Timbre

Ministério da Justiça e Segurança Pública- MJSP

Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE

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Processo Administrativo 08012.010483/2011-94

Representante: E-Commerce Media Group Informação e Tecnologia Ltda.

Advogados: Tercio Sampaio Ferraz Junior, Juliano Souza de Albuquerque Maranhão, Carla Osmo, Thiago Francisco da Silva Brito, Rodrigo Zingales Oller do Nascimento e outros.

Representados: Google Inc. e Google Brasil Internet Ltda.

Advogados: Mauro Grinberg, Leonor Augusta Giovine Cordovil, Ricardo Casanova Motta e outros.

Conselheiro-Relator: Conselheiro Maurício Bandeira Maia

 

EMENTA: Processo Administrativo. Mercado nacional de busca genérica. mercado nacional de comparação de preço. Plataformas digitais. Práticas discriminatórias. Alavancagem. Busca enviesada. Abuso de posição dominante. 

 

VOTO-VOGAL - CONSELHEIRA PAULA FARANI DE AZEVEDO SILVEIRA

VERSÃO PÚBLICA

 

Sumário

1. Considerações Iniciais..................................................................................................... 2

2. O negócio do Google........................................................................................................3

2.1 Racionalidade da Plataforma Google em Relação às Compras Online.......................... 9

3. Regime de Análise........................................................................................................ 12

3.1. Conduta Apurada........................................................................................................12

3.2. Regra da Razão........................................................................................................... 15

4. Mercado Relevante....................................................................................................... 21

4.1. Mercado nacional de busca geral............................................................................... 21

4.1.1 Interface entre a plataforma de busca geral e as plataformas de busca temática... 21

4.2 Mercado nacional de comparação de preço............................................................... 24

4.2.1 Substituibilidade da demanda limitada com marketplaces..................................... 25

4.2.2 Substituibilidade da demanda limitada com outros serviços de busca.................... 24

4.2.3 Comparadores de preço........................................................................................... 24

5. Poder de Mercado........................................................................................................ 26

5.1 Busca Geral................................................................................................................. 26

5.2 Mercado de sites de busca temática........................................................................... 28

6. Teoria de Dano.............................................................................................................. 29

6.1. Estratégias de Atuação de Plataformas Digitais Não-Transacionais............................ 29

6.1.1. Externalidades de rede, efeitos lock-in e economias de escala e escopo................ 31

6.1.2. Teoria Econômica sobre plataformas de múltiplos lados..........................................29

6.2. Acusação 1– Posicionamento Preferencial................................................................. 34

6.2.1. Teste para verificação da conduta ilícita.................................................................. 39

6.3. Acusação 2 – Restrição de acesso ao PLA e/ou ao Google Shopping......................... 40

6.3.1.Teste para verificação da conduta ilícita................................................................... 42

7. Análise Concorrencial.................................................................................................... 42

7.1. Acusação 1 – Posicionamento Preferencial................................................................. 42

7.2. Acusação 2 – Impedir acesso ao PLA e/ou ao Google Shopping................................. 48

8. Efeitos............................................................................................................................ 51

9. Remédio......................................................................................................................... 57

9.1. Efetividade do Remédio............................................................................................... 62

10. Dispositivo.................................................................................................................... 62

 

I. PRELIMINAR

Trata-se de Processo Administrativo instaurado em 13 de outubro de 2013, a partir de Representação formulada pela E-Commerce Media Group Informação e Tecnologia Ltda. (“Representante” ou “E-Commerce”) em face das empresas Google Inc. e Google Brasil Internet Ltda. (tratadas conjuntamente, no singular, como “Representada” ou “Google”).

Preliminarmente, a Representante apresentou manifestações[1] nas quais requereu que os dados utilizados pelo Departamento de Estudos Econômicos (“DEE”) na elaboração da Nota Técnica 34/2019/DEE/CADE deveriam ser disponibilizados.

Em resumo, a E-Commerce argumenta que o pedido de acesso se justifica devido às possíveis divergências que poderiam existir entre os dados apresentados pelo Google por meio de sua ferramenta “Google Analytics” e os dados apresentados ao CADE. Assim, a E-Commerce solicitou que o “DEE explique as razões que o levaram a obter, com os mesmos dados apresentados pela E-Commerce, conclusões díspares daquelas apresentadas pelos economistas contratados pela Representante; e que fossem feitos esclarecimentos quanto às diferenças entre as séries fornecidas ao CADE e quanto às amostras fornecidas ao DEE pela Representada”.

De outro lado, como bem exposto pelo Conselheiro-Relator, o DEE apontou que não haveria divergências significativas entre os dados apresentados, de modo que não haveria diferenças nos resultados alcançados.

Portanto, neste ponto, sigo o entendimento proferido pelo Conselheiro-Relator, no sentido de que não há necessidade de abertura dos dados utilizados, uma vez que, em última instância, as possíveis divergências alegadas seriam insignificantes e não alterariam os resultados expostos.

Dessa maneira, rejeito a preliminar suscitada.

 

II. MÉRITO

1. Considerações Iniciais

O presente caso concretiza, na prática, uma série de desafios que a literatura especializada já vem apontando e abordando em teoria. Em vista disso, este é um caso que impõe à autoridade antitruste uma reflexão bastante aprofundada sobre os pressupostos do direito da concorrência e os seus instrumentos metodológicos, analíticos e processuais.

O avanço cada vez maior e mais acelerado da tecnologia resulta, igualmente, em uma dinâmica competitiva diferenciada, que impõe às autoridades antitruste o esforço de se manterem atualizadas.

As autoridades têm se atentado e se movimentado nesse espírito, promovendo a realização de workshops, guias, etc.

As boas práticas ainda estão sendo construídas. Nesse caminho, erros do tipo 1 e 2 serão cometidos inevitavelmente, e as autoridades deverão ir moldando seus entendimentos. A dificuldade ou dinamismo do setor não pode eximir a autoridade de intervir e fiscalizar. No entanto, a autoridade tem que estar disposta a prontamente reconhecer quando errou e alterar seu entendimento, se for o caso.

 

2. O Negócio do Google

Antes de proceder ao caso concreto, entendo que a descrição do negócio de buscas do Google é essencial para a devida compreensão e contextualização das alegações formuladas neste Processo. Assim, permito-me fazer uma breve divagação inicial para tratar das plataformas detidas pelo Google e dos serviços fornecidos, tão somente no intuito de fornecer as noções básicas essenciais para compreensão do caso e com foco nos serviços atualmente existentes no Brasil.

O Google foi criado em 1995 como “um mecanismo de pesquisa que usava links para determinar a importância de páginas individuais na World Wide Web[2], e, em 1998, a empresa Google Inc. foi fundada[3]. O objetivo central do mecanismo, tendo em vista o recente surgimento da internet, consistia em facilitar a navegação, permitindo que o usuário pudesse buscar e acessar páginas na internet, ainda que não se soubesse o nome de domínio de determinado site ou mesmo a sua existência.

Diferentemente de um repositório de links para páginas, o mecanismo de pesquisa do Google era motivado pela consulta realizada pelo usuário. Tomando como base os termos de pesquisa utilizados, o mecanismo rastreava o conteúdo existente na internet e, na sequência, enumerava e exibia os resultados por relevância conforme o critério da busca.

Ainda hoje, o mecanismo de pesquisa do Google funciona nesse mesmo molde geral, em um processo de três etapas principais, conforme descrito pela Superintendência-Geral (“SG”):

“[P]rimeiro, softwares automatizados (“crawlers” ou spiders”) visitam sites na WWW em geral por meio de navegação em links de sites que foram visitados antes ou por meio da requisição de visita” pelo administrador de um site; depois, as informações da página visitada são salvas em um índice do Google; por último, quando um usuário faz uma consulta de busca, algoritmos da ferramenta de busca selecionam as páginas com conteúdo mais adequado como resposta à busca e as organizam de maneira ranqueada em uma página de resultados (“SERP, de search engine results page)[4].

 

O sucesso do mecanismo de pesquisa do Google é atribuído ao algoritmo de “PageRank”, desenvolvido para o rastreio das informações e o ranqueamento dos resultados, dando maior importância aos sites que são mais referenciados por outros sites.

Conforme explicado pelo Google:

O PageRank interpreta a conexão entre a página A e a página B como um "voto" da página A sobre a importância da página B. Os "votos" de cada site não são iguais em peso. Ou seja, um site que está conectado a poucos sites que estão bem ranqueados pode ter um saldo maior no PageRank que um site que está conectado a vários sites que estão abaixo no ranque. (...). Atualmente, o PageRank é apenas um componente dentro de um conjunto de fatores considerados pelo Google corno os algoritmos temáticos de busca. No total, os algoritmos do Google consideram mais de 200 sinais diferentes para fornecer o resultado a uma pesquisa. Tais sinais incluem, por exemplo, o contexto da página, o contexto das páginas vizinhas e a formulação do texto âncora (o texto visível deum link fornecido nos resultados, no qual o usuário clica). Os sinais de ranqueamento são utilizados como proxies que auxiliam o Google em sua tarefa mais crítica: entender o que o usuário está procurando (interpretando apenas algumas palavras dentro de sua pesquisa) e apresentar resultados relevantes e úteis em resposta, dentre bilhões de páginas da internet[5]. (Grifou-se).

 

Entretanto, segundo alega o Google, a dificuldade em dar respostas certeiras para o usuário consiste na ambiguidade dos termos de pesquisa, que nem sempre permitem identificar a real intenção de busca do usuário e quais tipos de resultados devem ser apresentados – se notícias, imagens, vídeos, produtos, locais e outros.

Em face disso, no intuito de aprimorar a precisão dos resultados e a adequação da resposta fornecida para a pesquisa, conforme a intenção de busca do usuário, o Google desenvolveu plataformas de buscas temáticas, que visam a atender de maneira mais especializada o interesse do usuário. Desse modo, o usuário poderá usufruir de uma experiência de pesquisa com menos fricção, na medida em que poderá se valer de uma plataforma que fornecerá resultados de apenas um tipo ou tema.

 Assim, o Google lançou uma plataforma de busca temática especializada para produtos, tendo sido iniciada nos Estados Unidos em 2002 – denominado de “Froogle”. Posteriormente, a plataforma foi aperfeiçoada e se transformou no “Google Product Search” – que, ao longo deste voto, será chamado, informalmente, de Google Shopping. No Brasil, o Google Shopping foi lançado no final de 2011[6].

Ainda, seguindo o mesmo intuito, um ponto de extrema relevância para o negócio do Google foi o desenvolvimento da ferramenta “Universal Search[7], lançada em 2007 nos Estados Unidos, por meio da qual se passou a comparar a relevância entre resultados temáticos e genéricos para exibi-los conjuntamente dentro da página de resultados do mecanismo de busca genérica (“search engine results page” – SERP).

O objetivo, conforme explica o Google, era conseguir entregar uma melhor experiência de pesquisa aos usuários:

Assim, a introdução de resultados temáticos (Notícias, Imagens, Vídeos, Mapas e Shopping, dentre outras) nas páginas de resultados de busca do Google deve ser entendida como integrante de uma evolução contínua da experiência de busca, permitindo ao Google oferecer resultados aperfeiçoados. A exibição de resultados temáticos é uma tentativa de fornecer respostas mais relevantes às pesquisas do usuário. Em outras palavras, o Google tenta discernir quando os usuários estão procurando notícias, vídeos ou imagens, ou relação de comerciantes locais, por exemplo, e exibir estes resultados, dependendo da confiança que os algoritmos do Google têm de que um usuário está buscando aquele tipo particular de informações. A exibição de resultados temáticos de busca - como outras melhorias na experiência de busca - é um esforço para fornecer os melhores resultados e possibilitar que os usuários procurem e achem as informações de maneira mais rápida e fácil”[8]. (Grifou-se).

 

Com o lançamento da Universal Search, deu-se origem ao “Product Universal”, que consistia na apresentação diferenciada dos resultados temáticos dentro de uma “caixa” específica na SERP. O Product Universal apresentava os resultados temáticos de produtos e se sujeitava ao ranqueamento da SERP, de acordo com sua relevância e utilidade diante da consulta realizada[9].

A imagem abaixo ilustra a apresentação do Product Universal e demonstra a disposição dos resultados orgânicos (não pagos), dos resultados patrocinados (pagos) e dos resultados da busca temática:

 

Fonte: Representante, com alterações do DEE (SEI 0549417).

Como explicado pela SG:

Na época do Product Universal, a exibição de resultados temáticos de produtos era um serviço gratuito do Google, que, dentro da SERP, cobrava apenas para a exibição de resultados do AdWords, resultados da parte da página dedicada à “busca patrocinada”. (...). Em 2009, nos EUA, o Google passou a cobrar pela exibição de resultados temáticos de produtos em um sistema chamado de “Product Listing Ads” (“anúncios por listagem de produtos”; “PLAs”). Como explicado pelo Google, “os PLAs são anúncios que exibem a imagem de um determinado produto, o preço pelo qual determinado varejista está vendendo o produto e o nome do varejista”[1]. (Grifou-se)

 

Ainda a respeito dos PLAs, os seguintes esclarecimentos são pertinentes:

Os PLAs são gerados por meio de feeds (arquivos padronizados) de dados dos varejistas fornecidos ao Google. O feed pode ser enviado por upload direto para o Google, por FTP (um protocolo específico para a transferência de arquivos), por indicação de localização do feed no site do varejista (caso em que o Google faz o donwload do arquivo) ou por API (application programming interface). API é uma forma de conexão direta com os servidores de um site.

Como diferença para o Product Universal, o modelo do PLA exigia um ato adicional por parte dos varejistas: o pagamento pela circulação do seu produto, pagamento esse com base em lances de um cost-per-action (“custo por ação”; “CPA”) – pagamento devido quando um usuário clica no anúncio e completa a compra no site do varejista (o que é chamado de “conversão”). Entre os vários PLAs cadastrados pelos varejistas, aqueles exibidos na SERP, quando fosse o caso de exibição de resultados temáticos de produtos, eram os que o Google identificasse como relacionados à consulta do usuário, identificação essa feita com base nas informações sobre o produto enviadas nos feeds. Ademais, dentre os diversos PLAs que podem se relacionar à consulta do usuário, o Google adotou um critério de dois passos para escolher quais anúncios serão exibidos com prioridade. Primeiramente, os resultados possíveis são filtrados com base na relevância e na qualidade do varejista e da oferta. Em seguida, para o ranqueamento final dos PLAs na SERP, é realizado um leilão com base nos lances dados pelos varejistas anunciantes[11].

 

Por certo período, o Product Universal e os PLAs poderiam integrar os resultados da mesma página. Entretanto, o Product Universal foi descontinuado em 2012, de modo que os resultados temáticos de produtos na SERP ficaram restritos aos PLAs.

Os PLAs passaram, então, a serem exibidos em um único bloco na SERP, denominado atualmente de “Shopping Unit” ou “unidade comercial”.

A SG explica que:

Na unidade comercial, as imagens e os textos são links que direcionam o usuário para uma página onde o usuário pode comprar o produto. O link Ver [termo de busca]” (na imagem, “Ver geladeira”), acima das imagens de produtos, leva o usuário para a página independente de resultados temáticos de produtos do Google, em que diversos produtos relacionados ao termo de busca são listados, cada um com uma breve descrição e uma relação de sites de varejistas em que o mesmo produto pode ser encontrado e seus respectivos preços em cada um deles, além de opções de organização dos resultados por preço e avaliações. Antigamente, o texto desse link era sempre “Resultados no Google Shopping”.

No design atual da unidade comercial, ao se clicar no botão com uma seta após o último anúncio, um “carrossel” com diversos outros PLAs é aberto. Após o último, um link com o texto “ver tudo” leva o usuário para a mesma página independente de resultados temáticos de produtos do Google descrita acima[12]. (Grifou-se).

 

Na figura abaixo, fornecida pela Representada, consta a linha do tempo sobre as mudanças efetuadas pelo Google em suas plataformas no Brasil e nos Estados Unidos:

 

Histórico de mudanças nas plataformas do Google no Brasil e nos EUA

Fonte: SEI 0475176, p. 2, §1.

 

Por fim, é importante notar que o desenvolvimento de plataformas de busca temática, associadas à plataforma de busca genérica, e juntamente com outros serviços fornecidos pelo Google, cria um ecossistema próprio de navegação e consumo. Essa é uma estratégia competitiva relevante no ambiente digital. Para fins do presente caso, cumpre apenas notar que a existência de um ecossistema do Google fomenta os incentivos de incrementar e diversificar os serviços fornecidos, a fim de que os usuários permaneçam no ecossistema.

Essas são as explicações preliminares sobre o negócio de buscas do Google que julgo necessárias para o prosseguimento da análise.

 

2.1. Racionalidade da Plataforma Google em Relação às Compras Online

Em relação às compras online, é importante lembrar que o Google surgiu como uma plataforma[13] de matching não transacional[14]. Isso significa que a interação proporcionada pelo Google entre os lados da sua plataforma não consistia na realização de uma transação, tal qual como ocorria em marketplaces, nos quais o encontro proporcionado entre lojas e clientes tem o objetivo comum, para ambos os lados, de realizar a comercialização do produto.

O Google, por sua vez, como plataforma de busca genérica, funcionava para mediar a intenção de busca do usuário com resultados pertinentes da internet, de modo que uma eventual transação não ocorreria em sua plataforma, mas poderia vir a ocorrer na interação entre o usuário e algum dos resultados obtidos.

Assim, no que tange às compras online, antes o Google atuava unicamente no fornecimento de respostas: os consumidores inseriam uma busca não-específica e recebiam links (orgânicos ou patrocinados) que os direcionavam para sites de terceiros[15], onde finalizavam suas compras. Ou seja, o Google atuava unicamente no mercado upstream, sem obter uma plataforma específica para promover o encontro entre usuários e varejistas para compras.

Entretanto, como explicitado anteriormente, com o advento da ferramenta Universal Search, o consumidor poderia fazer uma busca não específica na plataforma de busca genérica e obter, na própria SERP, resultados temáticos para a pesquisa, dentre os quais poderia constar o Product Universal. É nesse momento que o Google passa a atuar não apenas como fornecedor de tráfego para os sites de terceiros, mas também como um concorrente, ao mediar o usuário até o produto que será comprado. Isto porque o usuário poderia se direcionar para a realização da busca e da transação nos sites expostos pelo Google ou ir acessar a plataforma temática do Google para realizar a busca temática.

É nesse racional que se enquadra o Google Shopping, que atua, por sua vez, como uma plataforma de anúncios (i.e., de atenção). Sua principal motivação não é apenas o matching, mas também reter a atenção do usuário pelo maior período possível.

O Google, portanto, atua como uma plataforma de múltiplos lados e é afetado fortemente por “cross-platform network externality” ou externalidade de rede através da plataforma. Esse fator implica na interdependência dos diferentes lados da plataforma, ao ponto em que as decisões de cada um afetam o outro, mesmo que indiretamente. Os efeitos de rede são resultantes dessa externalidade e ocorrem quando as ações de participantes de algum dos lados da plataforma, ou as ações da própria plataforma, afetam os participantes dos outros lados e até mesmo o funcionamento da plataforma[16].

Ademais, a externalidade de rede através da plataforma também gera os chamados feedback loops. Sobre isso, a OCDE explica que:

​“Por exemplo, quando uma forte externalidade de rede através da plataforma existe em mais de um lado do mercado, isso cria feedback loops. Nesses loops, uma ação pode disparar uma espiral de reações, que, como em um efeito multiplicador, aumenta a magnitude das consequências da ação. Como exemplo, aumentar o preço que usuários pagam pode reduzir o número de usuários, mas isso também pode reduzir o valor da plataforma para anunciantes e, por isso, reduzir a quantidade de anunciantes dispostos a pagar. Por sua vez, isso pode reduzir o retorno que os fornecedores de conteúdo recebem quando seu conteúdo é visto na plataforma, reduzindo, portanto, a quantidade ou qualidade do conteúdo, o que pode reduzir o número de usuários. Novamente, isso pode então reduzir o número de anunciantes que estão dispostos a pagar, e assim por diante. Cada ação tomada pela plataforma pode criar uma série de reações (um ripple effect). Se esses efeitos se estenderem suficientemente, eles podem levar a empresa à falência, de um lado, ou ao monopólio, de outro[17].

 

Portanto, esse efeito multiplicador é justamente a motivação para plataformas como o Google investirem e expandirem para mercados relacionados[18], nos quais a geração de algum valor para o usuário consegue, por meio de positive feedback loops, aumentar exponencialmente o valor do ecossistema.

 

3. Regime de Análise

3.1. Conduta Apurada

O caso originou-se por meio de Representação protocolada pela E-Commerce em face do Google, em 20 de dezembro de 2011[19]. Na peça inicial, a Representante, que é titular dos sites comparadores de preços Buscapé e Bondfaro, alegava que a Representada estaria incorrendo na realização de práticas discriminatórias, por meio das quais estaria favorecendo o seu próprio site de comparação de preços – comumente referido como “Google Shopping” – e, assim, alavancando a sua participação no mercado verticalizado de sites de comparação de preço em razão de sua posição dominante no mercado de busca genérica[20].

O presente Processo Administrativo foi então instaurado em 13 de outubro de 2013, por meio da Nota Técnica 349/2013[21], no intuito de apurar condutas enquadráveis no art. 36, incisos I, II e IV, da Lei 12.529/2011 e dos incisos III, IV, X e XI do §3º do art. 36, da Lei 12.529/2011 (correspondentes aos incisos IV, V, XII, XIII do art. 21 da Lei 8.884/94).

Na ocasião, a SG indicou que a primeira conduta investigada consistiria na prática de “search bias” ou “busca enviesada”, por meio da qual o Google estaria influenciando os resultados orgânicos da sua plataforma de busca genérica para privilegiar a sua própria plataforma de busca temática por produtos, o Google Shopping.

Como indicado na Nota Técnica de Abertura, a conduta de busca enviesada teria sido modificada com o passar do tempo, de modo que não mais consistiria em uma influência indevida sobre os resultados orgânicos da busca genérica, mas consistiria propriamente na fixação de um espaço reservado para o Google Shopping, fora dos resultados orgânicos da busca genérica, no topo da página de resultados, ocupando local privilegiado.

Desse modo, o Google estaria diminuindo o espaço, a visibilidade e, consequentemente, o tráfego dos sites de comparação de preço. Isso também estaria, segundo a Representante, confundindo os usuários a respeito de quais seriam os resultados orgânicos e os resultados patrocinados na SERP.

A respeito da primeira conduta, embora dois momentos distintos sejam identificados e tratados como práticas distintas, tratarei os dois momentos como um contínuo da prática de self-preferencing, que será explicada com mais detalhes adiante, por entender que a alegação de “busca enviesada” pode ser compreendida como uma das maneiras de conceder tratamento preferencial aos próprios serviços na plataforma.

No tocante à segunda conduta, a SG indicou que ela envolveria, de modo geral, as questões relativas ao acesso Product Listing Ads (“PLA”). As alegações diriam respeito à recusa de venda e ao tratamento discriminatório, uma vez que os comparadores de preço não poderiam usufruir do serviço, a menos que fornecessem as informações solicitadas pelo Google. Num segundo momento, a questão do acesso se modifica, pois os anunciantes do Google Shopping teriam que ser exclusivamente varejistas ou plataformas de compra, os marketplaces.

O DEE, na Nota Técnica nº 34/2018/DEE/CADE, concluiu que as condutas alegadas consistiriam em inovações pró-competitivas e que não haveria evidências que demonstrassem a produção de efeitos anticompetitivos, de modo que não teriam sido encontrados indícios econômicos suficientes para caracterizar a ocorrência de condutas anticoncorrenciais.

A Nota Técnica Final nº 51/2018/SG/CADE concluiu pelo arquivamento do caso, por compreender que não haveria elementos robustos para, em uma análise pela regra da razão, condenar o Google pelas práticas denunciadas.

Contudo, embora tenha entendido pela inexistência de nexo de causalidade entre as práticas do Google e prejuízos ao mercado, a SG apontou que há indícios de que houve efeitos negativos sobre os comparadores de preços, decorrentes da falta de acesso ao PLA. Levando em consideração a importância do tráfego advindo do Google para comparadores de preço, entendeu que a conduta poderia, em tese, ter o potencial de prejudicar concorrentes. Ainda, a SG indicou que seria recomendável, após a instrução realizada, que a empresa permitisse o acesso de comparadores de preço nos PLAs, como seria o caso dos meta-buscadores para pesquisa de hotéis.

Tendo em vista tais informações, me parece que a questão posta no presente caso cinge-se a responder, primeiramente, se a decisão de negócios do Google de conceder espaço privilegiado para a exposição do conteúdo de sua plataforma de busca temática na SERP pode configurar uma conduta anticompetitiva.

Em adição, é preciso também responder se a decisão de negócios do Google de restringir a varejistas e marketplaces o acesso ao PLA e ao Google Shopping pode ser tida como uma conduta anticompetitiva.

Para responder a essas questões, é preciso definir o regime de análise e os testes aplicáveis, considerando as teorias de dano formuladas. Para tanto, após a definição do mercado relevante e a aferição do poder de mercado, a análise se voltará ao exame da racionalidade da conduta no contexto do modelo de negócios do Google e nas justificativas econômicas oferecidas pelo Google para tais condutas.

 

3.2. Regra da Razão

No presente caso, trata-se de conduta unilateral vertical que, de acordo com a literatura especializada, pode vir a gerar efeitos negativos sobre o bem-estar do consumidor. Portanto, entendo que tal conduta deve ser analisada pela regra da razão, em linha com o entendimento jurisprudencial do CADE[22].

Assim, a análise deve ser feita com observância de uma sequência de etapas, indicadas pela doutrina e adotadas pela jurisprudência, para que se possa configurar o ilícito concorrencial. A primeira etapa consiste na identificação do ato que poderia vir a gerar efeitos anticoncorrenciais. De maneira geral, as etapas seguintes consistem na análise antitruste tradicional, pela qual se deve (i) inquirir o poder de mercado dos agentes econômicos envolvidos e verificar a existência de eventual posição dominante; (ii) prosseguir ao exame quanto aos efeitos concorrenciais decorrentes do ato (verificar se o ato resulta em efeito líquido positivo) e (iii) por fim, inquirir se não há como atingir os mesmos benefícios por meios menos restritivos.

A tipicidade aberta da legislação concorrencial condiciona as práticas dos agentes econômicos à potencialidade e concretização de efeitos anticoncorrenciais, o que permite uma ampla margem para identificação do ilícito, cabendo à autoridade antitruste a tarefa de densificar o conteúdo no caso concreto4[23]. Tal característica, que não é exclusiva da legislação brasileira, se justifica pela multiplicidade de práticas que podem ser promovidas pelos agentes econômicos para prejudicar a concorrência.

No entanto, notei que recentemente, a regra da razão, importada do direito norte-americano, tem sido adotada por membros do CADE de forma que sempre é feito o chamado “balancing”: isto é, a ponderação dos efeitos positivos frente aos efeitos negativos, para que se chegue a um resultado líquido.

Ocorre que, na jurisprudência norte-americana, de onde foi importado o instituto, a ponderação não é um requisito obrigatório do teste legal[24].

Conforme AREEDA, a regra da razão é assim delineada:

"A investigação parece pontuada em três fases. (1) Qual dano para a concorrência resulta ou pode resultar das atividades dos colaboradores? (2) Qual é o objeto que eles estão tentando alcançar e esse objeto é legítimo e significativo? Isto é, qual é a natureza e magnitude das “virtudes redimíveis” da colaboração questionada? (3) Existem outros e melhores modos pelos quais os colaboradores podem atingir seus objetivos legítimos com menores danos à competição? Isto é, existem “alternativas menos restritivas” para a restrição quesitionada?[25].

 

HOVENKAMP, por sua vez, afirma que:

“A lógica integral da prova pela regra da razão é adiar e minimizar as ocasiões para sopesar e balancear efeitos pró e anticompetitivos”[26].

 

Ele então critica algumas decisões que, de forma geral, afirmam que a regra da razão se resume à ponderação, insistindo que, dependendo do caso, avaliar os efeitos líquidos de uma conduta, sem medidas unitárias equivalentes, é transformar o teste em algo inteiramente subjetivo[27].

Na mesma linha, SCHREPEL explicita claramente que inexiste ligação entre a regra da razão e o teste de balancing:

“Nós deveríamos imediatamente enfatizar a ausência de qualquer automaticidade entre a regra da razão e o teste de balancing. No meu melhor conhecimento, a Suprema Corte de fato nunca vinculou os dois. Adicionalmente, um estudo recente analisando mais de 300 decisões de cortes provou que o teste de balancing apenas foi aplicado em cinco por cento desses casos. Em resumo, este artigo compreende a regra da razão como a negação de regras per se, e é isto. A questão sobre qual teste será aplicado para cada prática surge após a concordância sobre a necessidade de implementar a regra da razão.  Pode ser o teste de balancing – que eu rejeito por razãos relacionadas a sua administrabilidade – ou, por exemplo, o teste de sacrífico do lucro, o teste do rival igualmente eficiente, ou o teste de inexistência de sentido econômico. Isso é exatamente o que é delineado por Mark S. Popofsky, que afirma que “o princípio unificar é que cada teste da Seção 2 reflete uma expressão específica da mesma que determina a regra da razão” e que “a regra da razão da Seção 2, assim entendida, requer: para o tipo de conduta em questão, qual teste legal é mais plausível de maximizar o bem-estar do consumidor no longo prazo?””[28].

 

Essa foi, inclusive, a interpretação que adotei em meus precedentes[29]. Depreende-se da leitura da Lei nº 12.5292011 que o balancing tampouco é um requisito da legislação pátria. Rememoremos: o artigo 36 da Lei nº 12.529/2011 define as infrações à ordem econômica como atos – sob qualquer forma manifestados – “que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados” e passa a listar, nos incisos I a IV, tipos abertos de infrações à ordem econômica.

O artigo 36 não traz uma defesa de eficiências para as infrações à ordem econômica. Essa defesa pode ser encontrada no art. 88, §5º, especificamente quanto a Atos de Concentração. É nesse dispositivo, limitado à análise de Atos de Concentração que a Lei prevê o padrão de bem-estar do consumidor, ao afirmar que serão:

"proibidos os atos de concentração que impliquem eliminação da concorrência em parte substancial de mercado relevante, que possam criar ou reforçar uma posição dominante ou que possam resultar na dominação de mercado relevante de bens ou serviços, ressalvado o disposto no § 6º deste artigo.

§ 6º Os atos a que se refere o § 5º deste artigo poderão ser autorizados, desde que sejam observados os limites estritamente necessários para atingir os seguintes objetivos:

I - cumulada ou alternativamente:

a) aumentar a produtividade ou a competitividade;

b) melhorar a qualidade de bens ou serviços; ou

c) propiciar a eficiência e o desenvolvimento tecnológico ou econômico; e

II - sejam repassados aos consumidores parte relevante dos benefícios decorrentes".

 

É apenas para o controle de estruturas que a Lei prevê a obrigatoriedade de um balancing.

É possível interpretar – e a jurisprudência do CADE o faz – que o standard de bem-estar do consumidor também está insculpido no art. 1º da Lei quando a defesa dos consumidores é listada como um dos princípios constitucionais norteadores da defesa da concorrência, bem como no seu parágrafo único quando a coletividade é considerada titular dos bens jurídicos protegidos por esta Lei.

Nesse sentido, o princípio do bem-estar do consumidor deve servir para nortear a aplicação da chamada regra da razão. No entanto, repiso que a regra da razão não deve ser confundida com o teste de balancing. A regra da razão é, muito simplesmente, inquirir se a conduta em questão tem racionalidade econômica além dos efeitos anticoncorrenciais e se tais efeitos poderiam ser atingidos de forma menos restritiva à concorrência.

Portanto, divirjo do entendimento do Conselheiro Relator no sentido de que, nas condutas analisadas a partir da regra da razão, “é necessária a comprovação de efeitos negativos líquidos, ainda que potenciais” e que “é imperioso que os danos ou possíveis danos originados das práticas enquadráveis em tipos anticoncorrenciais se sobreponham às eficiências provindas de tais ações”.

A meu ver, essa é a última etapa da análise, mas uma conduta pode ser tida como anticoncorrencial caso a justificativa pró-competitiva apresentada pela defesa seja insuficiente ou caso exista uma forma menos restritiva à concorrência de atingir o mesmo propósito.

 

4. Mercado Relevante

O estudo empreendido pela Superintendência-Geral, em acordo com as ponderações realizadas pelo DEE na Nota Técnica nº 34/2018, resultou na definição de dois mercados relevantes em análise no presente caso, quais sejam: 1) o mercado nacional de busca genérica e 2) o mercado nacional de comparação de preço.

Ao analisar os autos do processo, observo que a Nota Técnica nº 51/2018 /SG/CADE contém uma análise detalhada das particularidades das plataformas de múltiplos lados, bem como da diferenciação de produto e sua relevância para definição do mercado relevante. Por considerar que tais análises e respectivas conclusões se deram de maneira adequada, concordo com a definição dos mercados relevantes, motivo pelo qual os acolho integralmente no presente voto.

Na sequência, permito-me apenas destacar alguns pontos relevantes para compreensão dos mercados em exame.

 

4.1.Mercado nacion​al de busca geral

4.1.1.Interface entre a plataforma de busca geral e as plataformas de busca temática

Embora a Representada tenha defendido a definição de um mercado relevante único[30], a definição realizada pela SG se mostra mais adequada, na medida em que consegue apreender a interface entre os mercados, mas ainda assim tratá-los separadamente, de modo a contextualizar as condutas sob análise.

Ainda que, de modo geral, as diversas plataformas concorram entre si para atrair os consumidores para os seus respectivos ecossistemas, os mercados voltados para produtos ou serviços específicos devem continuar sendo analisados separadamente, isto é, dentro de uma delimitação material e geográfica.

Isso não significa dizer que, no caso de plataformas de múltiplos lados, a análise dos seus lados deva ser negligenciada e avaliada de forma segregada. Pelo contrário, devido à interdependência dos lados, é essencial que todos os lados de uma plataforma sejam incluídos na análise antitruste, sobretudo em razão dos incentivos econômicos que dão origem às economias de escala e de escopo, efeitos de rede e o papel dos dados coletados.

 Nesse sentido, o relatório “Competition Policy for the Digital Era[31], publicado recentemente pela Comissão Europeia, conclui que:

Definição de mercado. No mundo digital, as fronteiras de mercado podem não ser tão claras quanto na “antiga economia”. Elas podem mudar muito rapidamente. Além disso, no caso das plataformas de múltiplos lados, a interdependência de “lados” se torna uma parte crucial da análise enquanto a função tradicional de definição de mercado tem sido a de isolar problemas. Portanto, argumentamos que, nos mercados digitais, nós deveríamos colocar menos ênfase em análises de definição de mercado e mais ênfase em teorias de dano e identificação de estratégias anticompetitivas. Ao mesmo tempo, mesmo se em alguns mercados voltados para o consumidor – de acordo com as suas próprias considerações – empresas concorrem para atrair consumidores para ecossistemas mais ou menos abrangentes, mercados de produtos ou serviços específicos persistirão sob uma perspectiva do consumidor, e deverão continuar a ser analisados separadamente, ao lado da competição em (possíveis) mercados para ecossistemas digitais. Onde as estratégias de lock-in das empresas são bem sucedidas e os consumidores encontram dificuldade de deixar um ecossistema digital, ecossistemas específicos de aftermarket terão que ser definidos”[32].

 

Nessa linha, é preciso compreender que a estratégia competitiva do Google não se coaduna com a noção de um único mercado relevante, mas com mercados distintos, que se correlacionam por meio da Universal Search, que insere, na SERP, resultados temáticos juntamente aos resultados genéricos.

Ao lançar o Google Shopping, com o objetivo de competir no mercado de busca temática e aumentar a sua monetização no mercado de buscas patrocinadas, o Google já era dominante no mercado de buscas geral[33] e detinha uma larga base de usuários, anunciantes, dados e poder analítico que possibilitavam o design desse novo serviço. Ou seja, o lançamento do Google Shopping consistiu em uma importante economia de escopo, possibilitada por uma externalidade de rede já existente e capaz de impulsionar, para um novo serviço, a base de usuários, de fornecedores de informação e de anunciantes do Google.

Desse modo, ainda que se compreenda que as plataformas em geral competem por atenção[34], com o lançamento do Google Shopping – uma plataforma de busca temática –, o Google passou a reter a atenção específica de usuários que tinham intenção de compra e, assim, passou a competir com outros sites comparadores de preços.

Então, se, anteriormente, a plataforma de busca genérica do Google apresentava resultados que redirecionavam para sites de terceiros, com o advento do Google Shopping, o Google também passou a apresentar a sua própria plataforma de busca temática como resultado, de modo que os usuários que demonstraram a intenção de compra com a busca genérica também poderiam ser redirecionados ao ecossistema do Google novamente.

Conforme mencionado acima, plataformas concorrem entre si para atrair os consumidores para os seus próprios ecossistemas. No mercado de buscas temáticas, tanto os marketplaces quanto as plataformas de buscas temáticas competem pela atenção dos usuários, sobretudo para que iniciem as suas buscas nos respectivos ecossistemas até exaurirem os seus desejos e necessidades.

Já durante o tempo em que o usuário estiver manuseando a plataforma, a concorrência consiste em atrair, durante o maior tempo possível, a sua atenção por meio da variedade de serviços e produtos disponibilizados. Dessa forma, quanto maior for (i) a facilidade dos usuários de conseguirem satisfazer as suas necessidades (e.g., descobrirem, pesquisarem e adquirirem produtos desejados); e (ii) a diversidade dos serviços e produtos ofertados, maior será sua aderência à plataforma e, consequentemente, o tempo dedicado às respectivas plataformas.

Com isso, o que se observa é que a entrada do Google no mercado de buscas temáticas (via Google Shopping) se deu principalmente para aumentar a sua monetização com os anúncios online e, portanto, reforçar a dominância de sua plataforma por meio da atuação em mercados correlatos e complementares, potencializando os efeitos de rede.

Portanto, para que se possa identificar a eventual estratégia anticompetitiva no presente processo e assim construir a teoria de dano, é essencial que os mercados de busca genérica e de comparação de preço sejam tratados separadamente. É preciso, ainda, compreender a interface entre eles, tendo em vista que o Google Shopping, por meio da unidade comercial e dos PLAs, é um dos resultados temáticos exibidos pela busca genérica.

 

4.2. Mercado nacional de comparação de preço

4.2.1. Comparadores de preço

Comparadores de preços podem ser compreendidos como metabuscadores que reúnem varejistas e consumidores, no intuito de promover o encontro desses dois lados para a realização de uma transação.

O serviço fornecido consiste em agregar um número de lojas que vendam determinado produto ou categoria de produtos e demonstrar os diferentes preços dados para esses produtos, a fim de que o consumidor possa avaliar as opções e efetuar a compra na loja que melhor convier.

 

4.2.2. Substituibilidade da demanda limitada com outros serviços de busca

Conforme já argumentado, embora as plataformas concorram pela atenção dos usuários, é preciso ponderar que as diversas plataformas de busca fornecem serviços distintos, que apenas podem exercer concorrência entre si até determinado nível ou sequer podem integrar um mesmo mercado.

Nesse sentido, a SG teceu a seguinte ponderação:

Assim, enquanto o Google é capaz de contestar o Buscapé no segmento de PCS, empresas como Decolar.com e outras OTAs no segmento de viagens, sites de notícias nesse segmento, cada um desses sites especializados são capazes de contestar o Google somente em cada um desses segmentos. Dito de outra forma, o Buscapé não é capaz de contestar o serviço de busca de passagens aéreas Google Flights. Por essa razão, incluir todos esses agentes em um único mercado de “busca geral” pode distorcer de maneira significativa a lógica competitiva do mercado. Ao fazê-lo, estar-se-ia considerando todos esses players concorrentes entre si, embora ofertem serviços completamente distintos; em verdade, apenas o Google oferta tal portfólio[35].

 

Desse modo, é preciso notar que, embora o Google, por meio da busca genérica, possa atender intenções de busca variadas, para variados temas, tendo em vista seu amplo portfólio, as plataformas de busca temática ficam adstritas ao seu campo de expertise – voos, hotéis, notícias, imagens, etc. – e apenas apresentam pressão competitiva para o Google neste determinado contexto – seja frente à plataforma de busca genérica ou às plataformas de busca temática detidas pelo Google.

Assim, no presente caso, constata-se que a substituibilidade pelo lado da demanda entre plataformas de busca genérica e de comparação de preço é limitada, na medida em que, para um rol extenso de intenções de pesquisa, as plataformas comparação de preço não conseguirão contestar a busca genérica.

 

4.2.3. Substituibilidade da demanda limitada com marketplaces

Em sentido similar, a substituibilidade entre comparadores de preços e marketplaces, pelo lado da demanda, é limitada. Os serviços fornecidos se diferenciam consideravelmente, na medida em que o comparador de preço oferece informações de diversos marketplaces e varejistas, agindo como um meta-buscador.

Entretanto, é preciso ponderar, igualmente, que os marketplaces também podem servir para comparação de preço, ainda que esse não seja uma ferramenta diretamente promovida e as escolhas se limitam aos varejistas presentes naquele marketplace. Isto é, não é possível uma pesquisa “cross-platform”.

Embora marketplaces não sejam usualmente locais de descoberta de produtos para a compra, eles podem funcionar dessa maneira, na medida em que conseguirem agregar um número relevante de varejistas e conseguirem se destacar no fornecimento de determinado produto. É o caso da Amazon nos Estados Unidos que se destaca por ser um sítio em que todo o funil de compra[36] do consumidor pode ocorrer.

 

5. Poder de Mercado

5.1. Busca Geral

Após a delimitação dos mercados relevante, cumpre verificar se, nos termos do art. 36, §2º da Lei nº 12.529/2011, o Google detém posição dominante no mercado nacional de busca universal (i.e., no mercado de origem da suposta conduta analisada) e, portanto, seria capaz de alterar unilateralmente as condições de mercado.

As participações de mercado anuais do Google no mercado brasileiro de busca, considerando o período da investigação, seriam de[37]:

 

Participação de mercado do Google entre novembro de 2011 e agosto de 2018

 

MÊS/ANO

Todas as plataformas

Desktop

Mobile

Tablet

Console

Nov/2011

99,08%

99,12%

97,06%

N/A

N/A

Nov/2012

95,84%

95,68%

98,33%

99,35%

99,70%

Nov/2013

93,59%

93,24%

96,03%

97,53%

99,53%

Nov/2014

94,35%

93,79%

96,30%

97,34%

75,67%

Nov/2015

96,25%

95,46%

98,33%

97,54%

66,76%

Nov/2016

97,07%

95,95%

99,07%

97,94%

73,26%

Nov/2017

97,22%

95,15%

99,44%

98,26%

68,41%

Nov/2018

96,37%

94,06%

99,28%

97,75%

52,02%

 

Fonte: Voto da Conselheira Polyanna Vilanova no PA 08700.009082/2013-03, com base nos dados StatCounter.

 

Como se observa, desde 2011 o Google possui participação no mercado de busca universal acima de 90% em praticamente todos os cenários expostos acima (e.g., desktop, mobile, tablet etc.), patamar este bem acima da participação de mercado de 20% necessária para presumir uma posição dominante, nos termos do art. 36, §2º da Lei nº 12.529/2011. De fato, o que se constata é que a participação de mercado do Google atinge um patamar próximo ao de um monopolista, o que o torna um líder incontestável neste mercado.        

Recentemente, muito se tem discutido sobre o período apropriado de intervenção antitruste em mercados digitais[38]. Dentre tal discussão, encontra-se uma questão central relacionada ao momento em que uma empresa pode ser considerada dominante ou até monopolista. Nesse sentido, tendo em vista que a competição em mercados digitais ocorre em grande parte pela própria inovação, a aferição de poder de mercado de forma estática por meio de participação de mercado é insuficiente. A aferição pode se dar pela verificação da contestabilidade da empresa incumbente nos últimos anos frente à inovação de outros players. Deve-se considerar, assim, não apenas um cenário estático, mas também a dinâmica do mercado e os seus efeitos de longo-prazo.

No presente caso, conforme exposto, o que se verifica é que a posição dominante do Google no mercado de busca universal não mudou ao longo dos oito anos da presente investigação[39]. Tal fato evidencia que o Google não foi contestado efetivamente por qualquer outro player do mercado.  

Portanto, considerando o significativo poder de mercado do Google no mercado de busca universal, verifico que uma conduta praticada unilateralmente por tal empresa seria capaz de gerar impactos negativos à concorrência. 

 

5.2. Mercado de sites de busca temática

No nível à jusante (i.e., no mercado de sites de busca temática), para fins das acusações feitas e da teoria de dano aventada, não é preciso avaliar o poder de mercado do Google. A teoria central de alavancagem (leveraging) é justamente a de utilizar a sua posição no mercado à montante para elevar a sua participação em um novo mercado.

Conforme se verifica nos autos, a empresa lançou o “Product Search” no Brasil em outubro de 2011. Portanto, no primeiro momento, o Google era apenas uma entrante nesse mercado. Os dados contidos nos autos demonstram que a partir de meados de 2015, a plataforma Google Shopping se tornou a mais utilizada (em termos de acessos).

 

[ACESSO RESTRITO - GOOGLE]

 

Essa liderança continua até o final da instrução processual.

 

6. Teoria de Dano

6.1. Estratégias de Atuação de Plataformas Digitais Não-Transacionais

Nesta seção, o objetivo é fornecer alguns conceitos e noções gerais que envolvem plataformas digitais, em geral, e, em específico, as plataformas do Google.

A ideia é traçar um cenário apto a demonstrar quais são as condições que influenciam o negócio de buscas do Google e quais seriam os incentivos que poderiam induzi-lo a adotar condutas lesivas à concorrência.

Com a delineação desses tópicos, será possível articular uma eventual teoria de dano para as condutas investigadas no presente processo, bem como os testes necessários para verificar a ocorrência do ilícito concorrencial.

 

6.1.1. Teoria Econômica sobre plataformas de múltiplos lados

Como plataforma de múltiplos lados, o modelo de negócios do Google deve conciliar e balancear os interesses de usuários e anunciantes para fomentar a criação de valor da sua plataforma e, obviamente, a sua fonte de monetização[40].

Em vista disso, a teoria econômica enuncia uma expressão que conjuga a totalidade de variáveis que influenciam os incentivos do Google para a tomada de decisão e o desenho da sua plataforma. A expressão correlaciona o valor da plataforma do Google a partir do número de usuários e do número de anunciantes[41].

Primeiramente, para determinar o volume de usuários que acessam a plataforma do Google, as variáveis são: (i) a qualidade dos resultados de pesquisa, (ii) o número de anúncios, (iii) a qualidade de outros sites de busca genérica, e (iv) a qualidade dos sites de busca temática. O aumento de qualidade resulta em impacto positivo no número de usuários, mas, por outro lado, o aumento do número de anúncios tem um efeito negativo sobre esse número. Similarmente, a melhor qualidade dos demais sites de busca genérica ou de sites de busca temática impacta no volume de usuários do Google.

O volume de anunciantes no Google é resultado da combinação entre (i) o número de usuários, (ii) a qualidade dos resultados orgânicos (não pagos), (iii) a qualidade do algoritmo de matching, (iv) o preço para anúncio, (v) o número de usuários em outros sites de busca genérica, e (vi) o número de usuários em sites de busca temática.

O volume de usuários impacta a participação de anunciantes na plataforma e a qualidade de matching entre buscas e anúncios torna a plataforma mais atrativa para anunciantes. De outro lado, a qualidade dos resultados orgânicos tem um impacto negativo direto sobre a participação dos anunciantes, já que os resultados orgânicos e patrocinados competem pela atenção do usuário pela relevância. Também, o volume de anunciantes é impactado negativamente com o aumento do preço do anúncio e quando há mais usuários nas demais plataformas de busca genérica e temática.

Sucintamente, o volume de usuários, o volume de anunciantes e o preço do anúncio determinam a receita total do Google e seu lucro.

 

6.1.2. Externalidades de rede, efeitos lock-in e economias de escala e escopo

Em linhas gerais, é possível compreender o Google como uma plataforma de pesquisas na internet que tem como objetivo central promover o melhor “matching” entre a intenção de busca do usuário (enunciada pelos termos de pesquisa inseridos na busca) e os resultados existentes na internet para essa busca.

A capacidade de combinar a pesquisa com os resultados pertinentes é devida ao acúmulo e fluxo de informações que perpassam pela plataforma do Google. Tendo surgido logo no início da internet e tendo adquirido relevância como página para disponibilização e acesso de conteúdo, o Google conseguiu se consolidar como um must da navegação na internet, por meio de externalidades de rede associadas a efeitos de lock-in[42].

O serviço fornecido pela plataforma de busca do Google – navegação, indexação, ranqueamento e disponibilização do resultado – tornou-se uma base elementar tanto para quem disponibiliza conteúdo na internet, quanto para quem acessa conteúdo na internet.

O aumento do número de usuários que buscam por conteúdo na plataforma do Google impacta direta e positivamente no número de detentores de conteúdo que querem ter o seu conteúdo disponibilizado na plataforma. A relação é direta e cria um processo de reciprocidade e retroalimentação contínua – quanto mais usuários buscando conteúdo, mais detentores de conteúdo disponibilizando suas informações para a plataforma e vice-versa.

Em acréscimo, o valor e a relevância da plataforma também crescem na medida em que o algoritmo de pesquisa é aperfeiçoado por decorrência do volume e da velocidade de dados que perpassam pela plataforma. Novamente, a ideia é de reciprocidade e retroalimentação contínua: o elevado número de usuários, anunciantes e demais detentores de conteúdo importa em um volume vultuoso de informações disponibilizadas para o Google, por meio das quais o algoritmo se torna mais preciso e eficiente. Tornando-se o algoritmo mais eficiente, torna-se maior a atratividade para usuários e anunciantes se utilizarem da plataforma.

Esse conjunto de interações e de impactos recíprocos consiste justamente nos feedback loops que foram abordados na seção 2.1 deste voto e que findam por causar o efeito multiplicador que impulsiona o aumento do valor do ecossistema do Google.

É nesse sentido que se afirma que a consolidação da posição dominante do Google ocorre por meio da associação de externalidades de rede e efeitos lock-in.

A teoria econômica indica que o efeito lock-in pode ser percebido na forma de custos de troca (switching costs) que deverão ser arcados pelo consumidor para poder modificar de um serviço para outro. Dentre esses custos, apontam-se custos de pesquisa e comunicação para iniciar, definir, controlar e adaptar o serviço, bem como as inconveniências adicionais de ter que aprender a usar e a personalizar o novo serviço adquirido[43].

Ademais, o efeito lock-in é consideravelmente reforçado na presença de externalidades de rede. Tendo em vista que as externalidades de rede ditam que determinada plataforma aumentará seu valor e relevância na medida em que agregar um número maior de usuários, as inconveniências de consumir esse mesmo serviço por um outro fornecedor fazem com que os usuários permaneçam na plataforma que já possui o público agregado[44].

No ambiente digital, o uso de dados pessoais para personalizar a experiência dos serviços também pode gerar o lock-in dos usuários. Como apontado no Relatório “Challenges for Competition Policy in a Digitalised Era”, a integração de múltiplas plataformas cria sinergias relevantes para os usuários, que se acostumam com a experiência proporcionada e a adotam em suas rotinas diárias:​

A integração de múltiplas plataformas por meio de dados de usuários cria sinergias que ambos os consumidores e anunciantes se beneficiam, mas ao mesmo tempo ela também cria efeitos “lock-in” para ambas as partes. Consumidores se acostumam com os serviços que eles gostam. Uma vez que esses serviços se tornam uma parte integral de suas vidas cotidianas, eles estarão menos inclinados a trocar para outros serviços. Eles são ainda menos inclinados a trocar quando a experiência de um serviço individual (ex. usando ferramentas de busca) depende do uso de outros serviços (como e-mail, serviços de geolocalização ou serviços de media social, por exemplo, trocando entre as nuvens da Apple e Microsoft). O uso de perfis de dados pessoais causa esse efeito. Qualquer limite para transferir esses dados para um competidor impõe custos de troca para consumidores[45].

 

Desse modo, o que ocorre é que a plataforma incrementa seu valor na medida em que atrai consumidores dos múltiplos lados da plataforma, como uma externalidade da rede, e, em associação, a plataforma consegue atar os usuários, porque eles já se acostumaram com o serviço e enfrentariam custos relevantes – muitas vezes, impeditivos – para trocar de plataforma.

Em adição, as economias de escala e escopo[46] também desempenham um papel significativo no contexto da economia das plataformas, porque permitem o desenvolvimento do ecossistema com custos marginais baixíssimos[47]:

“Quando os economistas explicam os efeitos indiretos da rede em nossos modelos teóricos, o preço de maximização do lucro para os participantes de um lado poderia ser menor que o custo de fornecer uma unidade adicional; poderia ser zero ou, em outras palavras, gratuito; ou poderia ser menor que zero no sentido de que o negócio realmente paga ao participante algo quando ele ou ela usa o produto”.

Em conclusão, o que se constata é que a plataforma do Google se tornou imprescindível para quem navega na internet. Em termos concorrenciais, isso desperta a atenção para os incentivos que o Google possui para empreender condutas que possam ter o efeito de excluir rivais.

 

6.2. Acusação 1 – Posicionamento Preferencial

Para além das considerações tecidas acima, é importante notar a disposição dos elementos da SERP para compreender a prática alegada de posicionamento preferencial.

 

Unidade comercial em resposta a busca por “geladeira”no Google em dispositivo móvel em 06/09/2018

Fonte: Nota Técnica nº 51/2018/CGAA2/SGA1/SG/CADE, pg. 32

 

 

Unidade comercial em resposta a busca por “geladeira”no Google em computador de mesa em 06/09/2018

Fonte: Nota Técnica nº 51/2018/CGAA2/SGA1/SG/CADE, pg. 30

 

Como se depreende das imagens, que exibem a SERP tanto em dispositivos móveis quanto em computadores, a unidade comercial do Google figura em posição inicial e destacada na página. O “box” exibe os PLAs dos varejistas e marketplaces que anunciam no Google Shopping.

Como explicado pela SG e pelo Conselheiro-Relator, os links nos PLAs direcionam o usuário para o site do vendedor do produto. Ao percorrer o box, o link ao final dos anúncios – “ver mais” – direciona para a página do Google Shopping. Desse modo, a unidade comercial funciona como um portal de acesso para a plataforma de busca temática.

Considerando a interface existente entre o mercado de busca genérica e o mercado de busca, trabalhada na seção 2.1 deste voto, a alegação principal em torno da prática do posicionamento preferencial consiste na alavancagem do poder de mercado que o Google detém, inquestionavelmente, no mercado de busca genérica para o mercado de busca temática, no qual entrou mais tardiamente.

A teoria de alavancagem desenvolvida no já mencionado Relatório “Competition Policy for the Digital Era[48] foi introduzida da seguinte forma:

Alavancagem. Sob uma perspectiva estratégica de negócios, alavancagem pode ser “ofensiva” (para gerar mais lucros) ou “defensiva” (impedir a entrada no mercado central por um mercado adjacente, frequentemente um nicho), mas não há diferenças legais ou analíticas entre os dois. Alavancagem pode se dar de diferentes maneiras. Como uma grande plataforma possui uma forte vantagem competitiva sobre novos entrantes por conta das externalidades de rede e acesso privilegiado a dado, é importante tentar mitigar tais efeitos sem sacrificar eficiências[49].

 

O relatório indica que uma das técnicas para promover a alavancagem consiste na prática de self-preferencing (“auto-preferência”), como alegada e investigada neste caso[50]. Isto é, o agente dominante concede um tratamento preferencial para os seus próprios produtos ou serviços quando competem com produtos e serviços fornecidos por outros agentes que usam a plataforma.

Essa técnica pode ser implementada pelos chamados modelos de negócios híbridos, que são definidos como aqueles em que o agente “atua como operador da plataforma, mediando diferentes participantes de mercado operando na plataforma, enquanto simultaneamente atuando como concorrente desses participantes no nível upstream ou no nível downstream e mercados correlatos[51]

Tais modelos de negócios possuem fortes incentivos para discriminar rivais, uma vez que os agentes têm interesse em aumentar a receita nos mercados correlatos e, por isso, podem optar por favorecer os seus serviços frente aos concorrentes[52].

Considerando o caso concreto, verifica-se que o Google, como modelo de negócio híbrido, possui incentivos econômicos para discriminar rivais. A alavancagem por meio do posicionamento preferencial teria, portanto, o objetivo de favorecer o Google Shopping em detrimento dos demais concorrentes que fazem uso da busca genérica para angariar tráfego. O posicionamento preferencial da unidade comercial teria o efeito de rebaixar os demais resultados da SERP e atrair e reter a atenção dos usuários no resultado temático do Google.

Desse modo, o tráfego de usuários ficaria concentrado na Unidade Comercial, no início da página. Considerando a dinâmica das plataformas e a teoria econômica apresentada, o aumento dos usuários na plataforma do Google Shopping também implica o aumento de anunciantes e, assim, da monetização.

Em contrapartida, a redução da relevância dos resultados inferiores à Unidade Comercial implica a redução de tráfego de usuários e, por conseguinte, na redução de anunciantes nos demais sites de comparação de preço. Com a redução de tráfego, tanto de usuários quanto de anunciantes, os demais concorrentes acabam tendo seus custos elevados para atuar e, em última instância, podem ser excluídos do mercado.

Assim, a teoria de dano para a conduta alegada se articula, em tese, com base nas seguintes premissas:

A plataforma de busca genérica do Google concede tratamento preferencial à unidade comercial e, em última instância, à sua própria plataforma de busca temática por produto;

O posicionamento da unidade comercial alavanca a relevância do Google Shopping e dos anúncios nele realizados, ao mesmo tempo em que diminui o espaço, a visibilidade e a relevância dos resultados orgânicos;

Com redução da relevância, os resultados para os sites de comparadores de preços perdem quantidade de tráfego, o que acarreta também a redução de anunciantes;

Com a queda do tráfego e da relevância e, por conseguinte, do número de anunciantes que monetizam os sites comparadores de preços, o Google consegue inviabilizar a concorrência e fechar o mercado de busca temática para produto.

Entretanto, o teste para verificar a ocorrência da potencialidade lesiva atribuída à prática não necessita da constatação de que a página do Google é uma infraestrutura essencial[53].

Tal análise é prescindível, tendo em vista que a alavancagem decorre da posição dominante, e a consequente possibilidade de fechamento do mercado não decorre da vedação do acesso à essencialidade da infraestrutura, mas da vedação ao alcance da massa crítica de usuários e anunciantes para os comparadores de preço.

No presente caso, a SERP é uma plataforma capaz de fornecer uma parcela substancial do tráfego necessário para atuação do negócio de comparação de preço na internet, uma vez que a posição dominante do Google equivale a aproximadamente 90% do mercado de busca genérica online.

Caso houvesse outros agentes com participação de mercado mais elevada, de modo a reduzir a relevância do Google, é possível que a plataforma do Google não fosse relevante para garantir a massa crítica necessária, tendo em vista que a combinação das demais poderia suprir a redução do tráfego.

A teoria de dano, portanto, é de que, por meio do self-preferencing, o Google alavanca a posição dominante do mercado upstream para a Unidade Comercial/Google Shopping, retirando a visibilidade e a relevância dos demais sites de comparação de preço, de modo que eles perdem tráfego e, assim, a massa crítica necessária para concorrer efetivamente.

 

6.2.1.Teste para verificação da conduta ilícita

A doutrina especializada destaca que as práticas de alavancagem são concorrencialmente preocupantes quando impedem a competição no mérito por meio do domínio que um agente adquiriu sobre uma interface, plataforma, infraestrutura essencial ou informações essenciais[54].

A alavancagem é problemática, portanto, quando resulta de uma prática que atenua a concorrência – isto é, quando o poder de mercado é alavancado no mercado correlato por uma medida que não consiste em concorrência no mérito (“competition on the merits”). Desse modo, o abuso da posição dominante é configurado, uma vez que o crescimento no mercado correlato se deu por meio de uma conduta que reduziu a pressão competitiva sem mérito.

Desse modo, em atenção às considerações tecidas a respeito do modelo de negócios e da teoria de dano, compreendo que a análise concorrencial deve verificar a ocorrência dos seguintes quesitos para configuração do ilícito concorrencial: (i) verificar que o agente possui posição do dominante no mercado upstream; (ii) verificar que o agente empreendeu conduta que reduziu a pressão competitiva sofrida no mercado downstream, de modo a alavancar seu poder de mercado[55]; (iii) verificar a existência de justificativa econômica legítima; e, (iv) no caso em que haja justificativa legítima, verificar se haveria alternativa menos restritiva da concorrência.

Isto é, é preciso que a alavancagem seja decorrente de uma conduta que tenha o objetivo e o efeito de reduzir a pressão competitiva dos agentes participantes do mercado downstream, de modo que a competição no mérito é mitigada. Assim se configuram o abuso da posição dominante no caso e a anticompetitividade da alavancagem.

 

6.3. Acusação 2 – Restrição de acesso ao PLA e/ou ao Google Shopping

A segunda conduta alegada consiste na suposta discriminação, por parte do Google, da disponibilização de anúncios com fotos (PLAs) apenas a varejistas e marketplaces, recusando sua contratação por parte dos comparadores de preço concorrentes.

Como argumentado pela SG, a conduta pode ser tida como anticompetitiva por dois fatores principais: (i) a exigência de que os comparadores de preços modifiquem seus negócios para realizar a venda de produtos significa um aumento irrazoável dos custos para competir; e (ii), em última instância, isso implica a mudança do concorrente direto do modelo de negócios do Google Shopping:

Essa alternativa, contudo, exige, de todo modo, que os comparadores de preço continuem gastando mais para divulgar esse serviço de administração de anúncios para os varejistas e, além disso, acompanhar o rendimento da conta do varejista para poder cobrar certa remuneração dele. A baixa adesão de comparadores de preço a esse modelo de negócios indica que ele não é eficiente o suficiente para ser lucrativo aos comparadores de preço e, efetivamente, compensar o dano sofrido pela perda de visibilidade na SERP do Google.

Contudo, mais relevante do que o aumento dos custos para que um PCS possa anunciar no PLA do Google, seja por meio da venda direta em seu site, no modelo de marketplace, seja no modelo de agenciamento de campanha de outros varejistas, é o fato de que o Google exige dos PCSs o desvirtuamento de sua atividade primária para que possam estar aptos a anunciarem no PLA. Dito de outra maneira, o Google impõe aos PCSs que deixem de ser somente PCSs para que possam anunciar em sua unidade comercial.

Esse é um ponto fundamental, pois os PCS, em seu modelo original de negócio, competem diretamente com o Google pelos anúncios do varejo. Nesse cenário, os comparadores de preço se constituem em uma opção adicional para os varejistas online divulgarem seus produtos. Ao mesmo tempo que competem com o Google por anúncios, os PCSs também são clientes do buscador, pois também anunciam em sua plataforma e pleiteam o acesso à sua mídia mais eficiente: os anúncios com imagens (PLA).

Ao forçar uma alteração do modelo de negócio dos PCSs para marketplaces como meio de obter acesso ao PLA, o Google pode estar induzindo a redução da competição no mercado de publicidade online, tornando os PCSs apenas consumidores de espaço em suas plataformas (o que já é atualmente) mas deixando de competir pelos anúncios do varejo. O Google impõe, dessa maneira, um custoso trade off aos PCSs: continuar atuando como comparadores de preço, mas sem acesso ao PLA, ou se transformarem em marketplaces e com isso poderem anunciar no PLA. Os dois caminhos podem contribuir para a manutenção e potencialização do poder de mercado do Google. Ao se manterem como PCSs, esses players não têm acesso a uma das mais relevantes formas de publicidade do mercado, perdendo relevância com o tempo e podendo eventualmente deixando o mercado. Ao se transformarem em marketplaces, esses agentes reduzem a competição com o Google pelas verbas publicitárias do varejo e passam a competir com esse mesmo varejo por espaço no próprio Google, potencializando as receitas da plataforma – considerando que o aumento da concorrência nos leilões de anúncios é elemento que contribui para a elevação dos valores para anunciar no Google”[56]. (Grifou-se).

 

Desse modo, a restrição do acesso para os comparadores de preço aos PLAs pode se mostrar como um tratamento discriminatório capaz de lesar a concorrência. Ademais, o Google teria incentivos para discriminar os comparadores de preço, pois conseguiria aumentar os custos dos seus rivais, bem como reduzir a pressão competitiva exercida por eles.

A teoria de dano articulada, portanto, considera que o tratamento diferenciado dado aos comparadores pode reverter em efeitos lesivos à concorrência, na medida em que: (i) impede condições dos rivais de se tornarem mais relevantes; (ii) aumenta os custos dos rivais para competir; e (iii) finda por desvirtuar a natureza dos concorrentes, enfraquecendo a pressão competitiva.

 

6.3.1. Teste para verificação da conduta ilícita

Tendo em vista a teoria de dano, é preciso constatar as seguintes condições para configuração do ilícito concorrencial: (i) constatar a existência de posição dominante no mercado à montante; (ii) verificar tratamento discriminatório aos agentes que atuam como concorrentes no mercado à jusante e que resulte em redução indevida da capacidade de concorrer; (iii) verificar a existência de justificativa econômica legítima; e (iv) no caso de haver justificativa legítima, avaliar se haveria alternativa menos restritiva da concorrência.

 

7. Análise Concorrencial

7.1. Acusação 1 – Posicionamento Preferencial

Primeiramente, tomando os mercados relevantes definidos e a aferição do poder de mercado, constata-se que o Google detém posição dominante firme no mercado nacional de busca genérica, em nível à montante.

A conduta de alavancagem no presente caso teria se consubstanciado por meio da prática de posicionamento preferencial. Como já trabalhado neste voto, a prática de posicionamento preferencial ocorreu com a disposição da Unidade Comercial no início da SERP, em local destacado. Tendo em vista que a própria Representada explica que a evolução da SERP se deu de modo a conceder posicionamento mais relevante aos resultados temáticos, como a SG bem conclui, “não há dúvidas de que o Google, de maneira intencional, conferiu tratamento diferenciado aos seus resultados de produtos, não os submetendo ao algoritmo de busca geral ao qual os demais sites, inclusive outros comparadores de preços, sempre foram submetidos[57].

O Google argumenta que a evolução das modificações promovidas no desenho da página tem justificativa legítima e resulta de uma postura de concorrência no mérito, pois buscou melhorar a experiência de compra do usuário e a qualidade dos anúncios[58].

Entretanto, analisando com mais atenção, o que se percebe, em verdade, é que a modificação do layout findou por excluir a possibilidade de competição no mérito entre a unidade comercial (e, consequentemente, o Google Shopping) e os demais comparadores de preço.

Isso porque, a unidade comercial, como resultado de busca, não se submete ao ranqueamento feito pelo algoritmo de pesquisa. Isto é, quando o algoritmo identifica termos de pesquisa que refletem a intenção de compra pelo usuário, a unidade comercial é fixada no topo página, em local privilegiado, independentemente de ranqueamento com os resultados da busca genérica[59].

Nesse sentido, o Google formulou o seguinte esclarecimento em manifestação juntada no início do procedimento:

Em seu pedido original, a E-Commerce contestava o Google Shopping sob o fundamento de que os resultados de shopping eram exibidos nos resultados de busca orgânica e que não eram ranqueados e divulgados da mesma maneira que os outros resultados de busca orgânica. Agora que o Google Shopping foi alterado para um modelo de anúncios pagos, os resultados de shopping não são mais exibidos, nem ranqueados dentre os resultados da busca orgânica. Esses resultados estão devidamente identificados como “Patrocinadose estão colocados próximos aos outros anúncios no topo ou ao lado direito dos resultados de busca. Portanto, considerando que o Google Shopping não mais aparece como um resultado de busca orgânica, o fundamento do pedido original da E-Commerce restou prejudicado. Do mesmo modo, a própria fundamentação de alegada discriminação em relação à E-Commerce não existe mais”[60].

 

Porém, diferentemente do quanto alegado, a posição preferencial e a inexistência de ranqueamento não afastam a alegação de tratamento discriminatório – pelo contrário, reforçam-na.

Essa realidade, a propósito, vai de encontro ao objetivo que o Google alega ter com seus serviços de busca – qual seja, fornecer a melhor resposta para o usuário. A avaliação da melhor resposta é feita por meio do PageRank, de modo que não é possível afirmar que a disposição da unidade comercial no topo da página seria a melhor resposta.

Além disso, se os PLAs são realmente uma ferramenta mais efetiva para a busca online e cria uma melhor experiência para os usuários, como o Google alega[61], submeter a unidade comercial ao ranqueamento seria uma maneira de atestar tal qualidade e de obter o resultado do posicionamento privilegiado de uma maneira verdadeiramente competitiva no mérito.

Não se trata, portanto, de uma modificação de design pró-competitiva, visto que a competição no mérito é afastada por meio do posicionamento privilegiado da unidade comercial da SERP.

Neste ponto, é importante destacar que a presente análise não implica que o Google incorrerá em ilícitos concorrenciais sempre que efetuar modificações de desenho em sua plataforma que causem a redução do tráfego dos concorrentes, como foi argumento pela Representada. As modificações realizadas pelo Google poderão configurar ilícitos concorrenciais na medida em que se revelarem como abusos de posição dominante, por meio de práticas que não blindaram o Google da pressão competitiva exercida pelos concorrentes no mercado à jusante. É isto que se verifica no presente caso.

Desse modo, em atenção aos quesitos elencados na seção 7.2.1, constata-se que o Google detém posição dominante no mercado upstream e que a conduta de alavancagem se consubstanciou por meio de prática que afastou a competição no mérito e reduziu a pressão competitiva dos concorrentes de maneira abusiva.

Ainda, para além de afastar a concorrência no mérito, a redução da relevância dos resultados orgânicos também é um incentivo para o Google realizar a prática, já que serviria para atrair um maior número de anunciantes. Como demonstrado anteriormente, uma das variáveis consideradas para determinar o número de anunciantes na plataforma do Google diz respeito à qualidade dos resultados orgânicos, já que eles concorrem com os resultados patrocinados.

A disponibilização da Unidade Comercial no topo da SERP acarreta a redução de espaço, de visibilidade e de tráfego nos resultados orgânicos. Com isso, há um impacto positivo sobre o número de anunciantes na plataforma.

Embora, por outro lado, a qualidade dos resultados orgânicos pudesse impactar negativamente no número de usuários, essa redução é mitigada, primeiramente, pela própria posição dominante do Google e os efeitos de rede e lock-in da plataforma.

Em adição, a própria posição privilegiada da unidade comercial mitiga a transferência dos usuários para outras plataformas de busca e comparação, pois ainda assim ela consegue atrair a maior parte da atenção do consumidor para o resultado patrocinado na unidade comercial e, posteriormente, ao Google Shopping, caso a Unidade Comercial sozinha não forneça as respostas adequadas.

Compreendo, assim, que a relevância adquirida pela Unidade Comercial/PLAs/Google Shopping não pode ser atribuída a uma competição no mérito. O self-preferencing findou por blindar o Google da pressão competitiva exercida pelos demais comparadores de preço, de modo que é possível constatar o abuso da posição dominante no Google para a alavancagem da sua própria plataforma de busca temática no mercado correlato.

Seguindo ao próximo passo da análise, cumpre verificar a suficiência das justificativas econômicas apresentadas pelo Google para realização da prática. Em se mostrando suficientes, deve-se avaliar se haveria alternativas menos restritivas da concorrência que poderiam ser adotadas.

Como mencionado, a alegação principal do Google quanto a essa conduta diz respeito ao elemento inovador da prática e ao aumento de qualidade proporcionada para o usuário na experiência de pesquisa online.

De fato, o argumento relativo à inovação e à melhoria de bem-estar pode se revelar como uma justificativa econômica legítima para a prática. Entretanto, é preciso rememorar a ponderação tecida pela SG quanto à potencialidade lesiva de inovações à concorrência[62]:

Importa ressaltar que é possível que inovações introduzidas por um agente dominante possam causar, como efeito colateral, possíveis prejuízos a concorrentes, não necessariamente constituindo infração à ordem econômica. Por outro lado, mesmo inovações que objetivam, prioritariamente, melhorar a experiência do usuário podem conter artifícios anticompetitivos embutidos, que visem tão somente a exclusão de competidores. Nesse sentido, as justificativas apresentadas devem ser sopesadas com seus eventuais efeitos, intencionais ou não. Assim, em seguida serão apresentados dados a respeito dos possíveis efeitos negativos para o ambiente concorrencial[63].

 

Ademais, não entendo que o Google Shopping tenha apresentado qualquer inovação. A inovação de fato existente consiste na experiência de busca introduzida pelo Universal Search. No entanto, a Unidade Comercial, o PLA e a plataforma Google Shopping não introduziram qualquer elemento de novidade que já não existissem em outras plataformas.

O mesmo argumento se repete para a qualidade da experiência do consumidor. O Universal Search traz uma comodidade para o consumidor ao “advinhar” intenção da busca e incluir – ou não – resultados de compra no SERP. Isto é, o aumento de qualidade não decorre diretamente da Unidade Comercial, do Google Shopping ou do posicionamento desses elementos no SERP.

Em vista disso, as informações juntadas pelo Google, como aquelas apresentadas no Parecer elaborado pela LCA Consultoria, a respeito do sucesso dos PLAs e da Unidade Comercial, não podem ser tomadas como provas de que a modificação promovida pelo Google de fato foi pró-competitiva e resultou em melhoria para a experiência dos usuários[64]:

"O sucesso dos PLAs entre os anunciantes é também evidenciado [ACESSO RESTRITO AO GOOGLE]. Isto tem o efeito de tornar esse tipo de resultado cada vez mais útil ao usuário, já que uma maior gama de produtos ofertados faz com que os PLAs se tornem ferramenta relevante para um maior número de pesquisas, [ ACESSO RESTRITO AO GOOGLE]. O gráfico 9 abaixo mostra o [ACESSO RESTRITO AO GOOGLE] entre 2015 e 2016.  [ACESSO RESTRITO AO GOOGLE] os anunciantes estão satisfeitos com os PLAs como uma ferramenta para alcançar potenciais consumidores. Além disso, o aumento do número de produtos ofertados torna os PLAs uma ferramenta útil para um número mais abrangente de termos de buscas. Isto também explica o [ACESSO RESTRITO AO GOOGLE] observado em 2016 (Gráfico 8), mostrando que também entre os usuários esta ferramenta é bem sucedida, uma vez que estão demandando cada vez mais PLAs."

 

[ACESSO RESTRITO AO GOOGLE]

 

O aumento de anunciantes no PLA/Unidade Comercial apontado pelo Parecer pode resultar, de fato, da melhoria da experiência e dos retornos recebidos por usuários e anunciantes em razão do Universal Search, mas também pode decorrer justamente do posicionamento preferencial, como explicado em seções anteriores sobre a racionalidade da conduta e a teoria de dano.

A despeito disso, ainda que se tome a justificativa econômica apresentada como legítima, o que se constata é que o Google poderia ter promovido a mesma melhoria por meio de alternativas menos restritivas, resguardando a competição no mérito e a possibilidade de escolha livre pelo usuário.

Ainda que a experiência do Universal Search seja tida como uma inovação que melhorou a experiência de pesquisa do usuário, que passou a receber outros formatos de resposta que não apenas os “links azuis”, a diagramação da página poderia se dar de modo a equilibrar os resultados – orgânicos ou patrocinados – tidos pelo PageRank como mais relevantes para aquele determinado usuário.

Isto é, ainda que a experiência com resultados temáticos na SERP possa ser tida como a melhor, a prática de posicionamento preferencial não tem justificativa econômica ou de negócios e revela a racionalidade anticompetitiva do Google em promover preferencialmente os resultados próprios de sua plataforma e de seus anunciantes.

Em vista do quanto analisado, compreendo que os quesitos indicados na seção 6.2.2 deste voto foram constatados e o ilícito concorrencial foi configurado.

 

7.2. Acusação 2 – Impedir acesso ao PLA e/ou ao Google Shopping

Igualmente, tomando os mercados relevantes definidos e a aferição do poder de mercado, verifico que o Google detém posição dominante no mercado nacional à montante de busca genérica.

Neste ponto, o Relatório “Competition Policy for the Digital Era” faz apontamentos relevantes a respeito do papel das plataformas como reguladoras do seu próprio ecossistema e como isso pode despertar preocupações concorrenciais:

“Como a recente literatura salientou, muitas plataformas, “marketplaces” em particular, atuam como reguladores, estabelecendo as regras e instituições por onde seus usuários interagem.

O fato de as plataformas escolherem as regras não é um problema per se. Nós devemos agradecer a competição entre diferentes modelos de negócios e diferentes arquiteturas de plataformas e encorajar inovação naquele espaço – de fato, esses tipos de inovação permitiram que plataformas gerem grandes eficiências ao possibilitar transações que não eram possíveis anteriormente. Além disso, nós esperaríamos que, em muitos casos, plataformas possuem incentivos para escrever boas regras para fazer as suas plataformas mais valiosas para os usuários.

Contudo, isso pode não ser sempre o caso. Por exemplo, uma plataforma dominante pode ter incentivo para vender “posições de monopólio” para seus usuários de negócios (e.g. em termos de ranqueamento de resultados apresentados aos consumidores de uma plataforma). Alternativamente, como visto acima, uma plataforma dominante poderia desenhar as regras (ou aplicá-las) de uma maneira que permita participar de auto-preferência abusiva.

Para lidar com esses tipos de problemas, nós acreditamos que – por causa de suas funções como reguladores - plataformas dominantes tem a responsabilidade de garantir que a suas regras não impedem uma livre, sem distorção e vigorosa competição sem justificativa objetiva. Uma plataforma dominante que estabelece um marketplace deve garantir condições de igualdade nesse marketplace e não pode usar o seu poder de estabelecer regras para determinar o resultado da competição” [65].

 

Essas considerações da literatura especializada são pertinentes para a presente análise concorrencial, porque permitem enxergar o potencial anticompetitivo da conduta em exame e a configuração do ilícito.

Ao restringir o acesso aos comparadores de preço, como já apontado, o Google consegue aumentar os custos de rival. Nesse mesmo tópico, a SG compreendeu que:

Como informado na descrição dos mercados, contudo, a atuação como marketplace envolve a internalização de custos extras, de modo que a requisição disso para a exibição no topo da SERP é, na prática, um aumento de custos de uma firma rival. Esse aumento de custos não seria preocupante se o topo da SERP não fosse necessário para uma rivalidade efetiva por parte dos comparadores de preço. Como avaliado na análise do DEE, embora esses sites não recebam todo o seu tráfego da busca orgânica do Google, parte relevante do tráfego provém de lá, mas tem sido desviada pela atenção do usuário ao anúncio com foto. Estes trechos das respostas de comparadores de preço aos ofícios enviados durante a instrução reafirmam isso[66].

 

De outro lado, o Google argumenta que:

tem diversas justificativas para limitar o Product Universal e os PLAs aos anunciantes que vendem produtos em seus sites. Em primeiro lugar, os resultados de produtos do Google fornecem informações detalhadas aos usuários sobre aquele produto específico, tais como preço, vendedor, modelo e uma imagem antes que eles cliquem no link. Em segundo lugar, links que direcionam a uma página de compra agilizam e melhoram a experiência do usuário. Em terceiro lugar, o Google concebeu o Product Universal e os PLAs para melhorar a qualidade dos resultados exibidos em resposta a buscas realizadas no Google.com.br"[67]

 

Contudo, essa justificativa não se sustenta e é contraditória com o comportamento do próprio Google para outras plataformas temáticas, como bem apontado pela SG:

Pesquisas executadas por esta SG em 24/07/2018, pouco após a apresentação dessa informação pelo Google (11/07/2018), revelaram funcionamento diferente dos resultados de hotéis.

Em busca por “royal tulip brasilia alvorada”, hotel localizado em Brasília, o TripAdvisor apareceu entre os resultados de hotéis. Essa mesma consulta foi apresentada como exemplo pelo Google ao responder o questionamento feito pela SG.

Diferentemente do alegado pelo Google, a página do TripAdvisor não permitia "que o usuário completasse uma ação (reserve o hotel ou adquira uma passagem)".

De modo semelhante, quando, na SERP do Google, esta SG clicou não no link do TripAdvisor, e sim no do Booking, também não lhe foi permitido completar uma ação (reservar o hotel).

Como já fora explorado por esta SG em investigação recente no mercado de agências de turismo online, o Tripadvisor é um metabuscador, agente que apenas busca e compara preços de acomodações e oferece como resultado para o usuário diversas opções de sites para fazer a reserva, desde agências de turismo online (como Booking, Expedia, Decolar) até sites dos próprios estabelecimentos hoteleiros.

Ou seja, o Google oferece em sua plataforma de resultados para hotelaria agentes que permitem efetuar a reserva diretamente em seus sites bem como agentes que apenas fazem uma nova comparação e redirecionam o usuário para outros sites de reserva, que podem inclusive também anunciar na plataforma do Google[68].

 

É certo que se trata de mercados distintos, com peculiaridades que merecerão soluções distintas. Contudo, isso demonstra que a experiência de transação realizada diretamente no resultado fornecido não é a única forma da qual o Google se vale para organizar seu negócio. Isso indica que a geração de valor da plataforma do Google, bem como a qualidade da experiência de busca poderiam se dar de maneira menos restritiva à concorrência no que tange à comparação de preço.

Além disso, o fato de que o Google permite que meta-buscadores apareçam como resultados na busca temática sobre hotéis reforça a racionalidade anticompetitiva que o Google adotou para o mercado de comparação de preço.

Ainda, por fim, ao se perceber a conduta de restrição de acesso ao PLA juntamente com a conduta de self-preferencing, nota-se com maior clareza a racionalidade anticompetitiva do comportamento do Google.

Articulando as duas teorias de dano, o que se nota é que por meio do posicionamento preferencial da Unidade Comercial o Google consegue retirar a relevância dos resultados orgânicos para os comparadores de preço e, ao mesmo tempo, impede que os comparadores consigam retomar a relevância e competir efetivamente ao restringir o acesso ao PLA, que se localiza na Unidade Comercial, no topo da página de resultados.

Portanto, compreendo que as condições elencadas na seção 6.3.1 deste voto foram constatadas, de modo que o ilícito concorrencial foi configurado.

 

8. Efeitos

Considerando a combinação das duas condutas alegadas, verificarei a produção dos efeitos de maneira conjunta.

De acordo com a Nota Técnica nº 51/2018/CGAA2/SGA1/SG/CADE, a SG, muito embora tenha mencionado não ser possível concluir pela existência de nexo de causalidade ou quantificar os possíveis efeitos da conduta, entendeu que seria possível uma conclusão pela potencialidade de efeitos negativos decorrentes de tal conduta.

Além disso, afirmou que seria possível afirmar que a conduta do Google tenha causado danos aos comparadores de preços. De forma semelhante, já no que diz respeito aos efeitos negativos para o consumidor final, concluiu que a conduta do Google, ao afetar sites de comparação de preços, acabou por afetar em algum grau, também, o consumidor final, a quem restou um mercado menos competitivo para a busca por produtos. Tais conclusões encontram-se transcritas abaixo:

311. É possível afirmar, todavia, que a conduta do Google tenha causado danos aos comparadores de preços, ante todo o abordado sobre a importância das páginas de resultado do Google como “portal de entrada” da WWW. Sublinha-se, também, que os efeitos analisados foram sentidos em todos os comparadores de preço de uma maneira geral, com alguns agentes tendo deixado o mercado ao longo dos anos (como é o caso do Zura)259com exceção de um único, o Zoom, que tinha outras razões para conseguir manipular o seu tráfego de maneira diferenciada (é parte de um grupo econômico relevante, o que lhe permite o subsídio cruzado).

312. A impossibilidade de atestar, de maneira quantitativa, causalidade entre a conduta do Google e o dano à concorrência é elemento importante, mas não suficiente, para que se afaste os elementos qualitativos presentes nos autos. Ao contrário da primeira conduta analisada, em que não é possível relacionar a prática do Google de inserir os resultados de busca por produtos do Google Shopping com efeitos deletérios aos seus concorrentes, em relação à discriminação na comercialização dos PLAs, essa é uma conclusão passível de obtenção por dedução lógica – não obstante a mensuração de sua magnitude seja mais improvável.

313. Embora não seja possível quantificar o quanto da queda de tráfego dos PCSs concorrentes se deveu à recusa do Google em disponibilizar anúncios com fotos aos comparadores de preços, considerando que (i) os anúncios com fotos são reconhecidamente mais eficientes na atração do público usuário; e (ii) o posicionamento desses anúncios goza de espaço privilegiado na página de resultados da busca – acima ou na lateral da página – estar alijado desse espaço publicitário obviamente reduz a capacidade de um agente econômico expor seus produtos e serviços.

314. Se não é possível quantificar e objetivar em números a produção dos ditos efeitos negativos em decorrência da conduta, é, pelo menos, possível uma conclusão pela potencialidade desses efeitos negativos em decorrência da conduta. O potencial lesivo de o Google exibir, com preferência, anúncios com fotos de produtos no lugar de sites onde o usuário podia entrar para ver anúncios de produtos é claro: esses sites perderão visibilidade, tráfego e renda.

VII.4.2 Efeitos negativos para o consumidor final

(...)

324. A conduta do Google, ao afetar sites de comparação de preço, acaba por afetar em algum grau, também, o consumidor final, a quem resta um mercado menos competitivo para a busca por produtos. Por outro lado, ausente um nexo causal robusto entre as práticas do Google e os efeitos prejudiciais ao mercado, não se pode afastar a possibilidade de que o mercado esteja, de fato, caminhando para um modelo em que os PCS percam relevância para o consumidor, hipótese que, mesmo em um exercício contrafactual que já perdura 7 anos, desde o início das investigações, ainda não se confirmou[69]” (grifos nossos).

 

Diante das considerações da SG, acolho as suas conclusões referentes aos efeitos anticompetitivos decorrentes da conduta do Google.

Nesse sentido, os dados juntados aos autos permitem verificar que a potencialidade lesiva da conduta se concretizou por meio da constatação de dois fatos centrais concomitantes: a saída de um número considerável de comparadores de preço do mercado, associado ao crescimento acelerado do Google Shopping.

Primeiramente, verifica-se que o Google Shopping obteve um crescimento agudo bastante acelerado frente aos comparadores de preços que existiam e detinham, anteriormente, poder de mercado relevante no setor:

 

[ACESSO RESTRITO - GOOGLE]

 

 

Ademais, como apontado pela Representante[70], a entrada do Google Shopping marcou a saída de quase a totalidade dos comparadores de preços do mercado:

 

[ACESSO RESTRITO – E-COMMERCE]

 

Paralelamente, constata-se que o Google Shopping teve um crescimento elevado não apenas frente aos comparadores de preço, mas também frente aos marketplaces nacionais, se sobrepondo a todo eles, exceto por um:

 

[ACESSO RESTRITO - GOOGLE]

 

Assim, tendo em vista que o posicionamento privilegiado da unidade comercial, associado à restrição de acesso ao PLA, constitui uma estratégia de redução de competição no mérito e articula uma teoria de dano relacionada à alavancagem de posição dominante por meio da redução de tráfego dos concorrentes e impedimento da massa crítica de usuários e anunciantes, entendo que os dados demonstram a concretização do efeito anticompetitivo. Já no que diz respeito ao nexo de causalidade, divirjo das conclusões da SG e entendo pela existência de nexo de causalidade entre a conduta praticada pelo Google e os seus efeitos anticompetitivos. Isto porque, não vislumbro, no presente caso, outros fatos que poderiam explicar a queda de participação de mercado dos comparadores de preço e, conforme também evidenciado acima, a saída de determinados players desse mercado.

Como fundamento adicional, não enxerguei provas de que o comportamento do consumidor tenha alterado durante o período da conduta, fato que, ao meu ver, reforça a causalidade entre a conduta investigada e os efeitos anticompetitivos trazidos acima.     

 

9. Remédio

Tendo em vista o quanto exposto ao longo do voto, entendo que um remédio que seja efetivo no presente caso envolveria a imposição de uma restrição que impeça a alavancagem automática de seu comparador de preço, razão pela qual adiro integralmente ao remédio proposto pelo Conselheiro João Paulo Resende.

Isto porque, conforme visto, o Google consiste em uma plataforma que conecta diversos tipos de consumidores, empresas e anunciantes de acordo com o seu algoritmo que está constantemente direcionando os seus consumidores para os resultados que, de acordo com critérios estabelecidos pelo próprio Google, entende serem os mais pertinentes a tal consumidor.

O Google, como disse, surgiu como uma plataforma de matching na qual o usuário espera receber a melhor informação possível para a resposta formulada. No entanto, o que ocorre quando usuário não entende que as informações apresentadas na SERP respondem adequadamente à sua pergunta e têm a intenção de comprar? Os dados mostram que os usuários têm recorrido ao Google Shopping. No entanto, não compreendo que as provas apresentadas pelas Partes permitem concluir que a preferência do usuário decorre de algum valor percebido pelo usuário ou inovação promovida pelo Google.

A alavancagem no presente caso é exercida por meio do desenho da página e uso de arquitetura de escolha (“choice architecture”) para direcionar o usuário que utiliza a busca genérica e não encontra o resultado na SERP para o seu serviço de shopping. Evidência disso é o fato dos links que mais geram cliques para o serviço do Google Shopping estarem em volta da Unidade Comercial.

Como ressaltado pelo Conselheiro João Paulo Resende, os gráficos apresentados demonstram que “pouca relevância teria a frequência com que outros comparadores de preços aparecessem na busca orgânica do Google, nem se eles aparecessem em posição de maior destaque que o Google Shopping”.

Assim, é possível ver o Google como um arquiteto de escolha. Nas palavras de THALER e SUNSTEIN, “[u]m arquiteto de escolha tem a responsabilidade de organizar o contexto em que as pessoas decidem[71].

Por se tratar de um fenômeno de comportamento e escolha humana, entendo apropriado analisar essas escolhas à luz não apenas do direito e da economia, mas também à luz da economia comportamental. Ou seja, como seres humanos agem e não como o homo economicus age.

A economia comportamental trouxe importantes contribuições que entendo serem aplicáveis ao presente caso. Trata-se de complemento à teoria econômica neoclássica no sentido de que seres humanos são agentes maximizadores racionais, mas que o comportamento humano sofre algumas restrições:

A tarefa do direito e economia comportamental, afirmado de maneira simples, é explorar as implicações do real (não hipotético) comportamento humano para a lei. Como as “pessoas reais” se diferenciam do homo economicus? Nós iremos descrever as diferenças salientando três importantes “limites” do comportamento humano, limites que colocam em questão as ideias centrais da maximização de utilidade, preferencias estáveis, expectativas racionais e processamento ótimo de informação. Pode ser dito que pessoas mostram racionalidade limitada, força de vontade limitada e interesse próprio limitado[72].

 

Então o que ocorre nos momentos de tomada de decisão? De acordo com KAHNEMAN, temos dois sistemas de processamento de informações e decisões. A literatura sugere que utilizemos o sistema 1 de pensamento quando realizamos compras online[73]:

“O desejo dos consumidores de diminuir esses custos cognitivos pode levar as pessoas a adotar comportamentos habituais difíceis de serem alterados ao usar a internet.

Se nós estabelecermos hábitos e rotinas para alocar nossos escassos recursos cognitivos, essas rotinas - assim como muitos outros hábitos - podem ser bem difíceis, i.e., custosos para romper, criando altos custos de troca com possíveis implicações anticompetitivas. Se o Google Search fornece maneiras para diminuir esses custos por meio de acesso conveniente para serviços de internet desejados como e-mail, YouTube ou mapas, então pode haver custos de troca que se desenvolvam conforme o uso do Google se torne habituado. Se essas tendências são magnificadas, como podem ser por meio de efeitos de rede, é ao menos possível que resultados anticompetitivos podem seguir – de forma que a competição não está mais a “um clique de distância”. Para se desenvolver até esse ponto, eu adoto a terminologia do vencedor do Nobel de econômica e pioneiro intelectual  da economia comportamental, Daniel Kahneman. Ele divide os mecanismos para o controle de ações humanas entre o automático e involuntário (que ele denomina “Sistema 1”) e o esforçoso, deliberado, consciente e introspectivo (que ele denomina “Sistema 2”)”[74].

 

Nesse sentido, a alavancagem é exercida por meio do posicionamento privilegiado que nada mais é do que um “nudge” (ou incentivo) para direcionar o consumidor inserido na sua plataforma para os lugares que o Google pretende:

“A aquisição do Google de recursos altamente utilizados, muitas vezes únicos da internet, tais como o YouTube e o Google Books, e a inserção pelo Google de seus links em locais fáceis de achar podem refletir um esforço para encorajar a formação de hábito e talvez remeter o uso do consumidor do Google para o Sistema 1. Considere a página do browser do Google. Os seus links, tais como o Google News, YouTube, Gmail, Google Books, combinam os recursos da rede que possivelmente constituem uma constelação das melhores ferramentas de busca especializada da rede. A coleção de vídeos do YouTube é verdadeiramente única e impossível de ser replicada porque reflete milhões de vídeos de milhões de espectadores coletados ao longo de muitos anos”[75].

 

A intervenção antitruste vem justamente para quebrar tais incentivos e fazer com que o consumidor exerça a sua própria vontade e não a vontade percebida pelo Google. A intervenção serve, assim, para impedir o abuso da posição dominante que, no caso, é exercido por meio de uma “choice architecture” que retira a livre escolha do consumidor.

A alteração da arquitetura de escolha em sede de remédios antitruste foi analisada por FLETCHER ao avaliar o remédio no caso Microsoft Browser. FLETCHER ressalta que, em se tratando de escolhas, oferecer acesso aos concorrentes poderá não ter efetividade se a arquitetura de escolha não for alterada.

“Segundo, comportamentais viesados tem implicações importantes para a efetividade dos remédios, onde estas são dependentes do comportamento do consumidor. Por exemplo, oferecendo aos consumidores uma nova opção pode ter pouco impacto sobre a concorrência se eles apresentam forte viés padrão ou status quo. Em alguns casos, remédios só funcionarão bem se eles mudarem a arquitetura de escolha frente os consumidores, não apenas as opções de escolha. Um exemplo reflexivo foi o remédio no caso Microsoft Browser; uma “tela de escolha de caixa”, que forçou os consumidores a fazerem uma escolha ativa e imparcial. Após a introdução deste remédio na UE, a participação de mercado do Internet Explorer no mercado de navegador diminuiu significativamente mais rapidamente na União Europeia do que nos Estados Unidos, que não foi sujeito ao remédio”[76].

 

Um dos fundamentos do bem-estar do consumidor é a liberdade de escolha por meio da preservação da qualidade e diversidade dos bens no mercado. O antitruste tradicionalmente protege a qualidade e diversidade dos bens no mercado. O que sugiro, no presente caso, e o que se almeja com a restrição proposta é proteger também a liberdade de escolha.

Portanto, vejo o remédio sugerido como um elemento que quebra a tomada de decisão automática do usuário e o força a escolher se prefere continuar no ecossistema Google ou se prefere comparar em outro metabuscador.

Por fim, ressalto que a restrição proposta é efetiva, uma vez que soluciona as preocupações concorrenciais decorrentes da conduta e atende também a um elemento restitutivo destacado como importante em casos de self-preferencing no Relatório da Comissão Europeia emitido em 2019:

Ainda, onde se auto-priorizar tem beneficiado significativamente uma subsidiária de plataforma em melhorar o seu posicionamento de mercado frente aos competidores, tais remédios podem incluir um elemento restitutivo (“remédios reparadores”). De forma a permitir competidores anteriormente em desvantagem recuperarem força, tal remédio pode, por exemplo, ser necessário para dar a eles acesso ao recurso de dados competitivamente relevantes da plataforma dominante ou de outra forma compensar pela sua visibilidade reduzida ou falta de acesso de dados no passado[77].

 

10. Dispositivo

Adiro integralmente à proposta de multa e análise de dosimetria proposta pelo Conselheiro Paulo Burnier, bem como à proposta de remédio do Conselheiro João Paulo Resende.

É o voto.

 

PAULA FARANI DE AZEVEDO SILVEIRA

Conselheira

 

[1] SEI 0598846 e SEI 0608210.

[2] Disponível em: https://about.google/our-story/. Acesso em 04 jun. 2019.

[3] “Em agosto de 1998, o cofundador da Sun, Andy Bechtolsheim, assinou um cheque no valor de US$ 100.000,00 para Larry e Sergey, e a Google Inc. nasceu oficialmente”. Em: https://about.google/our-story/. Acesso em 04 jun. 2019.

[4] Nota Técnica Final nº 51/2018, p. 6, parágrafo 23 (SEI 0549266).

[5] Vol. 1, p. 97 (SEI 0001421).

[6] Vol. 1, p. 17 (SEI 0001421): “O Google exibe resultados de shopping em sua página de busca em outros países (por exemplo, nos Estados Unidos da América) desde 2002. O serviço de busca do Google foi aperfeiçoado desta forma no Brasil no final de 2011 para enfatizar os resultados de shopping quando os algoritmos do Google determinam com alto grau de confiabilidade que um usuário está procurando um produto ou serviço específico”.

[7] Vol. 1, p. 15 (SEI 0001421): “A exibição de resultados de ambos algoritmos especializados e generalistas em uma única página de resultados de busca - referido como "Universal Search " - portanto, representa simplesmente uma solução para um serviço de busca que se empenha em ser tanto profundo como amplo, em termos do tipo de informações que fornece.

[8] Vol. 1, p. 16, §22 (SEI 0001421).

[9] Nota Técnica 51/2019/SG/CADE, p. 22, §47: “(...) “Google Product Search” (ou, simplesmente, “Product Search”)71 e os seus resultados de produtos (ou seja, informações tanto enviadas por varejistas, quanto informações obtidas pelo Google por crawling)72 passaram a ser exibidos, dentro da SERP, com imagens, preços e links para sites de comerciantes onde os produtos podem ser adquiridos, como exibido na imagem a seguir, com os resultados provenientes do Product Search dentro de um retângulo com bordas vermelhas. A caixa com resultados do Product Search foi chamada de “Product Universal”. Os resultados no Product Universal eram ranqueados para a exibição na SERP de acordo com sua relevância e utilidade perante a consulta feita pelo usuário”.

[10] Nota Técnica 51/2019/SG/CADE, p. 24, §§50-51.

[11] Nota Técnica 51/2019/SG/CADE, p. 24-25, §§52-53.

[12] Nota Técnica 51/2019/SG/CADE, p. 29-30, §§58-59.

[13] Diz-se que o Google é uma plataforma pois obedece aos três critérios formulados por Evans (2003): i) existência de dois ou mais grupos distintos de consumidores; ii) existencia de externalidades positivas em força da conexão ou coordenação de dois grupos; e iii)  a necessidade de um intermediário para internalizar as externalidade.

[14]One distinction may be drawn between transaction platforms and non-transaction platforms.12 A transaction platform can be defined as an intermediary whose aim is to enable direct (observable)13 transactions between two distinct customer groups. Both groups share the same objective, i.e. to conduct a transaction (such as the trading of a product) with the respective other side. There are positive bilateral indirect network effects between the two groups that are internalised by the transaction platform. One side by itself would not be sufficient for the service offered by the platform, i.e. multi- sidedness is not a non-mandatory option but an essential part of the service. In contrast, non-transaction platforms mediate a different kind of interaction and do not necessarily exhibit bilateral positive network effects. Enabling interactions is not always an integral part of their service. In particular, some non-transaction platforms may be launched with one side only, and the second side may be added at a later stage. A media platform, such as a newspaper, for example, is able to generate a wide readership by providing editorial contents, and later offer the platform to advertising companies for their purposes.” OECD (2018). Rethinking Antitrust Tools for Multi-Sided Platforms, p. 57. Disponível em: www.oecd.org/competition/rethinking-antitrust-tools-for-multi-sided-platforms.htm. Acesso em 19.06.2019.

[15] Nesse sentido ver páginas 32 a 34 da Nota Técnica DEE (SEI 0549416).

[16]Cross-Platform Network Effects. The different sides of a platform market are interdependent to the extent their decisions affect each other, even indirectly.5 Network effects are the cross-platform externalities that result when the actions of participants on any side of the platform, or of the platform itself, affect participants on other sides of the platform (or the functioning of the platform itself). The externality can be direct, as when an increase in content providers makes the platform more valuable to content consumers, or indirect, as when a platform’s provision of better terms for users makes the platform more attractive to content or service providers and to advertisers. For ease of exposition, this paper will refer to all cross-platform externalities simply as “network effects””. SHELANSKI, H; KNOX, S; DHILLA, A. Network Effects and Efficiencies in Multisided Markets. Disponível em: https://one.oecd.org/document/DAF/COMP/WD(2017)40/FINAL/en/pdf. Acesso em 19.06.2019.

[17] Tradução livre de: ““For example, when a strong cross-platform network externality exists on more than one side of the market, this creates feedback loops. In these loops, an action can trigger a spiral of reactions, which, as in a multiplier effect, increase the magnitude of the consequences of the action. As an example, increasing the price that users pay might reduce the number of users, but this may also reduce the value of the platform to advertisers and hence reduce the amount that advertisers are willing to pay. In turn, this may reduce the return that content providers earn when their content is viewed on the platform, thereby reducing the amount or quality of content, which may reduce the number of users. Once again, this may then reduce the amount that advertisers are willing to pay, and so forth. Each action the platform takes can therefore create a series of reactions (a ripple effect). If these effects go far enough they may tip the firm towards failure on the one hand, or dominance (monopoly) on the other”.

 OCDE (2018). Rethinking Antitrust Tools for Muti-Sided Platforms, p. 11. Disponível em:https://www.oecd.org/daf/competition/Rethinking-antitrust-tools-for-multi-sided-platforms-2018.pdf. Acesso em 19.06.2019.

[18] Não confundir mercados relacionados com mercados verticalmente relacionados.

[19] SEI 0001421, p. 1-94.

[20] Cumpre mencionar que a Representante, posteriormente, juntou aos autos um complemento à Representação, no qual informou que, para além das condutas já alegadas, o Google também estaria se utilizando de conteúdo de sites concorrentes, tais como comentários e reviews, para incrementar sua plataforma e aumentar o tráfego de seus próprios sites de busca especializada, em uma conduta denominada de scraping, em inglês, ou raspagem de conteúdo, em português. Para apurar a referida conduta, por meio do Despacho nº 1023/2013 , a SG autuou a investigação em autos apartados, sob nº 08700.009082/2013-03 .

[21] SEI 0001438, pp. 1303-1351.

[22] A título exemplificativo, cf. PA nº 08012.001271/2001-44 (caso SKF), PA nº 08012.011042/2005-61 (caso Raízen) e, mais recentemente, PA nº08012.007423/2006-27 (Unilever Brasil Ltda. e Nestlé Brasil Ltda.)

[23] FRAZÃO, Ana. Direito da Concorrência: pressupostos e perspectivas. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 257.

[24] Nesse sentido, vide: In re Mass. Bd. of Registration in Optometry, 110 F.T.C. 549 (1988), 1988 WL 1025476, at *43. “[the rule of reason is] a series of questions to be answered in turn. First, we ask whether the restraint is “inherently suspect.” In other words, is the practice the kind that appears likely, absent an efficiency justification, to “restrict competition and decrease output”? For example, horizontal price-fixing and market division are inherently suspect because they are likely to raise price by reducing output. If the restraint is not inherently suspect, then the traditional rule of reason, with attendant issues of market definition and power, must be employed. But if it is inherently suspect, we must pose a second question: Is there a plausible efficiency justification for the practice? That is, does the practice seem capable of creating or enhancing competition (e.g., by reducing the costs of producing or marketing the product, creating a new product, or improving the operation of the market)? Such an efficiency defense is plausible if it cannot be rejected without extensive factual inquiry. If it is not plausible, then the restraint can be quickly condemned. But if the efficiency justification is plausible, further inquiry—a third inquiry—is needed to determine whether the justification is really valid. If it is, it must be assessed under the full balancing test of the rule of reason. But if the justification is, on examination, not valid, then the practice is unreasonable and unlawful under the rule of reason without further inquiry—there are no likely benefits to offset the threat to competition. It is noteworthy that the Supreme Court in NCAA found a plausible efficiency, considered it, found it wanting, and rendered a decision for the plaintiffs under the rule of reason without employing the full balancing test normally associated with the rule.”

[25] Tradução livre de: “The inquiry seems three-pronged. (1) What harm to competition results or may result from the collaborators' activities? (2) What is the object they are trying to achieve and is it a legitimate and significant one? That is, what are the nature and magnitude of the "redeeming virtues" of the challenged collaboration? (3) Are there other and better ways by which the collaborators can achieve their legitimate objectives with fewer harms to competition? That is, are there "less restrictive alternatives" to the challenged restraint?”. In: P. Areeda, The "Rule of Reason" in Antitrust Analysis: General Issues (Federal Judicial Center 1981). https://www.fjc.gov/sites/default/files/2012/Antitrust.pdf. Ver também: MEESE, Alan J. Price Theory, Competition and the Rule of Reason. University of Illinois Law Review, 2003. p. 81: “Courts, scholars and the enforcement agencies have articulated a three step test to govern analysis under this Rule of Reason. First, a plaintiff must establish a prima facie case by showing that the restraint produces tangible anticompetitive harm, a showing that usually consists of proof of “actual detrimental effects” such as increased price or reduced output. Second, the defendants must prove that their agreement produces “procompetitive” benefits that outweigh the harm implicit in plaintiff’s prima facie case. Third, even if the defendants can make such a showing, the plaintiff can still prevail by proving that the defendants can achieve the same benefits by means of a “less restrictive alternative.” This three part test, it is said, helps courts distinguish those contracts that “harm” or “destroy” competition, by creating or exercising market power, from those that promote it”. Disponível em: http://scholarship.law.wm.edu/facpubs/553/. Ver também: BLAIR, Roger D.; SOKOL, Daniel. The Rule

of Reason and the Goals of Antitrust: An Economic Approach. Antitrust Law Journal, 2012, n. 2. Disponível em: https://pdfs.semanticscholar.org/910e/ac3f32cc301499754556e58626e9c45287c8.pdf

[26] Tradução livre de: “The entire logic of rule of reason proof is to put off and minimize the occasions for weighting and balancing pro- and anticompetitive effects”. In: HOVENKAMP Herbert J., "The Rule of Reason" (2017). Faculty Scholarship. 1778, p. 25. Disponível em: https://scholarship.law.upenn.edu/faculty_scholarship/1778. Acesso em 19.06.2019.

[27]General statements of the rule of reason sometimes say that it routinely requires “balancing” of procompetitive and anticompetitive effects.271 Courts make these statements notwithstanding decades of litigation showing such balancing to be unworkable and actual attempts at it to be rare.272 Once a court purports to engage in balancing it is almost always acting outside of its competence except in the most obvious cases. Balancing under a consumer welfare test is significantly easier than under a general welfare test, because the former requires prediction only of price or output effects.273 This is not to say, however, that balancing is easy, particularly for restraints that have survived the burden-shifting analysis that occurs prior to balancing. Sixth Circuit Judge William Howard Taft noted over a century ago in United States v. Addyston Pipe & Steel Co.274 that some courts misconceived the role of antitrust analysis as determining “the proper limits of the relaxation of the rules for determining the unreasonableness of restraints of trade.”275 These courts “have set sail on a sea of doubt” by assuming the power to determine “how much restraint of competition is in the public interest, and how much is not.”276 Taft’s caution contrasted Justice Brandeis’s oft criticized statement of the rule of reason in the Chicago Board of Trade decision, which put everything up for balancing: The true test of legality is whether the restraint imposed is such as merely regulates and perhaps thereby promotes competition or whether it is such as may suppress or even destroy competition. To determine that question the court must ordinarily consider the facts peculiar to the business to which the restraint is applied; its condition before and after the restraint was imposed; the nature of the restraint and its effect, actual or probable. The history of the restraint, the evil believed to exist, the reason for adopting the particular remedy, the purpose or end sought to be attained, are all relevant facts. This is not because a good intention will save an otherwise objectionable regulation or the reverse; but because knowledge of intent may help the court to interpret facts and to predict consequences.277 A test that makes everything relevant provides nothing useful, because it gives no calculus for weighting or even identifying the important factors.278 In a complex world it is essential that antitrust tribunals keep their eyes on the ball, which under the consumer welfare test refers to restraints that realistically restrict output and increase price, and that are not essential to carrying on a joint venture’s legitimate functions. Balancing is not even conceptually possible without a unit of measurement. That is, purely ordinal methods of balancing work only when the value on one side is zero. When both sides have some weight, however, we must have a way of netting them out. But it appears that outside of the merger context no court has ever even attempted to put an actual number, such as dollars of economic loss or gain, on either the anticompetitive effects of a restraint or the justifications offered against it. A far better way to view the rule of reason is as a series of sequential steps intended to avoid balancing whenever possible. When balancing must be performed, the consumer welfare principle insists on a measurable unit, which is either price or output”. Op. Cit., p. 38 e seguintes.

[28] Tradução livre de: “We should immediately emphasize the absence of any automaticity between the rule of reason and the balancing test. To the best of my knowledge, the Supreme Court has indeed never linked the two. Additionally, a recent study analyzing over 300 court decisions proved that the balancing test had been applied in only five percent of these cases.4 In short, this Article understands the rule of reason as being a negation of general per se rules, and that is about it. The question of which test to apply to each practice arises after the need to implement a rule of reason is agreed upon. It could be the balancing test—that I reject for reasons related to its administrability—or for instance, the profit sacrifice test, the equally efficient rival test, or the no-economic sense test. This is exactly what is underlined by Mark S. Popofsky, who states that “the unifying principle is that each Section 2 legal test reflects a specific expression of the same underlying ‘rule of reason,’ and that “Section 2’s rule of reason, so understood, asks: For the type of conduct at issue, which legal test likely maximizes consumer welfare over the long run?”. In: SCHREPEL, Thibault, A New Structured Rule of Reason Approach for High-Tech Markets (February 2, 2017). Suffolk University Law Review, Vol. 50, No. 1, 2017. Available at SSRN: https://ssrn.com/abstract=2908838. Notas de Rodapé no original: “4. See Daniel C. Fundakowski, The Rule of Reason: From Balancing to Burden Shifting, 1 PERSPECTIVES IN ANTITRUST, 1 (2013), http://www.americanbar.org/content/dam/aba/publications/antitrust_law/at303000_ ebulletin_20130122.authcheckdam.pdf [https://perma.cc/6R3T-FJV3] (explaining rule of reason’s burden shifting). 5. Mark S. Popofsky, Defining Exclusionary Conduct: Section 2, the Rule of Reason, and the Unifying Principle Underlying Antitrust Rules, 73 ANTITRUST L.J. 435, 437 (2006) (considering rule of reason a “foundation for courts to select among competing legal tests”). Applicable considerations in selecting the appropriate test include not only the likely consumer harms and benefits from the conduct, but also the risks of false positives, false negatives, and the legal process costs.” Id. 6. Id.”

[29] Vide, nesse sentido, PA nº 08012.002673/2007-51 (Representante: Associação Nacional dos Fabricantes de Autopeças (ANFAPE). Representados: Volkswagen do Brasil Indústria de Veículos Automotivos Ltda, Fiat Automóveis S.A, Ford Motor Company Brasil Ltda.), julgado em 14.03.2018; PA nº 08700.009082/2013-03 (Representante: E-Commerce Media Group Informação e Tecnologia Ltda. Representada: Google Inc. e Google Brasil Internet Ltda.), julgado em 19.06.2019, dentre outros.

[30] Volume 1. (SEI 0001421)

[31] CRÉMER, Jacques; MONTJOYE, Yves-Alexandre de; SCHWEITZER Heike. Report on “Competition policy for the digital era”. Bruxelas: Comissão Europeia, 2019, p. 3 e 4. Disponível em: http://ec.europa.eu/competition/publications/reports/kd0419345enn.pdf. Acesso em 19.06.2019.

[32] Tradução livre de: Market definition. In the digital world, market boundaries might not be as clear as in the “old economy”. They may change very quickly. Furthermore, in the case of multisided platforms, the interdependence of the "sides" becomes a crucial part of the analysis whereas the traditional role of market definition has been to isolate problems. Therefore, we argue that, in digital markets, we should put less emphasis on analysis of market definition, and more emphasis on theories of harm and identification of anti-competitive strategies. At the same time, even if in some consumer-facing markets – according to their own account – firms compete to draw consumers into more or less comprehensive ecosystems, markets for specific products or services will persist from a consumer’s perspective, and should continue to be analysed separately, alongside competition on (possible) markets for digital ecosystems. Where the firms’ lock-in strategies are successful, and consumers find it difficult to leave a digital ecosystem, ecosystem-specific aftermarkets may need to be defined.”

[33] Nota Técnica 51/2018. Parágrafos 156 ao 160.

[34] Nesse sentido, vide: WU, Tim. Blind Spot: The Attention Economy and the Law, p. 29. Disponível em: https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2941094&download=yesWU. Acesso em 19.06.2019. “Uma abordagem vem do economista David Evans em um pioneiro artigo de 2013. Evans observou que, em um período superior a 10 anos, categorias inteiras de sites se tornaram menos ou mais populares (por exemplo, media social se tornou mais popular, e portais de rede menos). Em tal artigo, ele insinuou que muito daquilo que está na rede competindo pela atenção está presumivelmente no mesmo mercado. Como ele escreveu: Twitter oferece um serviço muito diferente para os espectadores (micro – blogging) que Yahoo (curador de conteúdo). ... O ponto desse artigo, no entanto, é que tais diferenças não são necessariamente relevantes para analisar a competição entre plataformas online. Esses rivais de atenção estão todos competindo agressivamente entre eles para assegurar atenção” Tradução livre de: “One approach comes from economist David Evans in a pioneering 2013 paper.124 Evans noted that, over a ten-year period, entire categories of sites became more or less popular (for example, social media became more popular, and web portals less). In that paper he implied that much that is on the web competing for attention is presumptively in the same market.125 As he wrote: Twitter provides a very different service to viewers (micro-blogging) than Yahoo (content curation). … The point of this article, though, is that those differences are not necessarily relevant for assessing competition among online platforms. These attention rivals are all competing aggressively with each other to secure attention”.

[35] Nota Técnica nº 51/2018, p. 59, §§139-140.

[36]The conversion funnel models a consumer’s search and purchase process and is commonly used by marketers (Kotler and Armstrong, 2011). This literature suggests that consumer decision making involves a multi-stage process of – (i) awareness, (ii) information search, (iii) evaluation, (iv) purchase, and finally (v) post-purchase activity (Jansen and Schuster, 2011).” ABHISHEK, Vibhanshu; FADER, Peter; HOSANAGAR, Kartik. Media Exposure through the Funnel: A Model of Multi-Stage Attribution (August 17, 2012). Disponível em: https://ssrn.com/abstract=2158421 ou http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.2158421. Acesso em 19.06.2019.

[37] Cf. Voto da Conselheira-Relatora, p. 6 (SEI 0527547). A SG, embora tenha fornecido dados de apenas 2018, também constatou a presença de poder de mercado do Google: “91. Segundo dados do StatCounter, ferramenta de análise de tráfego de sites da internet, se considerados apenas os acessos através de desktop, o Google detinha, em maio de 2018, 94,05% do mercado. Já se forem considerados também os demais meios de acesso (mobile, tablete e console), o share do Google chega a 96,43%. É inegável, pela leitura dos dados acima, que o Google detém posição dominante no mercado nacional de sites de busca online genérica, mercado de origem da conduta. 92. A participação verificada no Brasil supera, inclusive, a média mundial, o que indica a dominância do Google no mercado brasileiro. A participação mundial do Google, também em maio de 2018, chega a 86,51%, se considerados apenas os acessos via desktop, e 90,62%, se considerados todos os meios. 93. É fundamental mencionar que tal valor seria próximo do poder de monopólio, bem acima da participação de mercado de 20% necessária para presumir uma posição dominante no mercado, segundo o § 2º do artigo 36 da Lei no 12.529/11. Esse nível de dominância, por si só, já lhe daria um relevante poder de influência em relação a sites verticalmente relacionados”. Cf. Nota Técnica nº 15/2018/CGAA2/SGA1/SG/CADE, p. 8.

[38] Vide, nesse sentido, os seguintes papers: European Commission, 2019. p. 52. Disponível em: http://ec.europa.eu/competition/publications/reports/kd0419345enn.pdf; OECD. The Digital Economy (2012), p. 8. Disponível em: http://www.oecd.org/daf/competition/The-Digital-Economy-2012.pdf; Digital Competition Expert Panel. Unlocking Digital Competition: report from the digital Competition expert panel, p. 102 e seguintes. Disponível em: https://www.gov.uk/government/publications/unlocking-digital-competition-report-of-the-digital-competition-expert-panel; dentre outros.

[39] Nesse sentido, de acordo com OECD. The Digital Economy (2012), p. 146: “Professor Wu added that, as an unscientific rule-of-thumb, one could consider a market-leading firm to be dominant for competition law purposes if it remains unchallenged for five years, or if it very easily defeats any challenges that do arise”. Disponível em: http://www.oecd.org/daf/competition/The-Digital-Economy-2012.pdf. Acesso em 19.06.2019.

[40]For firms that compete in multi-sided markets, a price change on one side of the market has positive feedback effects on the other sides of the market; the analyst must consider these crossover effects to determine the overall effect of a price change on profits”. EVANS, David S. The Antitrust Economics of Multi-Sided Platform Markets, 20. Yale J. on Reg. (2003). Available at: https://digitalcommons.law.yale.edu/yjreg/vol20/iss2/4. Acesso em 19.06.2019.

[41] Ver YUN, John. M. Understanding Google’s Search Platform and the Implications for Antitrust Analysis. Journal of Competition Law & Economics, vol. 14, n. 2, pp.  311–329, julho/2018. As considerações tecidas nesta seção a respeito dos incentivos econômicos que motivam o Google são todos baseados no referido artigo.

[42]The lock-in effect refers to a situation in which consumers are dependent on a single manufacturer or supplier for a specific service, and cannot move to another vendor without substantial costs or inconvenience”. In: https://cambridgeservicealliance.eng.cam.ac.uk/resources/Downloads/Monthly%20Papers/2014AugustPaperBusinesstoConsumerLockinEffect.pdf

[43]Lock-in can be described as 'switching costs' (e.g., Amit & Zott, 2001; Smith, Bailey, & Brynjolfsson, 1999) that consumers are forced to incur when changing from one vendor to another. In addition, the search and communication costs incurred, for example, for initiation, definition, control, and adaption of a service agreement (Fleisch, 2002). Therefore, the lock-in effect has its theoretical underpinnings in transaction cost economics (Coase, 1937, pp. 386-405; Williamson, 1989). Additional inconveniences can arise for the consumer when switching to another service, for example, learning how to use the service or personalizing the service” (Smith, 1999).

[44]The lock-in effect is also facilitated by positive network externalities, which are commonly referred to as the “network effect”; an increased number of users make a product more valuable, as in the case of the telephone. Positive network externalities make it inconvenient and cumbersome to consume a service from another supplier. Thus, the lock-in effect also has a theoretical basis in the network theory” (Katz & Shapiro, 1985; Liebowitz & Margolis, 1995; Shapiro & Varian, 1999).

[45] Tradução livre de: “The integration of multiple platforms through user data creates synergies that both consumers and advertisers benefit from, but at the same time it also creates lock-in effects for both parties. Consumers get used to services they like. Once these services have become an integral part of their daily lives, they are less willing to switch to other services. They are even less willing to switch when the experience of an individual service (e.g. using a search engine) depends on using other services (like email, geolocation services, or social media services, for example switching between the clouds of Apple and Microsoft). The use of personal data profiles causes this effect. Any limits to transferring these data to a competitor impose switching costs for consumers.” In http://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/STUD/2015/542235/IPOL_STU(2015)542235_EN.pdf

[46]While marginal costs of online platforms are low, platforms incur high fixed costs that result in large economies of scale. More platform users imply lower total costs per user: One additional user costs virtually nothing, and the fixed costs are distributed over a higher number of users. This affects market concentration positively. Diseconomies of scale are generally also possible due to the increasing complexity of the platform when it increases in size”. In http://ec.europa.eu/information_society/newsroom/image/document/2016-7/institut_der_deutschen_wirtschaft_kln_e_v_13988.pdf

[47] Tradução livre de: “When economists account for the indirect network effects in our theoretical models, the profit-maximizing price to the participants on one side could be less then the cost of providing an additional unit; it could be zero or, in other words, free; or it could be less than zero in the sense that the business actually pays the participant something when he or she uses the product.” EVANS. David, SCHMALESNSEE. Richard; Matchmakers: The New Economics of Multisided Platform. Boston, Massachusetts: Harvard Business Review Press (2016), pg. 32.

[48] European Commission, 2019, p.128. Tradução livre de: “Leveraging. From a business strategy perspective, leveraging can be “offensive” (to generate more profits) or “defensive” (preventing entry in the core market from an adjacent, often niche, market), but there are no analytical or legal differences between the two. Leveraging can take many different forms. As a large platform possesses a strong competitive advantage over new entrants because of network externalities and privileged access to data, it is important to try to mitigate these effects without sacrificing efficiency”.

[50]One specific technique of leveraging a platform’s market power is self-preferencing, i.e. giving preferential treatment to one’s own products or services when they are in competition with products and services provided by other entities using the platform”. Op. Cit., p. 7.

[51]Such harms are particularly salient because online platforms frequently operate “hybrid” business models, where they act as a platform operator mediating between different market participants operating on the platform, whilst simultaneously acting as a competitor to such participants upstream (e.g. by competing with firms using such platform for distribution à la Amazon) or in downstream and related markets (e.g. by competing with firms using the platform as an “eco-system” for marketing apps to consumers à la Google Android)”. Contribuições do Linklaters para “Shaping Competition Policy in the era of Digitalisation”, p .4 e 5. Disponível em:

 http://ec.europa.eu/competition/information/digitisation_2018/contributions/linklaters.pdf. Acesso em 19.06.2019.

[52]Such hybrid activities tend to create an inherent conflict of interest between the platform’s role as neutral intermediary on one hand, and as platform participant (active in related markets) on the other. In simple terms, the commercial interest in boosting revenues in related markets may provide a strong incentive to design the platform to discriminate in favour of its own offerings (selfpreferencing) or to leverage outputs gained as the platform operator to inform strategy or boost (solely) their own offering (cross-usage of data).Op. Cit., p. 4 e 5.

[53] European Commission, 2019, p. 7: “However, we believe that self-preferencing by a vertically integrated dominant digital platform can be abusive not only under the preconditions set out by the “essential facility” doctrine, but also wherever it is likely to result in a leveraging of market power and is not justified by a pro-competitive rationale. In a market with particularly high barriers to entry and where the platform serves as an intermediation infrastructure of particular relevance, we propose that, to the extent that the platform performs a regulatory function, it should bear the burden of proving that self-preferencing has no long-run exclusionary effects on product markets”.

[54]Leveraging is worrying when it hinders competition on the merits because one party has gained control over an essential facility, input, interface or platform, or over essential information. The complaints made about Google in relation to manipulating search results and imposing exclusivity obligations on advertising partners at the expense of competing services may fall under this category (see Box 6)”. VAN GORP, Nicolai; BATURA, Olga. Challenges for Competition Policy in Digitalised Economy, p.32. Disponível em: http://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/STUD/2015/542235/IPOL_STU(2015)542235_EN.pdf. Acesso em 19.06.2019

[55] "A Suprema Corte também enfatizou que “alavancagem pressupõe conduta anticompetitiva”, indicando que alavancagem por si só não viola a Seção 2, mas, ao invés, que qualquer pedido de extensão da conduta de monopólio de um mercado para outro deve incluir uma demonstração de conduta anticompetitiva”. Tradução livre de: “The Supreme court also emphasized that “leveraging presupposes anticompetitive conduct,” indicating that leveraging itself does not per se violate Section 2, but instead that any claim for extension of monopoly conduct from one market into another must include a showing of anticompetitive conduct”. JACOBSON, Jonathan. Antitrust Law Developments (sixth): Volume I. Chicago, III: Section of Antitrust Law, ABA, pg. 305. Disponível em: https://books.google.com.br/books?id=XZcS_H7yYTAC&pg=PA305&lpg=PA305&dq=antitrust+leveraging+test&source=bl&ots=uFpo9OL7ou&sig=ACfU3U3u7xgsE1zmcQYrRdRsMYgwo0QRuQ&hl=pt-BR&sa=X&ved=2ahUKEwjFq5T1qofjAhVpGbkGHRtECs0Q6AEwCXoECAcQAQ#v=onepage&q=antitrust%20leveraging%20test&f=true  Acesso em 19.06.2019.

[56] Nota Técnica 51/2018, p. 120-121, §§305-308.

[57] Nota Técnica 51/2018, p. 96, §245.

[58] Alegações finais, p. 12, §16. “As mudanças no design do produto do Google não apenas não preencheram tais requisites do caso Litrão como, também, foram um resultado natural de uma concorrência no mérito (competition on the merits), visto que o Google buscava melhorar a experiência de compra do usuário e a qualidade dos anúncios exibidos em sua página de resultados de busca (da mesma forma, também beneficiando os anunciantes)”.

[59] Uma das dificuldades enfrentadas pela autoridade antitruste é a constante inovação e alteração das páginas da internet. É possível que na data de publicação do presente voto, a localização da Unidade Comercial não seja única e exclusivamente no topo da página. No entanto, entendo que durante a instrução processual e a elaboração do presente voto, a Unidade Comercial ocupava posição de destaque. Ademais, a posição em si não é o problema concorrencial, mas a racionalidade de posição de destaque que induz o consumidor a entender que aquele é o resultado mais relevante/responsivo às suas necessidades.

[60] Vol. 1, p. 177 (SEI 0001421).

[61] Parecer, SEI 0422375, p. 14: “Além disso, os PLAs são beneficiados pela melhor qualidade do feed dos varejistas. Este tipo de anúncio foi criado para auxiliar varejistas e usuários, uma vez que fornece mais informações aos usuários, que, por sua vez, [ACESSO RESTRITO GOOGLE]. Percebe-se, então, que os PLAs foram estabelecidos para conectar de forma mais efetiva os usuários aos produtos que desejam comprar”.

[62] Nessa linha, ver: BAQUEIRO, Paula. Inovação predatória: preocupações e desafios para o Direito da Concorrência. 2017. 62 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito)—Universidade de Brasília, Brasília, 2017. Disponível em: http://bdm.unb.br/handle/10483/18841. Acesso em 10.06.2019.

[63] Nota Técnica 51/2018, p. 103, §267.

[64] SEI 0422368 e 0422375.

[65] European Commission, 2019, p. 5 e seguintes. Tradução livre: “As the recent economic literature has stressed, many platforms, in particular marketplaces, act as regulators, setting up the rules and institutions through which their users interact. The fact that platforms choose rules is not a problem per se; we should welcome competition between different business models and different platform architectures and encourage innovation in that space — indeed, these types of innovation have allowed platforms to generate large efficiencies by enabling transactions that were not previously possible. Moreover, we would expect that, in many cases, platforms have incentives to write good rules to make their platform more valuable to users. However, this might not always be the case. For instance, a dominant platform could have incentives to sell “monopoly positions” to their business users (e.g. in terms of the ranking of results displayed to consumers on a platform). Alternatively, as seen above, a dominant platform could design the rules (or apply them) in a way which allows it to engage in abusive self-preferencing. To deal with these types of problem, we believe that – because of their function as regulators – dominant platforms have a responsibility to ensure that their rules do not impede free, undistorted, and vigorous competition without objective justification. A dominant platform that sets up a marketplace must ensure a level playing field on this marketplace and must not use its rule-setting power to determine the outcome of the competition.”

[66] Nota Técnica 51/2011, § 299-300, p. 117.

[67] SEI 0516593 e 0516594, p. 10, §12.

[68] Nota Técnica 51/2011, p. 131-135, §§347-355.

[69] Nota Técnica nº 51/2018/CGAA2/SGA1/SG/CADE, p. 113 a 124.

[70] SEI 0518790 e 0518805: “Observa-se pelos dados constantes na Figura 1, supra, que antes do lançamento do Google Shopping e, consequentemente, da implementação das práticas anticompetitivas denunciadas, existiam instalados no Brasil, além dos sites de comparação de preços Buscape e Bondfaro, ainda os seguintes comparadores: JáCotei; Zura!; UOL, por meio da ferramenta Shopping UOL; Terra Ofertas; Globo.com; ShoppingPOP; Shopbot; PreçoMania; CotaPreço; Zoom; CotaCota; Economiza; PescaPreço; KuantoKusta; ShopMania; Twenga; Pega Preço; Eu Comparo entre outros. Havia, portanto, no país, no mínimo, 20 comparadores de preços operando antes de outubro de 2011. (...) A Figura 2, que apresenta o número mensal de visitas de cada comparador em milhar - e portanto a evolução da participação de mercado dos agentes aqui instalados confirma que a partir de janeiro de 2016 o Google Shopping assumiu a liderança deste mercado; e que apenas dois comparadores de preços (Buscape e Zoom) continuam a operar com um tráfego razoável, ainda que declinante, no caso do Buscapé, e estável, no caso do Zoo. Ou seja, todos os demais 18 comparadores de preços já saíram do mercado ou encontram-se em fase de saída, exatamente porque deixaram de ter tráfego e, portanto, condições para geração de receita com a comercialização de anúncios publicitários. A Figura 2 ainda confirma que, durante estes quase Sete anos do início da investigação e das práticas anticompetitivas denunciadas, não houve qualquer entrada de novo comparador de preço”.

[71] THALER, Richard H., SUNSTEIN, Cass R. Nudge: Improving decisions about health, wealth, and happiness. Yale University Press, 2008, p. 3.

[72] Tradução livre de: “The task of behavioral law and economics, simply stated, is to explore the implications of actual (not hypothesized) human behavior for the law. How do “real people” differ from homo economicus? We will describe the differences by stressing three important “bounds” on human behavior, bounds that draw into question the central ideas of utility maximization, stable preferences, rational expectations, and optimal processing of information. 7 People can be said to display bounded rationality, bounded willpower, and bounded self-interest”. JOLLS, Christine; SUNSTEIN, Cass R; THALER, Richard H. A Behavioral Approach to Law and Economics. 50 Stanford Law Rev. 1471 (1998). Disponível em: https://ssrn.com/abstract=2292029. Acesso em 19.06.2019. Nesse sentido ver também: THALER, Richard H. Doing Economics Without Homo Economicus, in Foundations of Research in Economics: How Do Economists Do Economics? 227, 230-35 (Steven G. Medema & Warren J. Samuels eds., 1996).

[74] Tradução livre de:Consumers’ desire to decrease these cognitive costs may lead people to adopt hard-to-change habitual behaviors when using the internet. If we establish habits and routines to allocate our scarce cognitive resources, these routines–like many other habits–can be quite difficult, i.e., costly, to break, creating high switching costs with possible anti-competitive implications. If Google search provides ways to lower these costs through convenient access to desired internet services such as email, YouTube, or maps, then there could be switching costs that develop as Google use becomes habituated. If these tendencies are magnified, as they often can be through network effects, it is at least possible that anti-competitive results may follow– so that competition is no longer a “click away.” To expand upon this point, I adopt the terminology of Nobel economics prize winner and intellectual pioneer of behavioral economics, Daniel Kahneman. He divides the mechanisms for control of human action between the automatic and involuntary (which he terms “System 1”) and the effortful, deliberate, conscious, and introspective (which he terms “System 2”).”

[75] Tradução livre de: “Google’s acquisition of highly used, often unique internet resources, such as YouTube and Google Books, and Google’s placement of their links in easy-to-find places may reflect an effort to encourage habit formation and perhaps consign a consumer’s use of Google to System 1. Consider Google’s browser page. Its links, such as Google News, YouTube, Gmail, Google Books, combine web resources that arguably constitute a constellation of the best-specialized search engines on the web. The YouTube video collection is truly unique and impossible to replicate because it reflects millions of videos from millions of viewers collected over many years”.

[76] Tradução livre de: “Second, behavioral biases have important implications for the effectiveness of remedies, where these are reliant on consumer behavior. For example, offering consumers a new option may have little impact on competition if they exhibit strong default or status quo bias. In some cases, remedies will only work well if they change the choice architecture facing consumers, not just the choice options. A thoughtful example was the remedy in the Microsoft Browser case; a “boxchoice screen” which forced consumers to make an active and unbiased choice. Following the introduction of this remedy in the EU, Internet Explorer’s market share in the browser market fell significantly more rapidly in the EU than it did in the U.S., which was not subject to the remedy”. LETCHER, Amelia. The EU Google Decisions: Extreme Enforcement or the Tip of the Behavioral Iceberg? Disponível em: https://www.competitionpolicyinternational.com/wp-content/uploads/2019/01/CPI-Fletcher.pdf. Acesso em 19.06.2019.

[77]Tradução livre de: Also, where self-preferencing has significantly benefitted a platform’s subsidiary in improving its market position vis-à-vis competitors, such remedies might include a restitutive element (“restorative” remedies). In order to enable formerly disadvantaged competitors to regain strength, it may, for example, be necessary to give them access to the dominant platform’s competitively relevant data resources or otherwise compensate for their reduced visibility or lack of data access in the past”. Comissão Europeia, 2019, p. 68.

 


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Documento assinado eletronicamente por Paula Farani de Azevedo Silveira, Conselheira, em 30/07/2019, às 20:17, conforme horário oficial de Brasília e Resolução Cade nº 11, de 02 de dezembro de 2014.


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Referência: Processo nº 08012.010483/2011-94 SEI nº 0644436