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Ministério da Justiça e Segurança Pública - MJSP

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Ato de Concentração nº 08700.003855/2020-69

Requerente(s): BRF S.A. e UPFIELD Brasil Holding Ltda.

Advogados(as): Priscila Brolio Gonçalves, Camila Pires da Rocha, Gabriel Mattioli de Miranda, Ana Paula Martinez e Alexandre Ditzel Faraco

Terceiro(s) Interessado(s): Seara Alimentos Ltda.

Advogados(as): Marcos Paulo Veríssimo e Ana Carolina Lopes de Carvalho

Relator(a): Conselheiro Mauricio Oscar Bandeira Maia

VOTO DO RELATOR – CONSELHEIRO MAURICIO OSCAR BANDEIRA MAIA

VERSÃO DE ACESSO público

Ementa: ATO DE CONCENTRAÇÃO. RITO SUMÁRIO. LICENCIAMENTO DE USO EXCLUSIVO, DISTRIBUIÇÃO E PRODUÇÃO de produto. CONTRATO ASSOCIATIVO. OPERAÇÃO REALIZADA NO BRASIL. MERCADO DE MARGARINAS. ABRANGÊNCIA NACIONAL. AUSÊncia de preenchimento do requisito temporal DO ART. 2º, CAPUT, da resoluçÃo CADE Nº 17/2016. DESCARACTERIZAÇÃO COMO JOINT VENTURE CONTRATUAL. nÃO CONHECIMENTO DA OPERAÇÃO. RECURSO DE TERCEIRO INTERESSADO. CONHECIMENTO E NÃO provimento.  

Operação que se enquadra como contrato associativo, considerando suas características de estabelecimento de empreendimento conjunto para um fim comum, o compartilhamento dos riscos e resultados entre os dois agentes envolvidos, bem assim a atuação das duas empresas como concorrentes no mercado nacional de margarinas.

Ausência de estruturação de empresa comum, necessária para o enquadramento como joint venture.

Joint ventures figuram como espécies do gênero contrato associativo, de forma que, para fins de notificação ao CADE, deve-se considerar o preenchimento de todos os requisitos previstos pela Resolução CADE nº 17/2016.

O não atendimento do requisito temporal previsto pelo art. 2º, caput, da Resolução CADE nº 17/2016 enseja o não conhecimento da Operação, implicando, destarte, a não obrigatoriedade de sua notificação ao CADE.

voto

i. requerentes

I.1. BRF S.A. (“BRF”)

A BRF é uma companhia aberta brasileira, com foco na industrialização, comercialização e exploração de alimentos em geral, principalmente aqueles derivados de proteína animal e que utilizem a cadeia de frios como suporte e distribuição[1], em território nacional e internacional. Seu principal ramo de atuação se dá mediante a criação, abate e produção de aves, suínos e bovinos, com a posterior industrialização, comercialização e distribuição de carnes in natura, produtos processados, massas, vegetais congelados e derivados de soja.

Dentre as atividades especificamente exercidas pela BRF estão a de industrialização, refinação e comercialização de óleos vegetais, gorduras e laticínios. Especificamente no setor de margarinas, a BRF atua em âmbito nacional, incluindo as marcas Qualy, Claybom e Deline.

Ainda segundo as requerentes, a BRF é parte do Grupo BRF, que atua em território nacional também nos segmentos de nutrição de plantas, por meio da produção de fertilizantes, health care, produtos agropecuários, ativos florestais, energia elétrica e setor imobiliário. Além disso, detém participações em holdings e outros negócios não relacionados com o objeto da operação.

I.2. UPFIELD Brasil Holding Ltda. (“Upfield”)

A Upfield é a subsidiária brasileira da Upfield Holdings BV, holding do Grupo Upfield. Ainda, é considerada parte do grupo KKR, tendo em vista que [ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES]. 

O Grupo Upfield atua na produção e venda de produtos para nutrição baseados em vegetais em diversos países, porém, no Brasil, possui atuação limitada por meio da marca de margarina Becel e direitos a ela relacionados. Sua produção em território nacional se dá a partir de arranjos contratuais com terceiros que detenham capacidade produtiva e redes de distribuição próprias, uma vez que a Upfield não possui unidades de produção ou redes de distribuição no Brasil.

Por outro lado, a KKR é uma firma global de investimentos, oferecendo ampla gama de fundos de ativos alternativos e produtos de investimentos, além de fornecer soluções de mercado de capital para a firma, empresas de seu portfólio e demais clientes. O grupo KKR, contudo, não possui atuação nacional no mercado de margarinas.

ii. Da Operação

A operação consiste no licenciamento, pela Upfield à BRF, do uso exclusivo da marca Becel no Brasil para a produção e distribuição de margarinas, pelo período pré-estabelecido de 12 (doze) meses e sem previsão de renovação.

Conforme consta no Contrato de Prestação de Serviços, Produção, Venda e Licenciamento de Marca e outras Avenças assinado pelas requerentes em 13.08.2020, caberá exclusivamente à Upfield a gestão estratégica do negócio, e à BRF apenas atribuições operacionais envolvendo a produção e distribuição do produto, conforme se extrai das cláusulas 2, 3, 4, 5 e 6 do contrato.

[ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES]

Quanto à racionalidade econômica, as requerentes informam que a operação se justifica para a Upfield como uma forma de reposicionamento no mercado brasileiro de margarinas.

[ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES]

A operação foi notificada ao CADE no dia 17.08.2020, tendo as requerentes estabelecido no contrato o prazo de 15 (quinze) dias contados da data da submissão para o início dos atos consumativos.

iii. Terceira Interessada – Seara Alimentos Ltda. (“Seara”)

No dia 09.09.2020, a Seara requereu sua habilitação nos autos como terceira interessada (SEI nº 0802557). Quanto à legitimidade para o seu ingresso, informou ser atuante no mercado de margarinas (dentre outras atividades exercidas nos segmentos de processamento e distribuição de produtos de proteína de aves e suína, além de carnes in natura), e figurando, portanto, como concorrente das requerentes.

 Na mesma ocasião, a Seara afirmou que a Operação poderia afetar parcela substancial da concorrência no mercado de margarinas, apresentou argumentos quanto à subsunção da operação aos critérios legais de notificação, apontou as preocupações concorrenciais que seriam geradas e requereu a imposição de multa por consumação antecipada da Operação.

Ao longo da instrução, a Seara trouxe nova manifestação (SEI nº 0809194) acompanhada de Nota Técnica elaborada pela M&A Consultoria, “que comprova que há elementos suficientes para indicar que a Operação gera efeitos anticompetitivos no mercado nacional de margarinas”, além de novas informações que corroboravam os argumentos anteriormente apresentados.

Quanto à natureza da operação, a Seara pontuou que: 

A Operação seria de notificação obrigatória ao CADE, nos termos da Lei nº 12.529/2011, tendo em vista que o contrato firmado entre as requerentes se assemelharia a uma “joint venture contratual”, por implicar na transferência de market share e de poder de mercado. Essa circunstância afastaria sua condição de mero contrato associativo, tornando o critério de duração do contrato previsto pela Resolução nº 17/2016 irrelevante, e impondo sua devida notificação e análise pelo CADE;

Por entender ser de notificação obrigatória, as requerentes não poderiam consumar a operação antes de sua análise pelo CADE, e mesmo que se tratasse de um caso que não gerasse preocupações concorrenciais, a infração de gun jumping estaria caracterizada (o que importaria na instauração de APAC para a apuração de infração ao art. 88, § 3º, da Lei de Defesa da Concorrência).

Em relação às preocupações concorrenciais, a Seara entende que a Operação seria capaz de gerar concentração horizontal entre as atividades das requerentes, reduzir a rivalidade e aumentar as barreiras à entrada no mercado de margarinas, o que resultaria em um aumento da probabilidade de exercício de poder de mercado da BRF (líder no mercado) e na redução da competição.

Segundo as informações e dados de market share, HHI, evolução de preços e volume vendido, características das marcas, índices de dominância e correlações entre as participações de mercado das empresas levantados pela Seara, os principais pontos que identificou foram: 

A BRF manteve sua participação de mercado próxima a 60% nos últimos 5 (cinco) anos, de forma que a Operação possibilitaria à BRF retomar papel importante da marca Becel para barrar o crescimento da sua principal rival, a Vigor, e assim contaria com incentivos a manter ou incrementar sua liderança no mercado de margarinas;

As marcas de margarina da BRF, Qualy e Deline, seriam as que apresentam menor coeficiente de variação entre 2015 e março de 2020, denotando poder de mercado da BRF e a dificuldade em rivalizar com a empresa;

A Operação dificultaria o crescimento de marcas com ociosidade e capital para investir em marketing e na expansão da distribuição, como a Vigor;

O índice de dominância da BRF indicaria que a Operação reduz o grau de rivalidade do mercado, considerando seu distanciamento como líder dos demais players;

O aumento das barreiras à entrada seria verificado a partir do impedimento do licenciamento da marca Becel para entrantes não comprometidos (como fabricantes de óleos vegetais e manteiga) com acesso a canais de distribuição e relacionamento com clientes.

Por fim, a Seara reiterou que a Operação teria o condão de alterar a estrutura do mercado diante otimização da capacidade instalada disponível da BRF e do próprio reconhecimento da empresa de que a experiência prévia com a marca Becel (entre 2007 e 2018) lhe traria vantagens.

IV. Do Parecer da SG quanto à análise de conhecimento.

Como se extrai do Parecer nº 70/2021 elaborado pela Superintendência Geral, a análise de conhecimento se pautou na verificação do enquadramento do ato de concentração pela natureza da Operação e, posteriormente, do preenchimento dos requisitos de notificação obrigatória de acordo com o enquadramento fixado.

A partir da divergência de posicionamentos apresentados nos autos – de um lado, as requerentes alegando se tratar de contrato associativo e, de outro lado, a Seara defendendo configurar um contrato com natureza de “joint venture contratual” – a SG teceu uma ampla análise quanto à classificação das joint ventures no contexto concorrencial brasileiro e o entendimento deste CADE a respeito da matéria.

Verificando a existência de dois tipos de joint ventures, a societária e a contratual, a SG observou que aquela destacada no art. 90, IV, da Lei de Defesa da Concorrência se consubstanciaria na joint venture societária, de modo que a denominada joint venture contratual seria uma espécie de sinônimo de contratos associativos.

Por esse motivo, o enquadramento da Operação se daria a partir da natureza de um contrato associativo, cuja análise ocorre de acordo com os requisitos da Resolução nº 17/2016. O não conhecimento da Operação se deu, portanto, em decorrência do não preenchimento do requisito temporal identificado no art. 2º, caput, uma vez que o contrato em tela tem duração de apenas 12 (doze) meses.

Ainda, a SG afastou a necessidade de abertura do APAC requerido pela Seara por concluir que a Operação não era de notificação obrigatória (fato esse que elide a preocupação quanto à consumação prévia dos atos pelas requerentes). 

Cumpre salientar que a conclusão pelo não conhecimento da Operação obsta a necessidade de análise de mérito quanto a possíveis riscos concorrenciais, mormente quando o próprio estudo dos termos do contrato e das informações complementares permitem essa constatação pelo órgão avaliador.

A esse respeito, a SG assinalou que, mesmo que a operação fosse conhecida, os dados apresentados nos autos não revelam indícios de alterações relevantes na dinâmica concorrencial, especialmente pelo fato de que [ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES].

Não obstante as considerações feitas pela Superintendência, passo a analisar os requisitos de conhecimento da Operação.

V. Dos fatos abordados nos autos e das obrigações previstas no contrato.

Inicialmente, pontua-se que os requisitos de faturamento para notificação de operações a este CADE – estabelecidos pelo art. 88 da Lei nº 12.529/2011 e alterados pela portaria interministerial MJ/MF nº 994/2012 – são cumpridos pelas requerentes. Resta analisar, portanto, a natureza do contrato firmado entre as partes, para fins de verificação da obrigatoriedade de sua submissão à análise perante esta Autarquia.

Na forma do art. 90, IV, da Lei de Defesa da Concorrência, realiza-se um ato de concentração quando 2 (duas) ou mais empresas celebram contrato associativo, consórcio ou joint venture.  

Nesse contexto, as requerentes notificaram a presente Operação ad cautelam, pois ainda que enquadrado sob a natureza de contrato associativo, o acordo firmado entre as partes não preencheria o requisito objetivo de duração mínima de 2 (dois) anos previsto pela Resolução CADE nº 17/2016.

Conforme prevê o art. 2º da Resolução em comento, para que um contrato associativo seja notificado ao CADE, é preciso que preencha 4 (quatro) requisitos, quais sejam: (i) requisito temporal de duração igual ou superior a dois anos; (ii) estabelecimento de empreendimento comum para exploração de atividade econômica; (iii) compartilhamento dos riscos e resultados da atividade econômica que constitua objeto do contrato; e (iv) as empresas envolvidas devem ser concorrentes no mercado relevante objeto do contrato. Vejamos:

 

Art. 2º Considera-se associativos quaisquer contratos com duração igual ou superior a 2 (dois) anos que estabeleçam empreendimento comum para exploração de atividade econômica, desde que, cumulativamente:

I - o contrato estabeleça o compartilhamento dos riscos e resultados da atividade econômica que constitua o seu objeto; e

II - as partes contratantes sejam concorrentes no mercado relevante objeto do contrato.

§1º Para os efeitos desta Resolução, considera-se atividade econômica a aquisição ou a oferta de bens ou serviços no mercado, ainda que sem propósito lucrativo, desde que, nessa hipótese, a atividade possa, ao menos em tese, ser explorada por empresa privada com o propósito de lucro.

O requisito de estabelecimento de empreendimento comum depende do grau e da forma de cooperação exercida entre as empresas, e cuja análise das cláusulas contratuais da presente Operação permitem concluir pelo seu preenchimento.

A delimitação de um “empreendimento comum” se dá a partir da verificação de uma estrutura de governança que coordene as decisões das partes, que se darão de forma conjunta, exatamente na linha jurisprudencial desta Autarquia. Confira-se, a respeito, o seguinte trecho extraído do voto do ex-conselheiro João Paulo de Resende nos autos do Ato de Concentração nº 08700.002276/2018-84 (Tim Celular S.A e Oi Móvel S.A):

Empreendimentos comuns nem sempre são denominados como tal no instrumento contratual. É preciso entender se há de fato um empreendimento comum decorrente da relação entre as partes, independentemente se tal nome é atribuído ao resultado da relação comercial.

A jurisprudência do CADE tem evoluído na delimitação deste conceito, sendo que as decisões mais recentes[1] têm exigido que a atividade objeto do contrato possa ser prestado de forma isolada e que haja alguma estrutura de governança a reger decisões conjuntas das partes. Ou seja, busca-se distinguir os casos em que as empresas decidem de forma isolada onde e como construir, configurar e operar seus ativos (no caso em tela, suas redes), daqueles casos em que essas atividades ocorrem de forma coordenada, contratualmente ou não.

 

Veja nesse mesmo sentido o entendimento da Superintendência-Geral no Parecer nº 4/2017, elaborado no âmbito do Ato de Concentração nº 08700.002529/2017-39:

Trata-se, como escrito na norma, de um empreendimento comum, semelhante ao exercício conjunto de uma “empresa” (na correta conceituação do direito societário, em que “empresa” é a atividade e não a pessoa física ou jurídica que a exerce, que é o “empresário”), só que por uma via contratual e não por laços societários.

E esse requisito pode ser verificado na seguinte cláusula, que conta com [ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES]

[ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES]

 

[ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES].

[ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES].

[ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES]

Quanto ao requisito relativo ao compartilhamento dos riscos e resultados da atividade econômica que constitua objeto do contrato, é certo que ele vai além da mera repartição de lucros ou custos, e não se confunde com a simples verificação de receitas, faturamentos e prejuízos do ponto de vista contábil.

Como se extrai de precedentes deste CADE[2], o compartilhamento de riscos e resultados em um contrato associativo representa a identificação da participação de uma parte no resultado obtido pela outra, como no pagamento por desempenho ou com base na receita decorrente das vendas da parte que receberá os produtos fornecidos.

No caso concreto, o contrato firmado pelas requerentes prevê que  [ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES]

[ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES]

A esse respeito, também se extrai do voto do ex-Conselheiro João Paulo de Resendo nos autos do AC nº 08700.002276/2018-84 que o “compartilhamento de riscos e resultados não se dá necessariamente pelo lado da receita, podendo se dar também pelo lado da despesa”, que é exatamente a circunstância observada no contrato firmado entre as requerentes. Conclui-se, portanto, pelo devido preenchimento do requisito de compartilhamento de riscos e resultados.

Por fim, as empresas requerentes são concorrentes no mercado de produção e comercialização de margarinas em território nacional, restando preenchido o requisito previsto pelo art. 2º, II, da Resolução nº 17/2016.

Partindo das considerações feitas alhures, observa-se que, apesar de possuir a natureza de um contrato associativo, o acordo firmado não preenche o requisito objetivo de temporalidade mínima de 2 (dois) anos, motivo pelo qual não é de notificação obrigatória a este CADE.

No entanto, a controvérsia estabelecida pela terceira interessada Seara foi no sentido de que o contrato em questão envolveria o licenciamento de marca para uso exclusivo e implicaria em mais do que um mero contrato de manufatura por encomenda, isto é, acarretaria na transferência de market share e de poder de mercado para a BRF, com uma consequente concentração horizontal entre as requerentes.

Por esse motivo, a Seara entende que o contrato em questão não se trata de apenas um contrato associativo, mas sim se assemelharia a uma “joint venture contratual”, importando em necessária notificação a este CADE, independentemente do critério de duração.

Antes de se adentrar na diferenciação existente entre joint ventures e contratos associativos, com vistas a sanar as dúvidas existentes em relação a estas duas modalidades de negócio jurídico, impende realizar um breve retrospecto acerca da evolução do entendimento deste CADE acerca de contratos associativos, bem como os motivos pelos quais foram estabelecidos os requisitos presentes na Resolução nº 17/2016, mormente no tocante ao requisito objetivo temporal. 

vi. Evolução do entendimento quanto aos contratos associativos e estabelecimento de critérios de notificação ao CADE. Da Resolução nº 14/2010 à Resolução nº 17/2016.

Extrai-se do art. 54 da antiga Lei de Defesa da Concorrência – Lei nº 8.884/1994 – que a submissão de operações para análise do CADE se baseava genericamente nos atos que pudessem “limitar ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência, ou resultar na dominação de mercados relevantes de bens ou serviços”.

O antigo diploma legal possuía, portanto, uma redação muito ampla quanto à caracterização de atos de concentração, além da própria ausência de critérios objetivos para sua notificação à autoridade de defesa da concorrência. Esse fato, além de gerar insegurança jurídica, dificultava que os administrados compreendessem com precisão quais negócios jurídicos deveriam passar pela análise e aprovação do CADE.

Um dos avanços que a Lei nº 12.529/2011 trouxe em relação à lei antiga foi exatamente o de objetivar as hipóteses de atos de concentração que deveriam ser submetidos ao escrutínio da autoridade de defesa da concorrência, tornando mais eficiente o controle prévio de estruturas ao possibilitar que os agentes econômicos identificassem com clareza as operações de notificação obrigatória.

Não obstante a objetivação dos critérios de notificação de operações ao CADE com o fim de dar mais eficiência ao controle de estruturas, é certo que a Lei antitruste não os atribuiu para privilegiar a forma da operação em detrimento de sua possibilidade de alteração da concorrência nos mercados.

Nessa toada, extrai-se do Voto do ex-Conselheiro Marcos Paulo Veríssimo no Ato de Concentração nº 08012.002870/2012-38 que a configuração de um Ato de Concentração econômica pode ocorrer de (a) concentrações formais de empresas, como merges and acquisitions e a (b) criação de novas sociedades, além de (c) arranjos puramente contratuais, que não envolvam a criação de uma nova empresa – isto é, não depende de fórmulas prévias, devendo ser avaliada na realidade sua capacidade de produção de concentração econômica.

Ao definir em seu art. 88 o enquadramento de operações como atos de concentração notificáveis ao CADE, a nova Lei de Defesa da Concorrência incluiu os contratos associativos no inciso IV . No entanto, a norma não definiu os critérios de enquadramento de contratos como associativos, de forma que a problemática de indefinição quanto à notificação de certos gêneros de negócios jurídicos ao CADE permanecia, ainda que em menor grau.

Os debates em torno de contratos associativos notificados ao CADE se tornaram bastante intensos nos anos de 2012 e 2013[3], em que foram notificadas operações de contratos associativos, sendo alguns deles julgados nos mesmos anos.

Sem pretender adentrar no exame de cada um desses precedentes, a questão que importa para a presente análise diz respeito à série de questionamentos levantados acerca do que se consideraria como um contrato associativo para fins de apreciação pela autoridade antitruste, uma vez que cada um dos casos possuía certas especificidades e não existia nenhuma norma que definisse critérios com esse fim.

Em linha com as mudanças feitas na nova Lei de Defesa da Concorrência e, de forma a conferir maior segurança jurídica e previsibilidade em relação à notificação de contratos associativos, em 2014, o CADE colocou em consulta pública proposta de resolução com a finalidade de objetivar os casos de notificação de operações referentes a contratos associativos.

Naquele ano foi editada a Resolução nº 10/2014, que disciplinou pela primeira vez as hipóteses de notificação da celebração de contratos associativos. A Resolução estabelecia, nos termos do art. 90, IV, da Lei de Defesa da Concorrência, os seguintes critérios para que um acordo se enquadrasse nessa definição:

 

i. Contratos com duração superior a 2 (dois) anos;

ii. Cooperação horizontal ou vertical, ou compartilhamento de riscos que acarretem em uma relação de interdependência, que era presumido quando:

a. As partes estão horizontalmente relacionadas no objeto do contrato e com participação de mercado conjunta igual ou superior a 20%; ou

b. As partes estão verticalmente relacionadas no objeto do contrato, desde que (b.1) pelo menos uma delas detenha participação superior a 30% em um dos mercados verticalmente relacionados; e (b.2) o contrato estabeleça relação de exclusividade, ou compartilhamento de receitas ou prejuízos entre as partes contratantes.

Apesar da tentativa de objetivar os critérios de notificação de contratos associativos, a Resolução nº 10/2014 acabou sendo alvo de diversas críticas, principalmente no tocante à amplitude que o critério por índice de market share gerava. Partindo desse parâmetro, muitos contratos que não eram efetivamente associativos deveriam ser notificados, da mesma forma que contratos genuinamente associativos poderiam ser deixados de fora.

A esse respeito, confira o trecho a seguir, referente aos principais problemas encontrados na referida resolução:

 

“Embora sejam mais precisos que o termo legal, o novo regramento ainda dá margem para dúvidas quanto à generalidade e abrangência do conceito, visto que os principais elementos dos critérios regulamentares referem-se às partes, e não aos termos do contrato em si. Ademais, as referências a participações de mercado podem gerar dúvidas nos casos em que não haja uma jurisprudência sedimentada sobre a definição do respectivo mercado relevante. Finalmente, a Resolução n. 10/2014 tende a exigir a submissão de um conjunto grande de contratos sem impacto concorrencial relevante em mercados oligopolizados em que empresas necessitam se relacionar com seus concorrentes”[4].

 

Com vistas a sanar os referidos óbices, a autoridade de defesa da concorrência brasileira editou a Resolução nº 17/2016 – que se encontra atualmente em vigor –, estabelecendo as seguintes condições para o enquadramento de um contrato como associativo:

"Art. 2º Considera-se associativos quaisquer contratos com duração igual ou superior a 2 (dois) anos que estabeleçam empreendimento comum para exploração de atividade econômica, desde que, cumulativamente:

I - o contrato estabeleça o compartilhamento dos riscos e resultados da atividade econômica que constitua o seu objeto; e

II - as partes contratantes sejam concorrentes no mercado relevante objeto do contrato.

§1º Para os efeitos desta Resolução, considera-se atividade econômica a aquisição ou a oferta de bens ou serviços no mercado, ainda que sem propósito lucrativo, desde que, nessa hipótese, a atividade possa, ao menos em tese, ser explorada por empresa privada com o propósito de lucro."

Partindo do racional adotado pelo CADE para a reformulação da Resolução, as mudanças se deram no sentido de simplificar os critérios de notificação e eliminar os parâmetros de market share, resultando em:

1. Estabelecimento de maior foco na ideia de “empreendimento comum”;

2. Eliminação da referência expressa a contratos puramente verticais;

3. Eliminação do critério de relação exclusiva e de participação de mercado;

4. Estabelecimento do compartilhamento de receitas ou prejuízos quanto aos riscos e resultados.

A observação dessas alterações permite afirmar que a nova regra estabelecida é mais seletiva e menos onerosa às empresas, restringindo a ideia de contratos associativos apenas àqueles que tenham um impacto mais estrutural e duradouro no mercado.

O ponto que merece destaque no presente caso diz respeito ao requisito temporal, que foi mantido praticamente inalterado desde a resolução anterior, sob a percepção de que o prazo mínimo de 2 (dois) anos contempla a permanência mínima necessária de um acordo entre empresas apta a gerar alterações significativas no ambiente concorrencial.

Esse parâmetro de estabilidade reflete a medida que um contrato associativo implica, necessariamente, na permanência e continuidade do empreendimento, de forma a alcançar o fim comum estabelecido.

A cooperação entre as partes com vistas a alcançar um fim comum – que é justamente o parâmetro de estabelecimento do requisito do empreendimento comum – vai de encontro ao cumprimento de simples obrigações isoladas, que poderiam ser adimplidas em um curto período de tempo.

E essa finalidade partilhada entre as partes de um negócio requer a construção de um vínculo duradouro, sem o qual não se poderia alcança-la. Não se trata, portanto, do cumprimento de meras obrigações isoladas por um curto período de tempo.

Ao estabelecer a obrigatoriedade de notificação de contratos associativos à autoridade antitruste, a Lei de Defesa da Concorrência os classificou como uma espécie de ato de concentração no direito concorrencial brasileiro, cuja importância para o controle prévio de estruturas decorre justamente de sua capacidade de provocar alterações significativas e prolongadas no mercado afetado.

No direito comparado, muito antes da edição da primeira Resolução relativa a contratos associativos pelo CADE, o Conselho da União Europeia estabeleceu no Regulamento (CE) nº 139/2004 que a estrutura de um mercado só é afetada a partir de concentrações econômicas que possuam algum grau de durabilidade – sendo esse, inclusive, um dos critérios adotados para a definição de “concentração”[5].

A própria experiência deste Conselho já pôde demonstrar que contratos com duração inferior a 2 (dois) anos apresentam baixo potencial ofensivo concorrencial, visto que raramente possuem o objetivo, a potencialidade ou a possibilidade de estabelecer uma estrutura econômica distinta daquela pré-existente e capaz de alterar a dinâmica de concorrência no mercado[6].

Dessa forma, o estabelecimento na Resolução nº 17/2016 do critério de duração mínima de 2 (dois) anos para os contratos associativos representa a busca do CADE pela conformidade de suas resoluções com a Lei nº 12.529/2011, em que a estabilidade e duração prolongada de uma relação entre empresas é pressuposto básico para que possa realizar mudanças permanentes na estrutura dos mercados, e, portanto, para desencadear a necessidade de atuação do controle de estruturas a cargo da Autarquia.

Este raciocínio é corroborado pelo entendimento da ex-conselheira Ana Frazão, ao afirmar que “a mera existência de cooperação entre as empresas, mesmo quando ocorre em grau intenso e diferenciado, tal como normalmente se verifica em contratos empresariais de longa duração ou contratos relacionais, não é suficiente, por si só, para ser considerada um ato de concentração.[7].

Foi baseada nessas premissas que a autoridade antitruste editou a Resolução CADE nº 17/2016 e adotou o critério de temporalidade de no mínimo 2 (dois) anos para que um contrato associativo seja notificável. Não se trata, portanto, de um critério arbitrariamente estabelecido, de forma que não há como ser flexibilizado quando da análise de contratos tidos por associativos.

VII. Definição de contratos associativos e joint venture.

Os contratos associativos como gênero são contratos atípicos, figurando como expressão da autonomia privada para a criação de novos arranjos contratuais dentre as figuras pré-estabelecidas na legislação pátria. A dificuldade encontrada para sua delimitação exata reside no fato de se deparar com, nas palavras de Engrácia Antunes, “uma multiplicidade insistematizável de figuras contratuais que podem servir a cooperação entre empresas[8].

Como uma alternativa às formas tradicionais de organização societária, os contratos associativos possibilitam a combinação da estabilidade empresarial com a flexibilidade do mercado, como uma terceira alternativa entre produzir bens e serviços dentro da própria organização ou compra-los no mercado (make or buy)[9].

Não obstante existam empecilhos de natureza organizacional para uma pré-definição de todas as modalidades de contratos associativos, a doutrina e a jurisprudência deste CADE já entenderam que as denominadas joint ventures figuram como uma das principais espécies de contratos associativos, assim como os consórcios, a sociedade e acordos parassociais.

Dito isso, importa esclarecer que o objetivo do legislador ao redigir o art. 90, IV, da Lei nº 12.529/2011 foi delimitar exemplificativamente, e não exaustivamente, as espécies do gênero contrato associativo, para fins de configuração de um ato de concentração.

Diante da infinidade de arranjos contratuais que podem ser feitos entre os particulares, a autoridade antitruste desenvolveu mecanismos de identificação de contratos meramente cooperativos daqueles que devem ser considerados como associativos com a obrigatoriedade de notificação.

Na esteira do quanto exposto no tópico anterior, os contratos associativos têm características de organização entre as partes para a regulação de um objetivo em comum, o que diminui sua autonomia como competidores em um mesmo mercado e, consequentemente, possui o condão de alterar essa dinâmica competitiva. Assim, a estabilidade da cooperação é uma das características essenciais à caracterização desse tipo contratual.

As joint ventures, sejam elas contratuais ou societárias, são uma espécie de contratos associativos, de forma que possuem todas as características essenciais à sua configuração (empreendimento comum, compartilhamento de riscos e resultados e empresas concorrentes no mercado, além do requisito da estabilidade e permanência do negócio), mas com modulações diferentes que permitem estabelecer fins específicos para a sua existência, bem como ante a criação de um novo centro de controle da atividade empresarial.

Dessa forma, as joint ventures podem ser estabelecidas pelas partes para a realização de uma empresa comum, como contratos organizativos, ou como contratos de compartilhamento de controle empresarial, dentre outras finalidades, permitindo que os agentes expandam sua capacidade produtiva, criando ou não uma nova personalidade jurídica. Por figurar como uma espécie de contrato associativo, o comportamento de cooperação entre as empresas exige uma relação prolongada, com vistas a permitir a devida harmonia entre os interesses dos agentes de forma compartilhada.

Não obstante figurarem como uma espécie de contrato associativo, as joint ventures possuem características próprias que as especificam em relação àquele tipo contratual, notadamente a formação de uma nova unidade empresarial. Esse entendimento pode ser verificado no próprio Parecer nº 70/2021 elaborado pela SG nos presentes autos, ao afirmar que:

17. Sob o viés concorrencial, na perspectiva dos acordos horizontais, Motta (2004) conceitua a joint venture como “acordos entre concorrentes que cria uma nova entidade que executará algumas atividades ao invés dos sócios [parceiros]”.

Inclusive, a esse respeito, os atos de concentração já submetidos e analisados por este CADE que foram enquadrados como joint ventures envolveram a criação de uma nova unidade empresarial, isto é, um novo centro de controle com a previsão de duração superior a 2 (dois) anos.

Importante esclarecer apenas que, por nova unidade empresarial se entende a comunhão de esforços entre os agentes para a constituição de um fenômeno econômico calcado no empreendimento em comum, e não necessariamente relativo a alterações nas personalidades jurídicas – esta alteração pode ocorrer ou não, a depender do tipo de joint venture criada, se apenas contratual ou societária.

Por essas razões, entendo que apesar de suas especificidades, as joint ventures figuram como uma espécie de contrato associativo e, por esse motivo, também se submetem aos critérios de notificação estabelecidos pela Resolução nº 17/2016, inclusive em relação ao critério temporal.

VIII. Do enquadramento da presente operação.

Considerando as informações e os conceitos abordados nos tópicos anteriores, observa-se que o contrato firmado entre as requerentes possui características de um arranjo cooperativo, com o estabelecimento de uma organização estruturada, com o compartilhamento de riscos e resultados, e cujas partes são concorrentes no mercado afetado.

Essas características são atribuídas pela Resolução CADE nº 17/2016 aos contratos associativos e que também se estendem às denominadas joint ventures, com a ressalva de que a geração de um ente com personalidade jurídica própria é característica exclusiva das joint ventures societárias.

Mesmo que se busque enquadrar o contrato em questão como uma joint venture, observa-se que, por possuir características de contrato associativo, deve se submeter à análise de conhecimento de acordo com o disposto na Resolução CADE nº 17/2016, na linha do quanto disposto pela SG no Parecer nº 70/2021.

In casu, apesar de o contrato firmado preencher os requisitos previstos pelos incisos I e II da referida resolução, o critério objetivo da temporalidade não foi alcançado, pois o tempo de vigência contratual previsto é de apenas 12 (doze) meses.

No entanto, ainda que as requerentes tenham previsto a hipótese de não renovação do contrato, o próprio art. 3º da Resolução nº 17/2016 prevê que os contratos com duração inferior a 2 (dois) anos devem ser notificados ao CADE caso esse período venha a ser ultrapassado, previamente à sua renovação, de forma que a continuidade de sua vigência por prazo igual ou superior a dois anos dependerá da prévia aprovação pela autoridade antitruste. Confira-se:

Art. 3º Os contratos com duração inferior a 2 (dois) anos ou por prazo indeterminado devem ser notificados, nos termos desta Resolução, caso o período de 2 (dois) anos, a contar da sua assinatura, venha a ser atingido ou ultrapassado.

Parágrafo único. Os contratos previstos no caput devem ser notificados previamente à sua renovação, e a continuidade da sua vigência por prazo igual ou superior a 2 (dois) anos dependerá da aprovação prévia do Cade.

Dessa forma, caso o contrato firmado atinja ou ultrapasse o prazo estipulado na referida resolução, a notificação da operação será obrigatória à autoridade de defesa da concorrência, a partir de quando se analisará sua potencialidade de alteração do mercado afetado previamente ao atingimento desse prazo de 2 anos, evitando-se, com isso, a produção de efeitos duradouros no mercado sem a análise concorrencial correspondente.  

IX. Análise de riscos à concorrência.   

Mesmo ante a identificação da desnecessidade de notificação da presente Operação, caso fosse passível de conhecimento por eventual preenchimento do requisito temporal, os elementos aventados nos autos demonstram que não são geradas preocupações concorrenciais.

Quanto à definição do mercado relevante e, em linha com precedentes deste CADE em que já se discutiu exaustivamente sobre essa questão[10], define-se sob a ótica do produto o mercado de margarinas e, sob a ótica geográfica, define-se o território  nacional.

No ponto, cumpre reiterar que a Operação consiste no licenciamento pela Upfield de uso da marca Becel à BRF, para o fim de produção e distribuição de margarinas por conta da própria Upfield. Assim, caberá à Upfield a gestão estratégica do negócio e à BRF atribuições operacionais envolvendo a produção e a distribuição das margarinas, conforme definido pelas cláusulas 2 a 6 do contrato.

As partes manterão sua independência, não havendo qualquer alteração na estrutura societária das empresas e também não será adquirido nenhum ativo. As decisões estratégicas relativas a marca Becel permanecerão como atribuição da Upfield, e a troca de informações necessárias à logística de produção e distribuição do produto seguirão regras de governança conforme pactuado nas cláusulas 3.6, 6.2, 14.1 e 14.3.

[ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES].

[ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES]

[ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES].

[ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES].

[ACESSO RESTRITO ÀS REQUERENTES].

Partindo, portanto, de uma análise clássica nos termos do Guia de Atos de Concentração Horizontal desta Autarquia, chega-se à definição de mercado relevante conforme exposto acima. Ainda nessa linha, a verificação do ΔHHI permite concluir pela baixa alteração no nível de concentração e, por conseguinte, de poder de mercado, o que torna desnecessária a avaliação da probabilidade.

X. CONCLUSÃO

Em síntese, a análise realizada possibilitou verificar que a operação em questão se enquadra em um caso de contrato associativo, considerando suas características de estabelecimento de um empreendimento conjunto para um fim comum, o compartilhamento dos riscos e resultados entre os dois agentes envolvidos, e as duas empresas configuram como concorrentes no mercado nacional de margarinas.

Mesmo que se cogite o enquadramento da Operação como uma joint venture contratual – o que não ocorre, contudo, pela ausência de estruturação de uma empresa comum –, compreende-se que as joint ventures figuram hoje como espécies do gênero contrato associativo. Dessa forma, para fins de notificação ao CADE, deve-se considerar o preenchimento de todos os requisitos previstos pela Resolução nº 17/2016.

Como a operação em questão prevê a duração do contrato para apenas 12 (doze) meses, ela não se encaixa no requisito temporal previsto pelo art. 2º, caput, da referida resolução, motivo o qual conclui-se por acertada a decisão da SG pelo seu não conhecimento.

Ainda que assim não fosse, isto é, caso a Operação preenchesse os requisitos para notificação do ato de concentração, a análise perfunctória dos riscos à concorrência demonstrou que não há qualquer probabilidade de concentração horizontal decorrente da atuação conjunta das requerentes, especialmente se considerado o prazo de 12 meses dessa atuação.

Considerando, portanto, que a Operação não se enquadra como de notificação obrigatória, rejeita-se a abertura de APAC em desfavor das requerentes, por não haver qualquer prejuízo na consumação dos atos antes que se findasse a análise por este CADE.

Dispositivo

Ante o exposto, voto pelo não provimento do recurso interposto pela terceira interessada, com a consequente manutenção da decisão proferida pela Superintendência Geral no Despacho nº 315/2021.

maurIcio oscar bandeira maia

Conselheiro-Relator

(assinado eletronicamente)

[1] Por exemplo, os casos de VSA no setor de transporte marítimo de cargas (Consulta nº 08700.008081/2016-86).

[2] AC nº 08700.002276/2018-84 (TIM e OI); AC nº 08700.006163/2019-39 (Telefônica e TIM); Consulta nº 08700.008419/2016-08 (Warner Bros. e EA); AC nº 08700.004835/2019-71 – (Johnson & Johnson e Cellera Farmaceutica). AC nº 08700.001943/2020-26 – (Novartis Biociências S.A e Divcom S.A.).; AC nº 08700.002560/2020-75 – (Janssen-Cilag Farmacêutica Ltda. e Piramal Critical Care).

[3] Ato de Concentração nº. 08700.008736/2012-92 (Petrobrás Distribuidora S.A. e Consórcio MPEC);

Ato de Concentração nº. 08700.000548/2013-05 (TIM Celular S.A., Brasil Telecom e TNL PCS S.A.);

Ato de Concentração nº. 08700.010858/2012-49 (TAM Linhas Aéreas S.A. e American Airlines, Inc.);

Ato de Concentração nº. 08700.003536/2013-24 (Claro S.A., Empresa Brasileira de Telecomunicações S.A. – Embratel e Primesys Soluções Empresariais S.A., Telefônica Brasil S.A. e Vivo S.A.);

Ato de Concentração nº. 08700.007347/2013-20 (Mabe Brasil Eletrodomésticos Ltda e Whirlpool S.A.);

Ato de Concentração nº. 08700.005590/2014- 95 (Arete Editorial S.A. (“Lance!”), Editora Gazeta do Povo S.A. (“Gazeta do Povo”), Empresa Folha da Manhã S.A. (“Folha”), Correio Popular S.A. (“Correio Popular”), Empresa Jornalística O Povo S.A. (“O Povo”), Infoglobo Comunicação e Participações S.A. (“O Globo”), O Estado de S. Paulo S.A. (“Estadão”), RBS – Zero Hora Editora Jornalística S.A. (“Zero Hora”) e S.A. A Gazeta (“A Gazeta”);

Ato de Concentração nº. 08012.002870/2012-38 (Monsanto do Brasil Ltda. e Syngenta Proteção de Cultivos Ltda); Ato de Concentração nº. 08012.006706/2012- 08 (Monsanto do Brasil Ltda. e Nidera Sementes Ltda.); Ato de Concentração nº. 08700.003898/2012-34 (Monsanto do Brasil Ltda. e Cooperativa Central de Pesquisa Agrícola – Coodetec); Ato de Concentração nº. 08700.003937/2012-01 (Monsanto do Brasil Ltda. e Don Mario Sementes Ltda.).

Ato de Concentração nº. 08700.004957/2013-72 (Monsanto do Brasil Ltda. e Bayer S.A.);

Ato de Concentração nº. 08700.006336/2013-23 (Monsanto do Brasil Ltda. e Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa).

[4] PEREIRA NETO, Caio Mário da Silva; CASAGRANDE, Paulo Leonardo. Direito Concorrencial: doutrina, jurisprudência e legislação. São Paulo: Saraiva, 2016. P. 56-57.

[5] Regulamento (CE) nº 139/2004 – Artigo 3 – Definição de concentração – “A concentration shall be deemed to arise where a change of control on a lasting basis results from: (...)”.

[6] CAIXETA, Deborah Batista. Contratos Associativos: características e relevância para o direito concorrencial das estruturas. In: Revista de Defesa da Concorrência – RDC, Vol. 4, nº 1, Maio 2016. P. 122-123.

[7] FRAZÃO, Ana. Direito da Concorrência: Pressupostos e Perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2017. P. 117.

[8] ANTUNES, José Engrácia. The governance of corporate groups. In: ARAUJO. Danilo; WARDE JR, Walfrido (org.). Os grupos de sociedades: organização e exercício da empresa. São Paulo: Saraiva, 2012. P. 390.

[9] FRAZÃO, Ana. Direito da Concorrência: Pressupostos e Perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2017. P. 203.

[10] Ato de Concentração n.º 08012.004423/2009-18 (Requerentes Sadia S.A. e Perdigão S.A); Ato de Concentração nº 08700.003979/2018-20 (Requerentes Bunge Alimentos S.A., Unilever Brasil Ltda e Sigma Brasil Holding Ltda.); Ato de Concentração nº 08700.001134/2020-14 (Requerentes Seara Alimentos Ltda. e Bunge Alimentos S.A.).

[11] Artigo 3, I, do Estatuto Social da BRF S.A.

 


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Documento assinado eletronicamente por Maurício Oscar Bandeira Maia, Conselheiro, em 19/04/2021, às 17:00, conforme horário oficial de Brasília e Resolução Cade nº 11, de 02 de dezembro de 2014.


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