Conselheiro, em 16/03/2022, às 17:00, conforme horário oficial de Brasília e Resolução Cade nº 11, de 02 de dezembro de 2014.


QRCode Assinatura

A autenticidade deste documento pode ser conferida no site sei.cade.gov.br/autentica, informando o código verificador 1035855 e o código CRC B85E0FBC.




Referência: Processo nº 08700.000726/2021-08 SEI nº 1035855