Timbre

Ministério da Justiça e Segurança Pública - MJSP

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Ato de Concentração  08700.002569/2020-86

Apartado Restrito 08700.003500/2020-70

Requerentes: Tupy S.A. e Teksid S.p.A.

Advogados(as): Tito Amaral de Andrade, Érica Sumie Yamashita, Lauro Celidonio Neto, Renata Zuccolo Giannella e outros

Relatora: Conselheiro Luis Henrique Bertolino Braido

VOTO-RELATOR - CONSELHEIRO luis henrique bertolino braido

VERSÃO DE ACESSO público

Ementa:

Ato de Concentração. Lei 12.529/2011. Procedimento ordinário. Aquisição de controle. Sobreposição horizontal em mercados de componentes de ferro fundido. operação INTERNACIONAL. altos índices de concentração nos mercados de blocos de motor de ferro para veículos de passeio e comerciais leves, blocos de motor de ferro para aplicações médias, pesadas e off-road e cabeçotes de motor de ferro para aplicações médias, pesadas e off-road. Ausência das condições de tempestividade, probabilidade e suficiência da entrada de novas empresas. Ausência de rivalidade e contestabilidade advinda DE Importações. Ausência de incEntivos para repasse de eficiências econômicas aos clientes. Acordo de Controle em Concentrações. Aprovação com restrições.

O mercado relevante sob a dimensão geográfica, quando baseado na localização do consumidor ("mercados à distância"), pode ser delimitado como predominantemente nacional, mas com participação de competidores sediados no exterior, se for verificada a existência de quantidade razoável de importações. Nesse caso, as importações devem ser consideradas para fins de análise de participação de mercado.

A presença de empresas estrangeiras nos leilões e cotações realizados pelos consumidores, e o moderado custo de importação (incluindo tributos e transporte) dos produtos no mercado relevante, são elementos que indicam a existência de rivalidade, a qual pode reduzir, mas não afastar, a probabilidade de exercício de poder de mercado decorrente do ato de concentração.

O Acordo em Controle de Concentrações, com medida estrutural (desinvestimento) e comportamentais, possibilita o robustecimento de concorrentes, de modo a contrabalançar o poder de mercado resultante do Ato de Concentração.

 

voto

ESTRUTURA DO VOTO

I. INTRODUÇÃO

II. ANÁLISE DA SUPERINTENDÊNCIA-GERAL

     II.1. Mercado Relevante

     II.2. Concentração

     II.3. Entrada

     II.4. Rivalidade

     II.5. Eficiências

     II.6. Argumentos das Requerentes e dos OEMs

III. ANÁLISE DO GABINETE 2

     III.1. Nova Definição de Mercado Relevante

     III.2. Participação de Mercado

     III.3. Exercício de Poder de Mercado

     III.4. Análise de Eficiências

IV. ACORDO EM CONTROLE DE CONCENTRAÇÃO

     IV.1. Remédio Estrutural

     IV.2. Remédio Comportamental

 

 

I. INTRODUÇÃO

Em respeito ao Regimento Interno do CADE, o relatório deste voto (SEI 0889878) foi antecipadamente exposto em ato disponível ao conhecimento das partes e demais interessados por ocasião da publicação da pauta deste julgamento. Parte dos fatos lá descritos é novamente apresentada com o intuito de tornar o voto autocontido.

Trata-se aqui de analisar a aquisição por Tupy S.A. (“Tupy”) do negócio de fundição de ferro de Teksid S.A. (“Teksid”), que hoje é detido por Fiat Chrysler Automobiles N.V. (“FCA”). Operação envolve cinco plantas da Teksid localizadas no Brasil (Betim), Portugal, México, Polônia e China.

A operação foi notificada em 27/05/2020 (SEI 0759565) e não conta com pedido de intervenção de terceiro interessado.

II. ANÁLISE DA SUPERINTENDÊNCIA-GERAL

A Superintendência-Geral do CADE (“SG”) analisou a operação em detalhes e recomendou sua reprovação. Esta seção do voto se dedica a destacar alguns pontos dessa análise.

II.1. Mercado Relevante

O negócio alvo da operação é a fabricação e comercialização de produtos em ferro fundido voltados majoritariamente para indústria automobilística, tais como: (i) blocos de motor; (ii) cabeçotes; (iii) caixa diferencial/tampas da caixa diferencial; (iv) coletor de escape; (v) suportes de motor; (vi) mangas de eixo; (vii) braços da suspensão; (viii) tampas; (ix) virabrequim.

O Parecer 20/2020/CGAA4/SGA1/SG/CADE (versão pública, SEI 0841500) apresentou a seguinte lista de produtos das requerentes:

Linhas de Produtos das Requerentes no Brasil (2019)

Produto

Tupy

Teksid

Blocos de motor de ferro fundido

x

x

- para veículos de passeio e comerciais leves

x

x

- para aplicações médias, pesadas e off-road

x

x

Cabeçotes de motor de ferro fundido

x

x

- para veículos de passeio e comerciais leves

x

 

- aplicações médias, pesadas e off-road

x

x

Outros componentes em ferro fundido

x

x

- Suportes de motor

x

x

- Tampa

x

x

- Virabrequim

x

x

- Caixa diferencial/Tampa de caixa diferencial

x

x

- Coletor de escape

x

x

- Mangas de eixo

x

x

- Braço de suspensão

x

x

- Capa de mancal

x

 

- Disco de freio

x

 

- Suporte de freio

x

 

- Conexões (bridge)

x

 

- Bloco de compressor

x

 

- Console

x

 

- Cilindro

x

 

- Camisa de cilindro

x

 

- Cotovelo

x

 

- Extensor

x

 

- Flange

x

 

- Volante de motor

 

x

- Porta de engrenagem

x

 

- Carcaça de câmbio

 

x

- Outros tipos de carcaça (de direção de turbina, de central de turbina e de eixos)

x

 

- Placa de pressão

x

 

- Perfis contínuos

x

 

- Anilha

x

 

- Sapata

x

 

- Luva

x

 

- Terminal

x

 

- Cavalete

x

 

- Tubo

x

 

- Cubo de roda

x

 

Fonte: Parecer 20/2020/CGAA4/SGA1/SG/CADE (versão pública, SEI 0841500)

A SG definiu quatro mercados relevantes, na dimensão produto, a saber:

Blocos de motor de ferro fundido para veículos de passeio e comerciais leves;

Blocos de motor de ferro fundido para aplicações médias, pesadas e off-road;

Cabeçotes de motor de ferro fundido para aplicações médias, pesadas e off-road; e

Outros componentes em ferro fundido.

Essa estrutura de segmentação do mercado foi considerada correta pelas empresas oficiadas.

Não há precedentes recentes sobre o modo como o CADE segmenta este mercado.

Na dimensão geográfica, a SG considerou o mercado relevante como sendo formado pelas fundições instaladas em território nacional.

A SG rejeitou a delimitação global para esses mercados com base no fato de não haver preço unificado para os produtos. Segundo o Parecer 20/2020/CGAA4/SGA1/SG/CADE (versão pública, SEI 0841500):

160. Conforme se observa dos trechos transcritos acima, o teste de mercado sugere que a influência nos preços, apontada pelas requerentes e seus concorrentes, não necessariamente resulta em proximidade de preços do produto feito no Brasil e o importado. Pelo contrário: há uma clara indicação que o valor pago pelos clientes dos componentes de ferro fundido importados é mais elevado do que os fabricados no país.

II.2. Concentração

A SG utilizou dois critérios para calcular as participações de mercado: um deles baseado na capacidade instalada das fundições nacionais e outro baseado nos faturamentos dessas mesmas fundições com cada produto.

A capacidade instalada foi alocada para cada um dos quatro produtos definidos acima de modo proporcional ao percentual do respectivo produto no faturamento bruto anual de cada fundição em 2019.

Note-se, por importante, que parte do faturamento bruto das Requerentes é proveniente de exportações. Entretanto, a SG não retirou tais receitas de exportação (e correspondente capacidade instalada) do cálculo da participação de mercado.

Essa metodologia resultou nos seguintes valores:

Blocos de motor de ferro para veículos leves (2019)

 

Capacidade Instalada
(mil ton.)

Participação de Mercado
(capacidade)

Faturamento
(reais)

Participação de Mercado
(faturamento)

Teksid

---

[40%-50%]

---

[40%-50%]

Tupy

---

[20%-30%]

---

[20%-30%]

Tupy + Teksid

---

[60%-70%]

---

[70%-80%]

WHB

---

[30%-40%]

---

[20%-30%]

Total

---

100%

---

100%

 

Fonte: Parecer 20/2020/CGAA4/SGA1/SG/CADE (versão restrita, SEI 0841200)

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

 

Blocos de motor de ferro para aplicações médias, pesadas e off-road (2019)

 

Capacidade Instalada
(mil ton.)

Participação
(capacidade)

Faturamento
(reais)

Participação de Mercado
(faturamento)

Tupy

---

[50%-60%]

---

[60%-70%]

Teksid

---

[30%-40%]

---

[30%-40%]

Tupy + Teksid

---

[90%-100%]

---

[90%-100%]

WHB

---

[0%-10%]

---

[0%-10%]

Hubner

---

[0%-10%]

---

[0%-10%]

Intercast

---

[0%-10%]

---

[0%-10%]

Total

---

100%

---

100%

Fonte: Parecer 20/2020/CGAA4/SGA1/SG/CADE (versão restrita, SEI 0841200)

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

 

Cabeçotes de ferro para aplicações médias, pesadas e off-road (2019)

 

Capacidade Instalada
(mil ton.)

Participação
(capacidade)

Faturamento
(reais)

Participação de Mercado
(faturamento)

Tupy

---

[50%-60%]

---

[50%-60%]

Teksid

---

[20%-30%]

---

[20%-30%]

Tupy + Teksid

---

[80%-90%]

---

[80%-90%]

WHB

---

[10%-20%]

---

[0%-10%]

Hubner

---

[0%-10%]

---

[0%-10%]

Total

---

100%

---

100%

Fonte: Parecer 20/2020/CGAA4/SGA1/SG/CADE (versão restrita, SEI 0841200)

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

 

Outros componentes fundidos de ferro (2019)

 

Capacidade Instalada
(mil ton.)

Participação de Mercado

Tupy

---

[0%-10%]

Teksid

---

[0%-10%]

Tupy + Teksid

---

[0%-10%]

WHB

---

[10%-20%]

Hubner

---

[0%-10%]

Intecast

---

[0%-10%]

Metalsider

---

[0%-10%]

Fundimisa

---

[0%-10%]

Fagor

---

[0%-10%]

Frum

---

[10%-20%]

Castertech

---

[0%-10%]

Shulz

---

[10%-20%]

Romi

---

[0%-10%]

Mahle

---

[0%-10%]

Durametal

---

[0%-10%]

Regali

---

[0%-10%]

Voges

---

[0%-10%]

Farina

---

[0%-10%]

Outros

---

[0%-10%]

Total

---

100%

 

Fonte: Parecer 20/2020/CGAA4/SGA1/SG/CADE (versão restrita, SEI 0841200)

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

Como se percebe, três dos quatro mercados analisados apresentam altos índices de concentração, a saber: (i) blocos de motor de ferro para veículos de passeio e comerciais leves; (ii) blocos de motor de ferro para aplicações médias, pesadas e off-road; e (iii) cabeçotes de motor de ferro para aplicações médias, pesadas e off-road.

Essa conclusão não permitiu a aprovação inicial da operação pela SG. O Parecer 20/2020/CGAA4/SGA1/SG/CADE (versão restrita, SEI 0841200) passou então às análises de entrada, rivalidade e eficiências.

II.3. Entrada

Para a SG, as barreiras à entrada percebidas na instrução derivam de capacitação tecnológica, elevados níveis de investimento, baixa taxa de retorno sobre o investimento e ociosidade atual do setor.

Quanto à capacitação tecnológica, SG apontou a existência de muitas fundições de ferro, contudo poucas capazes de produzir blocos e cabeçotes de ferro com os requisitos técnicos exigidos pelos fabricantes de veículos, aqui tratados como “OEMs” (Original Equipment Manufacturer). No país, apenas a WHB teria capacitação técnica necessária para ser considerada como competidora efetiva de Tupy e Teksid.

Quanto aos investimentos obrigatórios para entrada, o teste de mercado levado a cabo pela SG apontou para necessidade de aportes na ordem de R$ 100 a 500 milhões, de modo a obter uma capacidade de produção de 120 mil t/ano.

O argumento de baixa taxa de retorno sobre o investimento, segundo a SG, tem por causa a necessidade de elevado capital imobilizado e a existência de alto poder de barganha das OEMs.

Foi constatada elevada ociosidade, [ACESSO RESTRITO AO CADE]. Tal ociosidade tende a aumentar com a migração do segmento de motores leves para o alumínio, o que desencoraja investimentos para ingresso nesse setor.

O histórico de ingresso nesse mercado, percebido pela SG via teste de mercado, revelou que não houve entrada de agente econômico no mercado brasileiro de blocos e cabeçotes de motor de ferro nos últimos cinco anos.

Quanto ao prazo para ingresso, segundo informações colhidas pela SG, esse supera o período de três anos, considerado como limite para que uma entrada fosse considerada tempestiva.

Por fim, à luz dos altos índices de concentração, a SG não considerou o ingresso de um competidor fosse condição suficiente para constranger o poder de mercado decorrente da operação.

A SG concluiu, assim, que não haveria entrada provável, tempestiva e suficiente de novas empresas nos três mercados com altos índices de concentração, conforme apontado anteriormente.

II.4. Rivalidade

A SG constatou ser baixa a rivalidade nos três mercados acima referidos.

A partir de análise dos leilões reportados pelas OEMs oficiadas, a SG observou que Tupy e Teksid sagraram-se vencedores de todos os certames, os quais contavam geralmente com dois ou três participantes. Apontou ainda para a presença de empresas estrangeiras em alguns dos leilões e cotações realizados. Avalia, porém, que a “presença de concorrentes estrangeiros nesses certames parece se relacionar mais à obtenção de melhores propostas comerciais do que a opções críveis de fornecimento”.

A SG também analisou as variações nas participações de mercado como medida de possível contestabilidade de posições de mercado. Tal estudo indicou poucas mudanças nas participações, principalmente no mercado de blocos de motor de ferro para aplicação média, pesada e off-road. A operação une as duas empresas que lideram esses mercados há anos.

Com base nesses elementos, a SG concluiu pela baixa rivalidade efetiva nos mercados.

Em breve síntese, a SG resumiu didaticamente toda análise tratada até aqui na seguinte tabela:

Seção do Parecer

Hipótese

Resultado da Análise

IV.2.2.1

Fundição é indústria build-to-print.

Válida.

IV.2.2.2

Substitutibilidade pelo lado da oferta.

Inválida.

IV.2.2.3

Tendência para substituição de blocos e cabeçotes em motores de menor cilindrada de ferro para alumínio.

Válida, enquanto tendência, porém inválida quanto à substitutibilidade de produtos de ferro por alumínio e vice-versa.

IV.3.2.2

Requerentes e concorrentes fornecem para vários continentes e OEMs instalados no Brasil compram de vários continentes.

Válida somente no sentido da exportação, não sendo plausível para fins de abastecimento do mercado interno.

IV.3.2.3

Leiloes de compra promovidos pelos OEMs são internacionais.

Parcialmente válida, uma vez que no mercado há tanto leilões nacionais quanto internacionais.

IV.3.2.4

Representatividade das importações no abastecimento do mercado brasileiro

Inválida

IV.3.2.5

Proximidade dos preços nacionais e internacionais de componentes de ferro fundido.

Inválida

IV.3.2.6

Baixas margens de lucro.

Não é possível afirmar a validade da hipótese, contudo a mesma pouco contribui para sustentar a proposta de mercado relevante geográfico mundial.

IV.3.2.7

Baixa concentração de mercado, quando estimada de maneira empírica.

Não é possível afirmar a validade da hipótese, contudo a mesma pouco contribui para sustentar a proposta de mercado relevante geográfico mundial.

VI.2.3

Aquisição dos componentes de ferro fundido por leilões de compra dos OEMs.

Válida, porém não assegura que o mercado de componentes de ferro fundido, por ser operado por leilões, necessariamente terá um ambiente de rivalidade efetiva.

VI.2.4

Elevada capacidade ociosa das fundições de ferro.

Válida, mas a capacidade financeira comprometida da única concorrente efetiva das requerentes gera dúvidas se, em caso de aumento de preços representativos das requerentes, a rival terá condições de absorver eventual desvio de demanda valendo-se de sua capacidade ociosa.

VI.2.5

Vários OEMs possuírem fundição de ferro cativas.

Válida, mas as fundições cativas dos OEMs pouco contribuem para exercer pressão competitiva no mercado brasileiro de blocos e cabeçotes de motor de ferro.

VI.2.6

Facilidade na troca de fornecedor.

Inválida

VI.2.7

Elevado poder de barganha dos OEMs com fornecedores

  1. Inválida

Fonte: Parecer 20/2020/CGAA4/SGA1/SG/CADE (versão pública, SEI 0841500)

II.5. Eficiências

A SG reconheceu a possibilidade de esta operação gerar eficiências, mas observou a ausência de incentivos econômicos para que tais ganhos fossem repassados aos clientes, conforme se depreende do seguinte trecho do Parecer 20/2020/CGAA4/SGA1/SG/CADE (versão restrita, SEI 0841200):

373. A partir desse quadro, as requerentes, com base no Parecer Econômico, organizaram sua argumentação sobre as eficiências da operação nos seguintes eixos: (i) economias de escala e escopo; (ii) sinergias; e (iii) repasse dos benefícios aos clientes.

374. As economias de escala seriam verificáveis [ACESSO RESTRITO AO CADE]. Já as economias de escopo se justificariam [ACESSO RESTRITO AO CADE].

375. No que se refere às sinergias decorrentes da operação, elas seriam observadas pelos aspectos: [ACESSO RESTRITO AO CADE].

376. [ACESSO RESTRITO AO CADE]

377. Por fim, Tupy e Teksid defendem que as economias de escala e escopo e as sinergias derivadas da operação proporcionam aos clientes do mercado de componentes de ferro fundido: (i) preços competitivos; (ii) ligas mais complexas; e (iii) produtos mais leves e com propriedades mecânicas superiores. Tais ganhos, segundo as requerentes, são específicos da operação, não podendo serem alcançados de outra forma, sem incorrer em gastos significativos.

378. Nessa linha, para as requerentes, o repasse dos benefícios aos clientes é garantido por [ACESSO RESTRITO AO CADE].

379. Com base nesses argumentos, as requerentes entendem que as eficiências oriundas das economias de escala e escopo e de sinergia da operação, por força dos denominados contratos pró-OEMs, serão repassadas aos clientes na forma de redução de preços.

380. Para esta SG/Cade, os argumentos sobre as eficiências econômicas da operação apresentadas por Tupy e Teksid, embasadas no Parecer Econômico, mostram-se, em princípio, coerentes com as hipóteses de funcionamento de mercados apresentadas pelas requerentes. Entretanto, mesmo se admitindo a validade dos seus argumentos relativos às economias de escala e escopo e sinergias, pelos motivos já debatidos na Seção VI.2.7, os contratos pró-OEMs, apesar de preverem dispositivos para o repasse de eficiências econômicas dos fornecedores de blocos e cabeçotes de motor de ferro aos OEMs, não possuem incentivos efetivos para garantir o cumprimento dessas cláusulas de repasse de eficiência. Os motivos para tanto, como tratado na mencionada seção, residem: (i) na escassez de fornecedores alternativos para a substituição do contrato; e (ii) no representativo custo de troca de fornecedor. Por conseguinte, apesar do clausulado indicar vantagem aos OEMs, a baixa efetividade dos incentivos para garantir o cumprimento desse aspecto do contrato leva, pelo menos, ao reequilíbrio de forças entre fundições de ferro e OEMs.

381. Essa constatação fragiliza o argumento das requerentes de repasse das eficiências aos consumidores [ACESSO RESTRITO AO CADE]. Como, nos termos da Seção VII.1, o repasse de eficiências ao consumidor é condição necessária para a aprovação do ato de concentração sob a ótica do art. 88, § 6º, da Lei nº 12.529/2011, esta SG/Cade entende que, para a presente operação, o requisito em questão não é cumprido. Consequentemente, não cabe aprofundar a análise em questão, haja vista que os benefícios decorrentes das eficiências apresentadas por Tupy e Teksid não têm condições, nos termos da LDC, de serem contrapostos aos prejuízos ao ambiente concorrencial avaliados nas Seções V e VI.

382. Dessa forma, esta SG/Cade entende que não se mostra presente a condição de eficiências econômicas, nos termos do art. 88, § 6º, da Lei nº 12.529/2011 nos mercados relevantes de: (i) blocos de motor de ferro para veículos de passeio e comerciais leves nacional; (ii) blocos de motor de ferro para aplicações médias, pesadas e off-road nacional; e (iii) cabeçotes de motor de ferro para aplicações médias, pesadas e off-road nacional.

II.6. Argumentos das Requerentes e dos OEMs

As Requerentes apresentaram memoriais (SEI 0794160, 0794162, 0867690 e 0867694) argumentando haver efetiva competição entre fundições nacionais e internacionais, visto que as compras ocorrem em âmbito mundial.

Informam ter havido intensificação da fabricação de veículos de forma padronizada (com componentes idênticos sendo utilizados em diferentes veículos) e em torno de plataformas globais (com componentes servindo OEMs de diferentes países). Em suas palavras:

A modularização permitiu às OEMs comprarem blocos e cabeçotes de ferro em escala global, por meio de leilões de compra centralizados, com a participação de fundições que atuam em diversos países. As fundições que ganham os contratos derivados desses leilões fornecem as peças diretamente para as OEMs, que por sua vez alocam os componentes adquiridos entre suas unidades produtivas ao redor do mundo.

Segundo as Requerentes, a SG desconsiderou ainda: (i) o impacto expressivo das importações; (ii) as baixas margens de lucros, (iii) a existência de leilões internacionais de compra realizados/centralizados na matriz do grupo visando atender todas as subsidiárias espalhadas pelo mundo; (iv) o fato de que fundições estrangeiras participam de leilões realizados no Brasil; (v) a intensa rivalidade de competidores internacionais, algo que seria confirmado pela profusão de leilões – que de acordo com as informações apresentadas pelas Requerentes, diferente daquelas coletadas pela SG junto à OEMs nacionais, conta com centenas de certames e dezenas de empresas participantes; e (vi) a baixa sobreposição na participação da as duas requerentes nos referidos certames.

Apresentaram ainda dois Pareceres Econômicos (SEI 0760083 e 0867694) contendo estudos econométricos, com diferentes metodologias, os quais concluem pela estacionariedade da razão entre os preços praticados em vendas no Brasil e no exterior.

Sobre isto, o DEE elaborou a Nota Técnica 47 (SEI 0840941) na qual afirma:

A partir da Figura 1, é possível observar o comportamento da razão dos preços ao longo do período analisado. Percebe-se que durante o período analisado, tanto o logaritmo da razão de preços doméstico e internacional para blocos e cabeçotes apresenta oscilações ao longo do tempo e não parece estar, em torno de uma média, o que poderá indicar não estacionariedade das séries. Isso porque, uma propriedade importante das séries estacionárias é que elas frequentemente estão em torno de sua média e exibem uma tendência de sempre voltarem à sua média. Nesse sentido, os choques que afetam as séries estacionárias têm apenas efeitos temporários.

Figura 1 - Representação gráfica das séries – log (preço nacional/preço internacional)

Fonte: Elaboração DEE.

 Após uma primeira análise gráfica, foram realizados os testes de estacionariedade ADF, KPSS e PP conforme apresentado nas tabelas 1-3. Os resultados diferenciaram conforme a estrutura do modelo estimado, gerando contradições em relação a conclusão da presença ou não da estacionariedade, isto é, se os produtos domésticos e internacionais competem no mesmo mercado relevante geográfico. Essa divergência nos resultados dos testes de estacionariedade não permitiria corroborar a afirmação apresentada pelo Parecer Econômico (0760083) (...).

Ainda sobre a relevância de pressões competitivas advindas de importações, convém analisar algumas respostas sobre o processo de compra utilizado por OEMs instaladas no Brasil. Enfatiza-se a existência de alguma variação quanto ao modelo de compras, o qual quase sempre conta com competidor internacional, mesmo que apenas para balizar o preço de compra. Ademais, os OEMs oficiados apresentaram visões distintas sobre a possibilidade de importação de blocos de motor e cabeçotes, conforme pode se conferir a seguir.

Cummins Brasil:

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

Scania:

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

Dana:

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

Volvo:

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

Mercedes-Benz do Brasil – MBBras:

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

General Motors do Brasil:

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

Peugeot:

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

Perkins Motores:

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

III. ANÁLISE DO GABINETE 2

Após receber o presente Ato de Concentração para relatar, este Gabinete decidiu aprofundar a instrução relativa ao potencial competitivo advindo do mercado externo. Para tanto, enviou ofícios aos principais OEMs nacionais indagando sobre volumes e custos de internalização de peças trazidas do exterior.

Os três mercados relevantes considerados problemáticos pela SG, quais sejam: (i) blocos de motor de ferro fundido de veículos de passeio e comerciais leves; (ii) blocos de motor de ferro fundido para aplicações médias, pesadas e off-road; e (iii) cabeçotes de ferro fundido adquirido para aplicações médias, pesadas e off-road, foram avaliados com atenção. O mercado de outros componentes de ferro fundido não foi incluído na instrução realizada pelo Gabinete uma vez que, conforme a análise da SG, não foi identificada concentração relevante.

Analisando as respostas fornecidas pelos OEMs, identificamos que várias delas importam parte de sua demanda por blocos de motor e cabeçotes de ferro. A tabela abaixo indica os percentuais de importação para cada um dos três mercados analisados.

Média de importações segundo os OEMs oficiadas

Produto

Percentual Importado

Bloco de motor de ferro fundido de veículos leves (passeio e comercial)

9%

Bloco de motor de ferro fundido para aplicações médias, pesadas e off-road

21%

Cabeçotes de ferro fundido para aplicações médias, pesadas e off-road

59%

Note-se que tais volumes não são desprezíveis e, portanto, não devem ser ignorados. Também não são tão significativos a ponto de poderem ocupar posição central na análise, principalmente quando se considera os mercados de blocos de motor. Adicionalmente, conforme anteriormente apresentado, os OEMs divergem quanto aos custos logísticos e tarifários da importação.

III.1. Nova Definição de Mercado Relevante

O Guia de Análise de Atos de Concentração Horizontal do CADE1 sugere alguns critérios para se definir o mercado relevante em sua dimensão geográfica. Convém citar:

Em relação à classificação geográfica dos mercados, há aqueles baseados na localização do consumidor; na localização dos fornecedores; e na localização de ambos (mercados mistos).

- Mercados à distância (baseados na localização do consumidor) são aqueles aos quais o vendedor, por meio de uma logística de distribuição, disponibiliza seus produtos na localidade dos consumidores. Dada a importância da distribuição nesses mercados, deve-se informar custos de frete, modais disponíveis, tempo de entrega, as especificidades do produto, entre outros elementos. Será computado o total da mercadoria disponibilizada na região do consumidor, independentemente de onde se encontra o fornecedor do produto.

- Mercados tradicionais (baseados na localização dos fornecedores) são aqueles nos quais o consumidor se locomove ao local de venda para adquirir o produto. Aqui, computam-se as vendas realizadas na região do vendedor, independentemente da localização dos consumidores. A mesma empresa pode atuar em diferentes mercados geográficos, sem que isso implique agregação geográfica.

- Mercados Mistos são aqueles onde há uma mescla dos sentidos acima referidos. Lojas tradicionais com serviços de delivery são estabelecimentos em que consumidores tanto se deslocam à empresa [varejo tradicional], quanto a empresa, por meio de uma distribuidora, disponibiliza o produto na localidade dos consumidores [varejo à distância]. Neste tipo de situação, o Cade considerará: qual tipo de venda prevalece no comércio (se o fluxo do comércio tradicional ou à distância); qual tipo de mercado é mais envolvido com as partes da operação; se o perfil dos consumidores que adquirem diretamente no estabelecimento é distinto daquele que adquire à distância; e qual a elasticidade cruzada entre ambos tipos de compra.

(...)

Em linha com a prática internacional, o Cade privilegia a definição do MR pelo lado da demanda e entende que ponderações da substitutibilidade sob a ótica da oferta são complementares na análise dos impactos da operação.

Percebe-se que a SG adotou a definição tradicional baseado na localização dos principais fornecedores. A meu ver, entretanto, o caso concreto parece se adequar melhor à primeira definição listada (mercados à distância), não só porque as peças automobilísticas são de fato transportadas até os OEMs compradoras, mas também porque este conceito privilegia o lado da demanda, considerando as efetivas aquisições de produtos, conforme recomendado pela prática internacional e pelo Guia do CADE supracitado.

Desta forma, utilizo como dimensão geográfica do mercado relevante como sendo predominantemente nacional, mas com a participação de fundições estrangeiras, conforme as compras realizadas por OEMs nacionais.

Esse conceito se diferencia do conceito utilizado pela SG em duas dimensões importantes. Primeiramente, incorporam-se as importações dos produtos para fins de cálculo das participações de mercado. Em segundo lugar, excluem-se as exportações feitas pelas empresas brasileiras – que respondem por parte da capacidade produtiva e do faturamento utilizados na análise da SG.

Não há, a priori, motivo para considerar esta definição de mercado relevante mais ou menos conservadora. Ela simplesmente analisa o problema por outro ângulo, o da demanda nacional.

III.2. Participação de Mercado

Com esse conceito em mente, foram expedidos ofícios às requerentes (SEI 0886785 e 0886813), nos quais se solicita a segregação de seu volume de vendas para o mercado interno e externo. As respostas se encontram nos documentos SEI 0889096 e 0889388.

As requerentes também anexaram aos autos base de dados privada (SEI 0890748), elaborada a partir de informações providas por empresa internacional – a Power Systems Research2 – especializada na coleta de informação sobre a utilização anual de motores e seus componentes em diferentes países, Brasil incluso.

A partir do volume total de peças destinadas aos OEMs nacionais – o que inclui as importações (intracompany ou de fundição estrangeira) e as aquisições feitas de fundições nacionais – bem como dos volumes fornecidos pelas Requerentes a esses mesmos OEMs, obtivemos a seguinte estrutura de mercado.

 

Blocos de ferro para veículos leves (comercial e passeio)

Blocos de ferro para veículos médios, pesados e off-road

Cabeçotes de ferro para veículos médios, pesados e off-road

 

Unidades

Participação

Unidades

Participação

Unidades

Participação

Tupy

---

[10%-20%]

---

[50%-60%]

---

[50%-60%]

Teksid

---

[30%-40%]

---

[20%-30%]

---

[0%-10%]

Tupy + Teksid

---

[40%-50%]

---

[80%-90%]

---

[60%-70%]

Importação e outras fundições nacionais

---

[50%-60%]

---

[10%-20%]

---

[30%-40%]

Total

---

100%

---

100%

---

100%

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

Como se pode perceber, a operação resultará em elevadas concentrações nos três mercados ora analisados. A presença de importações nos cálculos aqui apresentados reduz os níveis de concentração relativamente àqueles computados pela SG. Essa redução, entretanto, não é suficiente para eliminar as preocupações com os níveis de concentração que seriam gerados por esta operação.

Teoria Econômica

Considero adequado representar o setor de fundição pelo modelo de oligopólio de Bertrand com bens diferenciados. Convém, portanto, uma análise à luz do trabalho de Berry, Levinsohn e Pakes (1995)3 para o mercado automotivo.

O equilíbrio de mercado nesta classe de modelos de oligopólio apresenta a margem de lucro (preço menos custo marginal) de cada empresa como diretamente proporcional à sua participação de mercado e inversamente proporcional à sensibilidade da demanda pelo bem diferenciado a seus preços.

Desta forma, na ausência de entrada de novos competidores ou de rivalidade, a elevação na participação de mercado de uma empresa tende a gerar aumento em sua margem de lucro, o que necessariamente decorre de aumento de preços ou redução de custo marginal.

Por essa é a razão, a elevada participação de mercado das empresas Requerentes é motivo de preocupação concorrencial. Questões ligadas à entrada e rivalidade serão comentadas na próxima subseção deste voto. A possibilidade de redução no custo marginal advinda de ganhos de eficiência será descrita a seguir.

Prática Antitruste

A Resolução CADE 2/2012, art. 8º, III aponta que sobreposições horizontais superiores a 20% não devem ser tomadas, de pronto, como de baixa relevância econômica. O valor de 20% de participação de mercado figurava na revogada Lei 8.884, de 11 de junho de 1994. (art. 20, §3º) como indicativo de existência de dominância. Segue na Lei 12.529/2011 (art. 36, §2º) como valor que permite presunção de existência de posição dominante:

§ 2º Presume-se posição dominante sempre que uma empresa ou grupo de empresas for capaz de alterar unilateral ou coordenadamente as condições de mercado ou quando controlar 20% (vinte por cento) ou mais do mercado relevante, podendo este percentual ser alterado pelo Cade para setores específicos da economia.

A Comissão Europeia utiliza o valor de 30% como baliza para tais concentrações horizontais​4:

25. The Commission is unlikely to find concern in non-horizontal mergers, be it of a coordinated or of a non-coordinated nature, where the market share post-merger of the new entity in each of the markets concerned is below 30 % (3) and the post-merger HHI is below 2000.

No caso presente, as participações são muito superiores a tais valores de referência. Em que pese o grau de concentração, por si só, não bastar para afirmar qualquer juízo sobre a operação, resta claro que os valores acima são fundamentais para a análise e indicam que a operação cobra exame para além do cálculo de participações.

III.3. Exercício de Poder de Mercado

Entrada

Considero bastante completa a análise da SG sobre não haver tempestividade, probabilidade e suficiência da entrada de novas empresas nos três mercados analisados pelo Gabinete.

O mercado brasileiro de ferro fundido para blocos e cabeçotes de motor de ferro apresenta alta ociosidade, de modo a tornar improvável o ingresso de agente econômico nesse setor. Segundo os autos, ao longo dos últimos cinco anos, não houve entrada de fundição em qualquer dos três mercados estudados por este Gabinete. Adicionalmente, a principal concorrente das requerentes encontra-se em recuperação judicial.

Segundo as respostas apresentadas pelos OEMs oficiados pela SG, há custos e tempos significativos envolvidos na adaptação do maquinário utilizado para a fabricação de peças, que tem especificidades para cada parque fabril. A instalação de novas plantas ocorre em prazo que varia, segundo as oficiadas, entre dois e quatro anos. Convém citar duas respostas:

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

Sobre a possibilidade de transferir ferramentais para outro fornecedor, tem-se:

[ACESSO RESTRITO AO CADE]

Por fim, de acordo com a Tupy, [ACESSO RESTRITO AO CADE].

Dessa forma, entendo não ser possível considerar a entrada nesse mercado como apta a inibir eventual exercício de poder de mercado.

Rivalidade

A análise da SG considerou baixa a possibilidade de fundições estrangeiras rivalizarem com as Requerentes no Brasil. Divirjo, parcialmente, dessa análise.

Conforme argumentado anteriormente, existe comprovada presença de empresas estrangeiras nos leilões e cotações realizados pelos OEMs, que em regra adquirem suas peças por meio de compras de âmbito mundial. Com base nisso, entendo haver potencial rivalidade externa com as vendas no mercado nacional.

Verifica-se pelas respostas aos ofícios dos principais OEMs nacionais ser baixo o custo de transporte de peças para o Brasil. Já as tarifas de importação, apresentam um quadro mais complexo, merecedor de análise. O gráfico a seguir, elaborados com base nas respostas ofertadas pelos OEMs, ilustram o custo de internalizar peças.

Custos de Internalização de Peças (Valores 2019)

 

[ACESSO RESTRITO]

 

Note-se que, para produtos adquiridos no Brasil em 2019, os custos de transporte respondem por algo entre 1% e 2% dos custos de blocos de ferro para veículos leves; entre 2% e 5% dos custos de blocos de ferro para aplicações médias, pesadas e off-road; e por cerca de 2% dos custos de cabeçotes. Já para os produtos importados no mesmo ano, os custos de transporte respondem por algo entre 2% e 7% dos custos de blocos de ferro para veículos leves; entre 3% e 5% dos custos de blocos de ferro para aplicações médias, pesadas e off-road; e entre 3% e 5% dos custos de cabeçotes. Conclui-se, assim, que o diferencial de custo de transporte é desfavorável ao produto importado, mas em magnitude bastante reduzida.

Por outro lado, os tributos sobre a importação respondem por algo entre 5% e 12% dos custos dos produtos adquiridos no exterior em 2019. Este valor é significativo. Poderia ser visto como um limite para o sobrepreço praticado por uma firma dominante que tenha o mesmo custo marginal de seus competidores internacionais. Segundo Parecer Jurídico apresentado pelas Requerentes (SEI 0867694), a alíquota base para importação de blocos de motor é de [ACESSO RESTRITO AO CADE]. Esse valor, entretanto, encontra-se zerado para importações de Argentina, México e Canadá devido a acordos comerciais entre MERCOSUL e NAFTA. Não consta haver acordos semelhantes com Índia e China, dois países importantes nessa cadeia produtiva.

Não é possível prever se as atuais condições de competição externa são conjunturais ou permanentes. Por um lado, há uma tendência de diferentes governos recentes em expandir os acordos de comércio internacional do país. Algumas inciativas recentes de liberalização comercial, entretanto, podem ser conjunturais. Válido lembrar que, em passado recente, o país adotou significativas políticas de conteúdo nacional no setor automobilístico, o que desfavorece a rivalidade advinda de fundições internacionais.

Poder de Compra

Em relação ao poder de barganha dos OEMs na aquisição de blocos e cabeçotes, observa-se diferenças entre as visões das Requerentes e das próprios OEMs.

As Requerentes sugerem que essas empresas apresentam grande poder de barganha por definirem as regras dos leilões e deterem direitos sobre os desenhos industriais e a propriedade intelectual das peças produzidas, o que facilitaria a substituição de fornecedor.

Um OEM, a [ACESSO RESTRITO], concorda com a existência de poder de compra alegada pelas Requerentes. Outras, entretanto, discordam dessa visão.

A empresa [ACESSO RESTRITO] afirmou que, no fornecimento de blocos de motor para veículos pesados, o poder de barganha é exercido pelas Requerentes, por serem as únicas empresas nacionais com tecnologia adequada e devido aos altos custos de internalização de blocos importados. Em sua reposta, lê-se:

[ACESSO RESTRITO]

Outras três empresas – [ACESSO RESTRITO] – afirmam não deterem escala suficiente para o exercício de poder de compra.

Em suma, não é consensual a existência ou não de poder de compra por parte dos OEMs. Ademais, a consumação deste Ato de Concentração, poderia deixar os OEMs nacionais com poucas (ou até sem) opções internas de fornecedores alternativos. Concluo, assim, semelhantemente à SG, pela existência de potencial de exercício de poder de mercado.

III.4. Análise de Eficiências

Reconheço, assim como fez a SG, que a operação trará eficiências. Tendo em vista a existência de contratos impondo o repasse de tais ganhos aos clientes (OEMs), que inclusive auditam as requerentes, entendo haver mecanismos firmados capazes de garantir que parcela dos ganhos de eficiência sejam absorvidos, a curto prazo, pelos OEMs. Os incentivos econômicos para repasse de tais ganhos derivam das multas contratuais resultantes do inadimplemento do pactuado.

Tais contratos, porém, não são permanentes e, em sua maioria, expirarão ao longo dos próximos cinco anos. As renovações dos atuais contratos assim como eventuais novos contratos poderão se dar sob outras condições.

Diante disso, entendo que a operação resulta em eficiências econômicas e que tais eficiências devem ser repassadas aos clientes durante a duração dos atuais contratos. Isso, porém, não é suficiente para aprovar a operação sem qualquer remédio, pois tais repasses podem não ser duradouros caso inexista rivalidade.

IV. ACORDO EM CONTROLE DE CONCENTRAÇÃO

O presente Ato de Concentração gera preocupação concorrencial devido à altíssima participação de mercado que as Requerentes passarão a ter após a operação, sem que as condições de entrada e rivalidade sejam suficientes para afastar um provável exercício de poder de mercado.

Dessa forma, após negociações com este Conselho, as requerentes apresentaram Acordo em Controle de Concentração (“ACC”), no qual se comprometem com remédios estrutural e comportamental visando amenizar o impacto da operação sobre os mercados relevantes, sem que com isso se perca os ganhos de eficiência esperados.

Tendo em vista que a operação ainda depende de autorização de agências antitruste de outros países (por exemplo, EUA e México), a concretização dos remédios definidos no ACC ficará suspensa enquanto a operação não for aprovada nas demais jurisdições.

IV.1. Remédio Estrutural

Conforme observado, existem poucos competidores atuantes nos mercados analisados, de modo que a Tupy e Teksid, de forma conjunta, passarão a atender mais de 50% dos mercados de bloco de motor de ferro e cabeçotes de ferro. Ademais, a principal concorrente das duas empresas nesses mercados (WHB) se encontra em processo de recuperação judicial. Dessa forma, faz-se necessário robustecer um ou mais concorrentes, de modo a contrabalancear o poder de mercado gerado pela operação.

Assim, as requerentes se comprometeram com o desinvestimento de contratos firmados junto ao Grupo Stellantis (controlador da atual controladora da Teksid), ou empresas a ele ligadas, na quantidade de [ACESSO RESTRITO AO CADE], sendo no mínimo 90% em contratos para fornecimento de blocos de motor de ferro.

Assim, a(s) fundição(ões) concorrente(s) envolvida(s) no desinvestimento apresentará(ão) incremento entre 9% e 10% na participação no mercado de blocos de motor de ferro. Em relação ao mercado de cabeçotes de ferro para aplicações médias, pesadas e off-road, considerado menos problemático do ponto de vista de concorrencial, o(s) concorrente(s) apresentará(ão) incremento entre 0% e 4% em sua participação.

Do ponto de vista da operação em si, o desinvestimento representa entre 26% e 29% dos blocos de motores de ferro vendidos por Teksid ao mercado interno. Em relação à Tupy, que exporta uma fração maior de sua produção, este desinvestimento representa algo entre 53% e 58% dos blocos de motores de ferro vendidos ao mercado brasileiro.

Consiste, portanto, em desinvestimento significativo para os volumes do mercado brasileiro, preservando ainda parte importante da operação destinada ao mercado internacional.

IV.2. Remédio Comportamental

As obrigações comportamentais apresentadas no ACC podem ser assim resumidas:

Conceder aos clientes a prorrogação dos contratos de fornecimento, observadas condições estabelecidas no ACC;

Renunciar a compromissos de compra de blocos de motor e/ou cabeçotes de ferro, observadas condições estabelecidas no ACC;

Não requisitar medidas antidumping, nem interferir em pedidos de concessão de redução, suspensão ou eliminação de tributos sobre a importação de blocos de motor e/ou cabeçotes de ferro, pelo prazo de cinco anos;

Não reassumir o fornecimento de volumes desinvestidos, observadas condições estabelecidas no ACC;

Comunicar tais compromissos a seus clientes.

Os remédios acima expostos facilitam, pelo prazo de cinco anos, que os atuais clientes de Tupy e Teksid possam transferir sua demanda para concorrentes, sem que haja alteração das condições contratuais presentes.

Dispositivo

Por todo o exposto, com base no disposto no art. 61, §1, VI, da Lei 12.529/2011, voto pela aprovação do Ato de Concentração, condicionado à assinatura do Acordo em Controle de Concentrações e ao integral cumprimento das medidas estruturais e comportamentais lá previstas (SEI 0892818).

LUIS HENRIQUE BERTOLINO BRAIDO

Conselheiro-Relator

(assinado eletronicamente)

 

 

https://cdn.cade.gov.br/Portal/centrais-de-conteudo/publicacoes/guias-do-cade/guia-para-analise-de-atos-de-concentracao-horizontal.pdf

https://www.powersys.com/pt/power-systems-research/

Steven Berry, James Levinsohn e Ariel Pakes (1995): Automobile Prices in Market Equilibrium, Econometrica, 63 (4), pp. 841-890.

https://ec.europa.eu/competition/mergers/legislation/Merger2015.pdf


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Documento assinado eletronicamente por Luis Henrique Bertolino Braido, Conselheiro, em 22/04/2021, às 17:20, conforme horário oficial de Brasília e Resolução Cade nº 11, de 02 de dezembro de 2014.


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Referência: Processo nº 08700.002569/2020-86 SEI nº 0894716