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Ministério da Justiça e Segurança Pública - MJSP
Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE

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Processo nº 08700.000625/2014-08

Tipo de Processo: Processo Administrativo

Interessado(s): Sindicato do Comércio Varejista de Derivados do Petróleo do Estado do Rio Grande do Norte - Sindipostos, Antônio Cardoso Sales, Agenor Silveira Távora Neto, José Vasconcelos da Rocha Júnior, UH° Maurício Câmara Flor, Luiz da Costa Cirne Júnior, Rildeniro Medeiros e Fernando Dinoá Medeiros Filho, Posto Novo Horizonte II, Posto Novo Horizonte, Posto Pium Ltda., Posto Pium Ltda. (Filial I), Posto Pium Ltda. (Posto Pirangi), Cavalcanti & Rocha Ltda. (Posto Arêz), Cavalcanti & Rocha Ltda. (Posto Litoral Norte), Cirne Pneus Comércio e Serviços Ltda., Cirne Pneus Comércio e Serviços Ltda. (Posto Cirne), Cirne Pneus Comércio e Serviços Ltda. (Posto Cirne), Cirne Pneus Comércio e Serviços Ltda. (Posto Cirne), Cirne Pneus Comércio e Serviços Ltda. (Posto Cirne), Cirne Distribuidora de Bebidas Ltda., Tirol Comércio Ltda., Joaquim Alves Flôr & Cia. Ltda. (Posto Jota Flôr I), Joaquim Alves Flor & Cia Ltda. (Posto Jota Flôr II) Joaquim Alves Flôr & Cia. Ltda. (Posto Jota Flôr III), Joaquim Alves Flor & Cia Ltda. (Posto Jota Flôr IV), M.B. Comércio e Derivados de Petróleo Ltda. (Posto Via Sul) e Petrobrás Distribuidora S/A.

Advogados: Arthur Villamil Martins, Fernando Antônio Leal Caldas Filho, Pedro Lucas de Moura Soares, Fabiano de Cristo Cabral Rodrigues e outros.

Relatora: Conselheira Polyanna Ferreira Silva Vilanova

 

           VOTO

(VERSÃO PÚBLICA)

 

 

  

EMENTA: Processo Administrativo. Cartel. Criação de barreiras à entrada por meio de ações junto ao Legislativo. Influência a conduta comercial uniforme por ações junto à mídia e aos associados de sindicato. Mercado de revenda de combustíveis automotivos no município de Natal/RN. Pareceres convergentes pela condenação por criação de barreiras à entrada por ações de lobby junto ao Legislativo. Decisão. Cartel. Ausência de provas. Arquivamento. Influência a conduta comercial uniforme. Objetivo de gestão de crise de imagem. Arquivamento. Criação de barreiras à entrada. Lobby perante Legislativo. Direito de Petição. Ausência de meios ilícitos ou enganosidade. Arquivamento.

 

 

 

Sumário

I. Introdução

II. Dos Pareceres

III. Das Defesas

IV. Dos Indícios de Infração contra a Ordem Econômica

IV.I. Indícios relacionados à suposta prática de cartel

IV. II. Indícios relacionados à suposta tentativa de criação de barreiras à entrada de concorrentes por meio de lobby junto ao Legislativo e outros órgãos públicos para impedir a aprovação do PL 411/09

IV. III. Indícios relacionados à suposta tentativa de influência a conduta comercial uniforme

V. Da Fundamentação

V.I. Da Cartelização

V.II. Da Criação de Barreiras à Entrada por meio de Lobby

V.III. Da Influência a Conduta Comercial Uniforme

Conclusão

 

 

I. INTRODUÇÃO

 

  1. Trata-se de denúncia de ações que caracterizariam três infrações contra a ordem econômica, quais sejam, (i) cartel, (ii) influência a conduta comercial uniforme, e (iii) criação de barreiras à entrada de concorrentes, todas no mercado de revenda de combustíveis no Município de Natal/RN. Tais condutas seriam tipificadas nos art. 20, I, III e IV, c/c o art. 21, I, II, IV e V, ambos da Lei n° 8.884/94, com correspondência no art. 36, incisos I, III e IV c/c seu §3º, I, II, III e IV da Lei n° 12.529/11.
  2. A acusação de participação na primeira conduta, que teria se verificado entre os anos de 2004 e 2009, recairia sobre todos os representados, com exceção do Sr. Rildeniro Medeiros, que é jornalista e não atua no setor. Já as outras duas acusações recairiam sobre o referido jornalista, sobre o Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Rio Grande do Norte (“Sindipostos”), e seus dirigentes, quais sejam, o gerente executivo Agenor Silveira Távora Neto (“Agenor Neto”), o vice-presidente Antônio Cardoso Sales (“Antônio Sales”) e o presidente José Vasconcelos da Rocha Júnior (“José Vasconcelos”). Vale ressaltar ainda que os órgãos pareceristas recomendaram a instauração de processo contra o diretor financeiro Eduardo Augusto de Viveiros Pinheiro Borges (“Eduardo Augusto”) e o arrendatário de posto Keines Alves Garcez (“Keines Garcez”), sendo que a ProCADE ainda recomendou também a inclusão das pessoas jurídicas a eles vinculadas, por auxílio a adoção de conduta comercial uniforme.
  3. Em síntese, a acusação referente a essa conduta consistiu em atos de comunicação dos representantes do sindicato com a mídia e com empresas, enquanto que a acusação de criação de barreiras à entrada referiu-se a ações junto ao Legislativo local para impedir a liberação de instalação de postos em hipermercados e supermercados no município de Natal, o que era proibido pela Lei Municipal nº 4.986/98. Essas ações ocorreram sobretudo no ano de 2011. Já a conduta de cartel teria se referido a contatos entre concorrentes e entre eles e a Petrobrás Distribuidora S/A (“Petrobrás Distribuidora”).
  4. O processo foi instaurado em 30 de abril de 2014, por meio do Despacho n° 483 (fl. 2432 do Volume 13), a partir da representação do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte.

II.  DOS PARECERES

  1. A SG concluiu que o Sindipostos e seus três dirigentes, quais sejam, Agenor Neto, Antônio Sales e José Vasconcelos, e “as respectivas pessoas jurídicas”, incorreram nas condutas passíveis de enquadramento no art. 20, I e IV, e art. 21, II e IV, da Lei nº 8.884/94. Adicionalmente, entendeu que o Sr. Rildeniro Medeiros teria incorrido na conduta de auxílio à adoção de conduta comercial uniforme, art. 20, I c/c o art. 21, II da Lei nº 8.884/94 (art. 36, I e §3º, II da Lei nº 12.529/2011).
  2. Adicionalmente, sugeriu a instauração de Processo Administrativo contra Keines Garcez e Eduardo Augusto, por auxílio à adoção de conduta comercial uniforme. Por outro lado, por insuficiência de provas, sugeriu o arquivamento do processo contra os Representados em relação ao art. 36, § 3º, I da mesma Lei, referente à prática de cartel.
  3. A ProCADE e o MPF acompanharam o entendimento da SG, com duas exceções. Primeiro, enquanto a SG recomendou a condenação dos dirigentes dos sindicatos e de suas “respectivas pessoas jurídicas”, os outros dois pareceristas recomendaram a condenação apenas das pessoas físicas. Segundo, enquanto a SG recomendou a abertura de processo apenas contra os Srs. Keines Garcez e Eduardo Augusto, no que foi acompanhada pelo MPF, a ProCADE recomendou também a abertura do processo contra as pessoas jurídicas representadas por essas pessoas físicas.
  4. O parquet pediu ainda que, em caso de condenação, fosse expedido ofício com cópia da decisão ao Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte para ciência e providências que entenda cabíveis, notadamente quanto à reparação civil dos danos decorrentes da prática ilícita, nos termos dos arts. 9º, § 2º e 47 da Lei n.º 12.529/2011.

III.  DAS DEFESAS

  1. A Representada Petrobrás Distribuidora apresentou sua defesa às fls. 2526-2669 do autos confidenciais em relação à acusação de cartelização.(Confidencial)
  2. (Confidencial).

IV. DOS INDÍCIOS DE INFRAÇÃO CONTRA A ORDEM ECONÔMICA

  1. A fim de facilitar a compreensão dos fatos, a seguir são apresentados os indícios que constam dos autos, separados por cada uma das três supostas infrações, quais sejam, cartel, criação de barreiras à entrada de concorrente por meio de ações junto ao Legislativo, e influência a conduta comercial uniforme, especialmente por meio de ações junto à mídia. Ressalto que não há uma autonomia completa entre as condutas, e é possível que um determinado indício seja considerado relevante em mais de uma infração na formação do convencimento de cada Conselheiro. Ainda assim, entendo que a divisão dos indícios por infração facilita a compreensão dos fatos, mas não retira a importância da compreensão do todo.

IV.I.  Indícios relacionados à suposta prática de cartel

36. (Confidencial)

IV.II. Indícios relacionados à suposta tentativa de criação de barreiras à entrada de concorrentes por meio de lobby junto ao Legislativo e outros órgãos públicos para impedir a aprovação do PL 411/09

44. (Confidencial)

IV.III.  Indícios relacionados à suposta tentativa de influência a conduta comercial uniforme

  1. (Confidencial)

 

V. DA FUNDAMENTAÇÃO

  1. Apresentados os pareceres, defesas e provas, segue análise sobre os fatos que poderiam configurar três infrações contra a ordem econômica, quais sejam, cartel, criação de barreiras à entrada por meio de lobby junto ao Legislativo, e influência à conduta uniforme por meio de ações junto à mídia e aos associados do Sindicato. Ao final de cada análise apresento minhas conclusões sobre a licitude das condutas.
  2. Adianto, desde já, minhas conclusões sobre as provas. No que tange ao cartel, verifica-se uma fragilidade muito grande dos indícios, o que justifica a recomendação de todos os pareceristas pelo arquivamento. Em relação ao lobby e à influência a conduta comercial uniforme, é indiscutível que houve uma atuação do Sindipostos, seus representantes e do jornalista Rildeniro Medeiros. A questão a ser analisada é se tais ações configuram infração concorrencial.

V.I.  Da cartelização

  1. Feitas essas considerações iniciais, ressalto que em relação à denúncia de cartelização, verifica-se que não há provas, ou, no máximo, clara insuficiência delas. O que se pode concluir, primeiramente, é que as discussões referiram-se a dados públicos e oficiais, não implicando em compartilhamento de informações concorrencialmente sensíveis, tais como preço ou quantidade.
  2. (Confidencial)
  3. (Confidencial)
  4. Destaque-se que essa conduta possui racionalidade econômica e é lícita, sendo algo natural do funcionamento do mercado. Abro um parêntese para apresentar algumas considerações sobre o argumento de preço abusivo, porque, embora com menor frequência, ainda há uma percepção equivocada de alguns consumidores e órgãos públicos de que o preço abusivo poderia ser uma conduta autônoma, ou seja, que uma margem de lucro elevada, ou um aumento mais significativo do preço poderia implicar em um ilícito. Essa visão, contudo, gera distorções no mercado, e um prejuízo à sociedade e ao consumidor, porque a livre variação de preços e quantidades tende a maximizar a eficiência alocativa.
  5. Nesse sentido, de forma muito clara, conforme informado pela OCDE, a Federal Trade Commission (“FTC”) e a Antitrust Division of the U.S. Department of Justice (“DOJ”) os preços abusivos não são infrações econômicas independentes. O ato das agências de regular o valor dos preços a serem cobrados pelas empresas poderia vir a gerar uma série de malefícios ao mercado e, consequentemente, aos consumidores. Seria um exemplo de efeito maléfico o desincentivo à competição e à inovação, em decorrência do fato de que a chance de cobrar um preço maior, mesmo que por um curto período, é um grande atrativo para que as empresas estejam dispostas a correrem riscos ao programarem inovações no mercado ou entrarem em um novo mercado.
  6. É destacada a grande dificuldade que uma agência reguladora teria em determinar o que seria um preço abusivo, ou margem abusiva, e como combatê-lo, dadas as variações naturais do mercado, como custo e demanda. Também foi fortemente questionado se seria competência dos órgãos antitruste determinar preços que seriam adequados a um mercado.  Ressalta-se que o preço funciona como, sobretudo, um mecanismo de sinalização, revelando, por exemplo, o quão significativa é a demanda de um produto em uma determinada região, já que aumento da demanda, em termos gerais, acompanha o aumento dos preços. Além disso, preços altos são atrativos para a entrada de novos players em um mercado, refletindo em uma maior competitividade, que acarreta, em regra, melhores condições ao consumidor em relação tanto ao preço quanto à qualidade dos produtos.
  7. É essencial para o bom funcionamento do mercado, na ausência de falhas deste, que as empresas cobrem o quanto acreditem ser mais eficiente em termos de custo-benefício. Assim, um preço só seria abusivo caso decorresse de alguma infração concorrencial, sendo que, portanto, esse abuso seria apenas um indício de infração, de modo que, finalizado o ilícito antitruste, os preços tenderiam a voltar ao do mercado normal.
  8. O argumento é análogo à discussão sobre colusões tácitas, que, em sua forma pura, sem qualquer outro fator facilitador de conluio, não é punível.  Nesse sentido, especialmente em mercados oligopolizados, o equilíbrio provável resultante da ação das empresas, agindo de forma independente, mas racional, tende a ser de preços semelhantes e supracompetitivo, tal como poderia ocorrer em um cartel. Contudo, a punição a colusões tácitas, ainda que gerem um resultado social sub-ótimo, geraria efeitos ainda mais negativos no mercado.
  9. (Confidencial)
  10. Assim, ante todo o exposto, acompanho a posição dos três órgãos pareceristas no sentido de arquivamento do processo em relação à conduta de cartel, diante da inexistência de provas. Os fatos acima relatados serviram de gatilho para o início da investigação, mas ao longo dela, não se verificou a existência da referida conduta.

 

V.II. Da criação de barreiras à entrada por meio de lobby

  1. Quanto à denúncia de criação de barreiras à entrada, a prática se deu por meio de ações especialmente junto à Câmara Municipal. O principal objetivo era impedir a aprovação do PL 411/09, que alteraria a Lei Complementar Municipal n° 4.986/98, de forma a permitir a instalação de postos de combustíveis em supermercados e hipermercados no Município de Natal. No entendimento da Superintendência-Geral do CADE, da ProCADE e do Ministério Público, essas ações teriam configurado infração contra a ordem econômica, tipificada no art. 20, incisos II, IV c/c art. 21, incisos II, e IV, da Lei nº 8.884/94.
  2. Ressalto inicialmente que é fato incontroverso a participação do Sindipostos e seus representantes, bem como do jornalista Rildeniro Medeiros, nessas atividades, ainda que posteriormente tenha que se analisar a ilicitude desses atos. (Confidencial)
  3. (Confidencial)
  4. Além desses, houve recomendação dos pareceristas no sentido de instaurar processo administrativo contra Eduardo Augusto e Keines Garcez, pois de fato houve participação deles na atividade de lobby. (Confidencial)
  5. Em que pese os evidentes prejuízos à concorrência e ao consumidor de uma lei dessa natureza, é necessário inicialmente considerar que há um conflito normativo. De um lado, há o princípio da livre concorrência, previsto no art. 170, inciso IV, da CF/88, e as normas concorrenciais, em especial, à época, a Lei nº 8.884/94, e, de outro lado, o direito fundamental de petição, previsto no art. 5o, inciso XXXIV, alínea “a”, da Constituição.
  6. Adianto que não pretendo aqui constitucionalizar a análise concorrencial, o que tenderia a gerar enorme insegurança jurídica. Reconheço e destaco que a análise jurídica realizada pelo CADE, mais fortemente apoiada na teoria e no instrumental econômicos, bem como suportada pela experiência internacional, garantiu um nível de previsibilidade e de foco na melhoria do funcionamento dos mercados que, sem dúvida, colabora para o desenvolvimento nacional. Alterar essa metodologia seria um claro retrocesso.
  7. Ocorre, contudo, que a conduta ora em análise é peculiar, e não há como não considerar que há outro valor a ser considerado e, com isso, necessário um claro exercício de ponderação. A questão pontuada é se os representados poderiam defender seus interesses econômicos por meio da tentativa de impedir a aprovação do PL 411/09 na Câmara Municipal, ainda que em claro detrimento da concorrência.
  8. Primeiramente, apresento as considerações sobre o abuso de peticionar junto ao Legislativo e Executivo na jurisprudência do CADE, ressaltando que aqui não analisarei os casos de sham litigation perante o Judiciário. O primeiro caso foi o do cartel de postos de Brasília, qual seja, Processo Administrativo nº 08000.024581/94-77, de relatoria do Conselheiro Roberto Pfeiffer; o segundo, Averiguação Preliminar nº 08012.006076/2003-72, sobre certificação de baterias do Grupo Mouro na Anatel, de relatoria do Conselheiro Luiz Prado; o terceiro, Processo Administrativo nº 08012.010648/2009-11, da Associação Brasileira da Indústria Óptica (“ABIÓPTICA”), de relatoria do Conselheiro Eduardo Pontual; e, por último, o caso mais recente, envolvendo o Sindicato Intermunicipal do Comércio Varejista de Combustíveis e Lubrificantes do Estado do Rio Grande do Sul (“SULPETRO”), que foi o Processo Administrativo nº 08012.010075/2005-94, de relatoria do Conselheiro Gilvandro Araújo.

Processo Administrativo nº 08000.024581/94-77 (cartel de postos de Brasília/DF)

  1. As condutas analisadas referiram-se à edição de lei que proibisse a instauração de postos de gasolina em estacionamentos de supermercados e hipermercados de Brasília, através de ações coordenadas junto aos Poderes Legislativo e Executivo, ações estas que restaram exitosas. Segundo consta da fl. 1900, entendeu-se que:

“Suficientes são as provas que corroboram a formação de cartel com o intuito de impedir a entrada daquela rede de hipermercados no segmento em que atuam, sendo que a ação concertada, que culminou com a edição da Lei nº 2.526/00, ocasionou danos não somente ao Carrefour, mas a outros potenciais concorrentes que ficaram impedidos de entrar no mercado. ”

  1. Os temas das reuniões sindicais eram conhecidos com antecedência, e as decisões tomadas em Assembleia deviam ser seguidas por todos os associados, que tinham ciência das decisões via fax ou correio. Consta dos autos que os Representados firmaram acordo para impedir a entrada do Carrefour, conforme se segue:

“O Senhor Carlos disse que temos de continuar trabalhando para impedir o deferimento do pedido do Carrefour” (fl.88; grifo nosso) “O Senhor Presidente comentou sobre a aprovação da construção do Posto da Rede ‘Carrefour’ tendo sido discutido consequências e soluções para o seu impedimento” - Ata de reunião da Diretoria do SINPETRO/DF (fl. 130), de 22/08/94. (Presente o representante da Rede Igrejinha; grifo nosso)“Em seguida, foi enfatizado sobre o caso Carrefour, tendo sido lido o ofício enviado a Sra. (...) da Secretaria de Viação e obras, ficando acertado entrar em contato com aquela Secretária” Ata de reunião da AGE do SINPETRO/DF (fl. 143), de 10/10/94. Presente o representante da Rede Gasol. (grifo nosso) “O Senhor Presidente informou sobre a audiência prevista para às 16:30 horas do dia 08 de março de 1994, com o Secretário de Viação e Obras do DF, (...), na qual será enfocada a pretensão da Rede de Supermercados Carrefour, no sentido de obter transformação do uso de parte de seus pátios de estacionamento para construção de Postos de Gasolina.” Ata de reunião da Diretoria do SINPETRO/DF, de 07/03/94 (fl. 75). Presentes os representantes das Redes Igrejinha e Gasol. “ CARREFOUR - O Senhor Marcos falou com o Governador (...) que o Sindicato estava formando uma comissão e iria marcar uma Assembléia em seu Gabinete. O Governador esclareceu que não seria necessário e que iria tomar providências contra a pretensão daquela Rede de Supermercados” Ata de reunião da Diretoria do SINPETRO/DF, de 21/02/94 (fl. 68; grifo nosso). Presente o representante da Rede Gasol. “O Senhor Presidente (...) informou da possibilidade da presença do Deputado (...), à presente reunião, tendo sido adiada para o próximo dia 25 de julho vindouro.” Ata de reunião da Diretoria do SINPETRO/DF, de 20/07/94 (fl.119; grifo nosso). Presentes os representantes das Redes Igrejinha e Gasol.

  1. O Conselheiro destacou, ainda, que os Representados apenas se preocupavam com a entrada de concorrente diferenciado no mercado em relação ao padrão existente, e não com a higidez do ordenamento jurídico distrital. Portanto, a pressão exercida perante os Poderes, que culminou na promulgação da Lei nº 2.526/00, que impedia a entrada de hipermercados neste mercado, foi considerada um ilícito concorrencial.

Averiguação Preliminar nº 08012.006076/2003-72

  1. A Averiguação Preliminar tratou de possível ilicitude na denúncia feita de forma coordenada por empresas produtoras de baterias junto à Agência Nacional de Telecomunicações (“ANATEL”) contra produtos do Grupo Moura, que estaria supostamente em desacordo com as normas técnicas da agência, o que foi considerado plausível por ela. O processo restou arquivado.
  2. Vale informar, contudo, considerações em voto-vista do Conselheiro Ricardo Cueva, que analisou a doutrina Noerr-Pennington, propondo três parâmetros a serem seguidos para a averiguação desta conduta, conforme consta da fl. 323:

“O primeiro parâmetro interpretativo a ser afirmado diz respeito à ampla proteção do direito de petição quando exercido na arena política. [...] numa democracia representativa a comunicação entre representados e representantes é essencial para a formação da vontade política que se traduz na legislação aprovada pelo Parlamento. Por isso, o conteúdo do que os representados informam aos representantes não é passível de controle quanto a possíveis efeitos anticompetitivos. Isso não se aplica, obviamente, às petições dirigidas ao Executivo ou aos litígios judiciais, sujeitos a regras próprias.

Um segundo parâmetro interpretativo concerne a proteção do processo decisório do Estado. Não cabe à autoridade antitruste verificar se tal ou qual decisão do Executivo ou se tal ou qual lei editada pelo Legislativo são viciadas. Para isso existem leis e competências próprias.

Em terceiro lugar, como corolário dos parâmetros anteriores, deve-se reconhecer que a capacidade de a autoridade antitruste constatar abuso de direito de petição é bastante limitada. Como nos exemplos da jurisprudência norte-americana, alguns dos critérios a serem levados em conta são a plausibilidade do direito invocado, a veracidade das informações, a adequação e a razoabilidade dos meios utilizados e a probabilidade de sucesso da postulação. ” (Grifo nosso)

         

  1. Este voto, a posteriori, serviu de base para casos subsequentes que trataram sobre a conduta de abuso do direito de petição.

Processo Administrativo nº 08012.010648/2009-11

  1. Neste caso, a ABIÓPTICA, o Sindicato do Comércio Varejista de Material Óptico, Fotográfico e Cinematográfico do Estado de São Paulo ("Sindióptica/SP") e o Sindicato do Comércio Varejista de Material Óptico, Fotográfico e Cinematográfico do Estado do Rio Grande do Sul ("Sindióptica/RS") foram denunciados por ilícito concorrencial no mercado varejista de óculos de sol – óculos escuros sem grau. Conforme consta das fls. 881-882, a SDE entendeu que:

“... a ABIÓPTICA tentou discriminar por meio de um selo de qualidade e da participação na Feira ABIÓPTICA; o Sindióptica/SP buscou a edição de normas que, no mais das vezes, simplesmente vedam a comercialização de óculos por seus concorrentes; e o Sindióptica/RS também busca a edição de normas, mas de formato diferente, além de aumentar a assimetria de informações por meio de campanhas que se pretendem apenas educativas”.

  1. No tocante ao selo de qualidade em relação a origem do produto, não foi entendida sua aplicação como infração concorrencial, mas sim como fator de distinção do produto, tendo em vista a sua aplicação para limitação à entrada em evento privado, ou seja, não havia fechamento de mercado. Houve ainda acusação de sham litigation, mas, após a verificação de parâmetros jurisprudenciais baseados na exceção à doutrina Noerr-Pennington, determinou-se o arquivamento.
  2. Nesse sentido, segundo o Conselheiro Eduardo Pontual (fls. 896-907), deveriam ser seguidos os parâmetros elencados pela doutrina e jurisprudência internacional em relação ao sham litigation, em especial os destacados pelo precedente da Averiguação Preliminar nº 08012.006076/2003-72 supracitada. Os parâmetros para averiguar esta conduta foram (i) a plausibilidade do direito invocado, (ii) a veracidade das informações, (iii) a adequação e razoabilidade dos meios utilizados e, por fim, (iv) a probabilidade de sucesso da postulação. O Conselheiro assim entendeu, in verbis:

“A preocupação concorrencial maior, que levaria a claro prejuízo injustificado a concorrência, resta na situação em que a percepção da realidade do agente público responsável pela edição do ato lesivo à concorrência é manifestada por informações inverídicas dolosamente encenadas pelas empresas privadas.”

  1. Em relação à legislação proposta pelos Requerentes, esta foi reputada com claro potencial anticompetitivo. No tocante à probabilidade de sucesso da postulação, o Conselheiro Pontual entendeu que o encaminhamento da questão ao Legislativo gera expectativa de sucesso da postulação, e por isso, não aprofundou neste quesito. Ademais, houve no processo a demonstração de que ocorreu o questionamento das leis vigentes ao tempo da conduta, sendo estas já submetidas ao controle de constitucionalidade estadual, o que comprovaria a plausibilidade do direito invocado pelas Requerentes ao Legislativo (fls. 902-903):

“As Sindiópticas foram acusadas de buscar restringir o varejo de óculos escuros apenas a ópticas. Entretanto, conforme comprovado pela requerente Sindiópticas/SP, tal restrição conta com o apoio de autoridades públicas incumbidas de zelar pela saúde ocular da população as quais também aconselham a compra de óculos de sol somente em óticas. ” (Grifo nosso)

  1. O trecho mostra que os Requerentes possuíam, também, o posicionamento favorável do próprio Poder Público, o qual aconselhava a compra de óculos de sol somente em óticas, o que se encaixava na pretensão dos Requerentes de promulgar lei neste sentido, restando clara a plausibilidade do direito invocado. Por fim, ainda sobre este parâmetro, o Conselheiro destacou que os Requerentes não buscavam inovar o ambiente jurídico brasileiro, pois haveria restrições semelhantes em lei nacional há sete décadas, o que afastaria a imputação de má fé.
  2. Em relação à veracidade das informações, entendeu haver prova de tentativa de orientação do Parlamento com base em informações inverídicas, ou de que os pleitos tinham o cunho de fortalecer conluio de empresas contra concorrentes. Ademais, destacou que apesar da SDE ter criticado a racionalidade da argumentação dos Requerentes, não “foi provada falsa representação de fato, nem que lançaram mão de meios ilegais ou condenáveis, em razão do que não é possível se falar em ilicitude na promoção das pretensões”. Ao final, concluiu:

“Quanto à adequação dos meios utilizados, que foi o de postular ao Parlamento, a via eleita para fazer valer a pretensão é, de fato, a via correta para a pretensão das requerentes, que é restringir o varejo de óculos escuros em ópticas. Em uma democracia representativa não cabe outro locus para buscar criar direitos específicos, mesmo frente a contradição com legislação atual. ”

  1. Feita a análise dos quatro parâmetros e visto que não havia condutas que se enquadrasse na reprovabilidade dos critérios, o Processo Administrativo em análise foi arquivado.

Processo Administrativo nº 08012.010075/2005-94

  1. Mais recentemente, referente ao caso SULPETRO, de relatoria do Conselheiro Gilvandro Araújo, instaurou-se Processo Administrativo em razão de supostos indícios de influência nos Poderes Legislativo e Executivo dos municípios do Rio Grande do Sul para aprovação e leis com o fim de impedir a instalação de postos revendedores de combustíveis em grandes centros comerciais da região.  No referido processo, o entendimento foi no sentido de que o lobby em si não seria ilícito concorrencial, no entanto, também ficou claro que esse direito referente à liberdade de expressão política apresenta limitações, devendo atender aos princípios de boa-fé, razoabilidade e responsabilidade presentes no ordenamento brasileiro.
  2. Deste modo, ao direito antitruste não caberia punir agentes que buscam convencer o Legislativo ou o Executivo a criar ou alterar leis que possam restringir o comércio, mas sim punir condutas de caráter anticoncorrencial, como é o caso da Sham litigation - abuso do direito de peticionar. Para configurar o sham litigation, deve-se analisar se houve ou não abuso do direito de peticionar, que é dividido pela doutrina e jurisprudência do Cade por meio da análise (i) da probabilidade de sucesso da postulação, (ii) plausibilidade do direito invocado, (iii) veracidade das informações e (iv) adequação e razoabilidade dos meios utilizados. Além disso, segundo o Relator, a caracterização como abuso de direito que gere impactos no meio concorrencial exige critérios objetivos, não sendo apropriado utilizar como base elementos subjetivos de probabilidade ou plausibilidade.
  3. Referente ao caso concreto, o argumento por parte do SULPETRO e de seus dirigentes relatando a possível ameaça de supermercados, hipermercados e shopping centers estava pautada na vantagem competitiva decorrente da alíquota reduzida do ICMS, tendo em vista que eles utilizavam o mesmo CNPJ para os postos e para suas atividades regulares. Assim, segundo o Relator, o exercício do direito de influenciar o Legislativo e Executivo seria lícito.
  4. Outro fato observado foi que o SULPETRO atuou ativamente perante os dois Poderes com a intenção de estimular a elaboração de legislações que disciplinassem a instalação de postos de combustíveis. As atas demonstraram que o SULPETRO debatia com seus associados projetos de lei que estabelecessem regras tributárias, de segurança e de meio-ambiente no setor, não havendo nessas indagações quaisquer elementos que demonstrassem falsidade, e, portanto, que caracterizem um ilícito. Em razão da falta de elementos objetivos para a materialização de conduta voltada a prejudicar concorrentes ou a impedir a entrada de novos agentes econômicos no mercado em questão, o caso foi arquivado.

Conclusões sobre sham litigation junto ao Legislativo

  1. Ante o exposto, percebe-se que a jurisprudência do CADE em relação ao abuso do direito de petição perante o Legislativo vem evoluindo, sendo que o primeiro voto que se destacou em termos de precedentes por sistematizar parâmetros interpretativos é o voto-vista do Conselheiro Ricardo Cueva na Averiguação Preliminar nº 08012.006076/2003-72. Em seguida, constam considerações adicionais especialmente no voto do Conselheiro Eduardo Pontual no Processo Administrativo nº 08012.010648/2009-11, e do Conselheiro Gilvandro Araújo, no Processo Administrativo nº 08012.010075/2005-94.
  2. Em suma, no primeiro caso, houve condenação com base apenas nas provas de que os Representados agiram fazendo pressão sobre o Poder Público. Já nos três casos seguintes, os Conselheiros Cueva, Pontual e Gilvandro analisaram a questão sob a égide da doutrina Noerr-Pennington e destacaram parâmetros interpretativos, com alguma variação, para determinar a condenação, fundamentada no cabimento da exceção à essa doutrina. Basicamente, os parâmetros são: (i) a plausibilidade do direito invocado; (ii) a veracidade das informações; (iii) a adequação e razoabilidade dos meios utilizados; e (iv) a probabilidade de sucesso da postulação.
  3. No presente caso, não há dúvidas de que houve movimento por parte do Sindipostos e de seus representantes, bem como pelo jornalista Rildeniro Medeiros, no sentido de impedir a aprovação da nova lei. Entendo também que não há dúvidas de que a referida restrição é socialmente indesejável, pois implica em restrição à concorrência, sem qualquer benefício à sociedade, com exceção aos proprietários de postos. Entretanto, entendo que essas ações, apesar de talvez censuráveis de um ponto de vista ético, por objetivarem um benefício próprio em detrimento dos consumidores, são legais, por dois motivos.
  4. O primeiro é que os Representados não almejaram a criação de uma lei que viesse a restringir a concorrência. Na verdade, o parlamento municipal já havia aprovado uma lei em 1999, que restringia a abertura de postos em supermercados, hipermercados e shopping centers no município de Natal. Essa lei, por mais deletérios que possam ter sido seus efeitos, naturalmente passou pelo crivo dos representantes do povo, e poderia ter sido questionada por diferentes órgãos de controle. Na verdade, em 2011, o Ministério Público Estadual ingressou com a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 0009130-02.2011.8.20.0000, contra referida lei. Considerando que em 2013 o próprio Legislativo retirou a restrição a supermercados e hipermercados, mantendo a quanto a shopping centers, a ação perdeu parte do objeto, mas o Tribunal de Justiça do Estado reconheceu a inconstitucionalidade da lei nessa parte, tanto em relação à Constituição Estadual quanto à Federal, por ofensa aos princípios da livre concorrência, democracia econômica, da proporcionalidade, bem como da incompatibilidade com as normas que regem a política nacional das relações de consumo. Fato é, contudo, que essas restrições se mantiveram por mais de uma década e os Representados apenas buscaram sua manutenção. Assim, entendo que seria menos grave uma ação no sentido de preservar uma lei já existente do que tentar a inserção de uma nova no ordenamento jurídico.
  5. O segundo, diz respeito à ação junto ao Legislativo, ressaltando que não verifiquei a utilização de qualquer ato inequivocamente ilícito ou enganoso por parte dos Representados. Se o legislador local optou por manter a proibição, naturalmente influenciado por um determinado grupo de interesse, ele o fez por uma decisão política consciente de suas consequências, e, caso houvesse qualquer questionamento de afronta da referida lei à Constituição, há meios claros para o devido controle jurídico de constitucionalidade. Esse raciocínio vale tanto para o Sindipostos quanto para seus representantes e para o jornalista Rildeniro Medeiros, no que tange à sua atuação de lobby, lembrando que o último também atuou junto à mídia, o que será analisado em seguida. Pensar que tal ação constituiria um ilícito per se implicaria na abertura de processos administrativos nas mais diversas áreas.
  6. Assim, é inegável que o resultado pretendido por esse lobby é sabidamente negativo para a concorrência e para o consumidor. Entretanto, conforme já dito, segundo a doutrina Noerr-Pennington e a própria Constituição Federal, o direito de acesso ao Legislativo deve ser preservado e, sua exceção, em caso de condenação por algum ilícito concorrencial, deve ocorrer apenas nos casos em que haja prova clara e irrefutável de que houve meio fraudulento ou enganoso nas influências exercidas sobre os agentes do poder público.
  7. Ressalto que a democracia tem suas imperfeições, mas o CADE e outros entes estatais devem ser ponderados para não querer transformar a democracia em tecnocracia. Se o processo legislativo ocorreu de forma regular, o limite de ação dos órgãos técnicos é limitado. Se a lei é inconstitucional, o que entendo ser o caso, cabe ao Judiciário declará-la como tal, preferencialmente de forma célere, a fim de evitar que os danos à sociedade se prolonguem no tempo. Dito isso, entendo que no presente caso não se verificou um ilícito concorrencial.

 

V.III. Da influência a adoção de conduta comercial uniforme

  1. A terceira potencial infração apontada seriam as ações do sindicato, dos seus representantes e do Sr. Rildeniro junto à mídia e associados. Em alguma medida, essas ações estão relacionadas à atuação de lobby no Legislativo, o que já concluí que foram legítimas, mas optei por fazer a análise em separado porque as ações junto à mídia, ao menos potencialmente, distorcem o funcionamento regular do mercado, podendo impactar nos preços e quantidades, gerando ineficiências alocativas e redução do bem estar do consumidor e da sociedade como um todo.
  2. De forma mais individualizada, entendo que é fato incontroverso, no que tange às ações junto à mídia, a participação do Presidente do Sindipostos, Sr. José Vasconcelos, consequentemente também do Sindipostos, e do jornalista Rildeniro Medeiros. Quanto aos demais dirigentes, não há indícios claros. (Confidencial)
  3. Ressalto novamente, contudo, que é necessário analisar se de fato essas ações configurariam uma infração contra a ordem econômica. Teoricamente, entendo que os efeitos de uma ação junto à mídia justificando aumento de preços podem ser semelhantes aos obtidos com o tabelamento, ou seja, geraria sim uma tendência à elevação artificial dos preços. A jurisprudência do CADE é pacífica no sentido da condenação de tais atos, porque efetivamente os efeitos são deletérios e dificilmente há algum benefício compensatório.
  4. Em princípio, a atuação dos referidos Representados constituiria uma infração contra a ordem econômica, porque não cabe a um sindicato, direta ou indiretamente, o papel de justificar aumentos de preços no setor. Ocorre, contudo, que há uma particularidade a ser considerada, que foram os movimentos contra o aumento do preço de combustível, como explicado pela SG:

12. Os fatos que deram origem ao presente feito remontam a junho de 2009, quando, em virtude de forte  mobilização  da  sociedade  contra  os  altos  preços  dos  combustíveis praticados  na  cidade  de  Natal,  foi  lançado  o  movimento  Combustível  Mais  Barato  Já, capitaneado pelo Promotor de Justiça do Direito do Consumidor da Comarca de Natal, José Augusto Peres Silva, e pelo diretor do Procon, Araken Farias. O MP criou uma força-tarefa para fiscalizar os postos de combustíveis e o Procon passou a exigir notas fiscais de compra e venda, o que resultou na autuação de 24 postos por aumento abusivo de preços.

13.  Naquele mesmo ano, o vereador Ranieri Barbosa apresentou à Câmara Municipal de Natal o Projeto de Lei nº 411/09 (...).
14.  Em  30  de  dezembro  de  2009  foi  instaurado  pela  Polícia  Federal  o  Inquérito Policial nº 1000/2009, que tinha por objeto investigar a ocorrência do crime tipificado no art. 4º, I, “a” da Lei nº 8.137/90 no setor de revenda de combustíveis do município de Natal.  
15.  No âmbito do aludido inquérito policial foi levada a cabo a Operação Hefesto (...).16.  Em abril de  2011  novo  movimento  contra  os  preços  de  combustíveis  foi organizado em Natal, desta vez com a mobilização popular por meio da rede social twitter, depois  de  um  novo  aumento  dos  preços  do  etanol  e  da  gasolina.  O primeiro  protesto  foi marcado para o dia 08 daquele mês, no posto São Luiz, na avenida Prudente de Morais. Os organizadores programaram fazer uma grande fila no posto para abastecer o carro das seguintes maneiras: (i) abastecer o carro de R$ 1,00 em R$ 1,00 e pedir o teste de qualidade; (ii) colocar R$ 1,00 de combustível e pedir troco para R$ 100,00; (iii) colocar R$ 4,00 e pagar com cartão de crédito; (iv) abastecer usando moedas e pedir o troco quebrado; (v) pedir nota fiscal em todos os abastecimentos.

  1. Verifica-se que o mercado estava em crise, não de oferta e demanda, mas sim porque havia uma organização dos consumidores e do Estado contra o que seria supostamente um aumento abusivo de preços. Se ações coordenadas de empresas e/ ou sindicatos geram prejuízos ao mercado, essas ações por parte do Estado e dos consumidores também podem gerar.
  2. Como informado acima, preço abusivo não é uma infração autônoma, e os proprietários de postos de gasolina estavam sendo prejudicados indevidamente pelo “movimento combustível mais barato já”. As notícias abaixo informam sobre o movimento, com participação de órgãos estatais, restringindo o livre funcionamento do mercado.

 

  1. Considerando essas informações, entendo serem plenamente justificáveis as ações junto à mídia, a fim de preservar até mesmo a segurança das empresas e seus funcionários, bem como a própria concorrência. Assim, a contratação de um jornalista para realizar uma “gestão de crise” foi justificada, não se confundindo com uma ação do sindicato para facilitar um aumento de preços por parte dos associados, o que seria um ilícito concorrencial. Dessa forma, igualmente entendo que o processo deva ser arquivado também com relação a essa conduta.
  2. Por fim, considerando meu entendimento de que as ações acima analisadas não configuraram ilícito concorrencial, não acompanho a sugestão dos órgãos pareceristas no sentido de determinar a instauração de processo contra outros agentes do mercado. Para relembrar, a Superintendência-Geral e o Ministério Público Federal recomendaram a instauração de Processo Administrativo contra os Srs. Keines Alves Garcez e Eduardo Augusto de Viveiros Pinheiro Borges, enquanto que a ProCADE recomendou a abertura de processo contra eles e também das pessoas jurídicas dos quais são sócios. Não há dúvida da participação deles, pessoas físicas, nas ações acima analisadas, mas por uma questão de coerência com o exposto no voto, no sentido da licitude das ações, entendo incabível a instauração de novo processo.

 

CONCLUSÃO

          Ante o exposto, voto pelo arquivamento do processo em relação à conduta de formação de cartel, criação de barreiras à entrada e influência a conduta comercial uniforme. Por fim, destaco que a Superintendência-Geral e o Ministério Público Federal recomendaram a instauração de Processo Administrativo contra os Srs. Keines Alves Garcez e Eduardo Augusto de Viveiros Pinheiro Borges, enquanto que a ProCADE recomendou a abertura de processo contra eles e também contra as pessoas jurídicas dos quais são sócios. Contudo, por decorrência lógica do exposto no voto e da conclusão pelo arquivamento, voto pela não determinação de instauração de novo processo.

Brasília, 13 de dezembro de 2017.

                                                                                                                                POLYANNA FERREIRA SILVA VILANOVA

                                                                                                                                                   Conselheira Relatora 

      

 


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Documento assinado eletronicamente por Polyanna Ferreira Silva Vilanova, Conselheiro(a), em 15/12/2017, às 10:21, conforme horário oficial de Brasília e Resolução Cade nº 11, de 02 de dezembro de 2014.


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Referência: Processo nº 08700.000625/2014-08 SEI nº 0420947