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Ministério da Justiça e Segurança Pública - MJSP

Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE

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Ato de Concentração nº 08700.001134/2020-14

Requerentes: Seara Alimentos Ltda. e Bunge Alimentos S.A.

Advogados: Marcos Paulo Veríssimo, Ana Carolina Lopes de Carvalho, José Carlos da Matta Berardo, Juliana Maia Daniel Pinheiro, Pedro Henrique Rubini Cini e outros.

Terceiro Interessado: BRF S.A.

Advogados: Priscila Brolio Gonçalves, Camila Pires da Rocha, Renata Gonsalez de Souza e outros.

Relator: Conselheiro Sérgio Costa Ravagnani

 

VOTO DO RELATOR - CONSELHEIRO SÉRGIO COSTA RAVAGNANI

 VERSÃO PÚBLICA

Ementa:

ATO DE CONCENTRAÇÃO. ORDINÁRIO. AQUISIÇÃO DE ATIVOS. TERCEIRO INTERESSADO: BRF S.A. MERCADO NACIONAL DE MAIONESES, MARGARINAS E ÓLEO DEGOMADO DE SOJA.  SOBREPOSIÇÃO HORIZONTAL NO MERCADO NACIONAL DE MARGARINAS. RELAÇÃO VERTICAL NO MERCADO DE ÓLEO DEGOMADO DE SOJA. RIVALIDADE. AVOCAÇÃO. CONHECIMENTO. APROVAÇÃO SEM RESTRIÇÕES.

Existência de rivalidade efetiva ainda que verificadas elevadas participações e altas barreiras à entrada.

voto

I.DESCRIÇÃO DA OPERAÇÃO

Conforme detalhado no Relatório (SEI 0829630), a Operação consiste na aquisição, pela Seara Alimentos Ltda  (“Seara”), de ativos tangíveis e intangíveis (o “Estabelecimento”) destinados ao negócio de maionese e margarinas da Bunge (“Bunge” e, em conjunto com Seara, as “Requerentes) (“Operação”).[1] Em 20/12/2019, as Requerentes celebraram o Contrato de Trespasse de Estabelecimento e Outras Avenças (“Contrato” – SEI 0730142) que detalha os ativos que integram os Estabelecimentos e as condições de suas transferências.

As figuras abaixo trazem os organogramas antes e após a Operação:

 

Figura 1 – Controle do Negócio-Alvo antes da Operação

 

 

Fonte: Requerentes (SEI 0731052)

 

Figura 2 – Controle do Negócio-Alvo após a Operação

Fonte: Requerentes (SEI 0731052)

 

A cláusula 5.2.3(i) e o Anexo 5.2.3(i) do Contrato indicam que estão sendo transferidos, entre outros ativos: [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES].

Além dos ativos transferidos de forma definitiva pela Bunge à Seara, foram celebrados dois Contratos de Licença e Uso de Marca (SEI 0730146) para licenciamento de marcas entre as Requerentes, além de um Contrato de Manufatura por Encomenda (SEI 0730148) e Contrato de Fornecimento (SEI 0730147).

Em relação aos Contratos de Licença e Uso de Marca, por um lado, a Bunge licenciará à Seara as marcas: [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES].

[ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES].   

A tabela abaixo sintetiza os licenciamentos a serem celebrados entre as Requerentes:

 

 

Tabela 1 –  [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES].   

Fonte: Requerentes. Elaboração SG (SEI 0785977)

 

De acordo com as Requerentes, todas as marcas acima são, hoje, detidas pela Bunge. A Operação significará a saída da Bunge do mercado de margarinas e maioneses, mas não afetará sua atuação nos mercados de óleos refinados e gorduras, nesse cenário, foi necessário adotar o critério [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES].   

[ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES].   

Tendo em vista que a Bunge alienará sua capacidade produtiva à Seara, porém prosseguirá comercializando óleos refinados de soja, as Requerentes acordaram em celebrar um Contrato de Manufatura por Encomenda (“Contrato de Manufatura”) [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES]

[ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES]

[ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES]

Conforme destacado, a Operação implica uma desverticalização, haja vista que a Bunge continuará no segmento de originação de grãos e comercialização de óleos vegetais refinados e gordura vegetal, mas alienará sua capacidade produtiva de margarinas, maioneses e óleos refinados. Como a Bunge permanecerá atuando no mercado de óleos refinados e gorduras vegetais, os contratos de fornecimento, fabricação e licenciamento foram firmados para permitir que a Bunge continue atuando nesses segmentos até que consiga reorganizar sua produção de outra forma.

A figura abaixo ilustra essa desverticalização:

 

 

Figura 3 – Sobreposições horizontais e relações verticais envolvendo margarinas e maioneses.

 

O quadro abaixo ilustra as sobreposições horizontais e as relações verticais relacionados à Operação.

 

Figura 4 – Sobreposições horizontais e relações verticais envolvendo margarinas e maioneses.

       Fonte: Requerentes. Elaboração SG (SEI 0785944)

 

A Operação não resulta em sobreposição horizontal no mercado de maioneses, mas tão somente no mercado de margarinas. Além disso, sendo o óleo de soja degomado um insumo importante para a fabricação de margarinas e maioneses, a Operação, por meio do Contrato de Fornecimento, gera uma relação vertical em que a Bunge fornecerá esse insumo para a Seara, que o utilizará para produzir margarinas e maioneses em sua recém adquirida capacidade produtiva própria. 

Em síntese, a Operação resultará em ampliação da capacidade produtiva da Seara no negócio de margarinas, bem como, permitirá a sua entrada no mercado de maioneses, consistindo em simples substituição de agente econômico nesse último caso. A integração vertical entre fornecimento de óleo de soja degomado e produção de margarinas e maioneses decorre do Contrato de Fornecimento em que a Bunge fornecerá esse insumo para a Seara produzir margarinas e maioneses em sua recém adquirida capacidade produtiva própria.

Adicionalmente, a Bunge também fornecerá à Seara farelo de soja e milho em grãos.[2] O fornecimento se dará para que a Seara utilize [3] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES], conforme ilustrado na figura abaixo:

 

 

Figura 5 – [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES]

Fonte: Requerentes. Elaboração SG (SEI 0785977)

 

Como justificativa econômica para a Operação, as Requerentes afirmaram (SEI 0731052):

 

“A Operação Proposta conferirá à Seara capacidade produtiva própria e aumentará a sua eficiência no negócio de margarinas, além de permitir a sua entrada no mercado de maioneses no Brasil. Em decorrência das sinergias e da expansão do portfólio de produtos, a Seara otimizará sua plataforma de distribuição e incrementará sua atuação nos mercados envolvidos, com vistas a atender às crescentes necessidades do consumidor brasileiro.

Para a Bunge, a Operação Proposta se enquadra na decisão global do grupo de otimizar e racionalizar o portfólio dos produtos da empresa, para manter o foco nos seus negócios principais”

 

Acerca dos aspectos formais, observo que: (i) a Operação configura Ato de Concentração, nos termos do inciso II do art. 90 da Lei nº 12.529/2011; (ii) as Requerentes atendem aos valores de faturamento previstos pela Lei nº 12.529/2011, atualizados pela Portaria Interministerial MJ/MF nº 994/2012; e (iii) a Operação produzirá efeitos no Brasil, pois envolve empresas brasileiras com atuação no mercado nacional. Atendidos esses requisitos, conheço do presente Ato de Concentração e verifico que as Requerentes realizaram o devido recolhimento da taxa processual (SEI 0730137).

 

I.1.Terceiro Interessado

Em  02 de abril de 2020, a BRF S.A. (“BRF”) protocolou pedido de intervenção como terceira interessada (SEI 0740243), nos termos do art. 50 da Lei nº 12.529/2011 e do art. 117 do Regimento Interno do CADE. Em seu pedido, a BRF sustentou ter legitimidade na medida em que seria afetada pela operação na condição de: (i) cliente do insumo óleo de soja degomado produzido pela Bunge, tendo seu fornecimento diretamente afetado pela operação e impactando potencialmente [4] [ACESSO RESTRITO AO CADE] e (ii) concorrente no mercado nacional de margarinas.

No mérito de suas razões, a BRF apontou três principais preocupações concorrenciais: (i) significativa sobreposição horizontal no mercado nacional de margarinas; (ii) relações verticais entre a Requerentes (óleo degomado, farelo de soja e farelo de milho) e (iii) incremento do portfólio da Seara após a consumação da Operação.

Por meio do Despacho SG nº 7/2020 (SEI 0743326), de 13 de abril de 2020, que acolheu a Nota Técnica 4/2020/CGAA1/SGA1/SG/CADE (SEI 0743633), a BRF foi admitida como terceira interessada no processo.

Em 17 de abril 2020, a BRF protocolou manifestação complementar (SEI 0745474) ao seu pedido de admissão como terceira interessada, oportunidade em que apresentou dados e informações para subsidiar a análise da Operação pela SG.

Em 15 de julho de 2020, a BRF protocolou mais uma manifestação (SEI 0780202) e, por fim, em 24 de julho de 2020 apresentou sua manifestação final, contendo uma Nota Técnica Econômica elaborada pela LCA Consultores (SEI 0783508).

 

II.MÉRITO

II.1.Instrução realizada pela SG

Após análise preliminar, a SG deu início à instrução em 19/06/2020, com objetivo de obter informações para subsidiar a análise concorrencial. Assim, a SG expediu diversos ofícios a concorrentes e clientes que atuam em mercados que poderiam ser afetados pela Operação. Segue abaixo lista dos ofícios enviados:

 

Tabela 2. Instrução SG – Lista de oficiados

Ofício

SEI

Acesso (ofício)

Empresa oficiada

SEI Resposta

2215

.0734731

Público

Atacadão

.0739809

2216

.0734751

Público

Assai

.0740184

2217

.0734753

Público

Grupo BIG

.0748059

2218

.0734755

Público

Grupo Pereira

n/a

2219

.0734757

Público

Dia

n/a

2220

.0734760

Público

WMS Supermercados do Brasil Ltda.

n/a

2221

.0734764

Público

Sendas Distribuidora S.A.

.0740184

2222

.0734786

Público

Armazém Matheus S.A.

n/a

2223

.0734788

Público

Colina Distribuidora de Produtos Alimentícios EIRELI

n/a

2225

.0734791

Público

Makro Atacadista S.A.

n/a

2322

.0736552

Público

Brasil Foods

.0748043

2323

.0736555

Público

Unilever

n/a

2324

.0736558

Público

M. Dias Branco

.0752723

3061

.0748330

Público

Unilever

.0755966

3110

.0749221

Público

Makro Atacadista S.A.

.0755523

3123

.0749849

Público

Dia

n/a

3563

.0757197

Público

Sigma/Upfield

.0764666

2321

.0736522

Público

Cia Leco/Vigor

.0747579

2508

.0740082

Público

Icofort Agroindustrial Ltda.

.0743699

Fonte: elaboração própria com base em informações disponíveis nos autos.

 

II.2.Definição dos mercados relevantes

 

II.2.1.Considerações iniciais sobre os mercados relevantes

Como verificado pela SG, a Operação envolve o segmento de margarina, maionese e óleo degomado de soja. No que diz respeito ao mercado de margarina e maionese como um todo, as Requerentes apresentaram a seguinte figura, que foi também reproduzida pela SG e traz o portifólio detido pelas Requerentes:

 

Figura 6. Portfólio de margarinas e maioneses das Requerentes

Fonte: Requerentes (SEI  0731052).

 

Ambas as Requerentes comercializam marcas de margarina no Brasil. A Seara comercializa as marcas Doriana e Delicata, enquanto a Bunge produz e comercializa as marcas Cremosy-Soya, Cukin, Delícia, Primor, Suprema, Predileta, Ricca, Gradina, Soya e Salada.

Considerando que a Seara não comercializa maioneses atualmente, a aquisição do portfólio da Bunge não resulta em sobreposição horizontal em um eventual mercado relevante de maioneses. Dessa forma, no que tange especificamente às marcas de maionese a serem adquiridas pela Seara, a Operação constitui simples substituição de agente econômico.

Quanto às margarinas, cabe definir o mercado relevante em que ocorre sobreposição horizontal de produtos das Requerentes. Embora a jurisprudência[5] do Cade aponte para uma definição mais conservadora, com as margarinas formando um mercado relevante próprio, as Requerentes defendem que (SEI 0731052):

 

“a relativa flexibilidade das linhas produtivas quanto à fabricação de óleos vegetais em geral e margarinas, o que implica que fabricantes de óleos podem passar a produzir margarinas rapidamente e com custos relativamente baixos, e vice-versa, de forma que, dessa perspectiva da oferta, poder-se-ia até cogitar de um mercado relevante único para óleos e margarinas. Ainda, conforme será detalhado abaixo, importante notar que há substituição entre os diferentes spreads sob a ótica da demanda - notadamente entre margarinas/cremes vegetais e spreads lácteos, tais como manteiga, requeijão e cream cheese.”

 

Nesse aspecto, as Requerentes apontam uma possível ampliação do mercado de relevante de modo a contemplar produtos que seriam spreads substitutos da margarina como manteiga, cream cheese e requeijão. Haveria assim um mercado relevante de spreads do qual a margarina seria mais um integrante e não um mercado relevante composto somente pelas diferentes marcas de margarinas.

As Requerentes chamam a atenção também para o uso culinário da margarina. Na função de ingrediente para a elaboração de pratos, a margarina enfrentaria a concorrência de produtos substitutos como óleos vegetais, azeite e manteiga[6].

Os argumentos das Requerentes em favor de um mercado relevante mais amplo serão analisados à luz dos elementos trazidos aos autos pelas próprias Requerentes e pelos demais agentes oficiados ao longo da instrução. A pertinência de se alargar ou não as fronteiras do mercado relevante em que o produto margarina está inserido também serão analisados conforme jurisprudência desses mercados no Cade.

Com relação ao mercado de óleo degomado de soja, a SG concluiu em seu Parecer (SEI 0785977) que “a Operação não resulta em integrações verticais; ao contrário, a Operação produz uma desintegração vertical, visto que a Bunge deixará de atuar na manufatura de margarinas, maioneses e [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES].”

A fim de examinar todos os possíveis efeitos concorrências da Operação, a SG analisou essa relação contratual verticalizada no mercado de óleo degomado de soja.[7] É por essa razão que tal relação contratual é aqui chamada de “relação vertical”, pois substituirá a integração vertical hoje existente na Bunge.

Para fins de análise da presente Operação, antecipa-se entendimento comum à SG quanto à definição dos mercados relevantes em suas dimensões produto e geográfica, nos fundamentos explicitados no Parecer SG nº 10/2020 (SEI 0785944)[8].

Em seguida, destaca-se algumas considerações acerca de cada mercado.

 

II.2.2.Margarinas

Dimensão Produto

Margarina é o termo genérico para identificar gorduras alimentares de origem vegetal usadas em substituição à manteiga.[9]

Conforme informado pelas Requerentes no Formulário de Notificação (SEI 0731052), o processo produtivo da margarina está sintetizado nas seguintes etapas[10]:

 

Figura 7 – Etapas do processo produtivo da margarina

Fonte: Requerentes. (SEI 0731052)

 

Com relação ao argumento apresentado pelas Requerentes em que haveria um mercado relevante de spreads (e.g. manteiga, requeijão, cream cheese) do qual a margarina seria mais um integrante e não um mercado relevante composto somente pelas diferentes marcas de margarinas[11], a SG concluiu que uma parcela dos consumidores de fato consome outros spreads, porém não necessariamente abandonam definitivamente a margarina.

Ademais, e mais importante, essa substituição da margarina por outros spreads é mais factível de ser realizada pelos consumidores de maior renda. Consumidores de renda mais baixa certamente enfrentariam dificuldades para realizar essa substituição mesmo diante de uma elevação no preço da margarina, dado a significativa diferença de preço para os demais spreads.

As Requerentes afirmam que, embora os outros spreads sejam proporcionalmente mais caros, o consumidor, no momento da compra, seria influenciado não necessariamente pelo preço por quilo, mas pelo preço de desembolso por unidade de compra. Dessa forma, no caso de um eventual aumento de preços da margarina, o consumidor estaria disposto a adquirir um volume menor de outro spread, mesmo que esse fosse proporcionalmente mais caro que a margarina.

 

“À luz do cenário do mercado de spreads aludido acima identifica-se a necessidade de alargamento do mercado relevante ora sob análise, uma vez que o entendimento restritivo (mercado único de margarinas), adotado em casos anteriores, implicaria um exame artificial e deficitário ao não considerar os efeitos de disciplina de preços (pricing constraints) existentes sobre as estratégias comerciais das Partes (fabricantes de margarina) quanto a posicionamento e precificação de produto.” (SEI 0731052)

 

Por seu turno, a terceira interessada BRF manifestou uma posição contrária ao mercado relevante proposto pelas Requerentes. Embora tenha reconhecido a existência de uma interseção nas ocasiões de consumo, a BRF destacou o fato de os spreads manteiga, requeijão e cream cheese possuírem um preço médio muito superior ao da margarina. A terceira interessada apontou a maionese como o spread com maior proximidade da margarina em termos de preço, além de utilizar um insumo em comum – o óleo de soja. Porém, salientou que em diversas ocasiões de uso culinário não há possibilidade de substituição da margarina nem por maionese, nem por outros spreads.

A BRF apresentou uma pesquisa da Kantar[12] (SEI 0745476) segundo a qual a margarina possui uma penetração nos domicílios de 96,1%, superior à do requeijão (64,4%), da manteiga (38,9%) e do cream cheese (4,1%). Ou seja, a margarina está presente em quase todos os lares brasileiros, o mesmo não se verificando em relações aos demais spreads. Além disso, o estudo da Kantar apresentado pela BRF indica que, com exceção da maionese, os preços médios por quilo dos demais spreads são significativamente superiores aos da margarina. O requeijão possui um preço médio 144% superior, a manteiga 275% e o cream cheese 266% ao da margarina.

 

Tabela 3 – Dados sobre o consumo, preço e substituição da margarina

Fonte: Kantar World Panel – Report Spreads. (SEI 0748043)

 

Nesse cenário, a SG conduziu um teste de mercado que buscou obter de concorrentes e clientes (varejistas e atacadistas) informações quanto à substitutibilidade da margarina por outros spreads.

A concorrente Upfield Brasil Holding Ltda (“Upfield”), detentora das margarinas de marca Becel, apresentou uma visão do mercado relevante similar à das Requerentes (SEI [ACESSO RESTRITO AO CADE]): 

 

[ACESSO RESTRITO AO CADE] [13]

 

A concorrente Vigor Alimentos S.A. (“Vigor”) (SEI 0747579) atribui à manteiga o papel de principal substituto da margarina, apontando o sabor e a origem animal do produto (que a tornaria mais natural) como as vantagens e o custo mais elevado da manteiga em relação à margarina como a desvantagem dessa substituição para o consumidor. Segundo a Vigor, a categoria manteiga tem se tornado mais acessível aos consumidores em virtude da redução nos preços de produtos dessa categoria. A Vigor acredita que o maior obstáculo à substituição da margarina pela manteiga está no preço dessa última e que um aumento no preço da margarina poderia resultar na sua substituição pela manteiga.[14]

Diferentemente, a concorrente Icofort Agroindustrial Ltda (“Icofort”) (SEI 0743699) apontou o requeijão (tanto aquele à base de leite como o à base de gordura vegetal) como o mais próximo substituto da margarina. A vantagem do requeijão (de ambos os tipos) em relação à margarina estaria na maior cremosidade daquele. Por outro lado, o requeijão à base de leite teria a desvantagem de ser mais caro que a margarina e o requeijão à base de gordura vegetal teriam a desvantagem de não possuir uso na culinária diária.

O Grupo Carrefour Brasil (“Carrefour”) (SEI 0739807) afirma ter observado, nos últimos anos, uma forte migração do consumo de margarina para o de manteiga, em virtude da busca dos consumidores por produtos mais saudáveis.[15] O Carrefour apontou outros possíveis substitutos para a margarina, como, o requeijão, o cream cheese e creme de ricota.

 Não obstante tais indicações quanto ao crescimento no consumo da manteiga em detrimento da margarina, o Carrefour afirmou que, diante de um aumento no preço da margarina, não haveria uma migração desse produto para outros spreads, mas sim para outras marcas de margarina. Segundo o Carrefour, mudança da categoria de spread não se dá em virtude do aumento de preços, mas em razão de outros fatores, como a saudabilidade.

A Sendas Distribuidora S.A. (“Sendas”), detentora da rede atacadista de bandeira “Assaí” e controlada pela Companhia Brasileira de Distribuição (detentora das bandeiras Extra e Pão de Açúcar) (SEI 0740183), elencou como substitutos próximos da margarina os cremes vegetais, a manteiga e o requeijão. A Sendas, ao comparar esses spreads com a margarina, apresentou como vantagens: a saudabilidade para os cremes vegetais; o sabor para a manteiga; e a embalagem e o valor nutricional para o requeijão. Como desvantagens desses spreads em relação à margarina, a Sendas apontou: o sabor, no caso dos cremes vegetais; a falta de cremosidade, no caso da manteiga; e a (não) substituição em receitas, no caso do requeijão. Para esses três spreads, a Sendas chamou a atenção para seu custo mais elevado em relação à margarina.

Embora tenha apontado alguns possíveis spreads substitutos para a margarina, a Sendas afirmou que (SEI 0740183):

 

“essas substituições não ocorrem com frequência, apenas em momentos de eventual escassez (ruptura) ou de forma muito gradativa com a melhora da situação macro econômica do País, caso em que o consumidor tenderia a buscar produtos mais "premium" e com maior apelo de saudabilidade em detrimento de preço. O contrário também é verdadeiro: se a situação macroeconômica se deteriora é esperado maior apelo aos produtos de baixo custo.”

 

A Sendas (SEI 0740184) também aponta [ACESSO RESTRITO AO CADE].  

O Makro Atacadista S.A. (“Makro”) (SEI 0755523) também apontou como possíveis substitutos da margarina no uso culinários os óleos vegetais (derivados de canola, algodão ou milho), no uso “recheio de pão”, apontou como possíveis substitutos o requeijão, manteigas, queijos e frios em geral. Entretanto, os óleos vegetais possuiriam a vantagem de serem mais baratos que a margarina, porém teriam menos sabor. Já os recheios elencados seriam mais saudáveis e saborosos, porém custariam mais que a margarina. 

Na visão do Makro a substituição da margarina por produtos substitutos tem ocorrido, seja em razão da saudabilidade e do sabor no caso dos “recheios”, seja por fatores econômicos, como utilização em receitas de produtos mais baratos (a exemplo dos óleos vegetais).[16]

A instrução realizada pela SG concluiu com base nas manifestações  das Requerentes, suas concorrentes e clientes, bem como os elementos trazidos aos autos por essas empresas, apontam, em sua maioria, para a existência de alguma substitutibilidade entre a margarina e produtos como manteiga, requeijão e cream cheese na função de spreads, bem como entre a margarina e óleos vegetais no que tange ao uso culinário.

Entretanto, observa-se que as manifestações e os estudos apresentados apontam que essa substituição, quando ocorre, se deve a fatores exógenos, não relacionados à política de precificação da margarina, como a saudabilidade e o sabor dos possíveis substitutos.

Desse modo, não há evidências de que uma elevação nos preços da margarina provoque um desvio significativo de demanda para produtos como manteiga, requeijão e cream cheese. De fato, os preços desses produtos são significativamente mais elevados que o preço médio da margarina, de modo que mesmo após uma hipotética elevação de 10% no preço margarina, os demais spreads (com exceção da maionese) continuariam a custar duas vezes mais, podendo alcançar três vezes mais, o valor da margarina.

As taxas de penetração da margarina, mencionadas nesse voto, estimadas pela Kantar e fornecidas pela BRF corroboram esse entendimento.[17] As taxas de penetração indicam que parte dos consumidores de fato consomem outros spreads, porém não necessariamente abandonam definitivamente a margarina.

De fato, a elevada taxa de penetração e a frequência de compras da margarina corroboram esse entendimento. A frequência de compras por ano dos demais spreads é cerca de metade da margarina, indicando que, ao menos para uma parcela dos consumidores, a compra desses outros spreads se dá de forma mais ocasional, enquanto a margarina é adquirida mensalmente pelos consumidores.

Ademais, a SG observa essa substituição da margarina por outros spreads é mais factível de ser realizada pelos consumidores de maior renda. Consumidores de renda mais baixa certamente enfrentariam dificuldades para realizar essa substituição mesmo diante de uma elevação no preço da margarina, dado o significativo diferencial preço dela para os demais spreads.

Com efeito, esse entendimento de base econômica [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES].

Conforme ilustrado na figura abaixo, a composição da cesta de spreads de um domicílio é crescente com a renda. [ACESSO RESTRITO AO CADE]. Observa-se que essa escada de consumo está diretamente associada aos preços desses spreads, com os mais baratos sendo incorporados à cesta antes dos mais caros.

 

Figura 8 – [ACESSO RESTRITO AO CADE]

 

 

Fonte: [ACESSO RESTRITO AO CADE]

 

Por fim, quanto à possível substituição da margarina por óleos vegetais, o mencionado estudo da Kantar indica que somente em [ACESSO RESTRITO AO CADE]. das ocasiões, a margarina é utilizada para o uso culinário, enquanto em [ACESSO RESTRITO AO CADE] das ocasiões ela é utilizada como spread, confirmando que o principal uso da margarina é como spread

Assim, ainda que os óleos vegetais sejam considerados substitutos próximos da margarina, essa possível substituição não interfere na exposição acima sobre as dificuldades, em particular para as famílias de menor renda, de substituir margarinas por outros spreads.

Por todo exposto, assim como analisado pela SG, conclui-se que não há elementos suficientemente robustos justificando uma modificação na jurisprudência do Cade no sentido de promover um alargamento do mercado relevante no qual o produto margarina está inserido, conforme proposto pelas Requerentes. A definição mais adequada de mercado relevante na dimensão produto é o de margarinas como mercado único.

 

Dimensão Geográfica

O Cade tem definido a dimensão geográfica do mercado de margarinas como nacional [18]. As Requerentes concordaram com essa definição e acrescentam que as principais marcas possuem alcance nacional e que os custos de transporte não são suficientes para justificar uma classificação distinta.

A terceira interessada, BRF, também manifestou concordância com a definição nacional do mercado relevante. Contudo, destacou que embora a produção e distribuição de margarinas apresentem contornos nacionais, as participações de mercado dos concorrentes variam de forma significativa conforme o escopo geográfico adotado, destacando ainda o fato de que algumas empresas exercem pressão competitiva somente em regiões específicas.

As demais concorrentes que manifestaram opinião sobre a definição geográfica também concordaram com a dimensão nacional para o mercado relevante de margarinas. Não obstante, algumas concorrentes, assim como a BRF, destacaram que algumas empresas são players relevantes somente em determinadas regiões, enquanto outras possuem atuação relevante em todo o território nacional, percepção essa que, em geral, é compartilhada pelas redes de varejo e atacado.

Pelos motivos expostos, conforme a jurisprudência e o entendimento da SG, define-se o mercado relevante de margarinas como nacional.

 

II.2.3.Óleo degomado de soja

Dimensão produto

O Cade já analisou os mercados de óleo de soja em várias oportunidades, tendo considerado, conforme as especificidades de cada caso, diferentes recortes sob a dimensão produto:

 

(i) mercado de comercialização de óleo de soja (sem segmentação);[19]

(ii) óleo de soja como parte de mercados mais amplos, como os de “óleos vegetais”, “insumos destinados à produção de biocombustíveis” ou “insumos destinados à alimentação animal”;[20]

(iii) mercados de óleo de soja bruto degomado e/ou de óleo de soja refinado, de acordo com o(s) tipo(s) óleo envolvido(s) na operação;[21]

(iv) mercados de óleo de soja bruto (degomado), óleo de soja refinado a granel e óleo de soja refinado engarrafado/enlatado, segmentando o mercado de óleo refinado com base na forma de comercialização (a granel ou envasado).[22]

 

Não obstante, verifica-se que o Conselho considerou o óleo de soja degomado como mercados relevantes único, separado do óleo de soja refinado na maioria dos casos analisados. Nesse sentido, pode-se afirmar que as definições propostas pelas Requerentes encontram respaldo na jurisprudência do Cade.

Quanto à presente Operação, é importante destacar que o Contrato de Fornecimento a ser celebrado entre a Bunge e a Seara não configura uma integração vertical e, portanto, não seria de notificação obrigatória nos termos da Resolução nº 17, de 18 de outubro de 2016, caso a Operação se resumisse ao Contrato de Fornecimento.

Não obstante, no intuito de endereçar as preocupações trazidas aos autos pela terceira interessada e verificar se a presente Operação, ainda que desse origem a uma integração vertical, não suscitaria riscos de natureza concorrencial, será empreendida a análise do mercado de óleo degomado de soja, considerando para tanto as informações fornecidas pelas Requerentes, pela terceira interessada, pelas empresas oficiadas, além outras informações apresentadas à SG ao longo da instrução.

O óleo de soja é o produto obtido por meio da prensagem mecânica e ou através da extração por solvente dos grãos de soja. Conforme o grau de elaboração e qualidade, o óleo de soja é classificado como:

 

(i) bruto ou cru: o óleo tal qual foi extraído do grão;

(ii) degomado ou purificado:  óleo do qual se retiram as substâncias indesejáveis denominadas fosfolipídeos;

(II) refinado: óleo que após a extração e degomagem é refinado mediante o emprego de processos tecnológicos adequados (neutralização, clarificação e desodorização).

 

As etapas para obtenção do óleo degomado de soja estão ilustradas na figura abaixo[23].

Figura 8 – Processamento para obtenção do óleo de soja bruto e do farelo desengordurado

 

 

Fonte: Embrapa Soja, ISSN 2176-2937; n.171.

 

Tendo em vista que a degomagem não elimina os fosfatídeos de cálcio e magnésio, essas substâncias serão removidas no processo de refino propriamente dito. Isso porque, para que seja próprio para o consumo humano, o óleo deve ser composto essencialmente por triglicerídeos. A purificação é necessária para eliminar os demais elementos que lhe imputam características indesejáveis, e que provocam sua rancificação e oxidação. Assim, para que possa ser consumido pelo ser humano, o óleo ainda passa pelos processos de: neutralização; lavagem; centrifugação; clarificação; filtração; e desodorização.[24]

Observo que o óleo degomado de soja a ser fornecido pela Bunge para Seara após a Operação, situa-se numa etapa intermediária da cadeia produtiva que se inicia com a armazenagem dos grãos de soja, passa pela extração do óleo bruto, degomagem para, ao fim do processo, resultar no óleo de soja refinado[25], esse sim passível de consumo humano.

Contudo, o óleo degomado de soja não se destina exclusivamente ao refino. Esse produto também é utilizado na produção de biodiesel e na fabricação de rações animais. Parte da produção nacional é exportada. Dessa forma, são diversas as aplicações e destinações do óleo degomado de soja produzido no país.

Se por um lado, a demanda por óleo degomado de soja possui fontes diversas, por outro lado, esse insumo possui substitutos em potencial. Segundo as Requerentes, outros óleos vegetais, como os óleos de milho, girassol, canola e palma, podem substituir o óleo de soja na produção de margarinas e maioneses.[26]

Por outro lado, a BRF aduz que a substituição do óleo de soja degomado por outros tipos de óleo não é trivial. Segundo a terceira interessada (SEI 0740243)[27]:

 

“[a] substituição do insumo, por sua vez, implicaria custos de adaptação da fórmula do produto, que demandariam tempo e investimentos. Para além dos impactos mais diretos em termos de custos, tais insumos alternativos também impactariam a qualidade do produto, alterando o paladar e textura da margarina.”

 

Acerca da possibilidade de substituição, a instrução realizada pela SG concluiu que não foram trazidos aos autos elementos suficientes para precisar o efetivo grau de substituição entre o óleo de soja e os demais óleos vegetais para a produção de margarina. A instrução identificou que essa substituição de fato pode ocorrer, porém os custos financeiros e os efeitos dessa substituição sobre atributos como paladar e textura da margarina (e logo sobre as preferências dos consumidores) não foram informados nem pelas Requerentes e nem pela terceira interessada.

Por todo exposto, conclui-se assim como definido pela SG, que o mercado relevante é o de óleo degomado de soja, não havendo elementos suficientes para definição de um mercado relevante mais amplo.

 

 

Dimensão geográfica

Inicialmente vale destacar que este Conselho analisou o mercado de óleo degomado de soja recentemente no âmbito do Ato de Concentração nº 08700.002605/2020-10 (Bunge/Imcopa), aprovado sem restrições pelo Cade em 11 de novembro de 2020. Na oportunidade, o Conselho acompanhou voto de minha relatoria, por meio do qual se acompanhou a definição de mercado relevante indicada pela SG. Na ocasião, a SG teceu as seguintes considerações (SEI 0796287):

 

“[...] registre-se novamente que a Abiove, principal entidade associativa das indústrias brasileiras do complexo soja, manifestou-se favoravelmente à definição dos mercados de farelo e óleo de soja como nacionais, em vista da grande quantidade de produtores espalhados pelo país.

Pelo exposto, verifica-se que a definição proposta pelas Requerentes para os mercados geográficos – qual seja, a dimensão nacional – vai ao encontro da jurisprudência do Cade e da percepção geral dos agentes de mercado. Além disso, as informações obtidas pela SG ao longo da instrução indicam que tais segmentos são caracterizados por um reduzido volume de importações e pela presença de fornecedores e compradores situados em diversas regiões do Brasil.”

 

Com efeito, precedentes deste Cade têm considerado a dimensão nacional para os mercados de produtos do complexo soja, tais como farelo de soja, óleo de soja degomado e óleo de soja refinado.[28]

Com relação à dimensão geográfica, a terceira interessada, BRF, demonstrou preocupação com os efeitos da Operação sobre a disponibilidade de óleo degomado de soja. Em sua manifestação do dia dezessete de abril de 2020 (SEI 0745474), a BRF afirmou que:

 

(i) a distribuição da capacidade de esmagamento de soja para produção de óleo no território nacional não é homogênea, havendo regiões com reduzida oferta deste insumo frente à demanda, como é o caso da Região Nordeste;

(ii) a busca de óleos de soja em regiões distantes implica custos adicionais significativos, com impactos profundos sobre a competitividade do produto final; e

(iii) o óleo de soja degomado não é substituível por outros insumos em condições comerciais normais.

 

Em suas manifestações a BRF procura enfatizar a relativa escassez do óleo degomado de soja na região Nordeste. A terceira interessada declarou que no caso de uma eventual interrupção no abastecimento dessa região, seria necessário deslocar óleo de soja de outras regiões (como Centro-Oeste e Sudeste), acarretando elevados custos de transporte (SEI 0740230).

Além disso, a BRF, cita como fonte a Associação Brasileira das Indústrias Vegetais (Abiove), destacando que somente 6,2% da capacidade de processamento de óleos vegetais do Brasil está instalada na região Nordeste.

No entanto, destaca-se entendimento apontado no Parecer da SG[29]:

 

“A definição de um mercado regional de óleo degomado de soja carece de precisão. Com efeito, a disposição espacial das esmagadoras de soja acompanha a fronteira agrícola desse cultivar, a qual guarda relação com os biomas e não necessariamente com as regiões do país”.

“Considerando que aproximadamente 80% da capacidade de processamento de oleaginosas do país está localizada nas regiões Centro-Oeste e Sul e que parcelas relevantes da produção atribuída às regiões Nordeste e Sudeste ocorrem, de fato, em áreas de cerrado, distantes, portanto, do litoral e do Norte do país, conclui-se que a produção nacional de óleo degomado de soja é, fundamentalmente, a produção levada a cabo no centro-sul do país e em áreas próximas, que, em conjunto, respondem por praticamente toda a oferta nacional produto, não cabendo definir mercados relevantes geográficos de acordo com as regiões do país.”

 

Conforme será mais aprofundado no tópico V.1, verifica-se que a produção e estrutura de oferta do mercado de óleo degomado de soja não é balizada por limites regionais, de modo que eventual restrição do mercado relevante geográfico em regiões poderia superestimar ou subestimar inadequadamente as participações de mercado dependendo da região analisada sem capturar a real dinâmica de oferta existente.

Da mesma forma, uma definição mais restritiva não considera que a produção nacional do óleo degomado de soja é localizada nas regiões Centro-Oeste e Sul, além de imediações,  onde se encontram aproximadamente 80% da capacidade de processamento de oleaginosas do país, sendo parcelas relevantes da produção atribuída às regiões Nordeste e Sudeste em biomas específicos e distantes do litoral.[30]

Também não há que se falar na escassez do grão de soja, o principal insumo empregado na produção de óleo de soja degomado, sendo o Brasil um dos maiores produtores de soja do mundo, conforme demonstram os números elevados de área plantada e produção[31]. Tampouco, há indícios de que o processo produtivo de óleo degomado de soja, embora tenha suas especificidades, requeira tecnologias inovadoras e/ou inacessíveis a possíveis entrantes ou que dificultem a expansão da produção pelos atuais processadores.

Considerando os precedentes deste Conselho para mercados da cadeia de soja, a ampla disponibilidade da soja no Brasil, o fato de a produção do óleo degomado de soja ser nacional, a existência de diversos fornecedores espalhados no território nacional, conclui-se, assim como definido pela SG, a definição geográfica do mercado de óleo de soja degomado como sendo nacional.

Destaca-se que uma retomada das razões para definição nacional deste mercado será realizada no tópico V.1 com o objetivo de abordar questões específicas indicadas no Despacho de Avocação.

 

II.2.4.Conclusões sobre a definição dos mercados relevantes

Por todo o exposto, concluo que, para realização da presente análise, devem ser considerados os seguintes mercados relevantes, em suas dimensões produto e geográfica:

 

(i) mercado nacional de margarina;

(ii) mercado nacional de óleo de soja degomado;

 

Baseado em tais definições, a Operação resulta em sobreposição horizontal no mercado relevante de margarinas na dimensão nacional. A Operação também resulta em uma relação vertical envolvendo o mercado nacional de óleo de soja degomado e o mercado nacional de margarinas.

Conforme esclarecido, a Operação resulta em integrações verticais envolvendo o fornecimento de farelo de soja e de milho em grãos, previsto no Contrato de Fornecimento. Não obstante, esses produtos serão empregados em segmentos fora do escopo da Operação (alimentação animal e óleos refinados especiais), além de não constituir insumos diretos para produção de margarinas – segmento em que se observa concentração significativa e que é objeto de análise mais detalhada neste Ato de Concentração. Por essa razão, somente a relação de fornecimento envolvendo o óleo degomado de soja para produção de margarinas será analisado de forma detida.

Acerca da instrução realizada pela SG, entendo que a SG considerou explicações fornecidas pelos agentes oficiados na instrução conduzida como parte da sua fundamentação, tendo sido feita uma análise detalhada e completa a qual acompanho e entendo pela desnecessidade de tecer considerações adicionais sobre qualquer um dos segmentos analisados no contexto desta Operação. Além de demonstrar que as definições de mercados relevantes propostas encontram-se alinhadas aos precedentes deste Conselho.

Ante todo o exposto, definidos os mercados relevantes, passo a analisar a existência de possibilidade de exercício de poder mercado em decorrência da Operação.

 

II.3.Possibilidade de exercício de poder de mercado

 

II.3.1.Considerações Iniciais

Inicialmente, vale apresentar um esclarecimento a respeito das margarinas de marca Becel. Até o final de 2018, havia uma parceria entre a Unilever e a BRF, formalizada por meio da sociedade UP! Alimentos Ltda., a qual era responsável pela produção e comercialização das margarinas Becel.

Contudo, com a venda, pela Unilever para o fundo KKR & Co. L.P. (controladora da sociedade Sigma Brasil Holding Ltda. - "Sigma"), dos negócios de baking, cooking and spreads[32] – que inclui as margarinas Becel, ficou acordado que a Unilever encerraria a parceria firmada com BRF S.A. e estabeleceria nova relação com a Bunge para a produção e distribuição das margarinas sob a marca Becel[33]. O fechamento dessa última operação se deu em 10 de novembro de 2018.[34] Nesse cenário, foi levado em consideração a possibilidade de incluir a marca Becel no portfólio da Bunge.

Entretanto, as Requerentes afirmam que a relação contratual entre a Sigma e a Bunge atribui a essa última somente os aspectos operacionais relativos à produção e distribuição das margarinas Becel, cabendo à Sigma a tomada das decisões comerciais, econômicas e estratégicas mais relevantes no âmbito desse negócio.

Em razão do alegado controle das decisões mercadológicas por parte da Sigma, as Requerentes entendem que as participações de mercado das margarinas Becel devem ser atribuídas à Sigma e não à Bunge. Da mesma forma, considerando que após a presente Operação, somente serão transferidas à Seara as atribuições hoje detidas pela Bunge, as participações de mercado das margarinas Becel não devem se somar ao da Seara para fins de análise antitruste.[35]

Ressalte-se que, em agosto de 2020, a BRF e a Upfield notificaram operação por meio do qual a Upfield licencia à BRF o uso exclusivo da marca Becel no Brasil para a produção e distribuição de margarinas, seguindo modelo similar alegado de atribuir a gestão estratégica do negócio à Upfiled, enquanto a BRF terá apenas atribuições operacionais envolvendo a produção e distribuição do produto[36]. A referida operação ainda se encontra em análise pela SG.

Com o desfazimento da relação entre Upfield e Bunge e a substituição da Bunge pela BRF na parceira relacionada à marca Becel, conclui-se que a participação da marca Becel não deve ser atribuída à participação das Requerentes.

Por outro lado, é possível considerar a inclusão conservadora do market share da Becel na participação de mercado da BRF. Como essa mesma inclusão conservadora não altera significativamente as conclusões para esta Operação e a referida relação entre BRF e Upfield ainda se encontra em análise pela SG, não se faz necessário tecer maiores comentários acerca desse cenário nesse momento.

Para avaliar o impacto da Operação no mercado de margarinas, serão utilizados os dados de participações de mercado oriundos dos relatórios de varejo elaborados pela Nielsen e fornecidos pelas Requerentes.

Para a análise do mercado de óleo degomado de soja serão considerados os dados de participações de mercado, em termos de volume e faturamento, da Abiove também fornecidos pelas Requerentes.

Além dos dados de participação de mercado, serão apresentadas as manifestações das concorrentes das Requerentes no mercado de margarina no que tange à disponibilidade do óleo degomado de soja enquanto insumo para produção de margarinas e maioneses.

 

II.3.1.1.Mercado nacional de margarinas

No mercado de margarinas, as participações de mercado combinadas das Requerentes tanto com o share da marca Becel sendo incorporado ao da Bunge ou não, são superiores a 20%. Além disso, o HHI em nível supera os 4.000 pontos.

Segundo as estimativas da Nielsen (SEI 0753163)[37], a estrutura de oferta é apresentada na tabela abaixo:

 

Tabela 4– Margarinas (nacional) – Participações de mercado em volume e faturamento - 2019 [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES]

 

Da tabela acima, depreende-se que a participação de mercado conjunta das Requerentes alcança [30%-40%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] e [20%-30%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] em volume e valor de vendas, respectivamente. Nesse cenário, o HHI passa de [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES], antes da Operação, para [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES], após a Operação, resultando num ∆HHI superior a 200 [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] pontos, pelos critérios volume/valor.

A BRF é a líder inconteste no mercado nacional de margarinas com [50%-60%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] de market share em termos de volume vendido. Além disso, as margarinas da BRF respondem por [50%-60%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] do faturamento com vendas de margarinas no varejo.

Dentre as margarinas ofertadas pela BRF, destaca-se a marca Qualy, que respondeu por [30%-40%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] do volume vendido e por [40%-50%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] do faturamento com vendas de margarinas no país em 2019.

A principal concorrente da BRF atualmente é a Bunge, que deteve em 2019 uma participação de mercado de [20%-30%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] em volume vendido e [10%-20%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] quando se considera o valor das vendas no varejo.

Dentre as margarinas da Bunge, destacam-se as marcas Delícia, com [10%-20%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] e [0%-10%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] de share em volume e valor, respectivamente; e Primor, com [10%-20%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] e [0%-10%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] de share em volume e valor, respectivamente.

A Seara ocupa a terceira colocação, com suas margarinas sendo responsáveis por [0%-10%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES]  do volume vendido e por [0%-10%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] do valor total de vendas de margarinas no varejo em 2019. A principal marca da Seara é a Doriana, com share de [0%-10%]  [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] e [0%-10%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] em volume e valor, respectivamente.

Em suas manifestações, as Requerentes argumentam que, embora resulte numa elevação do grau de concentração no mercado de margarinas, a Operação permitirá à Seara rivalizar de forma mais efetiva com a líder BRF. Ao adquirir capacidade produtiva própria, otimizar sua plataforma de distribuição e incrementar seu portfólio, as Requerentes alegam que a Seara estará em condições de ampliar sua ofertar de produtos e praticar preços mais competitivos.

Por outro lado, é preciso ponderar que a Operação resulta na união do portfólio de dois dos três principais concorrentes do mercado.[38]

Considerando que participação conjunta das Requerentes supera o patamar de 20% de participação de mercado e variação de HHI superior a 200 pontos, destaca-se prosseguimento com a análise no intuito de averiguar as condições de entrada e rivalidade no mercado de margarinas.

Em particular, a análise tem como objetiva avaliar em que medida a entrada de novos players e a pressão competitiva exercida pelos concorrentes já atuantes são suficientes para dissuadir eventuais estratégias de acomodação por parte dos líderes de mercado após a Operação.

Também, serão realizadas análise acerca de resultados dos estudos econômicos elaborados pelas Requerentes, bem como da Nota Técnica elaborada pelo Departamento de Estudos Econômicos (“DEE”), a pedido da SG.[39]

 

II.3.1.2.Mercado nacional de óleo degomado de soja

O mercado nacional de óleo degomado de soja possui uma estrutura de oferta bastante pulverizada.

 

Tabela 5 – Óleo Degomado de Soja (nacional) – Participações de mercado em volume e faturamento – 2017 a 2019 [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES]

Fonte: ABIOVE.

 

A maior produtora de óleo degomado de soja no país, a Bunge[40], responde por somente [20%-30%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] da produção nacional. Além da Bunge, somente a Cargil possui uma participação de mercado superior a [0%-10%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES]. Com efeito, os quatros maiores produtores de óleo degomado de soja (CR4) respondem por [40%-50%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] da produção nacional, enquanto os oito maiores produtores são responsáveis por [60%-70%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES]

A pulverização da oferta de óleo degomado de soja se reflete no HHI sempre inferior a 800 pontos no período 2017-2019. Segundo o Guia para Análise de Atos de Concentração Horizontal do Cade[41], mercados com HHI inferior a 1.500 pontos são considerados não concentrados. Ademais, como a participação de mercado da Bunge não se alterará uma vez que não há sobreposição horizontal, a Operação não tem condão de gerar efeitos negativos sobre a concorrência pelo lado da oferta.

A terceira interessada BRF, apesar de reconhecer a pulverização da oferta de óleo degomado de soja (com exceção da região Nordeste conforme exposto e contraposto quando da definição geográfica do mercado relevante), questiona a disponibilidade de insumo para a produção de margarinas comparando com outras destinações do produto. A BRF argumenta que a produção nacional de óleo degomado de soja possui destinações diversas como a produção de biodiesel, a exportação e o uso cativo por parte dos produtores que afeta a disponibilidade do insumo no mercado interno, indicando preocupações relacionadas à relação de fornecimento estabelecida entre Seara e Bunge nesse contexto.

Por se tratar de assunto especificamente apontado como razão de avocação do presente Ato de Concentração no Despacho Decisório 4/2020/GAB2 (SEI 0794102), uma análise mais detalhada da referida relação de fornecimento e preocupações concorrenciais relacionadas, será realizada no tópico V.1. De todo modo, antecipa-se entendimento de que a relação vertical a ser estabelecida entre a Bunge e a Seara no fornecimento de óleo degomado de soja não acarreta preocupações concorrenciais.

Pelos motivos expostos, o mercado nacional de óleo degomado de soja não demanda aprofundamento de análise concorrencial.

 

II.3.2.Conclusões acerca da possibilidade de exercício de poder de mercado

A análise realizada indica que a Operação é incapaz de promover alterações significativas nas estruturas de oferta dos mercados de maionese por se tratar de mera substituição de agente econômico e de óleo degomado de soja, considerando que a Operação não altera a disponibilidade do insumo no mercado nacional, não se vislumbrando risco de fechamento de mercado.

Já o mercado de margarinas demanda um aprofundamento da análise quanto à probabilidade de exercício de poder de mercado, haja vista que, nesse segmento, a Operação resultou em concentrações superiores a 20% com variações de HHI acima de 200 pontos. Somente nesse segmento, portanto, é que se procederá quanto à análise de probabilidade de exercício de poder de mercado.

 

 

II.4.Probabilidade de exercício de poder de mercado

 

II.4.1.Entrada

Analisando as condições de entrada no mercado de margarinas, a SG verificou que não há maiores impedimentos de natureza tecnológica, não há patentes e as licenças de funcionamento a serem obtidas com autoridades governamentais não parecem constituir óbices relevantes. Além disso, players atuantes no setor de refino de óleos vegetais teriam a vantagem de aproveitar parte de sua infraestrutura instalada e somente complementá-la com equipamentos especializados para poder produzir margarinas.

Por outro lado, a instrução identificou como provável barreira à entrada no mercado de margarinas a necessidade de investimentos em marketing e propaganda. As ações de marketing foram apontadas como um fator importante tanto para reforçar a fidelidade à marca, mas também para atrair novos consumidores. 

A análise da probabilidade de entrada demonstrou que o mercado margarinas não tem registrado entradas relevantes nos últimos anos, muito embora tenha havido a entrada da Icofort em 2018. Além disso, as informações fornecidas por algumas empresas oficiadas sugerem que a entrada está no limiar de não ser tempestiva nos termos do Guia H, isto é, o entrante conseguir entrar em completo e adequado funcionamento em menos de dois anos.[42]

Desse modo, embora se reconheça a possibilidade de entradas no mercado de margarinas, em particular para empresas já atuantes em indústrias correlatas, não se pode concluir, com bases nas informações disponíveis, que essa entrada é provável, suficiente e tempestiva.

Ante o exposto, conclui-se não haver possibilidade de entrada provável, tempestiva e suficiente capaz de contestar um eventual exercício de poder de mercado das Requerentes no mercado nacional de margarinas, sendo necessária a análise sobre as condições de rivalidade do mercado de margarinas.

 

II.4.2.Rivalidade

Acerca das condições de rivalidade no mercado de margarinas, a SG identificou elementos que apontam para a existência de competição efetiva entre a empresa resultante da Operação e as demais empresas instaladas e que essas condições permitem contestar eventual exercício de poder de mercado, mesmo diante de uma estrutura de mercado mais concentrada.

Para tanto, a instrução realizada pela SG apontou elementos do mercado de margarinas que favorecem a concorrência e diminuem os incentivos para atuação coordenada entre os agentes. A instrução indicou que o mercado de margarinas é caracterizado como mercado de produtos heterogêneos, em que fatores como fidelidade à marca e percepções distintas de qualidade, que variam conforme o uso pretendido e as preferências dos consumidores[43], são importantes na dinâmica competitiva.

Também foi verificado que há competição pelo preço envolvendo produtos diferenciados, conforme se verifica pela necessidade de investimentos em marketing e propaganda, existência de marcas de mesmo fabricante e a dispersão de preços entre as diferentes marcas[44], possibilitando a classificação em categorias de acordo com o posicionamento do produto no segmento.[45]

Analisando as participações de mercado (em volume e valor de vendas) no cenário nacional fornecidos pela Requerentes com base em dados da Nielsen entre 2015 e 2019, a SG destaca que é possível observar o posicionamento das diferentes marcas ao se compararem dados de vendas por valor e volume[46] e que se observa uma relativa estabilidade das participações de mercado no período, com exceção de declínio da participação da Becel e crescimento da Vigor.

Segundo a SG, essa estabilidade pode, em alguma medida, ser explicada pela fidelidade à marca dos consumidores. Em tese, contudo, a estabilidade apresenta sinais ambíguos, na medida em que pode sugerir tanto uma acomodação das incumbentes, como a existência de rivalidade efetiva, considerando que “o esforço para conquistar fatias adicionais de mercado pode não ser recompensador, dadas as margens prevalecentes para as firmas atuantes no mercado.”[47] Para obter maiores informações sobre as condições de rivalidade desse mercado, a SG recorreu a informações prestadas por concorrentes e clientes em instrução realizada.

A partir de instrução realizada, a SG destaca alguns elementos que indicam existência de rivalidade e poder de barganha por parte dos clientes que negociam nesse mercado. Nesse sentido, os contratos entre fabricantes e redes varejistas e atacadistas costumam ser de prazo relativamente curto (cerca de um ano), geralmente não envolvendo cláusulas de exclusividade e cláusulas de reserva ou controle de gôndolas que garantam maior visibilidade e exposição a determinado produto. É frequente ainda a adoção de políticas de desconto por quantidade vendida por parte dos fabricantes, fator que pode indicar a existência de rivalidade efetiva por parte das incumbentes.

A instrução também demonstrou que há concorrentes com atuação nacional, mas que apresentam maior relevância em âmbito regional. A SG analisou as participações de mercado em nível regional para o ano de 2019[48] e identificou uma realidade diferente do cenário nacional. Players que, em nível nacional, figuram com participação de mercado relativamente baixa, possuem participações importantes em determinadas regiões, sendo este o caso da M Dias Branco na região Nordeste e da Vigor nas regiões Sul e Sudeste, por exemplo.

Dessa forma, embora o mercado de margarinas conte com players de atuação nacional, existem importantes dinâmicas regionais. A exceção fica por conta da região Centro-Oeste, onde não há um quarto player com posição relevante a contestar as três principais concorrentes nacionais (BRF, Bunge e Seara).

Para aprofundar a análise sobre o grau de rivalidade no mercado de margarinas, a SG também solicitou ao DEE que elaborasse estudos econômicos a respeito. Esses resultados constam da Nota Técnica 30/2020/DEE/CADE (SEI 0785499). O DEE realizou então o teste de screening GUPPI, o qual, em síntese, não identificou incentivos para elevações dos preços praticados pela Seara e pela Bunge após a Operação.[49]

Ademais, os varejistas oficiados[50], em geral, entendem que a Operação pode resultar numa elevação da rivalidade no mercado de margarinas porque a Seara possui um sistema de distribuição de maior capilaridade e pode , após a Operação, distribuir o portfólio hoje detido pela Bunge de forma mais eficiente.

Pelo exposto, conclui-se que a Operação não traz preocupações concorrenciais associadas ao aumento da probabilidade de exercício unilateral de poder de mercado, uma vez que as condições de rivalidade no mercado nacional de margarinas se mostraram efetivas e capazes de contestar eventual exercício de poder de mercado.

De toda forma, uma análise mais detalhada da rivalidade será retomada no tópico V.3, apresentando considerações adicionais a respeito de questionamentos do Despacho Decisório nº 4/2020 (SEI 0794102), utilizado para fundamentar o pedido de avocação do Tribunal da presente Operação.

 

III.EFICIÊNCIAS ALEGADAS

As Requerentes indicaram que a Operação gera eficiências que podem ser segmentadas em quatro eixos principais[51]: i) fornecedores, ii) produção, iii) logística e iv) comercialização.

Quanto ao eixo de fornecedores, as Requerentes alegam que a Operação resulta em economias de escala e aumento do poder de barganha com a redução de custos decorrente do maior volume adquirido de insumos e embalagens. Acerca do eixo de produção, as Requerentes alegam que a Operação elimina a dupla margem retida pelas atuais fabricantes de margarinas que realizam a industrialização de seus produtos, passando a subsistir somente a margem da empresa integrada. Quanto ao eixo de logística, as economias de custos alegadas se justificariam pela redução de custos com intermediários e otimização e aproveitamento de rede de distribuição própria da Seara. Por fim, quanto ao eixo de comercialização, as Requerentes alegam economias de custos com racionalização das equipes de vendas.

A SG conclui que as eficiências alegadas apresentam racional econômico e são razoáveis do ponto de vista qualificativo, mas não são verificáveis a partir de testes para asseverar a precisão e robustez dos números informados. Dessa forma, a SG entende que as eficiências apresentadas pelas Requerentes são eficiências em potencial, sendo insuficientes no presente caso como fundamento para aprovação da presente Operação.

Com efeito, a análise realizada pela SG demonstra que os parâmetros definidos pelo Guia H não estão preenchidos, não sendo possível o argumento de eficiências como fundamento de aprovação da presente Operação.

Ressalta-se, contudo, que as condições de rivalidade verificadas nos mercados relevantes envolvidos afastam as preocupações concorrenciais decorrentes das concentrações analisadas, dispensando a análise de eficiências para aprovação da presente Operação.

 

IV.CLÁUSULA DE NÃO CONCORRÊNCIA

Nos termos da cláusula 7.1 do Contrato de Trespasse de Estabelecimento e Outras Avenças (SEI 0730142) prevê cláusula de não concorrência com a seguinte redação:

 

[ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES].

 

As provisões contratuais relacionadas ao acordo de não concorrência se encontram dentro dos parâmetros definidos em precedentes do Cade. As restrições concorrenciais são limitadas a período igual ou inferior a 5 (cinco) anos e limitadas ao objeto da Operação quanto ao escopo e limite geográfico.

 

V.ANÁLISE DOS PONTOS QUE ENSEJARAM A AVOCAÇÃO

O presente Ato de Concentração foi avocado pelo Tribunal do Cade por meio do Despacho Decisório nº 4/2020/GAB2 (SEI 0794102), homologado na 163ª SOJ (SEI 0799973).

No Despacho, o Conselheiro Luiz Braido ressaltou que a avocação não implicava juízo de mérito sobre a Operação, mas oportunidade para que o Tribunal pudesse examinar com maior profundidade alguns pontos acerca da possibilidade de aprovação da operação. Nesse sentido, indicou a necessidade de análise mais detida pelo Tribunal dos seguintes pontos:

1. Relação de fornecimento de óleo degomado de soja entre Bunge e BRF e se haveria a possibilidade de substituir facilmente a Bunge em caso de eventual restrição nas vendas do insumo à BRF;

2. Possibilidade da estrutura de mercado apresentada facilitar eventuais condutas anticompetitivas no mercado;

3. Analisar mais detidamente as justificadas apresentadas pela SG para aprovação da Operação.

Esses questionamentos serão analisados especificamente nos próximos pontos e, quando pertinentes, as preocupações suscitadas pela terceira interessada também serão abordadas.

 

 

V.1.Potencial escassez no fornecimento de óleo de soja degomado

O Despacho Decisório nº 4/2020/GAB2 (SEI 0794102) apontou a necessidade de análise adicional sobre a relação de fornecimento existente entre a Bunge e a BRF, assim como verificar se os demais produtores de óleo degomado de soja poderiam substituir facilmente a Bunge em caso de eventual restrição nas vendas do insumo à BRF.

O Conselheiro Braido indicou nas suas observações o fato de a Bunge ser a maior produtora nacional de óleo degomado de soja e a terceira interessada BRF alegar preocupação quanto ao fornecimento deste insumo.

Na condição de terceira interessada, a BRF afirma que a Operação poderá restringir indevidamente o seu acesso ao óleo degomado de soja para produção de margarinas em sua planta da região Nordeste, tendo em vista potencial desvio de oferta ocasionado pelo Contrato de Fornecimento celebrado entre Bunge e Seara.

A BRF (SEI 0780202) aponta que informações apresentadas pelas Requerentes (SEI 0731052) indicam potencial redução do nível de fornecimento do insumo pré-Operação no mercado interno, resultando no eventual aumento de preços do insumo na região Nordeste e aumento dos incentivos para prática de condutas discriminatórias sobre concorrentes no mercado de margarinas.

Acerca da relação de fornecimento, a BRF afirma que a Bunge é importante fornecedora de óleo vegetal para sua produção de margarinas, sobretudo na região Nordeste[52], [53] [ACESSO RESTRITO AO CADE].

Nesse sentido, fatores como oportunidades de vendas para exportação[54], utilização no consumo cativo e preferência de comercialização para segmentos mais rentáveis como o biodiesel, explicariam a dificuldade em se obter o insumo, mesmo sendo o Brasil grande produtor e esmagador de soja.[55]

Alega ainda que a produção e processamento do óleo degomado de soja no Nordeste são limitados quando comparados a outras regiões do Brasil[56], além de não ser viável substituir o óleo proveniente do grão de soja na fabricação de margarinas por insumos alternativos[57].

Por esses motivos, a BRF entende que a oferta de óleo degomado de soja na região Nordeste é restrita e escassa. A potencial redução da disponibilidade de óleo degomado de soja por importante fornecedor regional aumentará sua exposição ao desabastecimento e redução de competitividade da margarina produzida na região Nordeste, [58] [ACESSO RESTRITO AO CADE].

 Analisadas as alegações da terceira interessada, que subsidiam as preocupações expostas no Despacho de Avocação, é preciso destacar que o mercado relevante de óleo degomado de soja em sua dimensão geográfica é definido como nacional, assim como fundamentado no tópico II.3.

Embora a BRF argumente que a análise deva considerar um cenário regionalizado de oferta, com foco na região Nordeste, os precedentes que analisaram esse mercado no Cade[59], assim como a estrutura de oferta, indicam que a análise concorrencial deve considerar a disponibilidade do óleo degomado de soja no mercado nacional, conforme será melhor detalhado a seguir.

Com efeito, o óleo degomado de soja tem grande parte de sua produção concentrada nas regiões Centro-Sul e Sul do Brasil, além de áreas próximas, respondendo por praticamente toda a oferta nacional do produto[60]. Segundo a SG, há uma correlação entre a distribuição espacial das processadoras e a distribuição espacial da área plantada de soja no país, que não necessariamente coincide com os limites geográficos regionais, conforme indicado pelo mapa abaixo:

 

Figura 9 – Distribuição espacial da área plantada de soja, usinas de biodiesel e indústrias esmagadoras de soja no Brasil. [61]

 

De fato, a figura acima demonstra que a indústria processadora de soja acompanha as áreas de cultivo, valendo destacar que a localização das plantações está mais relacionada a biomas específicos como o cerrado do que com limites geográficos regionais. Dessa forma, não faria sentido uma segmentação de mercado relevante baseada na regionalização da oferta, conforme sustentado pela BRF.

[62][ACESSO RESTRITO AO CADE].

Destaca-se ainda levantamento elaborado pela Abiove, indicando que a capacidade de processamento da oleaginosa concentra-se nas regiões Centro-Oeste e Sul.

 

Tabela 6 – Capacidade de processamento de oleaginosas, por macro-região e estado (em ton/dia)[63]

 

Verifica-se, portanto, que a produção e a estrutura de oferta do mercado de óleo degomado de soja não são balizadas por limites regionais, de modo que eventual restrição do mercado relevante geográfico em regiões poderia superestimar ou subestimar inadequadamente as participações de mercado dependendo da região analisada sem capturar a real dinâmica de oferta existente.

Da mesma forma, uma definição mais restritiva não considera que a produção nacional do óleo degomado de soja é localizada nas regiões Centro-Oeste e Sul, além de imediações,  onde se encontram aproximadamente 80% da capacidade de processamento de oleaginosas do país, sendo parcelas relevantes da produção atribuídas às regiões Nordeste e Sudeste em biomas específicos e distantes do litoral.[64]

Reunidos esses elementos, conclui-se que uma análise da estrutura de oferta regionalizada não se mostra adequada e carece de fundamentos que permitam alterar a análise baseada na definição geográfica nacional.

Também não há que se falar na escassez do grão de soja, principal insumo empregado na produção de óleo de soja degomado, sendo o Brasil um dos maiores produtores de soja do mundo, conforme demonstram os números elevados de área plantada e produção[65].

Tampouco há indícios de que o processo produtivo de óleo degomado de soja  requeira tecnologias inovadoras e/ou inacessíveis a possíveis entrantes ou que dificultem a expansão da produção pelos atuais processadores, embora tenha suas especificidades.

É preciso considerar ainda a existência de capacidade ociosa razoável na indústria de óleo degomado de soja. Segundo dados da Abiove (SEI 0753161) trazidos aos autos pelas Requerentes, a capacidade ociosa no setor de processamento de soja em 2018 é de aproximadamente 30%.[66] Ou seja, a indicação de razoável capacidade ociosa demonstra que o mercado interno atualmente sequer exige utilização de toda a capacidade instalada disponível para suprir suas necessidades, havendo possibilidade de aumento da produção caso a demanda assim justifique.

Os concorrentes oficiados pela SG também confirmaram a disponibilidade de óleo degomado para a produção de margarinas. A Vigor (SEI 0747579) informou não encontrar dificuldades para adquirir óleo degomado, além de indicar quantidade razoável de fornecedores para esse insumo.

A M Dias Branco (SEI 0752722) afirmou que “há quantidade razoável de fornecedores no Brasil e não há dificuldade em adquirir o produto”. A Icoforte (SEI 0743699) também informou não enfrentar problemas para adquirir o óleo degomado. [ACESSO RESTRITO AO CADE]. 

Pelas manifestações dos concorrentes, verifica-se não ter sido comprovada a escassez do insumo ou a dificuldade de sua obtenção no mercado nacional.

A instrução realizada pela SG trouxe informações adequadas para avaliar a definição geográfica do mercado relevante em análise, sendo de se destacar que este Conselho analisou recentemente a estrutura do mercado de óleo degomado de soja nacional no Ato de Concentração nº 08700.002605/2020-10 (Bunge/Imcopa) e chegou a conclusões similares quanto à ampla disponibilidade do insumo no cenário nacional, não considerando uma segmentação regional como cenário alternativo.[67] [68]

Portanto, considerando a ampla disponibilidade da soja no Brasil, a existência de capacidade ociosa na indústria processadora de soja, o fato da produção do óleo degomado de soja ser nacional, a existência de diversos fornecedores, e que concorrentes de margarinas afirmaram não ter dificuldades para adquirir o insumo, verifica-se que há condições para que a BRF possa obter fornecimentos alternativos de óleo degomado de soja em caso de eventual redução de vendas do insumo pela Bunge.

Além disso, não foram identificadas restrições relevantes ao acesso do insumo que indiquem fechamento de mercado e inviabilizem a produção de margarinas da BRF no Nordeste. Diversos fatores relacionados a decisões comerciais dos produtores de óleo de soja degomado mencionados pela BRF, como condições favoráveis para exportação e vendas para mercados consumidores mais rentáveis, fazem parte da dinâmica de mercado.

Nesse contexto, assegurar condições comerciais mais favoráveis a um setor específico não consiste em fundamento adequado para intervenção desta autoridade. Com efeito, argumentos relacionados à redução de competitividade de um agente econômico representam preocupações de natureza privada.

Ainda assim, vale esclarecer que o Contrato de Fornecimento – principal ponto das preocupações suscitadas pela BRF – não tem o condão de alterar a disponibilidade do óleo degomado de soja no mercado nacional.

No que tange ao seu aspecto vertical, a Operação consiste numa desverticalização. Atualmente, a Bunge realiza todas as etapas das cadeias produtivas de margarina e óleos refinados internamente.

Com a alienação de seu negócio de margarinas e maioneses e de suas respectivas unidades produtivas para a Seara, a Bunge passa [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES]

[ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES].

É importante destacar que o óleo degomado de soja a ser eventualmente fornecido pela Bunge à Seara equivale razoavelmente ao quantitativo que seria utilizado pela própria Bunge caso a desverticalização ocasionada pela Operação não ocorresse.

Acerca desse ponto, as Requerentes se manifestaram no seguinte sentido:

 

“Este mesmo percentual de [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] hoje utilizado pela Bunge para fabricação de margarinas e maioneses, após a Operação Proposta, passará a ser comercializado para a Seara, em regime de direito de preferência, para sua produção de margarina e maionese3. Ou seja, não há quaisquer modificações na oferta de óleo degomado como resultado da Operação Proposta que justifiquem as alegadas "preocupações concorrenciais" suscitadas pela BRF.” (SEI 0743232, § 38)

 

Conforme afirmado pelas Requerentes, não há alteração significativa na disponibilidade do insumo no mercado interno em relação à estrutura de oferta verificada no cenário pré-Operação, como sugerido pela BRF em suas manifestações[69], considerando que praticamente a mesma quantidade de insumo atualmente empregada pela Bunge na sua produção cativa será destinada para a Seara.

Acerca da atual produção de margarinas, a Seara já detém as marcas de margarina Doriana, [70] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES], e Delicata [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES]. Com a internalização da produção de margarinas pela Seara, o óleo degomado necessário para produção da Doriana e da Delicata pode vir a ser fornecido pela Bunge.

Contudo, mesmo nesse caso, não haverá alteração da disponibilidade desse insumo no mercado nacional. Com efeito, haverá somente uma substituição de fornecedor. Os atuais fornecedores de óleo degomado de soja para fabricação das marcas Doriana e Delicata podem ser substituídos pela Bunge. Consequentemente, o óleo degomado de soja produzido por esses fornecedores pode ficar disponível para atender outros demandantes, inclusive aqueles atualmente atendidos pela Bunge.

Pelas razões expostas, considerando: (i) a presença de diversos fornecedores no mercado nacional de óleo degomado de soja; (ii) não comprovada a escassez do insumo no mercado nacional; (iii) a existência de capacidade ociosa das processadoras de soja no Brasil; (iv) concorrentes no segmento de margarinas afirmarem não terem dificuldades de obter o insumo; e (v) que o Contrato de Fornecimento não altera a disponibilidade de óleo de soja no mercado interno, conclui-se que a relação vertical a ser estabelecida entre a Bunge e a Seara para fornecimento de óleo degomado de soja não acarreta preocupações concorrenciais.

Entendo que esses pontos são suficientes para responder às preocupações constantes no Despacho Decisório nº 4/2020/GAB2 (SEI 0794102) acerca da eventual possibilidade de fechamento de mercado decorrente da Operação.

 

V.2.Análise de probabilidade de exercício de poder coordenado

O Despacho Decisório nº 4/2020/GAB2 (SEI 0794102) também indicou necessidade de avaliar se a Operação facilita a adoção de práticas anticompetitivas, especialmente diante da elevada concentração gerada no mercado nacional de margarinas em que os dois principais produtores poderão deter participação de mercado superior a 80% das vendas no Brasil.

Com efeito, a Operação resulta em índices de concentração elevados, conforme se verifica pela elevação do CR2 de 75,1% para 85,1% em volume de vendas e de 75,3% para 84,6% em valor de vendas, do CR3 de 91,1% em volume de vendas e 91,7% em valor de vendas. Já o CR4 alcança, em volume e valor de vendas, 96,1% e 95,5%, respectivamente.

O Guia H recomenda o aprofundamento da análise sobre o exercício abusivo de poder coordenado em situações nas quais o CR4 ultrapasse 75%[71]. Conforme demonstrado pelas razões de concentração, a Operação apresenta níveis que indicam necessidade de aprofundamento da análise de probabilidade de exercício de poder coordenado.

Importante destacar que a SG também identificou a necessidade de aprofundar a referida análise. Por meio do Despacho SG nº 656/2020 (SEI 0769273), a SG declarou o presente Ato de Concentração complexo e solicitou esclarecimentos adicionais às Requerentes, bem como estudo econômico ao DEE para “aferir a existência de incentivos econômicos para a adoção de estratégias de coordenação tácita ou acomodação que pudessem resultar no arrefecimento da concorrência no mercado nacional de margarinas.

Os principais resultados obtidos pelo DEE foram consolidados na Nota Técnica nº 30/2020/DEE (SEI 0785499) e, assim como orientado pelo Guia H, prestam-se a analisar se as características do mercado de margarina favorecem condições de coordenação e se a Operação facilita a prática de condutas anticompetitivas.

Em síntese, o estudo do DEE demonstra que a Operação não aumenta a probabilidade de exercício de poder coordenado no mercado nacional de margarinas. Embora o mercado de margarinas apresente algumas características de mercados que, em teoria, são propensos as condutas colusivas, uma análise mais aprofundada afasta as preocupações suscitadas ao se verificar a presença de elementos aptos a reduzirem a probabilidade da prática de condutas coordenadas.

A análise realizada demonstra que o mercado de margarinas é caracterizado por concentração de grande parcela da oferta em poucas empresas, relativa estabilidade de participações de mercado das atuais ofertantes, presença de barreiras à entrada que dificultam a contestação de posições por novos entrantes e não identificação de empresa caracterizada por ações disruptivas e disciplinadora de preços (maverick[72]) que dificultariam a coordenação entre os players.[73]

Por outro lado, é preciso destacar que a análise do DEE identificou as seguintes características do mercado de margarinas:

 

(i) Níveis de concentração elevados pré-Operação: As razões de concentração CR3 e CR4 nos últimos cinco anos (2015 a 2019) sempre estiveram acima do patamar de 75%, sendo o CR3 de 80% e o CR4 de 90%, de forma que a Operação reforça a concentração, mas que o cenário pré-Operação já apresentava níveis elevados;

(ii) Não há redução de simetria produtiva: A Operação não reduz a assimetria de capacidade produtiva existente, considerando que a Seara, que atualmente não detém capacidade produtiva própria, passa a gerir a capacidade empregada pela Bunge. Trata-se, portanto, de substituição de agente econômico em que a Seara adquire capacidade própria e libera capacidade produtiva que ocupa na fábrica de terceiros[74];

(iii) Heterogeneidade dos produtos: O mercado de margarina apresenta características de mercado de produtos diferenciados, que dificultam implementação de práticas coordenadas, como fidelidade à marca, necessidade de investimentos em marketing para reter e captar novos clientes. Além disso, a competição pelo preço se dá no contexto de produtos diferenciados, conforme se verifica pela dispersão de preços entre as diferentes marcas, sendo possível aventar a existência de categorias como premium, intermediária e de combate;

(iv) Ausência de transparência e compras frequentes nas negociações entre fabricantes de margarinas e varejistas/atacadistas: Apenas em relação aos preços ao consumidor final nos pontos de venda é que os preços são transparentes e as compras e interações frequentes. O mesmo não ocorre nas relações anteriores da cadeia em negociações e contratos de fornecimento entre fabricantes e redes atacadistas e varejistas – etapa da cadeia diretamente afetada pela Operação – que costumam durar um ano e não são observáveis como os preços aos consumidores finais.

(v) Poder de barganha dos clientes: O mercado consumidor de margarina conta com a presença de grandes redes varejistas com elevado poder de barganha que podem contestar eventual tentativa de estratégias coordenadas como aumento de preços conjunto;

(vi) Ausência de histórico de coordenação: Não se verifica histórico de coordenação no mercado relevante de margarinas;

 

Observa-se que o mercado de margarinas apresenta diversas características que tornam a prática de condutas coordenadas menos prováveis ainda que, de fato, haja um reforço importante de concentração, sobretudo em torno de dois grupos empresariais.

Existem, contudo, elementos do próprio mercado, como o poder de barganha de clientes, a dinâmica competitiva baseada em produtos heterogêneos e modelos de negociações na cadeia produtiva que afastam preocupações quanto ao eventual exercício de poder coordenado pelos players restantes. A própria ausência de histórico de coordenação nesse mercado, que anteriormente já se caracterizava como concentrado, parece corroborar esse entendimento.

Dessa forma, importante destacar que a análise realizada pela SG no mercado de margarinas seguiu as orientações do Guia H ao se verificar que a Operação resulta em níveis de concentração que requerem análise mais aprofundada quanto ao aumento de incentivos para prática de condutas colusivas.  Tendo em vista esses resultados, a SG prosseguiu na análise de probabilidade de exercício de poder coordenado, procedendo inclusive na solicitação de parecer econômico do DEE, evidenciando a profundidade de análise realizada e a devida cautela diante de uma concentração relevante no mercado analisado.

Nesse sentido, é relevante destacar que: (i) a análise empreendida pela SG foi bem detalhada e fundamentada com base em estudo econômico elaborado pelo DEE; e (ii) o estudo econômico do DEE utilizado pela SG indicou a presença de diversos elementos de mercado que, em conjunto, foram aptos a afastar preocupações concorrenciais quanto à probabilidade de exercício de poder coordenado após a Operação.

Entendo que esses pontos são suficientes para responder às preocupações constantes no Despacho Decisório nº 4/2020/GAB2 (SEI 0794102) e concluir que a Operação não acarreta preocupações concorrenciais associadas ao aumento da probabilidade de exercício de poder de mercado coordenado.

 

V.3.Condições de rivalidade no mercado de margarinas

O Despacho Decisório nº 4/2020/GAB2 (SEI 0794102) também indicou necessidade de avaliar mais detidamente as justificativas apresentadas pela SG para aprovação da Operação, tendo em vista que a Operação levará dois grupos econômicos a dominar uma elevada fração de mercado.

Especificamente quanto ao mercado de margarinas que gera a concentração mencionada pelo Conselheiro Braido, as duas principais preocupações concorrenciais analisadas se referem ao aumento da probabilidade de exercício de poder de mercado unilateral e coordenado. A SG fundamenta a aprovação da Operação na existência de elevada rivalidade e, conforme já detalhado no tópico V.2, à baixa probabilidade de exercício de poder coordenado.

Analisando a estrutura de oferta do mercado nacional de margarinas, a Operação, de fato, gera uma concentração elevada em torno de dois grupos econômicos, conforme detalhado na tabela abaixo:

 

Tabela 7 – Margarinas (nacional) – Participações de mercado em volume e faturamento - 2019 [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES]

Fonte: Nielsen (dados fornecidos pelas Requerentes).

 

Da tabela acima se depreende que em qualquer métrica, a marca Qualy (BRF) é líder de mercado e que, em conjunto, as marcas da BRF somam participações superiores a 50% de mercado em 2019. Por sua vez, as marcas da Seara combinadas com as marcas da Bunge totalizaram participações em torno de [20%-30%] em faturamento e [30%-40%] em volume comercializado [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES], com variações de HHI bem superiores a 200 pontos em qualquer métrica considerada, ambos em 2019.

Somadas, as participações da BRF e da Seara representariam participação combinada superior a 75% do mercado total de margarinas em qualquer métrica adotada em 2019. Permaneceriam ainda no mercado três grupos econômicos mais relevantes (Sigma/Upfield, Vigor e M Dias Branco), além de concorrentes atuando em franja de mercado, mas com participações inexpressivas.

Acerca do grupo Sigma/Upfield, responsável pela marca Becel, é importante destacar que até este ano a marca Becel era objeto de parceria comercial com a Bunge. As Requerentes explicam que a relação contratual entre a Sigma e a Bunge atribui a essa última somente os aspectos operacionais relativos à produção e distribuição das margarinas Becel, cabendo à Sigma as decisões comerciais, econômicas e estratégicas mais relevantes no âmbito desse negócio. Em função do alegado controle das decisões mercadológicas por parte da Sigma, as Requerentes defendem que o market share das margarinas Becel deve ser atribuído à Sigma e não à Bunge. 

Não obstante, em agosto de 2020, a BRF e a Upfield notificaram ao Cade operação por meio do qual a Upfield licencia à BRF o uso exclusivo da marca Becel no Brasil para a produção e distribuição de margarinas, seguindo modelo similar alegado de atribuir a gestão estratégica do negócio à Upfiled enquanto a BRF terá apenas atribuições operacionais envolvendo a produção e distribuição do produto[75]. A referida operação ainda se encontra em análise pela SG.

Com o desfazimento da relação entre Upfield e Bunge e a substituição da Bunge pela BRF na parceira relacionada à marca Becel, conclui-se que a participação da marca Becel não deve ser atribuída à participação das Requerentes. Por outro lado, é possível considerar a inclusão conservadora do market share da Becel na participação de mercado da BRF. Como essa mesma inclusão conservadora não altera significativamente as conclusões para esta Operação e a referida relação entre BRF e Upfield ainda se encontra em análise pela SG, não se faz necessário tecer maiores comentários acerca desse cenário nesse momento.

A despeito da concentração verificada entre BRF e Seara após a Operação, é preciso destacar que a Operação proporciona condições para que a Seara possa acirrar a rivalidade especialmente em relação à BRF. Com efeito, a BRF detém participações de mercado significativamente superiores no mercado nacional de margarinas em relação à Bunge e Seara, que ocupam atualmente a segunda e terceira posições no segmento, e ainda mais elevadas que os demais concorrentes como Vigor e M Dias Branco.

É fato, contudo, que essa diferença é por vezes relativizada dependendo da região em que se analisa a estrutura de oferta. Conforme já explorado no tópico II.4.1 sobre rivalidade, apesar do mercado ser definido nacionalmente e os players terem atuação nacional, os dados[76] indicam que há uma dinâmica regional que não pode ser desprezada e a existência de maior rivalidade nesse mercado em regiões específicas.

Nesse sentido, é possível mencionar os exemplos da região Sul e Sudeste, em que a Vigor detém participações superiores a 8% em qualquer métrica adotada em 2019. O mesmo pode ser dito da M Dias Branco que apresenta participações superiores a 17% na região Nordeste também em qualquer métrica adotada em 2019.

É preciso destacar que no próprio cenário nacional, a Vigor apresenta crescimento de participação passando de [0%-10%]/[0%-10%] para [0%-10%]/[0%-10%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] em volume/valor, respectivamente entre 2015 e 2019. Além disso, desde 2017 a Vigor passou ao controle do grupo Lala, uma companhia mexicana de laticínios com faturamento superior a US$ 60 bilhões por ano, que anunciou investimentos da ordem de R$ 400 milhões nas operações da Vigor no Brasil[77].

Trata-se, portanto, de um rival importante com atuação nacional, inclusive com participações mais elevadas nas regiões Sudeste e Sul, com capacidade de investimento nas suas operações e que, na prática, já tem apresentado crescimento relevante de suas participações nos últimos cinco anos.

Para aprofundar a análise sobre a rivalidade no mercado, a SG solicitou a elaboração de estudo econômico sobre o mercado de marginas ao DEE. Analisando a literatura sobre o comportamento e sensibilidade do preço no mercado de margarinas, o DEE identificou que a margarina possui elasticidade próxima da unitária.

Dessa forma, a margarina não seria um bem inelástico (com demanda pouco sensível a variações em seu preço), mas também não seria um bem elástico (com demanda muito sensível a variações em seu preço). Em geral, uma elevação (redução) percentual no preço da margarina induziria uma equivalente redução (elevação) na demanda por margarina.

O DEE também procedeu ao teste de GUPPI (Gross Upward Pricing Pressure Index) que fornece um valor percentual para o aumento de preços após a fusão. A literatura econômica indica existência de preocupações concorrenciais para atos de concentração que apresentem pressões para aumento de preços superiores a 5%. Os resultados do teste GUPPI são inferiores ao percentual de 5%[78], indicando que a Operação não gera pressões para elevação unilateral de preços.

Nesse mesmo sentido, a M&A Consultoria Econômica[79] contratada pelas Requerentes realizou o teste GUPPI e o teste UPP (Upward Pricing Pressure)[80], que, em resumo, não identificaram pressões por aumentos unilaterais de preços decorrente da Operação.

A BRF, por meio de parecer econômico elaborado pela Consultoria LCA[81], contesta os resultados dos testes GUPPI e UPP, considerando que não capturariam a pressão competitiva exercida no âmbito de marcas de preços similares. A BRF argumenta que a marca Qualy de sua propriedade e, que é líder do segmento, integra categoria premium, enquanto as marcas de Seara e Bunge se concentram nas categorias intermediária e de combate. Dessa forma, os testes realizados subestimariam os desvios de demanda entre marcas de mesmo segmento, desprezando o fato da concorrência entre marcas intermediárias ser mais significativa do que entre marcas de categorias diferentes.

Embora as preocupações indicadas na Nota Técnica Econômica da LCA sejam pertinentes e devam ser considerados na aplicação dos testes GUPPI e UPP, há elementos que reduzem as preocupações relacionadas a esses argumentos.

Em primeiro lugar, vale esclarecer que a tentativa de segmentação das marcas em diferentes categorias por similaridade de preço é uma das formas de classificação possível. Entretanto, diante da ausência de evidências sólidas e estudos indicando quais fatores e em que grau influenciam na categorização das marcas (como preço e qualidade), é necessário cautela quanto ao argumento de pressão de preços suscitado pela BRF.

Importante destacar que, mesmo considerando a categorização de marcas indicada pela LCA, verifica-se a presença de outras marcas que concorrem na faixa de preços (entre R$ 6,00/kg e R$ 10,00)[82] de marcas da Bunge e Seara, faixa que poderia ser classificada como intermediária.

Como ilustração, destaca-se abaixo a faixa de preços por marca de fabricante com base em dados da Nielsen.

 

Tabela 8 - [ACESSO RESTRITO AO CADE]

 

É possível citar nessa faixa intermediária as marcas Deline e Claybom, ambas da BRF, que conjuntamente detém participação de mercado correspondente a [10%-20%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] em volume comercializado e [10%-20%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] em valor de vendas, em 2019.

Adicionalmente, encontra-se nessa mesma faixa de preços a marca Amorela da M Dias Branco, além das marcas Vigor e Amélia da própria Vigor, que conjuntamente, detém participação de mercado correspondente a [0%-10%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] em volume comercializado e [0%-10%] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] em valor de vendas, em 2019.

Ademais, a SG e a análise empreendida neste voto consideram definição de mercado relevante mais restrito do que a proposta pelas Requerentes, que sustentaram a inclusão de outros produtos spreads, e não apenas margarinas. Essa proposta foi rejeitada, conforme detalhado no tópico II.2.2, em razão da ausência de evidências que justifiquem essa expansão. No mesmo sentido, as alegações da BRF que propõem cenário mais restritivo da perspectiva do produto carecem de evidências sólidas que permitam analisar o mercado de margarinas sob essa perspectiva.

Tendo sido devidamente fundamentado que a definição do mercado relevante de margarinas é único e engloba somente margarinas, é preciso considerar, para fins de análise antitruste, que os produtos incluídos no mesmo mercado relevante exercem pressão competitiva sobre os produtos desse mesmo mercado relevante.

Ainda que se reconheça maior pressão entre marcas de preços similares, para fins de rivalidade, a presente análise demonstrou existirem marcas de outros grupos na mesma faixa de preço e que não é possível desprezar a pressão competitiva exercida por marcas de outras categorias na ausência de fundamentos mais consistentes. Sobretudo, foi verificada a presença de rivais importantes com capacidade de investimento, atuação nacional e que, em determinados contextos regionais, exercem pressão competitiva mais significativa que no cenário nacional.

Além da presença de concorrentes relevantes, a instrução realizada pela SG demonstrou que os clientes do mercado de margarinas manifestaram visão favorável à Operação, com indicação de aumento de rivalidade em alguns casos. É relevante destacar que a SG oficiou 10 clientes, sendo que 5 clientes (Atacadão/Carrefour, Assaí, Grupo Big, Sendas e Makro) responderam. Em geral, grande parte das respostas em relação à Operação foi positiva ou neutra, destacando-se manifestações de que a Operação pode resultar em ganhos de eficiência e competitividade no mercado de margarinas.

Nesse sentido, o Grupo Big (SEI 0748051) afirmou que:

 

a oferta no mercado de margarinas melhorará, pois teremos uma segunda grande empresa dentro da categoria com capacidade de produção e marcas fortes. Atualmente o mercado está centralizado na liderança de Qualy, com o aumento de Seara nesse ramo, o mercado se tornará mais concorrido e consequentemente mais vantajoso para o cliente final.”.

 

O Atacadão (Carrefour) (SEI 0739809) também se manifestou favoravelmente à Operação por entender que torna o mercado mais competitivo:

 

“Acreditamos que será positivo, pois existirá um maior equilíbrio na concorrência entre as empresas e as marcas. Entendemos que com a aquisição, Seara terá uma participação de mercado mais equilibrada e poderá atuar com maior competitividade, principalmente pela aquisição das novas marcas e fábricas.”

 

O Makro (SEI 0755023) também corrobora que a Operação terá impacto positivo, tornando o mercado de margarinas mais competitivo e melhorando as condições de distribuição dos produtos, considerando que o canal distribuidor da Seara é mais eficiente que o da Bunge. De outro lado, o atacadista aponta risco de descontinuação de algumas marcas, com potencial perda de variedade para o consumidor.

Vale destacar ainda a manifestação da Sendas (SEI 0740184) que reconhece potenciais benefícios ao consumidor caso parte das eficiências alcançadas em decorrência da Operação sejam repassadas em alguma proporção ao custo final do produto, mas alerta que ficará mais sujeita a política de preços de BRF e Seara.

A partir das manifestações recebidas dos clientes, verifica-se que a maioria entende a Operação como pró-competitiva no sentido de aumentar a competitividade do atual mercado em razão de melhoras na distribuição de produtos e na ideia de se formar um novo player apto a rivalizar mais intensamente com a BRF[83].

Destaca-se ainda que a instrução realizada pela SG foi completa e suficiente para obter informações adequadas sobre as condições de rivalidade do mercado em análise. Os dados utilizados foram obtidos de concorrentes e clientes oficiados na instrução, além de dados produzidos pelas Requerentes e pela terceira interessada, estudos econômicos do DEE, sujeito ao contraditório com a apresentação de outras pareceres econômicos pelas partes.

Ante o exposto, considera-se que as informações apresentadas nos presentes autos, esmiuçados em pontos acima detalhados, são suficientes para afastar maiores preocupações concorrenciais constantes no Despacho Decisório nº 4/2020/GAB2 (SEI 0794102) acerca das justificadas para aprovação da presente Operação, especialmente em relação às condições de rivalidade no mercado nacional de margarinas.

 

 

VI.CONCLUSÕES SOBRE A OPERAÇÃO

Pelos motivos previamente expostos, conclui-se que os pontos indicados pelo Despacho Decisório nº 4/2020/GAB2 (SEI 0794102) foram devidamente respondidos após análise detalhada dos presentes autos, sem necessidade de instrução adicional. Em síntese, a análise realizada verificou:

 

(i) Ausência de preocupações concorrenciais quanto ao aumento das probabilidades de exercício unilateral e coordenado de mercado seja na sobreposição horizontal verificada ou na probabilidade de fechamento de mercado na integração vertical analisada.

(ii) Entrada não se mostrou provável no curto prazo e as eficiências apresentas não são verificáveis, mas não se identificaram indícios de arrefecimento da concorrência no mercado de margarinas após a Operação.

(iii) Presença da BRF como líder do segmento continuará exercendo pressão competitiva relevante e, no âmbito regional, alguns competidores poderão exercer essa pressão.

(iv) Características e o histórico do mercado de margarinas não sugerem que a adoção de estratégias coordenadas seja provável.

 

Pelas razões indicadas ao longo deste voto, entende-se que os elementos constantes nos autos são suficientes para sanar as dúvidas levantadas a respeito da probabilidade de exercício unilateral e coordenado de poder de mercado, bem como da probabilidade de fechamento de mercado em razão da presente Operação.

 

VII.DISPOSITIVO

Ante exposto, considero que: (i) os pontos que ensejaram a avocação estão devidamente respondidos; (ii) que a instrução conduzida pela SG foi suficiente, extensa e adequada; e (iii) os elementos da análise permitem entender possível a aprovação da Operação sem restrições, especialmente considerando condições de rivalidade efetiva no mercado nacional de margarinas, a baixa probabilidade de exercício de poder coordenado e a ausência de capacidade e incentivos para promover fechamento no mercado de óleo de soja degomado.

Voto, portanto, pela aprovação sem restrições do presente Ato de Concentração.

É o voto.

 

Brasília, 24 de novembro de 2020.

 

[assinatura eletrônica]

Sérgio Costa Ravagnani

Conselheiro Relator

 

[1] A Operação representará a saída da Bunge do mercado de margarinas e maioneses, com a alienação de sua capacidade produtiva que também é empregada na produção de óleos refinados, segmento em que continuará atuando. No mercado de margarinas, a concentração representará a união do segundo e terceiro maior players, permanecendo atrás da BRF, que continuará líder no segmento.

[2] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES].

[3]  [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES]

[4] [ACESSO RESTRITO AO CADE].

[5] Vide Ato de Concentração nº 08700.003979/2018-20 (Requerentes: Bunge Alimentos S.A., Unilever B.V., Unilever Brasil Ltda e Sigma Brasil Holding Ltda.); Ato de Concentração nº 08700.000782/2018-39 (Requerentes: M. Dias Branco S.A. Indústria e Comércio de Alimentos e Indústria de Produtos Alimentícios Piraquê S.A.); Ato de Concentração nº 08012.004423/2009-18 (Requerentes: Sadia S.A. e Perdigão S.A.); Ato de Concentração nº 08012.000882/2008-41 (Requerentes: Bunge Alimentos S.A. e Bertin Ltda.); Ato de Concentração nº 08012.000174/2008-19 (Requerentes: Bunge Alimentos S.A. e Unilever Brasil Ltda.).

[6] Nesse sentido, as Requerentes afirmam (SEI 0731052) “Já da perspectiva da demanda, a margarina é um alimento que desempenha diversas funções, destacando-se o seu uso culinário e como spread. Em se tratando de uso culinário, existem importantes produtos substitutos, tais como óleos vegetais, azeite e manteiga. Embora referidos produtos apresentem características diferentes entre si (e.g. preço por quilo, composição, tamanho da embalagem), o seu uso para uma mesma finalidade torna-os, em alguma medida, substituíveis, podendo o consumidor facilmente migrar de um produto para outro.”

[7] Como apontado pela SG no §49 do Parecer (SEI 0785944): “. [...] A relação vertical a ser estabelecida não configura um ato de concentração econômica nos termos da Resolução Nº 17, de 18 de outubro de 2016, que disciplina as hipóteses de notificação de contratos associativos de que trata o inciso IV do artigo 90 da Lei nº 12.529/2011.”

[8] Vide §41 a 161 do Parecer SG nº 10/2020 (SEI 0785944).

[9] A Instrução Normativa n° 66, de 10 de dezembro de 2019, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, define: Art. 2°: Para efeito deste Regulamento Técnico, considera-se: 1 - margarina: o produto com teor de gordura mínimo de 10 % (dez por cento) e máximo de 90 % (noventa por cento), em forma de emulsão estável plástica ou fluida, principalmente do tipo água em óleo (A/O), composto por água, óleos ou gorduras de origem animal ou vegetal, podendo ser adicionado de outros ingredientes.

[10] Para maiores detalhes, consultar o Formulário de Notificação (SEI 0731052)

[11] Acerca desse ponto, as Requerentes anexaram aos autos apresentações (slides) de estudos de mercado conduzidos pelas empresas especializadas Nielsen, Okno e Kantar. Segundo o estudo Cenário de Margarinas – Nielsen (SEI 0730145), enquanto o consumo de margarina recuou [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] entre 2017 e 2018, o consumo de manteiga cresceu [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] e o de requeijões/cream cheese cresceu [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES] no mesmo período. Considerando que todos esses spreads cresceram conjuntamente [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES], as Requerentes sugerem que os consumidores estão substituindo margarina por outros spreads. Não foram anexados aos autos os estudos de mercado completos, mas somente slides com dados extraídos desses estudos. Algumas das estimativas apresentadas carecem de descrição completa. Assim, os dados desses estudos de mercado reportados neste parecer são aqueles que puderam ser identificados a partir somente das informações constantes nos slides fornecidos pelas Requerentes. 

[12] Assim como as Requerentes, a BRF disponibilizou somente slides (SEI 0745476). Porém, enquanto a apresentação com dados Kantar/Nielsen fornecido pelas Requerentes tem quatro slides, a apresentação fornecida pela BRF possui 57 slides, de modo que essa última traz mais informações que a primeira.    

[13]  [ACESSO RESTRITO AO CADE].

[14] [ACESSO RESTRITO AO CADE].

[15] Essa migração teria resultado, segundo dados da Nielsen, em um crescimento de 6,1% no faturamento da categoria manteiga. (SEI 0730145)

[16] Porém, o Makro afirmou não possuir dados que demonstrem a efetiva substituição da margarina por outros produtos, por tais substituições não terem ocorrido de forma substancial.  

[17] A margarina segue presente em praticamente todos os lares brasileiros (96,1%). A maionese, embora tenha elevada penetração (85,3%) e preço mais próximo, foi o produto menos citado como possível substituto da margarina. O requeijão possui uma importante taxa de penetração (64,4%), porém não substitui a margarina em seu uso culinário, além de ter um preço médio superior. A manteiga, embora tenha apresentado algum crescimento em seu consumo, faz-se presente em menos de 40% dos lares do país, enquanto o cream cheese não alcança 5%.

[18] Vide Atos de Concentração nº 08700.003979/2018-20 (Bunge Alimentos S.A., Unilever Brasil Ltda. e Sigma Brasil Holding Ltda); Ato de Concentração nº 08700.000782/2018-39 (M. Dias Branco S.A. Indústria e Comércio de Alimentos e Indústria de Produtos Alimentícios Piraquê S.A.) e Ato de Concentração nº 08012.004423/2009-18 (Perdigão S.A. e Sadia S.A.).

[19] Ato de Concentração nº 08700.005478/2018-88 (Requerentes: ADM do Brasil Ltda. e ABC Indústria e Comércio S.A.).

[20] Atos de Concentração nºs 08700.012105/2015-11 (Requerentes: Corpesca do Brasil Empreendimentos e Participações Ltda. e Fasa América Latina Participações Societárias S.A.) e 08012.003278/2007-96 (Requerentes: Agrenco do Brasil S.A e Marubeni Corporation).

[21] Atos de Concentração nºs 08700.005846/2018-52 (Requerentes: Archer-Daniels-Midland Company e Neovia (InVivo Group)), 08012.000091/2012-06 (Requerentes: ABC Indústria e Comércio S.A. e Bunge Alimentos S.A.) e 08012.004140/2000-94 (Requerentes: ADM Exportadora e Importadora S.A., Rezende Óleo Ltda. e Granja Rezende S.A.), entre outros.

[22] Ato de Concentração nº 08012.006068/2002-45 (Requerentes: Bunge Alimentos S.A. e Bertol S.A Indústria Comércio e Exportação).

[23] Vide §99 e 100 do Parecer da SG (SEI 0785944)

[24] Para mais informações, consultar §101 do Parecer da SG (SEI 0785944)

[25] Após passar pelo processo de refino, o óleo de soja pode ser envasado ou comercializado a granel. O óleo refinado é ainda utilizado na fabricação de margarinas, maioneses e gordura vegetal. Todos esses produtos são vendidos, conforme o caso, aos distribuidores e posteriormente destinados a processadores (como indústrias e restaurantes) ou a varejistas que revendem aos consumidores finais.  

[26] Como exemplos concretos dessa utilização de outros tipos de óleo, as Requerentes mencionaram a comercialização pela Bunge das margarinas “Mila” (que era feita à base de óleo de milho) e a “Delícia” que chegou a ser produzida a partir do óleo de canola (SEI 0765586)

[27] Além disso, a BRF procurou desqualificar os casos das margarinas Mila e Delícia à base de óleos milho e canola, respectivamente, como exemplos de substituição do óleo degomado de soja por outros insumos. A terceira interessada argumenta que não se tratou de uma substituição em sentido estrito, uma vez que essas margarinas foram lançadas com o objetivo de se apresentarem como produtos diferenciados, buscando atingir um público com outras exigências. Segundo a BRF, por serem produzidas a partir de óleos “diferenciados”, as margarinas Mila à base de milho e Delícia à base de canola possuíam precificação e distribuição distintas do mercado em geral, constituindo produtos de nicho. A BRF afirma que essas margarinas possuíam preços até 40% superiores à margarina Delícia feita à base de óleo degomado de soja e que foram descontinuadas em virtude de seu insucesso comercial.

[28] Atos de Concentração nº  08700.002605/2020-10 (Requerentes: Bunge Alimentos S.A. e Imcopa – Importação, Exportação e Indústria de Óleos S.A. – Em Recuperação Judicial), 08700.005478/2018-88 (Requerentes: ADM do Brasil Ltda. e ABC Indústria e Comércio S.A.), 08700.007578/2016-87 (Requerentes: Cargill Agrícola S.A. e SGS Agricultura Ltda.), 08012.000091/2012-06 (Requerentes: ABC Indústria e Comércio S.A. e Bunge Alimentos S.A.) e 08012.006068/2002-45 (Requerentes: Bunge Alimentos S.A. e Bertol S.A Indústria Comércio e Exportação), entre outros.

[29] Vide os §118, 119, 120, 121, 122, 123 e 124 do Parecer da SG (SEI 0785944)

[30] Vide a Tabela 2 do Documento SEI 0785944. Informação disponível em: https://abiove.org.br/estatisticas/pesquisa-de-capacidade-instalada-da-industria-de-oleos-vegetais-2018/

[31] O Brasil é o segundo maior produtor de soja do mundo, com uma área plantada de 125,691 milhões de hectares e uma produção de 362,075 milhões de toneladas na safra 2018/2019. Informação disponível em: https://www.embrapa.br/soja/cultivos/soja1/dados-economicos.

[32] Ato de Concentração 08700.000450/2018-54 (Requerentes: Sigma Bidco B.V. - Unilever N.V e Unilever PLC).

[33] Ato de Concentração n° 08700.003979/2018-20 (Requerentes: Bunge Alimentos S.A., Unilever Brasil Ltda., Unilever N.V. e Sigma Brasil Holding Ltda.).

[34] Em termos práticos, a operação descrita acima consistiu na substituição da BRF pela Bunge na atividade de produção e distribuição de margarinas sob a marca Becel. Posteriormente, a Unilever foi substituída pela Sigma (controlada pelo fundo KKR), de modo que a Unilever se retirou totalmente do negócio, restando, somente a relação entre a Bunge e a Sigma.

[35] Ademais, as Requerentes esclarecem que [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES].

[36] Ato de Concentração nº 08700.003855/2020-69 (Upfield/BRF).

[37] Vide § 135 do Parecer da SG (SEI 0785977).

[38] Isso se reflete na Razão de Concentração (CR2) – A CR2 é uma medida de concentração que consiste na soma das participações de mercado das “n” maiores firmas de um mercado relevante, conforme a fórmula onde Si é a participação de mercado da empresa -  que se eleva de aproximadamente 75% para cerca de 85%, tanto em volume como em valor. Essa elevada concentração de participação de mercado em somente dois concorrentes traz consigo preocupações quanto a um eventual exercício poder coordenado.

[39] O estudo realizado pelo DEE teve por objetivo avaliar quantitativa e qualitativamente os incentivos que a Seara terá para unilateralmente exercer poder de mercado, bem como para efetivamente rivalizar com a BRF após a Operação.  

[40] Cumpre ressaltar que o Ato de Concentração 08700.002605/2020-10 Imcopa/Bunge foi aprovado pelo Tribunal desse Conselho, por meio da 168ª SOJ 168ª (SEI 0828630), em que a Bunge comprou duas unidades produtivas localizadas em Araucária/PR e Cambé/PR pertencentes ao Grupo Imcopa. Na ocasião, foram considerados os seguintes mercados relevantes: (i) mercado de originação de soja, nas dimensões nacional e estadual;(ii) mercado nacional de farelo de soja; (iii) mercado nacional de óleo de soja degomado; (iv) mercado nacional de óleo de soja refinado; (v) mercado nacional de lecitina de soja; (vi) mercado de etanol, nas dimensões nacional e regional; (vii) mercado nacional de ácidos graxos vegetais; e (viii) mercado nacional de biodiesel. Diante desse cenário, o market share da Imcopa, acerca do mercado óleo degomado de soja, foi somado ao da Bunge.

[41] Conforme define o Guia, na página 25: “Compreende-se que os mercados são: (i) Mercados não concentrados: com HHI abaixo de 1500 pontos;”. Disponível em:< http://www.cade.gov.br/acesso-a-informacao/publicacoes-institucionais/guias_do_Cade/guia-para-analise-de-atos-de-concentracao-horizontal.pdf >

[42] Acerca desse ponto, a SG obteve poucas informações consistentes. As Requerentes informaram no Formulário de Notificação que o prazo necessário estimado para efetivar uma entrada completa (considerando desde o planejamento, passando pela construção da fábrica, até à efetiva produção) está entre 12 e 24 meses. A BRF, por sua vez, afirmou que um entrante não comprometido precisaria de aproximadamente 24 meses para completar sua entrada, enquanto um entrante não atuante no setor de alimentos poderia precisar de um prazo superior a 24 meses para efetivar sua entrada. Entretanto, a Vigor informou que o tempo médio estimado para efetivar uma entrada no mercado seria de dois anos, independentemente de a empresa já ser atuante ou não nesse mercado.

[43] “A qualidade da margarina pode estar associada tanto à sua aplicação, se para uso culinário ou como spread, como à sua saudabilidade. As margarinas com alto teor de lipídios (entre 70 e 80%) são mais utilizadas no uso culinário profissional, como na fabricação de pães e bolos. Por outro lado, as margarinas com baixo teor de gordura (50% ou menos) são geralmente de uso caseiro. Margarinas de baixo teor de lipídios são preferidas também por consumidores que buscam por alimentos mais saudáveis. Há também variações de qualidade relacionadas à cremosidade e ao sabor do produto.” (SEI 0785944, §201).

[44] SEI 0783471.

[45] “Com base na distribuição de preços, é possível classificar as diversas marcas em diferentes categorias. Nesse exercício, pode-se definir uma categoria premium, que englobaria marcas como a Qualy da BRF e a Becel da Upfield; uma categoria intermediária composta por marcas como a Delícia da Bunge, a Doriana da Seara e a Vigor da Vigor; e marcas de combate, como a Primor da Bunge, a Delicata da Seara e a Puro Sabor da M Dias Branco.” (SEI 0785944, §203).

[46]A Qualy (BRF) é líder de participação nas duas métricas, mas por se enquadrar na categoria premium apresenta participação em valor de vendas razoavelmente superior em relação ao volume comercializado. A Becel (Upfled) também estaria nessa categoria. 1.         De outro lado, as marcas de combate, como Primor (Bunge) e Puro Sabro (M Dias Branco) apresentariam relação inversa com maior participação superior no volume de vendas e menor em termos de faturamento por tratarem de produtos com menor preço por unidade. As marcas intermediárias como Doriana (Seara), Delícia (Bunge) e a Vigor (Vigor), por sua vez, possuem participações próximas em termos de volume e faturamento de vendas.

[47] SEI 0785944, §213.

[48] Gráficos 1 a 4 do Documento SEI 0785951.

[49] Os testes GUPPI e UPP realizados pela M&A Consultoria Econômica, a pedido das Requerentes, também não identificaram incentivos para que a Seara promova aumentos de preços após a consumação da Operação. A BRF, por meio da Nota Técnica Econômica elaborada pela LCA Consultores, apresentou objeções à utilização dos testes GUPPI e UPP, sob o argumento de que estes testes poderiam não capturar a maior pressão competitiva existente entre marcas de preços similares. Segundo a BRF, as marcas da Seara e da Bunge se concentram nos segmentos mid-range e de marcas de combate, enquanto a marca líder de mercado – a Qualy da BRF – estaria situada no segmento premium.

[50] Grupo Big (SEI 0748051); Makro (SEI 0755023); Carrefour/Atacadão (SEI 0739809) e Sendas (SEI 0740184).

[51] As Requerentes afirmaram que a Seara ampliará seu poder de barganha ao passar a adquirir, após a Operação, maiores quantidades de insumos e embalagens para margarinas, obtendo assim reduções em seus custos. No entanto, ganhos pecuniários decorrentes de aumento de parcela de mercado e ou que representem mera transferência de renda entre agentes não são considerados ganhos de eficiência para fins de análise antitruste, conforme definido no Guia H do Cade, de forma que essa economia não foi acatada como uma eficiência decorrente da Operação.

[52] [ACESSO RESTRITO AO CADE].

[53] [ACESSO RESTRITO AO CADE].

[54] Segundo a BRF, em junho de 2020, foi registrado a importação do maior volume de soja desde 2016 como resultado do desabastecimento interno causado pelo direcionamento expressivo da produção interna de soja em grãos de exportação.

[55] Vide § 18 a 21 da manifestação complementar da BRF (SEI 0780202).

[56] “[...]o Nordeste não constitui, tradicionalmente, região produtora de grãos de soja na mesma escala que outras regiões (por exemplo, Centro-Oeste). Desta forma, há pouca oferta efetiva por empresas com capacidade de esmagamento de soja disponível ao mercado na região. os dados de Capacidade Instalada por Região, disponibilizado pela ABIOVE, demonstram que a região Nordeste detém apenas 6,2% da capacidade de processamento de óleos vegetais do Brasil - a dizer, capacidade sete vezes inferior à região Centro-Oeste. Neste contexto, as poucas empresas que possuem infraestrutura para tanto na região Nordeste têm seus produtos usualmente direcionados para a produção de biodiesel (e.g. Granol, Oleoptan), ou direcionam a totalidade de sua produção de óleo degomado para consumo cativo (e.g. Archer Daniels Midtand - ADM), sendo elas mesmas consumidoras de óleo disponível no mercado.” (SEI 0780202, §21 e 22)

[57] Vide § 4 a 14 do SEI 0780203 e 0780202.

[58] [ACESSO RESTRITO AO CADE].

[59] Atos de Concentração nº  08700.002605/2020-10 (Requerentes: Bunge Alimentos S.A. e Imcopa – Importação, Exportação e Indústria de Óleos S.A. – Em Recuperação Judicial), 08700.005478/2018-88 (Requerentes: ADM do Brasil Ltda. e ABC Indústria e Comércio S.A.), 08700.007578/2016-87 (Requerentes: Cargill Agrícola S.A. e SGS Agricultura Ltda.), 08012.000091/2012-06 (Requerentes: ABC Indústria e Comércio S.A. e Bunge Alimentos S.A.) e 08012.006068/2002-45 (Requerentes: Bunge Alimentos S.A. e Bertol S.A Indústria Comércio e Exportação), entre outros.

[60] “Considerando que aproximadamente 80% da capacidade de processamento de oleaginosas do país está localizada nas regiões Centro-Oeste e Sul e que parcelas relevantes da produção atribuída às regiões Nordeste e Sudeste ocorrem, de fato, em áreas de cerrado, distantes, portanto, do litoral e do Norte do país, conclui-se que a produção nacional de óleo degomado de soja é, fundamentalmente, a produção levada a cabo no centro-sul do país e em áreas próximas, que, em conjunto, respondem por praticamente toda a oferta nacional produto, não cabendo definir mercados relevantes geográficos de acordo com as regiões do país.” (SEI 0785944, § 124).

[61] Apresentação “O RenovaBio e o Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel” do gerente de economia da ABIOVE, Daniel Furlan Amaral, no Congresso Internacional de Biomassa, Curitiba/PR, em 5 de setembro de 2018. Apresentação disponível no endereço eletrônico: https://abiove.org.br/wp-content/uploads/2019/05/05092018-163355-43._cibio_-_biodiesel_e_o_renovabio.pdf.

[62][ACESSO RESTRITO AO CADE].

[63] Informação disponível em: https://abiove.org.br/estatisticas/pesquisa-de-capacidade-instalada-da-industria-de-oleos-vegetais-2018/

[64] Vide a figura 2 do Documento SEI 0785944. Informação disponível em: https://abiove.org.br/estatisticas/pesquisa-de-capacidade-instalada-da-industria-de-oleos-vegetais-2018/

[65] O Brasil é o segundo maior produtor de soja do mundo, com uma área plantada de 125,691 milhões de hectares e uma produção de 362,075 milhões de toneladas na safra 2018/2019. Informação disponível em: https://www.embrapa.br/soja/cultivos/soja1/dados-economicos.

[66] Nesse mesmo sentido a conclusão da análise do mercado nacional de óleo de soja degomado no Ato de Concentração nº 08700.002605/2020-10 (Bunge/Imcopa).

[67] Ato de Concentração nº 08700.002605/2020-10 (Bunge/Imcopa).

[68] Vide § 325 do Parecer nº 9/2020 (SEI 0795886).

[69] 31. No Formulário de Notificação, as partes informaram que, após a operação, além do volume que ficará para o consumo cativo da Bunge (que será de 70 a 80% da produção total de óleo degomado de soja, igual ou maior do que a quantidade direcionada ao consumo próprio no cenário pré-operação), a Requerente Bunge fornecerá até 10% do total de sua produção à Seara. Entende-se que o volume a ser adquirido pela Seara deve se aproximar de 10%, tendo em que vista que ela assumirá plantas produtivas que, atualmente, consomem esse montante. Verifica-se, portanto, que os 10% da produção de óleo de soja degomado a serem transferidos à Seara serão provenientes dos volumes que hoje são destinados à exportação e ao mercado interno, já que a cifra de consumo cativo da Bunge permanecerá inalterada, a despeito da alienação das plantas produtoras de margarinas e maionese. Assim, caso seja mantida a cifra de exportação registrada em 2019 pela Bunge (de cerca de 11%), o que parece provável dada a situação cambial presente, a operação, no melhor dos casos, resultará na redução de 50% do óleo de soja degomado disponibilizado ao mercado interno geral (de 20% para 10%) ou, na pior das hipóteses, ocasionará a completa retirada do potencial de oferta da Bunge no mercado interno. Em qualquer caso, fatalmente haverá redução de óleo de soja disponível aos concorrentes de Bunge/Seara no mercado de margarinas...” (SEI 0780202, § 31 a 34).

[70] [ACESSO RESTRITO AO CADE E ÀS REQUERENTES].

[71] “O cálculo do market share agregado das N maiores empresas do mercado (“Concentration Ratio N” ou CRN) permite caracterizar o mercado para essa finalidade. Por exemplo, caso verificada que a concentração aumenta o índice CR4 (market share agregado das 4 maiores empresas do mercado), tornando-o igual ou superior ao patamar de 75%, deve-se aprofundar a análise sobre a possibilidade de a operação permitir ou não exercício abusivo de poder coordenado.” Em Guia para Análise de Atos de Concentração Horizontal, Julho/2016.

[72] Segundo Guia H: “[g]eralmente são empresas com um baixo custo de produção e uma baixa precificação que força os preços de mercado para baixo ou empresas que se caracterizam por sua inventividade e estimulam a permanente inovação no segmento em que atuam. Nesse sentido, sua presença independente no mercado pode disciplinar os preços das empresas com maior market share.”

[73] Embora as Requerentes, por meio da Consultoria M&A, tenham indicado a Vigor com características de maverick, por adotar estratégia de precificação mais agressiva em relação às principais marcas de margarinas, contar com investimento anunciado considerável de seu controlador, o grupo mexicano Lala, e ter apresentado crescimento de mercado da ordem de 3,5% desde a entrada do Grupo Lala em 2017, “não há evidências de que a Vigor tenha implementado inovações disruptivas e nem que esteja puxando para baixo os preços no mercado de margarinas como um todo, muito embora se observe uma relevância das marcas da Vigor nas regiões Sul e Sudeste do país, assim como da M Dias Branco na região Nordeste.” (SEI 0785944, § 271)

[74][ACESSO RESTRITO AO CADE].

[75] Ato de Concentração nº 08700.003855/2020-69 (Upfield/BRF).

[76] SEI 0785951.

[77] https://www.istoedinheiro.com.br/grupo-lala-investe-r-400-milhoes-para-modernizar-fabricas-no-brasil/.

[78] Os resultados do teste podem ser conferidos no Documento SEI 0785499.

[79] SEI 0778656.

[80] Trata-se de um teste que considera tanto os incentivos para aumento de preços pós fusão, que dependem das taxas de desvio e das margens brutas, mas também considera as possíveis eficiências decorrentes do ato de concentração.

[81] SEI 0783511.

[82] Informações trazidas pela LCA no Documento SEI 0783511.

[83] Colabora para essa explicação o relato de alguns clientes indicando que a BRF detém isoladamente parcela muito relevante de suas vendas, o que pode justificar as respostas positivas para o fortalecimento de um player relevante no mercado que tenha melhores condições de desafiar a líder de mercado.


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Documento assinado eletronicamente por Sérgio Costa Ravagnani, Conselheiro, em 24/11/2020, às 21:21, conforme horário oficial de Brasília e Resolução Cade nº 11, de 02 de dezembro de 2014.


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Referência: Processo nº 08700.001134/2020-14 SEI nº 0834715